Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01423/06.7BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/30/2021
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Rosário Pais
Descritores:TAXA DE PROMOÇÃO; INSTITUTO DA VINHA E DO VINHO; AUXÍLIO DE ESTADO; NOTIFICAÇÃO À COMISSÃO EUROPEIA
Sumário:I - A taxa de promoção do vinho (criada essencialmente para financiar as atribuições do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cobrada aos agentes do sector e representando mais de 62% do orçamento afeto ao financiamento dos serviços de coordenação geral do mesmo) ao não implicar à partida um auxílio concedido pelo Estado ou proveniente de recursos estatais (característica típica associada à qualificação dos auxílios), não estava sujeita a comunicação prévia no decurso do respetivo procedimento legislativo de criação.

II - Para além de a Comissão ter concluído, logo no início de procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afeta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afeta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitasse os limites "de minimis," como a Comissão veio reconhecer a final.

III - No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Juiz não só pode, como também deve realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade. Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Juiz só não a deve realizar se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.

IV - O tribunal só dá provimento à impugnação das decisões interlocutórias, impugnadas conjuntamente com a decisão final, quando a infração cometida possa modificar aquela decisão ou quando, independentemente dela, o provimento tenha interesse para o recorrente.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:C., LDA
Recorrido 1:Instituto da Vinha e do Vinho, I.P.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento aos recursos.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de os recursos não merecem provimento.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

1. RELATÓRIO

1.1. C., Lda., devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 24.11.2015, pela qual foi julgada totalmente improcedente a impugnação deduzida contra a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos atos de liquidação de taxa de promoção sobre o vinho e produtos vínicos, respeitante aos meses de janeiro a abril de 2006, no valor de € 156.236,98.

1.2. A Recorrente C., Lda. terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:
«1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial do acto tributário relativo à taxa de promoção alegadamente devida ao Instituto da Vinha e do Vinho pelo período de Janeiro a Abril de 2006.
2. Um dos fundamentos em que a sentença recorrida se baseia para concluir pela improcedência da violação do Direito Comunitário, invocando para o efeito o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo 0202/13, é o suposto facto de a medida de auxílio em questão ter respeitado o limiar dos auxílios de minimis, como era «plausível ou prognosticável» e como, aliás, «a Comissão veio a reconhecer a final», o que levaria a que a medida em apreço tivesse enquadramento no previsto n.º 4 do actual artigo 108.º do TFUE.
3. Analisado o elenco da matéria de facto seleccionado pelo Tribunal a quo e que, legalmente, sustenta a respectiva decisão, verifica-se que semelhantes factos – o respeito, por parte da medida de auxílio em causa nos autos, do limiar de minimis e o reconhecimento de tal facto pela Comissão – não resultaram nem provados, nem não provados, nos presentes autos.
4. Estes factos seriam essenciais com referência à apreciação efectuada pelo Tribunal a quo, consubstanciando o corolário lógico e factual desse segmento da decisão.
5. Verifica-se assim a necessidade de se proceder à ampliação da matéria de facto, que deverá ser ordenada por este Tribunal ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do Código do Processo Civil (“CPC”), aplicável ex vi do preceituado na alínea e) do artigo 2.º do CPPT, o que aqui se requer.
6. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre um conjunto de questões suscitadas pela C. na respectiva petição inicial, não invocando uma razão qualquer para justificar a sua abstenção de apreciação, sendo certo que o conhecimento dessas questões não ficou, de forma alguma, prejudicado pela solução dada às questões apreciadas nos autos.
7. Na petição inicial, a C., para além das questões da incompetência do presidente do IW para a prolação do acto impugnado e da ilegalidade da taxa de promoção decorrente da não notificação prévia à Comissão Europeia e respectiva execução antes da decisão final da mesma Comissão, alegou ainda a violação de disposições comunitárias relacionadas com a restrição ilegal ao comércio entre Portugal e os demais Estados-Membros, a Política Agrícola Comum, e ainda a infracção a um acervo legal comunitário relativo à promoção de vinho e produtos vínicos comunitários, no quadro da organização comum do mercado vitivinícola e uma restrição ilegal sobre a livre circulação de mercadorias.
8. Estes vícios imputados ao acto tributário impugnado representavam, na verdade, questões suscitadas legitimamente pela parte com um objecto (pedido) definido e com especificação dos respectivos fundamento ou razões (fundamentação) desse pedido, devidamente individualizadas, a serem apreciadas pelo Tribunal.
9. O Tribunal a quo acabou simplesmente por não se pronunciar sobre estas questões, o que consubstancia uma omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável ex vi do preceituado na alínea e) do artigo 2.º do CPPT e artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, e, em consequência, fere de nulidade a sentença proferida, o que aqui expressamente se vem arguir, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do preceituado na alínea e) do artigo 2.º do CPPT, com todas as consequências legais.
10. Ao contrário do que julgou o Tribunal a quo, estamos perante um auxílio de Estado, porquanto as campanhas de promoção e de publicidade do vinho que beneficiam um determinado conjunto de empresas, são financiadas com receitas da taxa de promoção, sendo consequentemente possível identificar os três elementos que caracterizam um auxílio de Estado: (i) a vantagem económica (a vantagem económica para os operadores do sector vitivinícola decorre do facto de não terem de suportar o encargo com a organização da promoção dos seus produtos); (ii) para um determinado grupo de destinatários (a vantagem económica é atribuída a um determinado conjunto de empresas ou sector de actividade, in casu, o sector do vinho e dos produtos vinícolas); (iii) financiada através de recursos estatais (as receitas utilizadas provêm da cobrança da taxa de promoção que, como é claro, é um recurso estatal).
11. A própria Comissão Europeia reconhece, nas decisões proferidas sobre este assunto e juntas aos autos, que estamos perante um auxílio de Estado.
12. A implementação de uma medida parafiscal – in casu, a taxa de promoção - que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxílio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória ou legal, de tal modo que o produto da taxa influencia directamente o montante do auxílio concedido, tem de ser notificada à Comissão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 88.º do TCE (actual artigo 108.º do TFUE).
13. Foi dada execução pelo Estado Português à taxa de promoção do vinho cobrada pelo IW e às medidas financiadas pelo produto dessa imposição parafiscal, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão.
14. A Comissão Europeia inscreveu as medidas de auxílio e o respectivo modo de financiamento em causa nos presentes autos no conjunto de auxílios não notificados.
15. A taxa de promoção, não tendo sido notificada previamente a Comissão e continuando a ser mantida em execução, é necessariamente inválida até à prolação e trânsito final da decisão da Comissão sobre a respectiva compatibilidade com o mercado comum e manter-se-á inválida, relativamente ao período em questão nos autos, por mais regular e compatível com o mercado comum que se venha a considerar, a final, o auxílio investigado.
16. A taxa de promoção não podia, por isso, ser cobrada; e, tendo-o sido, impõe-se agora aos órgãos jurisdicionais nacionais que declarem a anulação dos actos de liquidação da taxa de promoção relativos ao período em questão, o que se requereu nos presentes autos e veio a ser, com erro de julgamento, indeferido em primeira instância.
17. Não se diga em sentido contrario – como o fez o Tribunal a quo ao reproduzir o Acórdão do STA de 4.12.2013 –, que, no momento de criação da taxa de promoção, «era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afecta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final».
18. Na decisão final proferida no âmbito do procedimento de investigação que vimos referindo, relativa ao período em causa nos autos, a Comissão não veio a enquadrar a medida nos chamados “auxílios de minimis”.
19. Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, a medida de apoio estatal a que se referem os presentes autos não pode ter enquadramento no disposto no actual artigo 108.º, n.º 4, do TFUE, pois:
A obrigatoriedade de notificação à Comissão do auxílio em causa deve ser analisada em função dos elementos, de facto e de direito, existentes à data em que esse auxílio foi adoptado, sob pena de se violarem os princípios da segurança jurídica e protecção da confiança dos cidadãos, princípios estruturantes do Estado de Direito democrático (cf. artigo 2.º da Constituição da Republica);
Aquando da sua introdução no ordenamento interno, o auxílio em causa não foi configurado, nem classificado, pelo Estado Português como um auxílio de minimis, nem foram cumpridas as obrigações inerentes à atribuição ou introdução de um auxílio dessa natureza, como deveria nos termos do disposto nos artigos 2.º e 3.º do Regulamento (CE) 994/98, de 7 de Maio de 1998, não se tendo estabelecido, sequer, na legislação atinente com esta medida, qualquer limite ao montante de auxílio a atribuir;
O elementar princípio da segurança jurídica que vigora e subjaz tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento comunitário, impede igualmente que não se saiba, à partida, se o auxílio é ou não compatível com Direito Comunitário, conclusão a que se chegará, antes da respectiva entrada em vigor, pela Decisão a proferir pela Comissão (em virtude da notificação a que alude o artigo 108.º do TFUE e que, por isso, deverá ser prévia) ou pela configuração antecedente da medida como um auxílio de minimis, o que não sucedeu no caso dos autos;
A considerarão que o auxílio em questão respeitou os limiares de minimis só relevará para efeitos de considerar semelhante auxílio compatível com o mercado comum, já não relevando para efeitos de sanar, a posteriori, a irregularidade cometida com a falta de notificação de um auxílio estatal;
Face ao disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 1998/2006 da Comissão, de 15 de Dezembro de 2006, o regime previsto para os auxílios de minimis, não pode ser aplicado à taxa de promoção, porquanto o produto da taxa, que varia todos os meses, influencia directamente o montante do auxilio concedido, dada a relação de afectação legal entre ambos.
20. A invocada aplicação do regime de auxílios de minimis ao caso dos presentes autos consubstancia uma violação de normas comunitárias, em concreto do n.º 4 do artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 1998/2006, da Comissão.
21. A anulação da taxa de promoção, posta ilegalmente em execução, violando o disposto no artigo 108.º, n.º 3, do TFUE, mostra-se não apenas necessária e adequada à salvaguarda do Direito Comunitário, como proporcional face à violação, que o Estado Português bem conhecia, da proibição de execução da medida em causa enquanto não houvesse pronúncia final da Comissão sobre a mesma.
22. O Tribunal a quo incorreu, pois, em erro de julgamento na sentença proferida, rogando-se a este Venerando Tribunal a revogação da sentença aqui posta em crise.
Termos em que deverá o presente recurso proceder, revogando-se a sentença recorrida, com todas as consequências legais.
Requer-se, em acréscimo, nos termos do disposto no artigo 267.º do TFUE, que a presente instância seja suspensa e se proceda ao reenvio do processo ao Tribunal de Justiça da União Europeia para que esta instância se pronuncie sobre as questões prejudiciais que se enunciarão abaixo.
Note-se que o alcance da obrigação de notificação prévia e efeito suspensivo no caso da taxa em causa nos presentes autos e, bem assim, a possibilidade de aplicação do regime dos auxílios de minimis à mesma medida, consubstanciam questões de interpretação de Direito Comunitário Primário (em concreto, do actual artigo 108.º, n.º 3 e 4. do TFUEV.
Por outro lado, a interpretação do alcance da obrigação de notificação prévia prevista no mencionado artigo 108.º, n.º 3, e o âmbito da possibilidade de aplicação do regime de auxílios de minimis, a posteriori, à medida em causa, são inegavelmente pertinentes e relevantes para a decisão da causa, porquanto semelhante decisão assenta, precisamente, na apreciação da violação ou não dessa obrigação de notificação e, porventura, na possibilidade de aplicar o regime de auxílios de minimis à mesma medida.
Acresce que nos termos do disposto no parágrafo 3 do artigo 267.º do TFUE, o reenvio de uma questão de interpretação de direito comunitário necessária para a decisão da causa mostra-se obrigatória para a última instância de recurso ordinário,
Sendo que entendimento contrário ao referido reenvia prejudicial obrigatório a efectuar por este Alto Tribunal mostrar-se-á forçosamente inconstitucional, por contrariar frontalmente o princípio do juiz legal/natural consagrado nos artigos 216.º, n.º 1 e 217.º, n.º 3, da Constituição e o disposto nos n.os 1 a 4 do artigo 8.º da Constituição,
Porquanto, o juiz comunitário vem a ser o intérprete último do artigo 108.º do TFUE, pois só ele pode garantir a aplicação uniforme do direito da União Europeia, que é acolhido directamente no nosso ordenamento por força do disposto nos n.os 1 a 4 do artigo 8.º da Constituição.
Desta forma, deverá a presente instância ser suspensa e ser ordenado o reenvio do processo ao TJUE para que esta instância se pronuncie sobre as seguintes questões prejudiciais:
A implementação de uma medida parafiscal - in casu, a chamada taxa de promoção - que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxilio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória de tal modo que o produto da taxa influencia directamente o montante do auxilio concedido, tem de ser notificada à Comissão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 88.º do TCE (actual artigo 108.º do TFUE)?
A resposta à questão anterior é alterada em alguma medida pelo facto do produto dessa taxa - consubstanciando embora a única fonte de financiamento desses auxílios, numa relação de afectação legal percentual - financiar igualmente, na percentagem remanescente, outro conjunto de serviços e actividades (podendo ter, por isso, porventura, um efeito protector que vai para além do auxílio propriamente dito que financia)?
O n.º 3 do artigo 88.º do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE) permite a um Estado-Membro proceder à cobrança dessa medida parafiscal que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxílio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória – e que se encontra a ser alvo do procedimento previsto no n.º 2 do mesmo artigo, tendo sido inscrito no registo de auxílios de Estado não notificados -, antes da decisão da Comissão e do trânsito dessa decisão sobre a respectiva compatibilidade?
Em caso negativo – e na hipótese de o Estado-Membro ter procedido à cobrança da referida medida parafiscal –, pode um contribuinte nacional recorrer aos Tribunais nacionais, invocando a violação da obrigação de notificação prévia e proibição de por em execução tal medida, para obter a restituição ou anulação da liquidação da taxa cobrada em violação dessa disposição?
Uma medida parafiscal – in casu, a chamada taxa de promoção ­que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxilio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória de tal modo que o produto da taxa, que varia todos os meses, influencia directamente o montante do auxílio concedido, pode ver-lhe aplicado o regime previsto para os auxílios de minimis, face ao disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 1998/2006 da Comissão, de 15 de Dezembro de 2006?
Em caso afirmativo, ainda assim, a ilegalidade decorrente da não notificação prévia da mesma medida parafiscal poderá ser sanada a posteriori pela eventual conclusão, retirada somente volvidos vários anos da respectiva implementação, de que, por acaso, o auxílio em causa terá respeitado o limiar dos auxílios de minimis, ou poderá ser sanada pelo facto de se mostrar, eventualmente, previsível, na data da respectiva implementação, que o mesmo viria a respeitar esse limiar?»

1.3. A Recorrente já havia interposto recurso do despacho interlocutório proferido em 07.12.2007 (fls. 110-111 do suporte físico dos autos) que indeferiu a requerida produção de prova testemunhal e pericial, formulando, a final, as seguintes conclusões:
«1. A recorrente requereu, na parte final da sua Petição Inicial, que, ulteriormente, venha a ser efectuada prova colegial, tendo indicado que a mesmas versará sobre a pertinente matéria de facto.
2. E arrolou como testemunhas os Funcionários da Administração que actuaram nos autos e os seus próprios funcionários que procederam aos registos e à expedição das mercadorias.
3. A Meritíssima Juíza a quo considera, salvo melhor interpretação do douto despacho recorrido, que o ora recorrente não indicou o objecto da perícia, nem tão pouco enunciou as questões que pretende ver esclarecidas pela diligência, nos termos do artigo 577º do CPC.
4. E indeferiu a inquirição de testemunhas arrolada pela impugnante, por as mesmas não terem sido devidamente identificadas.
5. É certo que, nos termos do n.º 4 do artigo 116º do CPPT, a prova pericial deverá ser regulada nos termos do Código de Processo Civil.
6. Contudo, a aplicação e interpretação da lei processual civil, que se aplica subsidiariamente ao Processo Tributário, deve ser feita em consonância, designadamente, com o princípio da igualdade das partes, expressamente acolhido no artigo 3º - A do CPC, na sua vertente relacionada com o princípio da igualdade das armas.
7. Na verdade, no momento em que apresenta a sua petição, o impugnante desconhece, como é óbvio, quais os factos que serão alegados pela parte contrária e, consequentemente, quais serão factos aceites ou impugnados pela mesma.
8. Pelo que, como é que se pode conjugar o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 577º do CPC, com os n.ºs 2 e 4 do artigo 116.º do CPPT?
9. A resposta, salvo melhor opinião, é dada pelo próprio legislador no n.º 3 do artigo 108º do CPPT.
10. Com efeito, nos termos do n.º 3 do artigo 108º do CPPT, o impugnante deverá oferecer com a Petição Inicial, os documentos de que dispuser, arrolará testemunhas e requererá as demais provas desde que estas não dependam de ocorrências supervenientes (sublinhado nosso).
11. No caso em apreço, o ora recorrente indicou, na medida do possível, o objecto da perícia requerida, dado que o mesmo depende de ocorrências supervenientes, isto é, o objecto da perícia requerida nos presentes autos depende da matéria de facto alegada, pelo impugnado, em sede de contestação.
12. Bem como as testemunhas arroladas pela recorrente foram identificadas na medida do possível dado que a indicação das mesmas nos presentes autos depende da matéria de facto alegada, pelo impugnado, em sede de contestação.
13. Contestação essa que, obviamente, não era conhecida pelo impugnante quando da apresentação da sua Petição Inicial.
14. Aliás, a indicação do objecto da perícia, não pode ser confundida com a fixação do objecto da mesma.
15. Com efeito, cabe ao Juiz, e não ao impugnante, caso não considere a diligência impertinente nem dilatória, determinar o respetivo objecto e enunciar as questões que considere relevantes para o apuramento da verdade, nos termos do artigo 578.º do CPC.
16. Face ao exposto, não tendo considerado a diligência impertinente nem dilatória, a interpretação feita pela Meritíssima Juiz a quo do artigo 577º do CPC, no douto despacho recorrido, bem como ao indeferir a inquirição das testemunhas arroladas limita consideravelmente os direitos, poderes e ónus do recorrente em relação ao impugnado, violando claramente o princípio da igualdade de armas, acolhido no artigo 3º-A do CPC.
17. Princípio esse, aliás, ínsito no direito de acesso aos tribunais, plasmado no artigo 20º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
18. Pelo que, o douto despacho recorrido viola o disposto no n.º 2 do artigo 577º do CPC, artigo 3º-A do CPC, o n.º 3 do artigo 108.º do CPPT e artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
19. Nestes termos, o douto despacho recorrido é nulo, conforme estipulado no artigo 201º do CPC, pelo que [o] mesmo deverá ser revogado, com as legais consequências.
Assim decidindo será feita inteira, devida e merecida
JUSTIÇA!».

1.4. O Recorrido Instituto da Vinha e do Vinho, I.P. apresentou contra-alegações apenas quanto ao recurso da decisão final, que concluiu nos seguintes termos:

«A. O presente recurso vem interposto da sentença que decidiu pela manutenção das autoliquidações da taxa de promoção devida ao IVV, aqui Recorrido, com referência aos períodos mensais de Janeiro a Abril de 2006.
B. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.os 2 e 3 e 685.º-A, n.os 1 e 2, todos do Código de Processo Civil e Acórdãos do STA de 21 de Maio de 1992, proferido no recurso n.º 027044 e de 5 de Julho de 2012, proferido no recurso n.º 053/2012.
C. Além da ampliação da matéria de Facto requerida, a Recorrente limita o objecto do seu recurso à questão de saber se as medidas financiadas pela taxa de promoção em crise violam a obrigação de notificação prévia à Comissão Europeia dos auxílios estatais, prevista hoje no artigo 108.º, n.º 3 do TFUE, pelo que também só sobre esta questão podem incidir as presentes.
D. A sentença a quo, com base nos documentos juntos aos Autos, designadamente na decisão da Comissão Europeia de abertura do processo contraditório C-43/2004, e da jurisprudência firmada do STA decidiu pela improcedência da impugnação.
E. A matéria de Facto dada como provada pelo Tribunal a quo é a relevante para a decisão proferida e suficiente para a fundamentar, pelo que não carece de ampliação.
F. A posição ai defendida, já foi confirmada pelo STA pelo menos nos Acórdãos de 23 de Abril de 2013, proferidos nos recursos n.º 29/13-30 e n.º 48/13, de 30 de Abril de 2013, proferidos nos recursos n.º 292/13-30 e n.º 1503/12, de 22 de Maio de 2013, proferidos nos recursos n.º 1311/12-30, n.º 9/13, n.º 44/13, n.º 53/13 e n.º 200/13-30, de 29 de Maio de 2013, proferidos nos recursos n.º 1398/12, n.º 30/13, n.º 84/13 e 198/13-30, de 3 de Junho de 2013, proferidos nos recursos n.º 1328/12-30 e n.º 143/13, de 5 de Junho de 2013, proferidos nos recursos n.º 1288/12-30, n.º 125/13 e n.º 249/13 e de 26 de Junho de 2013, proferidos nos recursos n.º 1245/12-30, n.º 1336/12-30 e 55/13-30, entre (cada vez mais) outros e também por este Venerando Tribunal, no Acórdão de 13 de Novembro de 2014, proferido no processo n.º 158/13.9BEVIS.
G. No dia 1 de Dezembro de 2004, a Comissão Europeia notificou o Governo português da sua decisão de dar início ao procedimento de investigação previsto no artigo 88.º, n.º 2 do Tratado CE – hoje, artigo 108.º, n.º 2 do TFUE –, com vista a analisar a compatibilidade da referida taxa com as regras do Tratado sobre auxílios de Estado.
H. Logo na decisão de abertura do procedimento a Comissão concluiu que o financiamento, através das receitas da taxa em causa, das actividades desenvolvidas pelo IVV enquanto autoridade pública responsável pela coordenação geral do sector vitivinícola em Portugal, nos termos da legislação comunitária e nacional aplicável, não constitui um auxílio de Estado na acepção do agora artigo 107.º do TFUE.
I. Estando demonstrado no âmbito do procedimento que as receitas desta taxa correspondem a mais de 62% do orçamento associado ao funcionamento do IVV, quanto à grande maioria da consignação da taxa de promoção, não estamos sequer perante um auxílio de Estado, pelo que, quanto a essa larga componente, inexistia, por completo, qualquer obrigação de notificação da medida em causa.
J. A Comissão considera que também o apoio financeiro concedido à associação Viniportugal para a organização e o desenvolvimento de campanhas de promoção genérica e de publicidade do vinho e dos produtos vínicos, ou seja, a actividade desenvolvida em Portugal por aquela Associação, não constitui um auxílio, na acepção do mesmo preceito, pelo que, também esta medida dispensava qualquer notificação prévia à Comissão.
K. A Comissão apenas deu início ao processo de investigação relativamente:
i) às medidas relativas à promoção e à publicidade do vinho português nos mercados dos outros Estados-membros e de países terceiros;
ii) ao regime de financiamento de tais medidas; e,
iii) ao regime de financiamento das medidas relativas à formação.
L. Apenas e só relativamente a essa ínfima parcela poderia eventualmente discutir-se a violação do dever de notificação prévia previsto no artigo 108.º, n.º 3 do TFUE, o que deita por terra as pretensões da Recorrente de não pagar a totalidade da taxa por si autoliquidada.
M. O IVV foi notificado da decisão relativa ao procedimento instaurado em 28 de Setembro de 2010, a qual abrange o período compreendido entre 2002 e 2006 foi objecto de recurso por parte das autoridades portuguesas, factos também referidos pela Recorrente nas suas alegações de recurso.
N. Após negociações entre as partes, a Comissão adoptou a Decisão C(2012) 2111 final, de 4 de Abril de 2012, que altera as condições sétima e nona da Decisão de 2010 nos termos acordados com as autoridades portuguesas em termos que levaram o Estado Português a desistir do recurso pendente, entretanto extinto por despacho de 10 de Maio de 2012 – cfr. Decisões de 2010 e de 2012 (esta ainda não publicada no Jornal Oficial da União Europeia) juntas em anexo a estas contra-alegações como docs. n.os 1 e 4.
O. A decisão final do procedimento conclui que, das três realidades averiguadas apenas as medidas relativas à promoção e à publicidade do vinho português nos mercados dos outros Estados-membros e de países terceiros e as medidas relativas o respectivo regime de financiamento podem constituir auxílios de Estado nos termos do artigo 107.º do TFUE, mas não as medidas relativas ao regime de financiamento da formação, que não constitui um auxílio de Estado, pelo que não carece de notificação prévia nos termos do artigo 108.º, n.º 3 do TFUE.
P. No âmbito da execução da Decisão de 2010, conforme alterada pela Decisão de 2012, a Comissão manifestou abertura para que Portugal demonstrasse que os apoios considerados como auxílios estatais no âmbito do procedimento concluso, respeitam os limiares de minimis aplicáveis, caso em que a Comissão consideraria a Decisão como executada.
Q. O Regulamento (CE) n.º 1998/2006 da Comissão, de 15 de Dezembro de 2006, estabelece, no seu artigo 2.º que se considera que os auxílios não preenchem todos os critérios estabelecidos no n.º 1, do artigo 107.º do TFUE, pelo que estão isentos da obrigação de notificação prevista no n.º 3 do artigo 108.º do TFUE, os auxílios de minimis concedidos, os quais não podem exceder € 200.000 durante um período de três exercícios financeiros por empresa beneficiária.
R. Após confirmação de que os limiares de minimis aplicáveis não foram excedidos por nenhum dos agentes económicos do sector vitivinícola em Portugal, o IVV enviou uma carta á Comissão comunicando que os apoios respeitaram os limiares de minimis aplicáveis e que por esta razão o Estado considera a Decisão de 2010 plenamente executada, sem necessidade de proceder a qualquer reembolso – cfr. doc. n.º 7 em anexo.
S. Em Outubro de 2012 – através de carta junta em anexo a estas contra-alegações como doc. n.º 8 –, a Comissão tomou boa nota do entendimento do Estado de que as poucas medidas classificadas como auxílio no âmbito da Decisão de 2010, conforme alterada pela Decisão de 2012, se encontram abrangidos pelos Regulamento (CE) n.º 1998/2006 da Comissão, de 15 de Dezembro de 2006 e cumprem os limites de minimis aí estabelecidos.
T. Esta carta traduz, a confirmação da Comissão de que a taxa de promoção não padece de qualquer incompatibilidade com o direito da União Europeia em matéria de auxílios de Estado e que as medidas financiadas por meio desta taxa classificadas pela Comissão como auxílios estatais no âmbito do procedimento não careciam de notificação prévia nos termos do artigo 108.º, n.º 3 do TFUE.
U. Também no que respeita às acções de promoção financiadas pelas receitas da taxa de promoção no período de 2007 em diante, a Comissão já encerrou as suas diligências de investigação preliminares, não tendo sequer chegado a instaurar qualquer procedimento de investigação formal, nesta matéria.
V. À semelhança do sucedido para o período compreendido entre 2002 e 2006, através de carta datada de 3 de Agosto de 2012, o Estado Português informou a Comissão de que os apoios concedidos entre 2007 e 2011 preenchem as condições previstas nos artigos 1.º e 2.º do Regulamento (CE) 1998/2006 da Comissão, respeitando os limites de minimis aí estabelecidos, pelo que não constituem auxílios de Estado, na acepção do artigo 107.º, n.º 1 do TFUE – cfr. doc. n.º 9 em anexo.
W. Através de carta datada de 18 de Setembro de 2012, a Comissão confirmou que toma boa nota do preenchimento dos limites de minimis pelos apoios concedidos a partir de 2007 em diante reconhecendo assim que, de acordo com as informações transmitidas por Portugal, os apoios em causa preenchem as condições previstas no Regulamento (CE) 1998/2006 da Comissão, pelo que obedecem aos limites de minimis aí fixados, não constituindo, consequentemente, auxílios de Estadocfr. doc. n.º 10 em anexo.
X. O Recorrido demonstrou, mesmo quanto às medidas investigadas pela Comissão, que estas não colocam quaisquer problemas de compatibilidade com o Direito Comunitário no que respeita ao dever de notificação prévia instituído no artigo 108.º, n.º 3 do TFUE, pois não constituem auxílios de Estado nos termos do artigo 107.º do TFUE.

V. DO PEDIDO
Termos em que a sentença recorrida não merece qualquer censura, devendo por isso ser mantida no que respeita à improcedência da pretensão da Recorrente em ver anulado o indeferimento do pedido de revisão oficiosa da taxa de promoção em crise, com as devidas consequências legais.
Só nestes termos será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA!».

1.5. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer com o seguinte teor:

«I- C., Lda interpôs recurso interlocutório a fls 222, do despacho de fls 110 que determinou a não inquirição das testemunhas referidas na PI, bem como a não realização de perícia colegial.
Alega a recorrente a nulidade do despacho que indeferiu a produção da prova testemunhal e pericial requerida.
Ora, a Impugnante arrolou como testemunhas na PI os funcionários da Administração que atuaram nos autos, a notificar, e os seus próprios funcionários que procederam aos registos e à expedição das mercadorias, a apresentar.
Requereu que fosse efetuada perícia colegial sobre a pertinente matéria de facto, não indicando o objeto, ou qual a matéria por redução a quesitos a que os peritos pudessem responder.
Como refere o STA em Ac proferido no Proc:0984/12, em 22-05-2013, cujo sumário se transcreve:
I - No processo judicial tributário compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal e pericial requerida pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária...
Quanto à nulidade do despacho diga-se que as nulidades processuais, podem ser principais, típicas ou nominadas, sendo-lhes aplicável o preceituado nos artigos 186º a 194º e 196º a 198º, do CPC; ou secundárias, atípicas ou inominadas, e têm a sua previsão no artigo 195º, nº 1, do mesmo CPC, estando a sua arguição sujeita ao regime previsto nos artigos 196º, 2ª parte e 199º do mesmo Código.
Dispõe o art. 195.º, n.º 1 do CPC que fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
O regime do artigo 195º do CPC, é aplicável por força do disposto no artigo 2º, alínea e), do CPPT.
Importa, porem, aferir se no caso dos autos tal decisão seria suscetível de gerar ou não nulidade, na medida em que pudesse influir no exame ou na decisão da causa.
Parece-nos que a não realização dessas diligências não é suscetível de afetar os direitos das partes.
Aliás, o despacho sob recurso encontra-se devidamente fundamentado e pronuncia-se devidamente sobre a prova testemunhal e pericial requerida.
II- A Impugnante veio ainda recorrer da sentença do TAF de Viseu, que declarou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação da taxa de promoção sobre o vinho e produtos vínicos dos meses de janeiro a abril de 2006, no montante global de 156.236,98€.
Defende que o ato de liquidação é ilegal por violar expressamente o direito comunitário, pois é um auxílio estatal e como tal, no momento em que foi criado, deveria ter sido notificado à Comissão Europeia para que procedesse ao respetivo exame nos termos do artigo 88.º, n.º 3 do Tratado de Roma.
III- Das conclusões das alegações, resulta que a recorrente imputa à sentença omissão de pronúncia sobre a incompetência do Presidente do IVV, erro de julgamento em matéria de facto e também de direito.
Pede a revogação da sentença e em acréscimo que:
Desta forma, deverá a presente instância ser suspensa e ser ordenado o reenvio do processo ao TJUE para que se pronuncie sobre várias questões prejudiciais que elenca.
IV- Entendemos que o recurso não merece provimento.
Da omissão de pronúncia sobre a incompetência do Presidente do IVV
Nos termos do disposto no artº 615, nº1, al d) do CPC, existe omissão de pronúncia na sentença, quando o Tribunal não se pronuncia sobre questões que devia conhecer.
Tal omissão deverá ser suscetível de influir na decisão da causa, determinante da ocorrência de uma nulidade processual secundária, atípica ou inominada, com os consequentes efeitos invalidantes.
A assim não ser considerado, sempre poderia concluir-se existir défice instrutório que implicaria um erro de julgamento.
Porém, basta ler a douta sentença para, sem necessidade de grande análise, constatar que a mesma se pronuncia devidamente sobre a questão levantada pela recorrente, pelo que não se verifica a alegada omissão de pronúncia.
Do erro de julgamento em matéria de facto
A sentença entendeu que tendo em conta a natureza da taxa de promoção ­de contrapartida pelos serviços prestados pelo Impugnado aos agentes económicos do setor no âmbito da gestão do mercado vitivinícola, da regulamentação do setor e do controlo das atividades do mesmo, permitindo aferir do cumprimento das legislações nacional e comunitárias aplicáveis e da qualidade dos produtos vínicos introduzidos no mercado — logo se conclui que a taxa de promoção, ao contrário do alegado pela Impugnante, não é um auxílio estatal e respeita os limites de minimis definida no contexto da política relativa aos auxílios estatais pela Comissão.
A recorrente alega que o tribunal deveria ter dado como provado, atentos os documentos juntos, que pelo menos uma parte da taxa de promoção consubstancia um auxílio do Estado.
Entendemos que não lhe assiste razão já que dos referidos documentos apenas se pode concluir tratar-se de um financiamento e não um auxílio estatal.
Por outro lado, a recorrente não dá cumprimento ao artº 640 do CPC fazendo a delimitação concreta de outros pontos de facto considerados incorretamente julgados e os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida.
Como refere a jurisprudência do STA o conhecimento das convicções do julgador quanto à matéria de facto e dos critérios de avaliação da prova com que operou é essencial para o controlo da definição da verdade que o mesmo deu como existente (Acs do STA de 12.02.2003, recurso 1850/02, de 29-5-2002, recurso nº 228/02 e Ac TCAN 17-6-2010)
A nosso ver, da sentença consta quanto à fundamentação da matéria de facto, os meios de prova a que o Tribunal recorreu para dar como provada a matéria fatual especificando devidamente os meios de prova atendidos, sendo lógico o processo que conduziu à decisão.
Do erro de julgamento em matéria de direito
Como refere a douta sentença a taxa de promoção incide sobre os «vinhos e produtos vínicos produzidos no território nacional, bem como os produzidos noutros países e aqui comercializados», sendo devida pelo agente económico (e, em certos casos, pelo produtor) ao Instituto da Vinha e do Vinho, IP (IVV) – artigos 1.º, n.º 1, e 3.º do referido DL 119/97.
A taxa de promoção constitui, conforme decorre do n.º 1 do artigo 1º do DL 119/97, a «contrapartida dos serviços prestados pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IW) relativamente à promoção genérica e à coordenação geral do sector»
De acordo com o n.º 1 do artigo 17.º do DL 209/2006, de 27 de Outubro, o IVV coordena e controla a organização institucional do setor vitivinícola, ao mesmo tempo que audita o sistema de certificação de qualidade e acompanha a política comunitária (eg., preparando as regras para a sua aplicação), bem como participa na coordenação e supervisão da promoção dos produtos vitivinícolas.
E são estas as suas funções desde a sua criação pelo DL 304/86, de 22 de Setembro, e posteriores reestruturações pelos DL 102/93, de 2 de Abril, DL 99/97, de 26 de Abril e DL47/2007, de 27 de Fevereiro.
Efetivamente, ao IVV são incumbidas competências relativas à coordenação da atividade vitivinícola nacional e respetiva regulamentação técnica, à definição e acompanhamento das regras da Organização Comum do Mercado Vitivinícola (OCM), ao acompanhamento junto das instâncias comunitárias dos processos relativos ao setor vitivinícola, à promoção das medidas de organização institucional do setor vitivinícola e à definição dos princípios, regras e regulamentação técnica a que deve obedecer o setor vitivinícola.
As normas gerais sobre os auxílios de Estado constam dos artigos 87º a 89.º do Tratado de Roma e aplicam-se «à produção e ao comércio dos produtos do setor vitivinícola por força do artigo 71.º do Regulamento (CE) n.º 1493/99 do Conselho, que estabelece a organização comum de mercado destes produtos»...
A Comissão concluiu, logo no início do procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afeta ao financiamento do IW, I.P., não constituía um auxílio de Estado, e à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afeta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final...
Conclui a sentença que tendo em conta a natureza da taxa de promoção não é um auxílio estatal e respeita os limites de minimis definida no contexto da política relativa aos auxílios estatais pela Comissão.
No mesmo sentido, cite-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo:01486/14, em 04-03-2015, cujo sumário se transcreve:
I - Decorre da Jurisprudência do Tribunal de Justiça que um órgão jurisdicional nacional pode ser conduzido a interpretar e a aplicar a noção de auxílio do artigo 92º do Tratado (atual artº. 107º do TFUE) com vista a avaliar da legalidade de uma medida estatal instaurada sem ter em conta o processo de controlo prévio do art.108º, nº 3, do TFUE.
II - A taxa de promoção do vinho, tendo sido criada essencialmente para financiar as atribuições do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cobrada aos agentes do sector e representando mais de 62% do orçamento afecto ao financiamento dos serviços de coordenação geral do mesmo, ao não implicar à partida um auxílio concedido pelo Estado ou proveniente de recursos estatais, característica típica associada à qualificação dos auxílios, não estava sujeita a comunicação prévia no decurso do respectivo procedimento legislativo de criação.
III - Para além de a Comissão ter concluído, logo no inicio do procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afecta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afecta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final.
IV - Pelas razões apontadas, considera-se não existir, na situação em apreço, “um grau suficiente de probabilidade” de tal medida envolver auxílios estatais, em termos de exigir a sua notificação prévia no decurso do procedimento legislativo de criação da taxa nem a consequente suspensão da sua execução.
V - A anulação da totalidade da taxa, por vício formal de procedimento, quando não está em causa a finalidade que se pretende alcançar (salvaguarda do Direito Comunitário), afigura-se desproporcionada sobretudo se se tiver em conta que a receita da mesma corresponde a cerca de 62% do financiamento da actividade do IVV, I.P., e que a parte que suscitou dúvidas à Comissão não representa mais do que uma pequena parte.
Do mesmo modo se pronunciaram os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, no Processo: 01514/13, em 06-03-2014, no Processo: 0533/14, em 29-10-2014, para além dos já citados na decisão sob recurso.
Da sentença consta pois corretamente o direito aplicável, sendo claro o processo lógico no sentido da decisão.
Pelo exposto, emitimos parecer no sentido da improcedência do recurso com manutenção da sentença recorrida.».
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Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se:

1) a decisão interlocutória enferma do erro de julgamento de direito que lhe vem imputado,
2) a decisão final proferida em 1.ª instância (i) padece de nulidade, por omissão de pronúncia sobre a incompetência do Presidente do IVV para praticar o ato de indeferimento impugnado e a violação de disposições de direito comunitário relacionadas com a restrição ilegal ao comércio entre Portugal e os demais Estados-membros, a Política Agrícola Comum e ainda a infração a um acervo legal comunitário relativo à promoção de vinho e produtos vínicos comunitários e uma restrição ilegal à livre circulação de mercadorias (conclusões 6 a 9), bem como de (ii) erros de julgamento de facto, por insuficiência da matéria de facto selecionada (conclusões 2 a 5), e de direito, quanto à questão jurídica ali apreciada (conclusões 10 a 22).
Mais cumprirá analisar se se justifica suspender a instância e efetuar reenvio prejudicial ao TJUE.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO

A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:

«Com interesse para a boa decisão da causa considero provados os seguintes factos:
1. A Impugnante é uma sociedade comercial que se dedica ao armazenamento e compra para revenda de vinho e produtos vínicos. Por admissão.
2. A Impugnante [procedeu] à autoliquidação da taxa de promoção relativas aos meses de janeiro a abril de 2006, no montante global de € 156.236,98 euros, não tendo efetuado o respetivo pagamento cfr. fls. o processo anexo aos presentes autos
3. Em 29/06/2006, o IVV notificou a impugnante para proceder ao pagamento da taxa em falta, nos termos da alínea anterior, no montante de € 156.236,98. cfr. fls. o processo anexo aos presentes autos
4. A presente impugnação foi remetida a este Tribunal por carta registada no dia 15.09.2006. Fls. 2.
b) Factos não provados:
Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa.
c) Motivação:
A convicção do Tribunal quanto aos factos provados resultou da análise crítica e conjugada do teor dos documentos não impugnados juntos aos autos e do PA, conforme referido em cada ponto do probatório e também da posição assumida pelas partes, na parte dos factos alegados não impugnados e corroborados pelos documentos juntos, (artigo 76.º, da Lei geral Tributária e artigo 362.º e sgs. do Código Civil).
A matéria de facto não provada redundou na ausência de prova produzida para o efeito.».

3.2. DE DIREITO

3.2.1. Do recurso da sentença
3.2.1.1. Nulidade por omissão de pronúncia

Nas conclusões 6 a 9, a Recorrente sustenta que, além das questões da incompetência do presidente do IVV para a prolação do ato impugnado e da ilegalidade da taxa de promoção decorrente da não notificação prévia à Comissão Europeia e respetiva execução antes da decisão final da mesma Comissão, alegou ainda a violação de disposições comunitárias relacionadas com a restrição ilegal ao comércio entre Portugal e os demais Estados-Membros, a Política Agrícola Comum, e ainda a infração a um acervo legal comunitário relativo à promoção de vinho e produtos vínicos comunitários, no quadro da organização comum do mercado vitivinícola e uma restrição ilegal sobre a livre circulação de mercadorias, sobre as quais não foi emitida pronúncia pelo Tribunal a quo, nem indicada de qualquer razão que justifique tal abstenção, sendo certo que o respetivo conhecimento não ficou prejudicado pela solução dada às questões apreciadas nos autos.
Vejamos, antes do mais, o que foi apreciado na sentença recorrida e vertido na sua fundamentação de direito:
«Alega a Impugnante que a taxa de promoção sobre o vinho e produtos vínicos, prevista no DL 119/97 de 15 de Maio, constitui um auxílio estatal que deveria ter sido notificado à Comissão Europeia, nos termos do artigo 88.º do TCE, para que esta procedesse ao respetivo exame, sob pena de invalidade do mesmo.
Concluiu que não é compatível com o direito comunitário constitucionalmente vigente em Portugal e não é, pelo exposto, cobrável a taxa de promoção sobre o vinho e os produtos vínicos.
NATUREZA DA PROMOÇÃO DA TAXA DE PROMOÇÃO (prevista no DL 119/97, de 15 de Maio1), E SUA COMPATIBILIDADE COM O DIREITO COMUNITÁRIO
1 Entretanto revogado pelo DL 94/2012 de 20 de abril.
A taxa de promoção incide sobre os «vinhos e produtos vínicos produzidos no território nacional, bem como os produzidos noutros países e aqui comercializados», sendo devida pelo agente económico (e, em certos casos, pelo produtor) ao Instituto da Vinha e do Vinho, IP (IVV) – artigos 1.º, n.º 1, e 3.º do referido DL 119/97.
A taxa de promoção constitui, conforme decorre do n.º 1 do artigo 1.º do DL 119/97, a «contrapartida dos serviços prestados pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) relativamente à promoção genérica e à coordenação geral do sector».
De acordo com o n.º 1 do artigo 17.º do DL 209/2006, de 27 de Outubro, o IVV coordena e controla a organização institucional do setor vitivinícola, ao mesmo tempo que audita o sistema de certificação de qualidade e acompanha a política comunitária (eg., preparando as regras para a sua aplicação), bem como participa na coordenação e supervisão da promoção dos produtos vitivinícolas.
E são estas as suas funções desde a sua criação pelo DL 304/86, de 22 de Setembro, e posteriores reestruturações pelos DL 102/93, de 2 de Abril, DL 99/97, de 26 de Abril e DL 47/2007, de 27 de Fevereiro.
Efetivamente, ao IVV são incumbidas competências relativas à coordenação da atividade vitivinícola nacional e respetiva regulamentação técnica, à definição e acompanhamento das regras da Organização Comum do Mercado Vitivinícola (OCM), ao acompanhamento junto das instâncias comunitárias dos processos relativos ao setor vitivinícola, à promoção das medidas de organização institucional do setor vitivinícola e à definição dos princípios, regras e regulamentação técnica a que deve obedecer o setor vitivinícola.
As normas gerais sobre os auxílios de Estado constam dos artigos 87.º a 89.º do Tratado de Roma e aplicam-se «à produção e ao comércio dos produtos do setor vitivinícola por força do artigo 71.º do Regulamento (CE) n.º 1493/99 do Conselho, que estabelece a organização comum de mercado destes produtos».
Ora, nos termos do n.º 1 do artigo 87.º do Tratado de Roma, os auxílios estatais são, salvo determinadas exceções, proibidos na ordem jurídica comunitária.
Auxílios estatais são aqueles «concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.» - n.º 1 do artigo 87.º do Tratado de Roma.
No contexto de uma livre concorrência no mercado interno e, nomeadamente, da abertura dos serviços públicos à concorrência, os Estados-Membros intervêm por vezes através de recursos públicos para promover determinadas atividades económicas ou proteger indústrias nacionais. Ao favorecerem determinadas empresas em relação aos seus concorrentes, estes auxílios estatais podem falsear a concorrência.
Os auxílios estatais são proibidos pelo Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. No entanto, algumas exceções autorizam os auxílios justificados por objetivos de interesse comum, por exemplo, para os serviços de interesse económico geral, desde que estes não falseiem a concorrência num sentido contrário ao interesse comum. O controlo dos auxílios estatais exercido pela Comissão Europeia consiste, assim, em avaliar o equilíbrio entre os efeitos positivos e negativos dos auxílios.
Em matéria de Política de Concorrência o artigo 87.º do Tratado da União Europeia refere que são proibidos, de uma forma geral, auxílios estatais que falseiem ou ameacem falsear a concorrência. Esta proibição não é absoluta, uma vez que existem situações para as quais os Auxílios de Estado são compatíveis com o Mercado Comum, enumeradas nos n.ºs 2 e 3 desse artigo. Compete à Comissão Europeia a função de controlar os auxílios estatais, de acordo com o artigo 88.º do Tratado, e os Estados-Membros têm o dever, obrigação de notificação, de informar a Comissão da concessão dos Auxílios de Estado, ainda durante a fase de projeto.
O Mercado Comum assenta no princípio da livre concorrência entre as empresas da União Europeia. A corroborar este princípio, o artigo 87.º do Tratado da União Europeia estabelece que são incompatíveis com o Mercado Comum os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, que confiram uma vantagem económica aos beneficiários, a qual deve ser concedida seletivamente, e a medida de auxílio deve ameaçar falsear a concorrência e as trocas comerciais entre os Estados-Membros.
Só são incompatíveis com o mercado comum os Auxílios de Estado que afetem as trocas comerciais entre os Estados-membros e falseiem ou ameacem falsear a concorrência.
O regime comunitário de auxílios estatais assenta num sistema de autorização prévia, nos termos do qual a Comissão Europeia determina se uma medida de auxílio que o Estado-Membro pretenda conceder pode beneficiar das derrogações previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 87.º do Tratado da União Europeia (ver regras processuais e procedimentos).
Com a preocupação de simplificação administrativa, a Comissão veio a considerar que existem auxílios de reduzido valor, não suscetíveis de afetar de forma significativa o comércio e a concorrência entre Estados-Membros, não devendo como tal ser abrangidos pelo n.º 1 do artigo 87.º do Tratado da União Europeia. Adotou então, uma regra dita de minimis, que foi pela primeira vez definida no contexto da política relativa aos auxílios estatais às pequenas e médias empresas (Regra de minimis).
A Comissão concluiu, logo no início do procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afeta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, e à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afeta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final.
No sentido vindo de referir vejam-se inter alias, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 23.04.2013, P. 29/13, de 30.04.2013, P. 292/13, de 22.05.2013, nos processos 9/13, 44/13, 53/13, 200/13, e 1311/12, de 29.05.2013, nos processos 84/13, 198/13, 30/13, e 1398/13, de 04.12.2013, P. 0202/13, in www.dgsi.pt.
Portanto, tendo em conta a natureza da taxa de promoção - de contrapartida pelos serviços prestados pelo IVV aos agentes económicos do setor no âmbito da gestão do mercado vitivinícola, da regulamentação do setor e do controlo das atividades do mesmo, permitindo aferir do cumprimento das legislações nacional e comunitárias aplicáveis e da qualidade dos produtos vínicos introduzidos no mercado – bem como a jurisprudência citada e tudo o acima exposto, logo se conclui que a taxa de promoção, ao contrário do alegado pela Impugnante, não é um auxílio estatal e respeita os limites de minimis definida no contexto da política relativa aos auxílios estatais pela Comissão.
*
Importa dar conta da recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, de que é exemplo, entre outros, o Acórdão de 04.12.2013, P. 0202/13, disponível em www.dgsi.pt e cujo sumário se transcreve:
“I - Decorre da Jurisprudência do Tribunal de Justiça que um órgão jurisdicional nacional pode ser conduzido a interpretar e a aplicar a noção de auxílio do artigo 92º do Tratado (actual artº. 107º do TFUE) com vista a avaliar da legalidade de uma medida estatal instaurada sem ter em conta o processo de controlo prévio do art.108º, nº 3, do TFUE.
II - A taxa de promoção do vinho, tendo sido criada essencialmente para financiar as atribuições do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cobrada aos agentes do sector e representando mais de 62% do orçamento afecto ao financiamento dos serviços de coordenação geral do mesmo, ao não implicar à partida um auxílio concedido pelo Estado ou proveniente de recursos estatais, característica típica associada à qualificação dos auxílios, não estava sujeita a comunicação prévia no decurso do respectivo procedimento legislativo de criação.
III - Para além de a Comissão ter concluído, logo no início do procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afecta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afecta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final.
IV - Pelas razões apontadas, considera-se não existir, na situação em apreço, “um grau suficiente de probabilidade” de tal medida envolver auxílios estatais, em termos de exigir a sua notificação prévia no decurso do procedimento legislativo de criação da taxa nem a consequente suspensão da sua execução.
V - A anulação da totalidade da taxa, por vício formal de procedimento, quando não está em causa a finalidade que se pretende alcançar (salvaguarda do Direito Comunitário), afigura-se desproporcionada sobretudo se se tiver em conta que a receita da mesma corresponde a cerca de 62% do financiamento da actividade do IVV., I.P., e que a parte que suscitou dúvidas à Comissão não representa mais do que uma pequena parte.
VI - A anulação total da taxa com o consequente comprometimento do financiamento do orçamento do IVV., I.P., pelo menos de 1995 até 2010, teria igualmente como consequência a violação dos princípios da confiança e da segurança jurídica.”
Concordando-se integralmente com a jurisprudência citada, impõe-se julgar improcedente, com este fundamento, a presente Impugnação.
*
Em face do exposto fica prejudicado o conhecimento das demais questões (artigo 608.º, n.º 2 do CPC), aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
Por tudo o que foi dito, não colhem os fundamentos invocados pela Impugnante, pelo que a sua pretensão terá que improceder, na totalidade.
(…).».

Preceitua o artigo 125.º, n.º 1 do CPPT que «Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.».
No mesmo sentido estabelece a alínea d), do n.º 1, do artigo 615.º CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, ao estatuir que «1. É nula a sentença quando: (…) d) O Juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; (…)».
Este vício está relacionado com a norma que disciplina as “Questões a resolver - ordem de julgamento” (cf. artigo 608.º n.º 2 do CPC) da qual resulta que o juiz «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)».
A nulidade da sentença por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Portanto, esta nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre alguma questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013, 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014 e 03589/04 - Aveiro).

No caso vertente, decorre da parte final da sentença transcrita que o Meritíssimo Juiz a quo considerou, em face da análise por ele efetuada, que restava prejudicado o conhecimento das demais questões. Assim, estamos perante um caso em que, explicitamente, o Juiz decidiu que não podia tomar conhecimento das demais questões suscitadas; daí que, podendo embora verificar-se erro de julgamento nesta parte, não podemos considerar que a sentença é nula por omissão de pronúncia.

3.2.1.2. Da ampliação da matéria de facto

Nas conclusões 1 a 5 das suas alegações de recurso, a Recorrente sustenta, em suma, que embora conclua que o auxílio em questão respeitou o limiar dos auxílios de minimis, o que teria sido reconhecido pela Comissão, não foi fixada, como provada ou não provada, qualquer factualidade que sustente este segmento da decisão.
Ora, não obstante possamos apontar alguma falta de rigor à decisão recorrida, o certo é que nela se conclui, em sintonia com a abundante jurisprudência nacional promanada do STA, que a taxa impugnada não constitui um auxílio de Estado. E, de facto não é, desde logo porque respeita a uma verba a entregar pelos sujeitos passivos ao Estado e, por definição, um tributo, designadamente uma taxa, não constitui uma prestação do Estado a favor dos particulares.
Assim sendo, é estéril discutir se a taxa em causa cumpre ou não o limiar dos auxílios de minimis, razão pela qual também não releva fixar qualquer factualidade relativa a esta questão.
Sem embargo, considerando que esta questão pode respeitar, não à taxa em crise, mas às prestações efetuadas pelo IVV com base no financiamento que obtém através desta taxa, ainda assim não se nos afigura necessário ampliar o probatório ou aditar-lhe qualquer factualidade porquanto o acórdão transcrito na sentença já engloba, na sua fundamentação jurídica, a factualidade pertinente que se extrai dos diversos atos comunitários nele aludidos, que são do conhecimento público e de publicação obrigatória, a qual se incorporou na sentença no momento em que esta se apropriou da dita fundamentação.
Improcede, pois, também este segmento do recurso.

3.2.1.3. Do erro de julgamento de direito
Nas conclusões 10 a 22, a Recorrente suscita questões que já foram amplamente discutidas e decididas pelo Tribunal de cúpula da jurisdição Administrativa e Fiscal, a cuja fundamentação inteiramente aderimos, pelo que passamos a transcrever o acórdão do STA de 5/07/2017, proferido no recurso 0529/15, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf//7738fde8c008ccf48025815b00562a00?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1:
«A Recorrente A………… Ldª deduziu impugnação judicial contra a taxa de promoção de vinhos e produtos vínicos, no montante de € 80 825,12 por si auto liquidada em 12 Dezembro de 2002 prevista no decreto lei nº 119/97 de 15 de Maio por considerar que a mesma sendo um auxílio de estado artigo 88 deveria no momento da sua criação ter sido notificada à Comissão Europeia a fim de a mesma proceder ao respectivo exame nos termos do nº 3 do artigo 88 do TCE que assim foi violado
O TAF de Viseu julgou improcedente a impugnação por considerar que a taxa em causa não podia ser qualificada de auxílio de estado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 87 e 88 do Tratado de Roma (artigos 107 e 108 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia TSFUE), não carecendo. De ser previamente notificada à Comissão Europeia nos termos do nº 3 do artigo 88 do Tratado (artigo 108 /3 do TSFUE).
A recorrente não se conforma com tal decisão e recorre dela para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, alegando, em síntese, como decorre do teor das suas conclusões, que a sentença enferma de erro de julgamento por entender que da subsunção fáctica e da lei resulta que a taxa de promoção devia ser considerada como verdadeiro auxílio de Estado que o artigo 87 do Tratado (107 do TSFUE) proíbe, o que implicava a sua notificação prévia à Comissão Europeia para efeitos do disposto no nº 3 do artigo 88 do Tratado (artigo 108/3 do TSFUE) que foi assim violado.
Esta questão foi, já, por diversas vezes colocada a este Supremo Tribunal pela mesma recorrente tendo este Tribunal em vários arestos decidido no sentido de que a taxa em causa não constitui auxílio de estado, violador do artigo 87 do Tratado CEE hoje artigo 107 do TSFUE o que desde logo afasta a necessidade de notificação à Comissão Europeia a fim de a mesma proceder ao respectivo exame nos termos do nº 3 do artigo 88 do TCE, reitera-se aqui a doutrina do acórdão de 07 01 2016 in processo nº 0656/14 deste STA que relatámos, de que transcrevemos agora o sumário:
“I - A taxa de promoção do vinho (criada essencialmente para financiar as atribuições do Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., cobrada aos agentes do sector e representando mais de 62% do orçamento afecto ao financiamento dos serviços de coordenação geral do mesmo) ao não implicar à partida um auxílio concedido pelo Estado ou proveniente de recursos estatais (característica típica associada à qualificação dos auxílios), não estava sujeita a comunicação prévia no decurso do respectivo procedimento legislativo de criação.
II - Para além de a Comissão ter concluído, logo no início de procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afecta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afecta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitasse os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final.”

Porque não vemos razão alguma para alterar essa jurisprudência com que concordamos e dada a identidade de questão e das partes limitar-nos-emos a transcrever o acórdão do STA de 18 06 2014 in processo 0330/14 na parte que ao recurso interessa:
“ 3.2. O presente recurso é interposto da sentença que julgou improcedente a impugnação deduzida pela sociedade A…………, Lda., contra a liquidação da taxa de promoção sobre o vinho e produtos vínicos, referente aos meses de Outubro a Dezembro de 2005, no montante de 76.060,38 Euros, cobrada pelo Instituto da Vinha e do Vinho.
As questões suscitadas no presente recurso são em tudo idênticas (até nos pressupostos de facto) às que foram decididas neste Supremo Tribunal pelo acórdão proferido em 23 de Abril de 2013, no recurso nº 29/13, e no qual, com fundamentação que merece a nossa inteira adesão, se concluiu no sentido da manutenção da autoliquidação aí em causa e de que ficava prejudicado o pedido de reenvio prejudicial, por inutilidade – acórdão a que se seguiram muitos outros, nomeadamente, os prolatados em 30/4/2003, no proc. nº 292/13; em 22/5/2013, nos procs. nºs. 9/13, 44/13, 48/13, 53/13, 200/13 e 1311/12; em 29/5/2013, nos procs. nºs. 84/13, 198/13, 30/13, e 1398/12; em 26/6/2013, nos procs. nºs. 1329/12 e 55/13; em 10/7/2013, nos procs. nºs. 44/13, 9/13, 53/13 e 200/13; em 2/10/2013, nos procs. nºs. 1221/12, 46/13 e 177/13; em 23/10/2013, nos procs. nºs. 1464/12, 31/13, 176/13 e 207/13; em 30/10/2013, nos procs. nºs. 193/13, 408/13, 1081/13, 1138/13 e 1147/13; em 13/11/2013, nos procs. nºs. 0901/13 e 01304/12; em 27/11/2013, nos procs. nºs. 01286/12 e 01232/12; em 4/12/2013, nos procs. nºs. 01287/12, 01441/12, 01143/13 e 0202/13; em 11/12/2013, no proc. nº 01389/13; e em 19/2/2014, nos procs. nºs. 01394/13, 028/13 e 09/14.

A doutrina expendida em tais arestos, nomeadamente naquele acórdão proferido no processo nº 29/13 (que pode ser consultado no sítio da Internet dgsi.pt/) é inteiramente transponível para o presente caso – sendo, aliás, as alegações e contra-alegações substancialmente idênticas – e encontra-se alicerçada nas razões jurídicas resumidas no respectivo sumário.
Deste modo, atentando na regra constante nº 3 do art. 8º do Código Civil – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito – e não se vendo que a Recorrente invoque em juízo novas razões que infirmem a fundamentação em que assentou essa decisão ou que levem a inflectir ou a divergir do entendimento aí afirmado, impõe-se remeter para essa fundamentação, que assim se acolhe e subscreve na íntegra.
Termos em que se negará provimento ao recurso com a fundamentação constante do aludido acórdão, desse modo ficando prejudicado, por inutilidade, o pedido de reenvio prejudicial para o TJUE formulado pela Recorrente.
3.3. E reportando-se a taxa aqui em questão aos meses de Outubro a Dezembro de 2005, tendo em conta as circunstâncias supra referidas, e, em especial, o facto de a Comissão ter conhecimento perfeito de toda a situação em torno da taxa de promoção do vinho desde 2004 e ter acabado por concluir não haver qualquer violação do Direito comunitário em relação a todas as componentes da mesma, podemos com segurança concluir que não haveria qualquer possibilidade de a sua intervenção poder influenciar o conteúdo material do acto de liquidação em causa, mesmo considerando ser a mesma referente as meses de Outubro a Dezembro de 2005.

Com efeito, como também se salienta no citado acórdão de 26/6/2013, no proc. nº 055/13, «a anulação da totalidade da taxa de promoção, como pretende a recorrente, por vício formal de procedimento, que é o único vício por si alegado, nas circunstâncias do caso, seria contrária, desde logo, ao princípio da proporcionalidade. Como ficou dito no já citado Acórdão 29/13, as razões que levam a Jurisprudência do TJ e a própria doutrina a sancionar com a nulidade o incumprimento da obrigação de comunicação prévia das ajudas de Estado residem na particularidade do bem jurídico que se pretende acautelar e que é o de impedir a entrada em vigor de ajudas contrárias ao Tratado e evitar que as trocas entre os Estados-Membros sejam perturbadas pelas vantagens concedidas pelas autoridades públicas que falseiem ou ameacem a concorrência.
Ora, no caso em apreço, a finalidade que se pretende obter foi alcançada, na medida que não subsiste qualquer violação do Direito Comunitário, pelo que a aplicação automática da sanção da nulidade seria manifestamente desproporcionada.
Sobretudo se se tiver em conta que, recorde-se, a receita da taxa afecta ao financiamento das actividades do IVV., I.P., corresponde a mais de 62% do seu orçamento e que a componente da taxa que inicialmente suscitou dúvidas à Comissão representa apenas uma pequena parte. Note-se também que a proceder a tese da recorrente, a mesma teria como consequência pôr em causa o financiamento da actividade do IVV., I.P., pelo menos desde 1995 até 2010, com a consequente violação dos princípios da confiança e da segurança jurídica.
Acresce, tal como consignado nas Conclusões do Advogado Geral L.A. GEELHOED, atrás mencionadas, a obrigação de notificação “não pode constituir um obstáculo à competência dos Estados-Membros para pôr em execução regulamentações fiscais gerais. Com efeito, estas não podem, por definição, constituir um auxílio.”
Finalmente, para além do que já ficou dito, não podemos deixar de salientar que, como ficou demonstrado, a liquidação da taxa de promoção que diz respeito à situação da recorrente não foi afectada pelas dúvidas suscitadas pela Comissão quando decidiu dar início ao procedimento de investigação previsto no art. 88º, nº 2, do TCE (art. 108º, nº 2, do TFUE).
Por outro lado, o juízo de aferição da legalidade da auto-liquidação não pode deixar de levar em conta as consequências que a recorrente pretende retirar de uma pretensa violação formal da regra «standstill», sem ter demonstrado ou sequer alegado que, no caso em apreço, estavam ultrapassados os limites de minimis, ou que a taxa respeita a produtos importados de outros Estados-Membros ou de Países Terceiros.
Em suma, a tese da recorrente conduziria, como já foi dito, a resultados absurdos e manifestamente desproporcionados
Improcedem, pois, as alegações da recorrente, sendo de confirmar o julgado recorrido - de improcedência da impugnação judicial deduzida – ficando prejudicados, por inutilidade, os demais pedidos, incluindo o de reenvio prejudicial para o TJUE requerido pela recorrente.».
Assim e pelos mesmos motivos, também concluímos pela inutilidade do almejado reenvio prejudicial para o TJUE.

3.2.1.4. Questões não apreciadas na sentença recorrida

A Recorrente alega que para além das questões da incompetência do presidente do IW para a prolação do ato impugnado e da ilegalidade da taxa de promoção decorrente da não notificação prévia à Comissão Europeia e respetiva execução antes da decisão final da mesma Comissão, alegou ainda a violação de disposições comunitárias relacionadas com a restrição ilegal ao comércio entre Portugal e os demais Estados-Membros, a Política Agrícola Comum, e ainda a infração a um acervo legal comunitário relativo à promoção de vinho e produtos vínicos comunitários, no quadro da organização comum do mercado vitivinícola e uma restrição ilegal sobre a livre circulação de mercadorias.
Em face do teor da decisão prolatada em 1.ª instância, é patente que, à parte a questão da incompetência do presente do IVV, todas as demais ficaram prejudicadas.

Cumpre, pois, conhecer em substituição.
O artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 99/97, de 26/04, expressa que o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) é um instituto público, dotado de personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira e património próprio. Por força do artigo 4.º, n.º 1, alínea a), do mesmo diploma, compete ao Presidente do Instituto dirigir os serviços do IVV.
Nos termos do artigo 7.º do referido decreto-lei, um dos serviços operativos do IVV é a Direção de Serviços de Fiscalização Vitivinícola (n.º 2, al. c)) que, por seu turno, compreende, entre outras, a Divisão de Auditoria dos Sistemas de Certificação (cfr. artigo 24.º, n.º 2, al. d).
De acordo com o artigo 12.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 119/97, de 15/05, que aprovou o regime de taxas incidente sobre vinhos e produtos vínicos: «Para os vinhos e produtos vínicos certificados, a taxa de promoção é devida pelos agentes económicos referidos no artigo 6.º e deve ser liquidada e cobrada simultaneamente, consoante os casos, num dos actos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 7.º, devendo a entidade certificadora proceder à liquidação e cobrança das duas taxas no mesmo acto.» - o realçado é da nossa autoria.

Está, pois, demonstrado que a competência para a liquidação e cobrança da taxa em crise nestes autos é da entidade certificadora, que é a Divisão de Auditoria dos Sistemas de Certificação, a qual integra a Direção de Serviços de Fiscalização Vitivinícola, que constitui um dos serviços operativos do IVV que, por seu turno, é dirigido pelo Presidente – autor do ato aqui impugnado.
Ora, não detendo a entidade certificadora poderes exclusivos para a prática dos atos de liquidação e cobrança, nada impede que o órgão dirigente daquele serviço igualmente os pratique, pelo que improcede o alegado vício de incompetência para a prática do ato.

3.2.2. Recurso da decisão interlocutória

Por despacho de 07.12.2007, foi indeferido o requerimento probatório apresentado na parte final da petição inicial porquanto, por um lado, a ora Recorrente arrolou como testemunhas “os funcionários da Administração que actuaram nos autos” bem como “os prórpios funcionários que procederam aos registos e à expedição da mercadoria”, sem qualquer outra identificação e, por outro lado, o pedido de “perícia colegial sobre a pertinente matéria de facto”não especificava o objeto da prova pericial a produzir.
A Recorrente não se conforma com o referido despacho por entender, em síntese, que, aquando da apresentação da p.i., ainda não conhecia os factos que iriam ser alegados na contestação e sobre os quais haveria de recair a produção de prova testemunhal e pericial, cabendo ao juiz fixar o objeto da perícia que, de qualquer modo, apenas poderia ser indeferida por impertinente ou dilatória.
Dispõe o artigo 13.º CPPT que incumbe aos juízes dos tribunais tributários a direção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer. E o artigo 114.º do mesmo código expressa que, não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de prova necessárias.
Desses preceitos não decorre para o juiz a obrigação de realizar todas as provas que sejam requeridas pelas partes, mas sim o dever de realizar e ordenar as diligências que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como necessárias e úteis ao apuramento da verdade.
Como refere o Ilustre Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, no seu CPPT anotado e comentado, 5.ª edição (anotação 9 ao artigo 13.º), é o critério do juiz que prevalece no que concerne a determinar quais as diligências que são úteis para o apuramento da verdade, sendo inevitável em tal determinação uma componente subjetiva, ligada à convicção do juiz; o que não significa que a necessidade da realização das diligências não possa ser controlada objetivamente, em face da sua real necessidade para o apuramento da verdade, em sede de recurso (v. Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, páginas 168 e 169).

Cabe fazer alusão ao decidido pelo STA, no seu acórdão de 05/04/2000, proc. n.º 024713, segundo o qual «No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Sr. Juiz não só pode, como também deve realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade.
Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Sr. Juiz só não deve fazer se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.».

Ora, como se percebe da síntese do despacho recorrido com que iniciámos esta análise, os fundamentos para o indeferimento das requeridas provas foram a omissão de correta identificação das testemunhas arroladas e de especificação do objeto da perícia a realizar, os quais não se reconduzem a qualquer juízo de (in)utilidade ou (im)pertinência e, assim, não podemos afirmar que o despacho em crise esteja conforme ao direito.

Nos termos do disposto no artigo 115.º e seguintes do CPPT, são admissíveis no processo tributário os meios gerais de prova, nomeadamente, a testemunhal e a pericial, permitindo o artigo 113.º, n.º 1 do mesmo diploma que o juiz conheça de imediato o pedido se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários.
Sucede que, no caso vertente, analisada toda a petição inicial, não vislumbramos a alegação de qualquer factualidade (nem a Recorrente a especifica, em momento algum) sobre a qual fosse necessário e útil produzir prova, testemunhal ou pericial, tendo em vista o apuramento da verdade material.

É certo que «(…) O processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos " se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários" (artigo 113° do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114°, 115° n°1 e 119° do CPPT.
Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam - posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios de prova (artigo 115° do CPPT) - pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias (…)” – cfr. Acórdão do STA, de 14/09/2011, proferido no âmbito do processo n.º 0215/11.
Ora, importa acompanhar a jurisprudência deste TCAN firmada, entre outros, no acórdão de 04.06.2020, rec. 00910/15.0BEBRG, disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/f794e398cb6fb86a8025859300341741?OpenDocument, no sentido de que «(…) o tribunal só dá provimento à impugnação das decisões interlocutórias, impugnadas conjuntamente com a decisão final nos termos do n.º 3 do artigo 644.º do CPC, quando a infracção cometida possa modificar aquela decisão ou quando, independentemente dela, o provimento tenha interesse para o recorrente – cfr. artigo 660.º do CPC.».

Ora, não se nos apresenta evidente que a realização de inquirição de testemunhas ou de prova pericial possa modificar a sentença recorrida pois, desde logo, nem sequer vislumbramos sobre que factualidade haveria de recair tal prova.

Assim, pese embora o despacho em crise não se apresente conforme ao Direito, deve o mesmo ser mantido, por ser manifesta a inutilidade das diligências probatórias requeridas na petição inicial, atenta a sua desnecessidade para a decisão da causa.

4. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento aos recursos e manter o despacho e a sentença recorridos, com a presente fundamentação.
*
Custas a cargo da Recorrente, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC.
*
Porto, 30 de setembro de 2021

Maria do Rosário Pais - Relatora
Tiago Afonso Lopes de Miranda - 1.º Adjunto
Cristina da Nova - 2.ª Adjunta