Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00177/17.6BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/05/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Rosário Pais
Descritores:IMPUGNAÇÃO; FATURAS “FALSAS”; ÓNUS DA PROVA A CARGO DA AT E DA CONTRIBUINTE; PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO;
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
Sumário:I. Estando em causa indícios de faturação falsa, a AT não tem que provar a falsidade das faturas, bastando-lhe demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as faturas são «falsas» para cumprir o seu encargo probatório.

II. Feita esta prova indiciária, a lei faz cessar a presunção de veracidade creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à faturação em crise.

III. A prova a realizar pelo contribuinte tem que ser inequívoca, positiva, concludente e sem margem para qualquer dúvida da materialidade das operações faturadas. Tal prova deve, pois, ser concretizadora, em termos de tempo, espaço e valores envolvidos, no sentido da demonstração concreta de cada operação, esclarecendo a identidade do vendedor, a data da transação, os bens transacionados ou serviços prestados, o respetivo custo, etc.

IV. A exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, prevista nas alíneas a), b) e c) do nº1 do artigo 640.º, integra um ónus impugnatório primário, na medida em que tem por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto, sendo que a respetiva inobservância impede que o Tribunal de 2.ª instância aprecie o julgamento de facto realização em 1.ª instância. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:P., Lda
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO

1.1. P., Lda , devidamente identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 24.05.2019, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC e juros compensatórios do ano de 2011, no valor global de €26.822,74.
A sentença recorrida considerou que a liquidação em crise não enferma dos vícios de forma por falta de fundamentação, nem de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, em virtude de não se ter provado que as faturas emitidas por G., V., A., C. e CS titulam fornecimentos efetivos dos bens e serviços nelas descriminados.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:

A. O Tribunal “a quo” julgou improcedente a impugnação judicial, sustentando que as liquidações impugnadas não padeciam de qualquer ilegalidade, com o que se não pode concordar.

B. Na motivação da decisão ora recorrida é referido que a prova testemunhal carreada para os Autos não é suficientemente assertiva e consistente para abalar a prova documental objectiva da AT.

C. Não resulta da motivação do Tribunal que a AT tenha logrado provar que as facturas desconsideradas por si não correspondem a operações económicas reais, pois a prova documental referida na sentença, trata-se tão só de um relatório de inspecção, que reproduz conclusões fácticas de funcionários da AT, cujo único fim foi demonstrar a inexistência das operações declaradas pela Impugnante.

D. Em nosso ver, em tais circunstâncias, se o Juíz “a quo” fica com dúvidas perante o meio de prova produzido pela Impugnante, tem o dever de procurar, oficiosamente, ao abrigo dos poderes inquisitórios previstos no artigo 411º do CPC, levar a cabo as diligências probatórias que se lhe afigurem relevantes para o integral apuramento dos factos em causa.

E. O Tribunal a quo entra em contradição quando refere que a prova testemunhal carreada para os Autos pela Impugnante não é suficientemente assertiva e consistente, não pondo em causa a credibilidade dos depoimentos, ou seja, parece demonstrar que compreende e aceita a existência de operações comerciais.

F. Para logo a seguir, referir que tal prova não abala a prova oferecida pela AT, que aliás não é prestada de forma directa e/ou confirmada em sede de audiência de julgamento.

G. Da forma como se encontra motivada a decisão, leva-nos a concluir, salvo melhor opinião que, qualquer prova que fosse produzida ou apresentada pela Impugnante não poderia ser suficientemente assertiva ou consistente, para abalar a prova documental da AT, ou seja, o fornecimento de bens e serviços por estas empresas à Impugnante.

H. A decisão ora recorrida viola os princípios da avaliação da prova à luz das regras da experiência comum.

I. Nos termos do artigo 74.º da LGT o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoca.

J. O princípio da legalidade não constitui um limite à actividade da administração constituindo o fundamento de toda a sua actividade.

K. Por força do princípio da legalidade, à administração caberá o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento previsto na lei para que seja ela a liquidar adicionalmente o imposto.

L. À administração cabe o ónus da prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas desfavoráveis aos administrados.

M. A AT não provou que a contabilidade ou a escrita da impugnante não se mostra organizada segundo a lei comercial ou fiscal, ou contém erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável, pelo que se presume a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes da contabilidade.

N. A AT não provou os requisitos legais de que depende a sua actuação, ou seja, a AT não provou a inexistência de aquisição de bens e serviços.

O. O acto tributário assenta na exclusão do direito á dedução do IVA contido nas facturas emitidas pelos prestadores de bens ou serviços, designadamente, G., V. e A..

P. Do relatório não consta a prova daqueles factos e dos documentos juntos aos autos, não resulta provada a emissão por estas empresas de facturas falsas.

Q. A impugnante, provou que manteve relações comerciais com estas empresas.

R. E, que não existiu qualquer dedução indevida do IVA liquidado e/ou no empolamento de gastos e no apuramento da matéria tributável de IRC.

S. Porque efectivamente tais bens e serviços foram prestados e adquiridos.

T. Pelo que inexiste facto tributário.

U. Os actos tributários impugnados violam os princípios da legalidade e da capacidade tributária na medida em que se exige da impugnante um imposto indevido.


Nos termos que se deixam expostos e em face da prova produzida deverá a impugnação proceder com todas as consequências legais.

Com o que se fará justiça.».

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. A EPGA junto deste Tribunal emitiu douto parecer em 30.10.2019, no qual consignou o seguinte:
«(…)
Submetida à apreciação do Tribunal estava a questão de saber se as faturas emitidas no ano de 2011 por G., Lda, V., A., C., e CS. correspondem ou não a operações reais.

Vejamos.
E vasta a jurisprudência sobre faturas reputadas de falsas por atestarem operações que não correspondem à realidade e sobre o respetivo ónus da prova.
Entre muitos outros destaco o ac. do TCAS proferido a 25.1.2018, no proc. 06744/ 13, no qual assim se sumariou:
I - Quando a Administração Tributária desconsidera faturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do arto 74 0 da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade. Feita essa prova, passa recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação; II — No que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela afaça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela fatura; III — Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Note-se ainda que a jurisprudência tem vindo a decidir no sentido de não impender sobre a AT a prova da existência de acordo simulatório entre emitente e utilizador da fatura, bastando-lhe provar a factualidade que a levou a não aceitar a dedução do imposto — cfr., entre outros, ac. do Pleno da Secção do CT do STA de 16.3.2016, proc. 1328/16. IBEPRT.

Ora, atentando na fundamentação da sentença, vemos que se baseou nos factos indiciários constantes do relatório de inspeção tributária, cujo teor deu por reproduzido, salientando a sua autenticidade e fidedignidade.

Ordenou-se a sua junção à sentença, da qual faz parte integrante.
Com efeito, estamos perante um relatório exaustivo e minucioso, onde se reuniram, como bem refere a sentença, elementos consistentes, coerentes e credíveis da inexistência das operações tituladas pelos supra identificados emissores.
E, partindo desse pressuposto, cabia então à impugnante provar o contrario, ou seja, que na realidade as operações atestadas nas faturas se realizaram.
Para o efeito limitou-se à prova testemunhal, que o julgador analisou criticamente, segundo a sua prudente convicção, nos termos do que lhe faculta o arto 607º do CPC, no seu no 5.
E em sede de recurso impunha-se-lhe que especificasse os concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados e indicasse os concretos meios probatórios, devendo o tribunal alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, mas apenas se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa - cfr. artº s 640º e 662º, ambos do CPC.
Os poderes de alteração da decisão de 1 a instância sobre a matéria de facto só se justificam quando possa concluir-se pela existência de erro, designadamente quando os depoimentos prestados, concatenados com a restante prova, impuserem conclusão diversa, sendo que sempre devem prevalecer os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova
Não vejo que tal se verifique, não me parecendo também que ocorra a apontada contradição do Tribunal na análise da prova testemunhal, circunstanciada e concisa, com bem se revela a págs. 5 a 11 da sentença.
Resta-me, assim, concluir do exposto que a sentença fez uma análise criteriosa dos factos e correta integração no direito aplicável, devendo, consequentemente, negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida.».


Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito em virtude de:
- a AT não ter provado que as facturas desconsideradas por si não correspondem a operações económicas reais (conclusões B., E. e Q.);
- ter considerado insuficiente a prova testemunhal produzida (conclusões C., F., I. a N. e P.);
- não ter considerado que os bens e serviços em causa foram efetivamente prestados (conclusões S., T. e U.)

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO

A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
A) A impugnante foi sujeita a um procedimento de inspeção ao exercício de 2011, que consta do relatório de inspeção tributária junto de folhas 16 a 25 verso do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
B) No exercício de 2011 a impugnante registou na sua contabilidade e relevou como gastos do exercício o valor das seguintes faturas (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA):
B.1) Faturas emitidas pela G., pessoa coletiva n.º (...), com sede que teve sede à Rua (…), (…), (…), abreviadamente designada G.:
Data Documento Fatura Base Tributável IVA liquidado Total
24/02/2011 20021 2556 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
29/02/2011 20022 2558 €3.150,00 €724,50 €3.874,50
03/03/2011 30025 2560 €1.950,00 €448,50 €2.398,50
14/03/2011 30026 2561 €2.000,00 €460,00 €2.460,00
18/03/2011 30027 2562 €2.150,00 €494,50 €2.644,50
02/05/2011 60027 2578 €2.000,00 €460,00 €2.460,00
14/03/2011 60028 2580 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
26/05/2011 60029 2583 €2.400,00 €552,00 €2.952,00
06/06/2011 60030 2586 €2.600,00 €598,00 €3.198,00
25/07/2011 70029 2584 €2.600,00 €598,00 €3.198,00
27/07/2011 70030 2587 €3.200,00 €736,00 €3.936,00
Totais €30.050,00 €6.911,50 €36.961,50

B.2) Fatura emitida por V. contribuinte fiscal n.º (...), residente na Avenida (…), (…), (...), abreviadamente designado V.:
Data Documento Fatura Base Tributável IVA liquidado Total
20/12/2011 120036 52/2011 €22.500,00 €5.175,00 €27.675,00
Totais €22.500,00 €5.175,00 €27.675,00

B.3) Faturas emitidas por A., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Rua (…), (…), (...), abreviadamente designado A.:
Data Documento Fatura Base Tributável IVA liquidado Total
15/12/2011 120037 2756 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
15/12/2011 120038 2788 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
Totais €8.000,00 €1.840,00 €9.840,00

B.4) Faturas emitidas pela sociedade comercial C., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Zona Industrial (…), (…), abreviadamente designada C.:
Data Documento Fatura Base Tributável IVA liquidado Total
15/12/2011 120037 2756 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
15/12/2011 120038 2788 €4.000,00 €920,00 €4.920,00
Totais €8.000,00 €1.840,00 €9.840,00

B.5) Faturas emitidas por CS., contribuinte fiscal n.º (…), residente à Rua (…), (…), (…), abreviadamente designado CS.:
Data Documento Fatura Base Tributável IVA liquidado Total
06/09/2011 100020 876 €3.140,00 €722,00 €3.862,20
20/09/2011 100021 889 €3.050,00 €701,50 €3.751,50
Totais €6.190,00 €1.423,70 €7.613,70

C. Com base nos factos e conclusões do relatório de inspeção tributária julgado provado em A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, os serviços de inspeção tributária consideraram que as faturas referidas em B) não titulam operações económicas reais, por não titularem efetivas operações comerciais efetuadas com as emitentes das faturas, pelo que os respetivos gastos foram indevidamente deduzidos pela impugnante, por não serem dedutíveis nos termos do art. 23.º do CIRC (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
D. Com essa fundamentação, a administração tributária considerou que essas faturas não conferem o direito à dedução dos gastos do exercício, por não titularem efetivas operações comerciais efetuadas com as emitentes das faturas (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
E. Por esse motivo, os serviços de inspeção tributária não aceitaram a dedução dos custos constantes das faturas identificadas em B), no montante global de €111.190,00 (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
F. Apesar do valor total das faturas desconsideradas ascender a €111.190,00, a impugnante contabilizou apenas 6,25% do gasto da fatura de V., pelo que do valor da fatura de €22.500,00, contabilizou um gasto de €1.406,25, pelo que o valor total dos gastos corrigidos ascende a €90.096,25 e não aos €111.190,00 (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
G. A Autoridade Tributária e Aduaneira, com base nos factos e conclusões do relatório de inspeção tributária e pelos motivos constantes no ponto denominado III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL, cujo teor aqui se dá por reproduzido, procedeu à correção meramente aritmética da matéria tributável da impugnante no montante de €90.096,25 (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
H. Com a correção da matéria tributável no montante de €90.096,25, a matéria coletável declarada pela impugnante de €0,00 foi corrigida para €95.009,94 (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
I. Esta correção deu origem à liquidação de IRC de 2011, à liquidação de juros compensatórios e à demonstração de contas juntas a folhas 7, 8 e 9 do procedimento de reclamação graciosa apenso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
J. No exercício de 2011 a impugnante declarou um volume de negócios de €427.943,16 e apurou um lucro líquido de €7.067,47 (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA).
K. No exercício de 2011 verificavam-se os seguintes rácios de rentabilidade fiscal [Rácio R04-RFVENDAS], rentabilidade bruta [Rácio R16-MBI] e [Rácio R17-MBII] (relatório de inspeção tributária de fls. 16 a 25 verso do PA):
Rácios
Ano de 2011
Empresa Unidade Orgânica Setor
R04-RFVENDAS 2,6 2,8 4,89
Rácios
Ano de 2011
Empresa Unidade Orgânica Setor
R16-MBI 70,68 61,73 62,47

Rácios
Ano de 2011
Empresa Unidade Orgânica Setor
R17-MBII 28,47 28,35 40,85

Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga não provado:
1) A G., V., A., C. e CS forneceram à impugnante os bens e serviços que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária referidas em B).
2) Essas faturas emitidas em nome da G., V., A., C. e CS e registadas na contabilidade da impugnante no exercício de 2011, como gastos do exercício, titulam operações económicas reais e efetivas operações comerciais efetuadas com essas empresas.
3.1.1 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo na parte em que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, conjugados com as regras da experiência e considerando ainda a prova testemunhal produzida em audiência.
Cumpre antes de mais explicar a matéria de facto julgada não provada.
A matéria de facto julgada nos pontos 1 e 2, não corresponde exatamente à matéria de facto alegada pela impugnante. A redação dessa matéria de facto traduz os factos considerados essenciais para a decisão da causa e que resulta, da síntese, dos factos alegados pela impugnante.
Os factos essenciais que a impugnante tinha de alegar e provar é que as faturas que foram desconsideradas pelos serviços de inspeção tributária correspondiam a operações económicas reais e ao fornecimento efetivo pelas emitentes das faturas dos bens e serviços que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária. E fá-lo quando alega que a administração tributária não apresenta qualquer facto suscetível de afastar a presunção de verdade da sua escrita e que fará prova da existência das operações, factos que demonstram, no seu entender, que essas empresas forneceram efetivamente os bens e serviços constantes das faturas desconsideradas pela administração tributária e que representam operações económicas reais, redação dada à matéria de facto julgada não provada nos pontos 1 e 2.
Por isso, o Tribunal decidiu reduzir os factos instrumentais alegados pela impugnante aos factos essenciais dos pontos 1 e 2.
Quanto à motivação da matéria de facto julgada não provada, cumpre dizer que o Tribunal entendeu que a prova produzida pela impugnante não foi suficientemente consistente para demonstrar a realidade dos factos alegados e convencer o Tribunal dos mesmos.
Vejamos.
A matéria de facto julgada não provada nos pontos 1 e 2, são factos alegados pela impugnante e constitutivos do seu direito, pelo que recaía sobre si o respetivo ónus da prova (art. 74.º, n.º 1, da LGT).
Perante a insuficiência da prova, esses factos têm de ser julgados contra si, isto é, têm de ser julgados não provados, por força do art. 414.º do CPC.
Por um lado, há prova do contrário resultante da prova carreada para os autos pela administração tributária no relatório de inspeção tributária.
Por outro lado, para prova dos factos alegados a impugnante juntou prova testemunhal que não se revelou suficientemente consistente para abalar a prova da administração tributária, nem convencer o Tribunal da ocorrência dos factos invocados.
Dos factos indiciários constantes do relatório de inspeção tributária, no capítulo denominado III – DESCRIÇÃO DOS AFCTOS E FUNDMANETOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL, cujo teor aqui se dá por reproduzido, por uma questão de autenticidade, fidedignidade e de economia processual, para evitar duplicações de citações, e das regras da experiência resulta de forma objetiva, coerente e consistente, fortes indícios que a G., V., A., C. e CS não forneceram à impugnante os bens e serviços que constavam das faturas desconsideradas pelos serviços de inspeção tributária.
Por outro lado, o depoimento das testemunhas não é bastante para convencer o tribunal.
A impugnante alega que as operações em causa correspondem a operações económicas reais e efetivas operações comerciais efetuadas com essas empresas.
Apesar da testemunha M. ter corroborado a versão da impugnante, o seu depoimento pela forma vaga e genérica como foi prestado, confirmando genericamente que as faturas em causa correspondiam a serviços prestados pelas respetivas emitentes, no caso da G., A. e C., não foi suficientemente assertivo para convencer o Tribunal. Acresce que esta testemunha tem interesse direto nos autos já que é sócia da impugnante, conforme a própria admitiu aquando da sua identificação.
Ponderada a forma vaga do depoimento, com o interesse direto na causa e a objetividade dos factos e provas carreadas para os autos no relatório de inspeção tributária que revelam que a G. não podia ter fornecido à impugnante os serviços que constam das faturas, em particular, o facto de não ter meios humanos e materiais, próprios ou subcontratados, para desenvolver a atividade produtiva necessária para prestar esses serviços, a falta de prova do pagamento das faturas, as divergências entre as faturas recolhidas na G. e as faturas em poder da impugnante e demais circunstâncias que revelam que essa empresa não forneceu à impugnante os serviços que constam das faturas, o tribunal não ficou convencido que o depoimento da testemunha é bastante para abalar a prova documental da Fazenda Pública e para demonstrar que essas faturas correspondem a efetivas operações comerciais efetuadas com essa empresa.
No caso de V. a testemunha não sabe nada da compra da máquina.
Todavia, V. em depoimento assertivo, consistente e verosímil declarou que não vendeu à P. a máquina que consta da fatura e não emitiu a fatura n.º 52/2011. Só fez uma venda à P. em 2010, de mil e poucos euros, nunca lhe vendeu nenhuma máquina no valor de cerca de €20.000,00, até porque só vende máquinas para madeira.
No primeiro trimestre de 2011 V. deixou de trabalhar em nome individual e cedeu a totalidade do seu património empresarial à sociedade que constituiu, pelo que não podia ter emitido a fatura n.º 52/2011, em 20/12/2011, já que não emitiu faturas em nome pessoal a partir de 07/03/2011. De resto, a fatura não foi contabilizada por V..
A fatura em poder da P. tem layout, estrutura, elementos e informações diferentes das faturas de V. o que indicia que foi forjada. Além disso, a P. não exibiu quaisquer outras evidências da operação económica subjacente à fatura, designadamente, nota de encomenda, documento de transporte ou outros.
Esta constatação é ainda reforçada pelo facto de no preenchimento da fatura ter sido utilizado o código ACSS que foi o código utilizado por V. no preenchimento da fatura n.º 3/2010, pela qual vendeu à impugnante alguns artigos. Contudo, V. esclareceu que se tivesse vendido a máquina o código que tinha usado seria MAQ, o que reforça os indícios de ser um documento forjado.
A P. contabilizou a fatura como pagamento de uma só vez e em numerário, o que viola o art. 63.º-C, n.º 3, da LGT, e não comprova o pagamento efetivo a V..
Além disso, a P. tinha o recibo n.º 52/2011, mas V. informou que a numeração dos recibos não acompanhava a numeração das faturas, isto é, na sua contabilidade o número do recibo, não coincidia com o da fatura.
Estes factos comprovam a existência de fortes indícios da inexistência da operação económica subjacente a essa fatura e infirmam a alegação da impugnante.
No caso de A., M. declarou que era cliente e fornecedor e que os pagamentos eram em cheque ou numerário e às vezes faziam acertos de contas.
Só que este depoimento também não revela consistência bastante para convencer o tribunal e é infirmado não só pelo depoimento de A., como pela prova constante do relatório de inspeção tributária. Esta testemunha declarou que os pagamentos eram feitos por acerto de contas e se houvesse diferença era feito o pagamento, mas não se recorda como. Além disso confirma as informações prestadas aos serviços de inspeção tributária e designadamente que em 2011 só passou uma fatura à P., a fatura n.º 429. As faturas n.ºs 326 e 333 que constam da contabilidade da P. não foram emitidas por si e não as reconhece como suas. Estes factos são corroborados pela circunstância das referidas faturas constarem da contabilidade de A. mas foram emitidas a outros sujeitos passivos. A fatura n.º 326 foi emitida em 29/11/2011 a A., no valor de €55,35, e a fatura n.º 333 foi emitida em 01/12/2011 a B, Ld.ª, no valor de €55,35, contribuintes que confirmaram ter as faturas em seu poder.
Acresce que as faturas utilizadas pela P. tem uma estrutura, elementos e informações diferentes das faturas de A. o que reforça os indícios de serem forjadas
No que respeita ao pagamento das faturas a P. apesar de ter exibido alegados pagamentos não refletiu os pagamentos na conta corrente deste fornecedor, não comprovando o seu pagamento efetivo.
Além disso a P. não apresentou quaisquer outras evidências da realização da operação económica subjacente às faturas, designadamente, eventuais documentos de transporte, requisições ou nota de encomenda, nem comprovou o pagamento efetivo.
No que respeita às referidas faturas n.ºs 326 e 333 há, por isso, fortes indícios que são fictícias ou simuladas e abalam a prova testemunhal da impugnante.
O mesmo sucede com a C..
Apesar da testemunha dizer que tinha negócios com esta empresa esta prova é infirmada pela prova da Fazenda Pública. A administração tributária demonstrou no relatório de inspeção tributária que a C. não teve qualquer relação comercial com a P. no ano de 2011, conforme informação do seu técnico oficial de contas. A C. juntou ainda as faturas n.ºs 2756 e 2788 que tem registadas na sua contabilidade, que foram emitidas a J. e L., Ld.ª, em 4 e 11/11/2011.
As faturas em poder da impugnante não constam da contabilidade da C. e não fazem parte da conta corrente da impugnante. As faturas com os mesmos números foram emitidas a outros clientes dessa empresa, indícios que são documentos forjados. Estes indícios são ainda reforçados pelo código hash Favx aposto nessas faturas, que não é identificado e reconhecido como válido pela empresa informática da C., pelo facto de no preenchimento dessas faturas ter sido aposto o código de cliente 1605 que corresponde a um outro cliente que não a P. e pela falta de contabilização do pagamento das faturas e das grandes diferenças formais entre as faturas emitidas à impugnante e as faturas em poder da emitente.
Como se não bastasse, a P. não apresentou quaisquer outras evidências da realização da operação económica subjacente às faturas, designadamente, eventuais documentos de transporte, requisições ou nota de encomenda, nem comprovou o seu pagamento efetivo.
No caso de CS a testemunha nada sabe quanto a ele.
Todavia, a prova produzida pela Fazenda Pública no relatório de inspeção tributária infirma as alegações da impugnante.
CS foi considerado pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Aveiro como emitente de faturas a que não correspondem efetivas transações de bens ou serviços, beneficiando de uma comissão pela emissão dos documentos. Este sujeito passivo entregou faturas em branco a uma sociedade comercial do Distrito do (…) que no ano de 2010 declarou no anexo P operações em nome de CS no montante de €110.924,00, só que CS declarou que essas faturas não correspondiam a transações verdadeiras, facto corroborado pelo gerente da referida sociedade comercial que procedeu à regularização da situação.
Na emissão da fatura n.º 889, em poder da P. não foi respeitada um critério lógico e sequencial, já que foi emitida em 20/11/2011, quando a fatura n.º 886 utilizada pela referida sociedade comercial com sede no (…) foi emitida em 27/09/2011. As operações mencionadas nas faturas n.ºs 876 e 889 utilizadas pela P. têm a mesma natureza das operações constantes das faturas daquela outra empresa e que não correspondiam a operações económicas reais, sendo que exigiam instalações limpas e organizadas que não eram conhecidas a CS..
Acresce que o técnico responsável pela contabilidade de CS facultou aos serviços de inspeção tributária o registo das faturas n.ºs 876 e 899, de 2011, do qual resulta que essas faturas foram emitidas, respetivamente, a CC, Ld.ª, pelo valor de €90,00, mais €20,70 de IVA, no total de €110,70, e a , Ld.ª, no valor de €60,00, mais €13,80 de IVA, no total de €73,80.
Outra incongruência resulta do facto do valor dos serviços prestados contantes das faturas em poder da P., no montante de €6.190,00, ser superior ao valor anual das prestações de serviços de CS. apuradas pelos serviços de inspeção tributária que ascendiam a €6.108,20.
A tudo isto, acresce que a P. também não comprovou o pagamento efetivo das faturas diretamente a CS., nem por intermédio da R., conforme alegou aos serviços de inspeção tributária.
Com efeito, a impugnante alegou que fez os pretensos pagamentos a CS. através da R. através de dois acertos de contas de €4.232,00 e €4.865,00, no total de €9.097,00.
Sucede que estes movimentos não estão refletidos na conta corrente da P. para com o seu fornecedor CS. e além disso o alegado pagamento ascendia a €9.097,00, quando o valor total das duas faturas é de €7.613,70. Como se não bastasse a P. relevou o pagamento dessas faturas como tendo sido efetuado de uma só vez e em numerário, com recibos emitidos pelo valor de cada uma das faturas.
Todas estas incongruências revelam fortes e fundados indícios de estarmos perante faturas fictícias ou simuladas que não titulam operações económicas reais e que infirmam as alegações da impugnante.
Relativamente a estas empresas só restam os depoimentos de C. e H. ambos funcionários da impugnante.
Os seus depoimentos também não revelaram consistência suficiente para convencer o tribunal pela forma vaga como responderam às questões colocadas e se referiram às empresas.
No que tange à compra da máquina a V. e aos fornecimentos de CS. C. declarou que nada sabia. H. também nada sabia de CS..
Quanto aos restantes fornecedores G., C. e A. declararam que levavam produtos para acabar.
Todavia, estes depoimentos são vagos, imprecisos e inconsistentes.
Desde logo, no que respeita à G. esclareceu que não conhece esta empresa, que só conhecia o Sr. T., o que pode levar a deduzir que não se sabe a que título e para quem é que ele trabalhava e se levava mercadoria para quem era: se para a G. se para qualquer outra empresa ou pessoa. Estas dúvidas ressaltam sobretudo perante a comprovada falta de meios humanos e materiais da G. para prestar os serviços que constavam das faturas.
No caso da C. porque depois de dizer que levava produtos para fazer acabamentos declarou que esta empresa fornecia esferográficas e isqueiros, porque chegou a ir lá buscar algum material, infirmando assim a prestação de serviços à impugnante e corroborando os factos apurados em sede de relatório de inspeção tributária que revelam que as faturas em poder da P. emitidas em nome da C. são faturas forjadas, por não serem reconhecidas pela alegada emitente que tem registadas na sua contabilidade as faturas com os mesmos números da P. mas emitidas a outros clientes.
Relativamente a A. a referência genérica que ia lá buscar produtos para acabar também não é suficientemente consistente para convencer o tribunal, porquanto esse depoimento é infirmado de forma cabal pelos factos apurados no relatório de inspeção tributária que demonstram que A. não emitiu as faturas que estão em poder da impugnante com o seu nome, nem que lhe prestou os respetivos serviços.
Ponderada toda a prova produzida, o tribunal ficou convencido que a impugnante não fez prova suficientemente consistente que as referidas empresas, G., V., A., C. e CS., efetivamente forneceram à impugnante os bens e serviços que constam das faturas emitidas em seu nome, que foram contabilizadas por si mas que foram desconsideradas pelos serviços de inspeção tributária e cuja dedução do custo não foi aceite pela administração tributária por terem sido considerados indevidamente deduzidos, por essas faturas não titularem operações económicas reais.
«As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos» (art. 341.º do CC).
Na falta de produção de prova bastante, os factos essenciais alegados pela impugnante (que as faturas em causa titulam operações económicas reais), enquanto factos constitutivos do seu direito e sobre quem recaía o respetivo ónus da prova, têm de ser julgados contra si (arts. 74.º, n.º 1, da LGT e 414.º do CPC), isto é, têm de ser julgados não provados, tal como consta dos pontos 1 e 2.
A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa.».

3.2. De Direito

3.2.1. A Recorrente começa por arguir que não resulta da motivação do Tribunal que a AT tenha logrado provar que as faturas desconsideradas por si não correspondem a operações económicas reais, pois a prova documental referida na sentença é um relatório de inspeção, que reproduz conclusões fácticas de funcionários da AT, cujo único fim foi demonstrar a inexistência das operações declaradas pela Impugnante.
Considera, também, que ocorre contradição da sentença, em virtude de ali se considerar que a prova testemunhal produzida não é suficientemente assertiva e consistente – sem colocar em causa a credibilidade dos depoimentos e parecendo demonstrar que compreende e aceita a existência das operações comerciais – e, logo de seguida, referir que tal prova não abala a prova oferecida pela AT.
Conclui, por isso, que a sentença em crise viola os princípios da avaliação da prova à luz das regras da experiência comum porquanto a AT não demonstrou os pressupostos legais de que depende a sua atuação.
Analisando, desde já, a questão do ónus da prova – que se nos afigura logicamente precedente das demais suscitadas no presente recurso -, devemos afirmar, em sintonia com a jurisprudência que, reiterada e uniformemente, vem sendo seguida nos nossos Tribunais que «(…) o ónus da prova se reparte, em processo onde o contribuinte impugne a actuação da AT, desconsiderando operações consubstanciadas em determinadas facturas existentes na escrita daquele, no sentido de caber a esta (AT) a prova dos pressupostos da sua actuação e àquele (contribuinte) a prova de que as questionadas operações tiveram, efectivamente, lugar. Ou, numa outra formulação, obtendo a AT indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção (neste sentido, Ac. TCAN de 24-01-2008, Proc. nº 02887/04 - VISEU, www.dgsi.pt ).
De notar que a administração tributária não precisa de demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-10-2004, processo n.º 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade - artigo 75.º da Lei Geral Tributária.
Tal significa que, quando está em causa a correcção de liquidações de IRC por desconsideração dos custos documentados por facturas reputadas de falsas pela AT, e porque a liquidação de IRC tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, tendo o juízo da administração tributária assentado na consideração de que as operações e o valor mencionado na factura em causa não corresponde à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na factura foi simulada, sendo que, como já ficou dito, feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável nos termos que decorrem dos artigos 17º nº 1 e 23º do CIRC, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100º do CPPT não tem aplicação; na verdade, o ónus consagrado no artigo 100º nº 1 do CPPT, contra a administração tributária (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a administração tributária: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como in casu, é ao contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos custos em que alega ter incorrido e que pretende ver reflectidos no apuramento do lucro tributável. ». – cfr. acórdão deste TCAN de 25/01/2018, proc. 02318/06.0BEPRT.
É que, «(…) embora a regularidade formal da escrita constitua presunção da sua veracidade - estendida aos seus elementos de apoio (art. 75º da LGT) -, tal presunção cessa no caso da existência de indícios sérios de que as operações escrituradas se não realizaram. Daí que, como se disse, provando a AT a existência de indícios sérios e credíveis de que tais operações não são verdadeiras, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das mesmas.» – cfr. acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 27/02/2019, proc. 01424/05.2BEVIS.
Assim, compete à AT evidenciar a existência de factos que, segundo as máximas da experiência comum, são seriamente indiciadores de que as operações tituladas pelas faturas não correspondem a transações comerciais efetivamente ocorridas, não lhe sendo exigível demonstrar a falsidade das faturas ou a existência de um conluio entre o emitente das faturas e o respetivo beneficiário. A prova exigível à AT é, portanto, a da existência de “indícios fundados” (objetivos, sólidos e consistentes) que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais, não se lhe impondo a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que refletem – cfr. neste mesmo sentido, o ac. do TCAS de 11/10/2018, proc. 1594/09.0BELRA.
Em suma, basta à AT provar a factualidade suscetível de abalar a presunção de veracidade dos registos constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito de deduzir os custos ao lucro tributável) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efetivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.
Relativamente ao ónus probatório a cargo da AT, considerou-se na sentença recorrida que «(…) a administração tributária carreou para os autos prova bastante consistente, coerente e credível da inexistência das operações económicas tituladas pelas faturas emitidas em nome G., V., A., C. e CS., registadas na contabilidade da impugnante, que foram consideradas pela administração tributária, de forma convincente e fundada, como titulando operações simuladas por não corresponderem a operações económicas reais e a efetivas operações comerciais efetuadas com essas empresas, em nome das quais foram emitidas as faturas.
Basta atentar na matéria de facto julgada provada, nas alíneas A) e F), e não provada nos pontos 1 e 2, na motivação da matéria de facto e no teor do relatório de inspeção tributária, que aqui se dão por reproduzidos, por razões de economia e fidedignidade, e nos fundamentos invocados pela administração tributária para não aceitar a dedução dos custos constantes dessas faturas, para concluir-se que a administração tributária alegou e provou a existência de sérios e fundados indícios da inexistência das operações económicas subjacentes às faturas emitidas em nome da G., V., A., C. e CS..
Estando feita prova consistente da existência de fortes e sérios indícios que as faturas emitidas com o nome dessas empresas, registadas na contabilidade da impugnante no ano de 2011, não titulam operações económicas reais, está afastada a presunção de veracidade da sua escrita (art. 75.º da LGT - Esta presunção cessa quando “…embora a escrita ou contabilidade esteja organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexatidões, ou haja, indícios fundados de que apesar da sua correta organização, não reflete a matéria tributável efetiva” – “Cabe nesta previsão, claramente, o caso de a contabilidade, impecavelmente organizada, se avaliada do ponto de vista técnico-contabilístico, no entanto omitir operações efetuadas; e cabe o caso inverso – o de incluir operações não efetuadas. Este último é aquele que correntemente se vem chamando de “faturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto refletirem, na verdade, não tiveram lugar. E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, impõe à Administração a “prova provada” de que por trás dos documentos não está a realidade que normalmente refletem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protetor da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respetivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles fundados indícios – Acórdão de 7/5/2003, da 2.ª secção do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 1026/02, disponível em www.dgsi.pt) e formal e materialmente fundamentada a decisão administrativa de não aceitar como custo fiscal do valor dessas faturas (art. 23.º, n.º 1, do CIRC).».
E este juízo do Tribunal a quo não nos merece qualquer censura por ser consentâneo com a factualidade vertida no relatório inspetivo que originou a liquidação em crise e descriminada na motivação do julgamento de facto.
Vejamos, então, quais os indícios demonstrados pela AT:
a) quanto às faturas da sociedade G., no valor global de 81.917,00€:
- não respeitam quaisquer critérios lógico e sequencial;
- não contêm as informações exigidas aos bens em circulação nem foram exibidos outros documentos que acompanhassem as mercadorias ali mencionadas;
- numa inspeção tributária realizada esta emitente, a AT apurou indícios sérios de que a mesma não exercia atividade em 2011 que justificasse a materialidade das operações em causa; era um sujeito passivo não declarante desde 2003; foi cessada oficiosamente com efeito a 31.12.2011; foi aberto procedimento administrativo para a sua dissolução;
- nos anos de 2011 e 2012 não há rasto documental de esta empresa ter colaboradores ao serviço ou fornecedores;
- o formato dos últimos documentos emitidos por esta emitente apresenta diferenças significativas relativamente aos utilizados pela agora Recorrente (quanto à sua identificação no cabeçalho, logotipo, contactos telefónicos, locais reservados à aposição da data e elementos exigidos pelo artigo 4.º do DL n.º 147/2003, de 11/07), grafia);
- não foi detetada qualquer ligação do suposto intermediário A. a esta sociedade emitente, tendo este domicílio fiscal em (…); no entanto, foi por ele referido em Termo de Declarações de 27.07.2015 que “… abandonou as instalações da G., (…), há cerca de dois anos e que na altura emitiu as faturas identificadas no Ponto 2 (do Termo de Declarações), o serviço era feito pelo declarante e com recurso a mão-de-obra ocasional, que trabalhava fora[m] das instalações daquela empresa”; embora notificado para o efeito, este contribuinte não exibiu qualquer documento comprovativo da efetividade das operações tituladas pelas faturas;
b) quanto à fatura de V., no valor de 27.675,00€, respeitante à aquisição de uma máquina de plasticização:
- na declaração periódica de IVA de 11-03T este sujeito passivo fez constar a cedência da globalidade do património empresarial a favor de V.;
- nas restantes declarações periódicas não está refletida a venda titulada por aquela fatura;
- a Recorrente registou o pagamento do valor desta fatura de uma só vez e em numerário, o que não lhe é permitido pelo artigo 63.º-C, n.º 3, da LGT;
- o alegado emitente da fatura declarou em Termo de Declarações que «não emitiu os exemplares da Fatura de Venda e Recibo de Venda Nº 52/2011», «não se recorda de alguma vez ter vendido máquinas de plasticização, uma vez que a sua atividade consistia unicamente na venda de máquinas para indústria de madeira», o código “ACS” era usado na venda de acessórios e não de máquinas, as suas faturas não apresentavam o layout da fatura em causa, nem esta contem a indicação habitual das condições de garantia e, no ano de 2011, a numeração dos recibos não acompanhou a numeração das faturas;
- não foi demonstrado o efetivo pagamento do valor da fatura, nem foram recolhidas evidências da existência de outros documentos precedentes ou contemporâneos da emissão da fatura (requisição, encomenda, documento de transporte ou outros);
c) quanto às faturas de A., n.º 326, 333 e 429, no valor global de 15.252,00€:
- o respetivo emitente apenas admitiu ter emitido a favor da Recorrente a fatura n.º 429 (as restantes foram emitidas a favor de outros seus clientes, que confirmaram as operações, e por valores diferentes das faturas exibidas pela Recorrente), na data em que transferiu todo o restante património afeto à sua atividade para a empresa “D…”, tendo o pagamento sido efetuado por “encontro de contas” da fatura da Recorrente n.º 3477 de 31.12.2011;
- a Recorrente não apresentou evidencias da realização das operações tituladas pelas faturas n.º 326 e 333;
d) quanto às faturas de C., com os n.ºs 2456 e 2788, no valor global de 9.840,0€:
- o TOC desta empresa informou que nos anos de 2011 e 2012 a mesma não teve qualquer contacto/movimentação comercial com a Recorrente e que as faturas com aquela numeração foram emitidas a outros sujeitos passivos;
- o layout das faturas em uso por esta fornecedora a partir de 01.01.2011 não coincide com as encontradas na contabilidade da Recorrente, que se assemelham mais ao formato antigo;
- os valores mencionados nas faturas n.º 2756 e 2788 constantes da contabilidade da emitente são muito inferiores ao mencionados nas faturas exibidas pela Recorrente;
- o n.º de cliente mencionado nas faturas exibidas pela Recorrente corresponde a outro cliente;
- as faturas exibidas pela Recorrente apresentam a aposição de assinatura digital em local distinto do das faturas emitidas por esta fornecedora, sendo também apostos em locais e de formas diferentes a identificação e morada da emitente, os elementos a que se refere o artigo 171.º do CSC, a identificação dos NIBS das contas bancárias do emitente, o número de casas decimais da coluna “preço” e nos resumos da fatura e de apuramento do IVA;
- o produtor de software desta emitente declarou que é «…100% seguro que não foi emitida nenhuma fatura com essa chave no sistema do … cliente C.»;
e) quanto às faturas de CS., com os n.ºs 876 e 889, no valor global de 7.613,70€:
- este emitente foi alvo de procedimento inspetivo onde se concluiu que é emitente de faturas a que não correspondem efetivas transmissões de bens ou serviços, recebendo uma comissão (preço) pela intervenção na emissão / colocação dos documentos, tendo o beneficiário das faturas (Sociedade R) procedido à regularização das mesmas;
- na emissão da fatura n.º 876 não foi respeitado qualquer critério lógico e sequencial;
- a natureza das operações mencionadas nas faturas n.º 876 e 889 é em tudo semelhante à generalidade das operações mencionadas nas faturas utilizadas pela Sociedade R;
- aquele tipo de serviços teria que ser efetuado em instalações limpas e organizadas, que o emitente em causa não possui;
- as operações que, alegadamente, evidenciam o pagamento destas faturas não estão refletidas na conta corrente da Recorrente relativa a este fornecedor/emitente, pois as que estão contabilizadas respeitam a valores superiores aos mencionados nas faturas.
Ora, se por um lado, os apontados factos, objetivamente apurados, são, segundo as regras da normalidade e da experiência comum, seriamente indiciadores de que as faturas em crise não correspondem a efetivas operações comerciais, por outro lado, a Recorrente não alegou nem demonstrou que tais indícios não têm aderência à realidade.
Dado que, como já vimos, a AT apenas tem o ónus de demonstrar indícios sérios de que as faturas não titulam operações efetivas (e, já não, o de provar a falsidade das faturas em crise), o mesmo mostra-se cumprido, o que, à face da lei e da jurisprudência, é quanto baste para afastar a presunção de veracidade da contabilidade da Recorrente.
Assim, podemos, desde já concluir pela improcedência das conclusões C. e I. a P. das alegações de recurso.

3.2.2. Em face da prova realizada pela AT, passou a competir à Recorrente a prova da efetividade das operações tituladas pelas faturas identificadas nos pontos B.1) a B.5) dos factos provados.
Esta prova tem que ser inequívoca, positiva, concludente e sem margem para qualquer dúvida, da realidade das operações faturadas. Tal prova deve, pois, ser concretizadora, em termos de tempo, espaço e valores envolvidos, no sentido da demonstração concreta de cada operação, esclarecendo a identidade do vendedor/fornecedor, a data da transação, os bens transacionados ou serviços prestados, o respetivo custo, etc.
Estamos, é certo, perante um ónus probatório rigoroso que, porém, não pode qualificar-se como “prova diabólica” ou particularmente difícil uma vez que se exige a demonstração de factos positivos, não se justificando, por apelo ao princípio constitucional da proporcionalidade, uma menor exigência probatória por parte do aplicador do direito, dando relevo a provas menos relevantes e convincentes, aplicando a máxima latina iis quae difficilioris sunt probationis leviores probationes admittuntur.
Nesta conformidade, nunca a mera demonstração da “existência de relações comerciais entre os emitentes e a Recorrente” seria suficiente para cumprimento deste ónus probatório, sendo certo que, no caso que nos ocupa, a factualidade vertida no probatório não nos permite concluir que a Recorrente cumpriu o ónus da prova que sobre si impendia.
E nem se diga que o Tribunal a quo devia ter suprido a apontada insuficiência probatória, por força do dever de inquisitório que impende sobre si nos termos do artigo 411.º do CPC e especialmente previsto nos artigos 13.º, n.º 1, do CPPT e 99.º, n.º 1 da LGT, o qual expressa que «O Tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.».
Sucede que, no caso, não vislumbramos, nem a Recorrente esclarece, quais as diligências probatórias que o Tribunal poderia ter determinado para apuramento da verdade material. Com efeito, as contabilidades da Recorrente e das emitentes foram analisadas pela AT, de forma minuciosa e objetiva como se extrai do relatório inspetivo, pelo que não se justificava a realização de prova pericial, tanto mais que a Recorrente não colocou em causa os factos apurados pela AT, mas apenas a sua conclusão. Foram ouvidas as testemunhas arroladas pela Recorrente e não foi requerida a junção aos autos de quaisquer documentos, nem resulta evidente a necessidade de tal junção.
Não se afigura, pois, que ocorra erro de julgamento em virtude de o Meritíssimo Juiz a quo não ter ordenado a realização de outras diligências, uma vez que os autos não evidenciam a respetiva necessidade e o Tribunal está proibido de realizar atos inúteis (cfr. artigo 130.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT).
3.2.3. Acresce referir que, embora as alegações de recurso evidenciem o inconformismo da Recorrente face ao julgamento de facto constante da sentença recorrida, a verdade é que não está cumprido o ónus (quer principal quer acessório) que sobre ela impendia para habilitar este TCAN a analisar tal julgamento.
Fazendo um breve enquadramento legal das regras a que a Recorrente está sujeita para a impugnar a matéria de facto e dos poderes do TCA para a sua apreciação há que trazer à colação os artigos 662.° e 640.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), de cuja leitura conjugada resulta que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto sempre que, em seu juízo autónomo, os elementos de prova acessíveis determinem uma solução diversa.
Isto, porém, sem prejuízo do especial ónus de impugnação que recai sobre o Recorrente, concretizado nas três alíneas do n.º 1, do artigo 640.º do CPC, as quais lhe impõem a especificação (i) dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, (ii) dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos a matéria de facto impugnados diversa da recorrida e (iii) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Decorre ainda do n.º 2 deste artigo que, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Como se pode constatar pela leitura das conclusões, a Recorrente não identifica (designadamente por referência ao articulado inicial) os factos por si alegados que, tendo sido demonstrados através da prova testemunhal produzida, não foram considerados pelo Juiz a quo.
Sabendo-se que o ónus de alegação imposto pelo artigo 640.º do CPC é especial, trazemos à colação o acórdão do STJ de 21.03.2019, proc. 3683/16.6T8CBR.C1.S2, onde se consigna que «(…) integram um ónus primário, a exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas als. a), b) e c) do nº1 do citado art.640º, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto (…).»
Este aresto sublinha, portanto, o rigoroso ónus impugnatório principal de especificação dos concretos pontos de facto incorretamente julgados e expressa que «(…) a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº1 do referido art. 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada,».
Uma vez que a Recorrente, desde logo, nunca identifica os concretos pontos de facto incorretamente julgados em 1.ª instância, está este TCAN impedido de reapreciar o julgamento de facto vertido na sentença recorrida.
Perante isto, improcede totalmente o presente recurso.

4. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente e manter a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente, dispensando-se a Recorrida do pagamento da taxa de justiça devida nesta sede, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 5 de março de 2020


Maria do Rosário Pais
António Patkoczy
Ana Patrocínio