Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02905/06.6BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/24/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina Travassos Bento
Descritores:FACTURAS FALSAS
ÓNUS DA PROVA
NULIDADE DE SENTENÇA
Sumário:I. Só há nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto quando a esta falte a absoluta fundamentação, ou nos casos em que a sentença não tenha relação percetível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.
II. Na discriminação dos factos que há-de fazer, o juiz não tem que se pronunciar sobre todos os factos alegados pela parte, tendo antes o dever de seleccionar os que interessam para a decisão segundo as várias soluções plausíveis de direito.
III. Quando a Administração Tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo-lhe fazer prova de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade.
IV. Feita esta prova, recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da facturação.
V. A AT não tem que demonstrar a falsidade das facturas. Basta-lhe evidenciar a consistência desse juízo indiciário, invocando factos que revelam uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – artigo 75º da LGT.
VI. Demonstrados tais indícios, recai sobre o contribuinte a prova de que os serviços facturados prestados pelo emitente correspondem a operações reais, efectivamente por este realizadas.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:C..., S.A.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

C…, S.A., com o NIF 5…, com sede na Travessa…, Gaia, veio recorrer da sentença que julgou improcedente a impugnação das liquidações do IRC do exercício de 2002, no valor global de 1.347.393,80€, tendo considerado que a AT carreou para os autos prova bastante e consistente de que as facturas, registadas na contabilidade da impugnante, não titulavam operações reais e que a impugnante não tinha feito prova de que as empresas emitentes haviam fornecido as operações descritas nas facturas.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença que considerou improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente contra os actos de liquidação de IRC e juros compensatórios (relativas ao exercício de 2002), no valor total € 1.348.393,80;
2. O presente recurso tem por fundamento incontornável os erros clamorosos em que incorreu o Tribunal a quo no plano da determinação – ou delimitação – da matéria de facto considerada como provada e não provada e que serviu de base ao sentido final do aresto produzido;
3. Ao contrário do que afirma o Tribunal a quo, a recorrente produziu ampla prova – testemunhal e documental – que permitem, concluir:
a. que o montante constante da factura 282 de 17/1/02 emitida pela sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagem Lda., não emanou de qualquer simulação, tendo subjacente uma efectiva transmissão de bens, não sendo, por isso, uma «factura falsa»;
b. e que os valores constantes das demais facturas emitidas pela sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagem Lda. e, bem assim, das facturas emitidas pela sociedade N... Lda., corresponde rigorosamente ao realmente praticado.
4. Não é manifestamente verdade a afirmação do Tribunal a quo de que nos autos se verifica uma «total ausência de prova»;
5. O erro no juízo do Tribunal a quo quanto à realidade de facto em causa é patente:
6. Todas as transacções da C... com o Sr. N... (e empresas por si detidas [F... e N...Lda.]), e que estão na sua contabilidade, são verdadeiras, reais, correspondem a transacções efectivamente realizadas e os preços praticados (e demais condições) são sempre e em todos os casos os constantes das facturas;
7. A factura 282 não é falsa - titula, é certo, um acordo especial e irrepetível entre a recorrente e a F... (na pessoa do Sr. N...), mas explicado e justificado no respectivo contexto de relacionamento empresarial entre os intervenientes (dadas as relações pessoais e profissionais entre a recorrente e o Sr. N...).
8. Tratou-se de uma ajuda da recorrente à F..., traduzido na compra, em 2002, de uma certa tonelagem de sucata a um elevado preço pré definido, cujas entregas foram efectuadas até Outubro, sem adiantamento de preço e pagas em numerário, a pedido e conveniência da F.... Este acordo foi documentado através da factura 282 (emitida no momento inicial);
9. O facto de o pagamento ser feito em numerário nada prova quanto à falsidade da factura 282, porquanto o pagamento da factura não foi feito de uma só vez, mas em 15 períodos, com entregas em dinheiro na ordem dos € 15.000 a €25.000 por entrega. A que acresce a circunstância de a recorrente ter titulado esses pagamentos em dinheiro da melhor forma possível, isto é, através da emissão de um cheque ao portador, que era levantado pelo funcionário que ia ao Banco (para depois de entregar o dinheiro à F...) - e guardava cópia desse cheque na sua contabilidade (associando-o ao pagamento da factura 282);
10. Além disso, os demais argumentos indicados na inspecção (na tentativa de comprovação da falsidade da factura 282) a que o Tribunal a quo aderiu são totalmente aparentes e irrelevantes:
a. Todos concordam - até o Dr. Ab... (testemunha e inspector das Finanças) - que a recorrente, em 2006, não estava obrigada a guardar os tickets de balança e as guias de transporte das operações de 2002;
b. É falso e abusivo alegar (e não se provou) que a recorrente inutilizou e deitou ao lixo os tickets de balança e guias de remessa para, com isso, impossibilitar a comprovação da aquisição das mercadorias constantes da factura 282 - a inutilização dos tickets e das guias de trtansporte foi feita para evitar confusões (pagamentos em duplicado)
11. Do mesmo modo, as restantes facturas da F... e todas as emitidas pela N...Lda. correspondem à realidade dos factos, seja ao nível dos preços praticados, seja em relação às quantidades transaccionadas, seja, por fim, relativamente às demais características da operação;
12. No que se reporta ao quadro factual relevante, ficou também demonstrado, ao contrário do que sustentou o Tribunal a quo, que os cheques emitidos pelo Sr. N… a favor dos Srs. C…, F…, J…, A… e António… nada têm a ver com a actividade da recorrente não se inserem numa relação comercial ou financeira entre a recorrente e o Sr. N… (e empresas por si detidas e geridas);
13. Titulam, simplesmente, relações de crédito entre pessoas singulares - entre o Sr. N… (como devedor) e os Srs. C…, F…, J…, A… c António… (como credores, agindo enquanto pessoas singulares e não como administradores da C…);
14. A prova produzida reforça estas considerações: provou-se que havia uma sucessão de créditos mas que os mesmos nunca superaram, em cada momento, o valor de € 100.000 que nos cálculos de cada um dos 5 credores, dá um valor de €20.000 por credor - e associaram-se na mesma conta bancária para melhor controlo destes valores);
15. Provou-se igualmente que os credores só emprestavam o dinheiro contra a recepção, no mesmo momento, de cheques do mesmo valor emitidos pelo Sr. N..., mas com data posterior (15 dias a 1 mês).
16. É falso afirmar que a recorrente não cooperou com a inspecção tributária relativamente à matéria dos cheques pessoais - não é a C... que pode dar informações que estavam na esfera pessoal dos seus administradores.
17. Todos os indícios invocados pela Administração fiscal, e que o Tribunal a quo não deu por infirmados, foram devidamente esclarecidos pela recorrente:

a. Em 2002, a recorrente iniciou as diligências pata implementar um sistema de inventário permanente. Todavia, dada a complexidade e especificidade do sector (grande transformação dos produtos - o que sai da fábrica é muito diverso do que entra, com elevados desperdícios) e a inexistência no mercado de um programa informático pré concebido - o inventário permanente só entrou em funcionamento em 2004;
b. Em 2002, a generalidade das empresas de sucata não possuíam o sistema de inventário permanente: era muito difícil de implementar, por causa das especificidades do sector - depoimento de João...;
c. O Fiscal Único (no seu relatório e parecer anual do ano de 2002) e o Revisor Oficial de Contas (na revisão às contas de 2002) não colocam quaisquer objecções organização documental e contabilística da recorrente por não cumprir a obrigação de existência de inventário permanente;
d. No sector de actividade da C... é usual que o descritivo da factura indique apenas «sucata» ou «sucata diversa», porque essa designação corresponde à verdade e é impossível identificar, de outra forma, a amálgama de ferro, metais e outros produtos;
e. Há por vezes disparidade entre a tonelagem indicada nas guias de remessa e nas facturas (em função do somatório dos tickets de pesagem da balança). Quando tal sucede, o que prevalece é a pesagem da balança. No sector não se dá muita importância às guias de transporte, por causa da pesagem obrigatória. Por vezes fazia-se uma guia de remessa por entregas de vários camiões (foi isso o que aconteceu na Guia de remessa que refere 190 toneladas). Ou fazia-se uma Guia de remessa por toda a carga entregue num mês;
18. Já no plano do direito, a ora recorrente havia invocado que, nos termos do art.° 75.° da LGT, a contabilidade, a escrita (se organizadas de acordo com a lei comercial e fiscal) e declarações delas constantes do sujeito passivo presumem-se verdadeiras e de boa-fé - só assim não seria se a Administração fiscal lograsse introduzir «indícios fundados» da falsa facturação;
19. In casu, como se viu, os indícios apresentados nada provam: alguns não são aplicáveis à C..., outros São totalmente aparentes, e outros ainda de nada valem, se devidamente inseridos no seu contexto, conforme amplamente se explanou acima:
20. Consequentemente, ao arrepio da decisão proferida pelo Tribunal a quo, impunha-se a anulação das liquidações impugnadas, por não haver indícios fundados de operações fictícias, ou, pelo menos (mas sem prescindir), porque existe uma fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário - cfr art 100º’ do CPPT;
21. E ainda que se entendesse que a Administração fiscal aduziu indícios fundados para provar a sobre e falsa facturação - como decorre do juízo formulado pelo Tribunal a quo - a verdade é que a recorrente os rebateu completamente;
22. Por outro lado, como se demonstrou no plano factual, a Administração recorreu a factos falsos, insuficientes, contraditórios, e sem conexão lógica com as liquidações - tudo englobado em vícios de fundamentação e violação de lei (art.° 77.° da LGT), por «obscuridade, contradição ou insuficiência [que não esclareçam concretamente a motivação do acto» (n.° 2 do art.° 125.° do CPA);
23. O Tribunal a quo aderiu totalmente à tese, ou às teses, da Administração fiscal. E se não bastasse já a frontal divergência, no mero plano dos factos, que essa adesão merece por parte da recorrente, sucede que ela é maior na justa medida em que se baseia em juízos gerais, por um lado, e na assumpção de uma realidade sobre a actividade de reciclagem de sucatas que não existe manifestamente;
24. Esta constatação conduz-nos a uni incontornável vício da própria sentença - o da falta de especificação dos fundamentos de facto, isto é, insuficiente descriminação da matéria de facto não provada e ausência de exame crítico da prova produzida;
25. Tal especificação dos factos não provados (ou falta dela) é absolutamente inadmissível, por ser meramente tautológica e conclusiva. É que «a veracidade da operação / aquisição de mercadorias (vulgo sucata) à sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagem Lda., titulada pela factura n.° 282», ou a «veracidade do preço indicado nas facturas emitidas quer pela F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., quer pela N..., Lda e que titulam transacções destas com a Impugnante» - factos dados como não provados - não são verdadeiros factos, isto é, não o podem ser para efeitos da Sentença que deveria ter sido proferida no presente processo. Eles são metas conclusões, insusceptíveis de serem levadas ao probatório, porque encerram em si mesmas a própria sorte da lide;
26. Com efeito, o que está em causa averiguar no presente processo é, precisamente, saber se as mercadorias cuja compra à F... e à N...Lda foi declarada em 2002 pela recorrente foram efectivamente transaccionadas, e, portanto, se as facturas correspondentes têm ou não por subjacentes operações reais. Por isso, os factos que devem ser levados ao elenco dos factos provados e não provados são os factos concretos que podem ter influência no sentido a dar àquela questão.
27. Ora, sob pena de estarmos perante uma decisão da matéria de facto redundante e vazia de conteúdo, entre os factos provados e não provados não podem estar as conclusões que consubstanciam a própria decisão da causa;
28. Em segundo lugar, a especificação da matéria de facto não provada realizada pela Sentença recorrida é inadmissível por ser insuficiente - existe uma contradição ostensiva entre, por um lado, a complexidade e extensão da factualidade que foi carreada para o processo, designadamente pela ora recorrente (na petição inicial e alegações finais) e, por outro, o desleixo com que a Sentença a tratou;
29. A relevância de tais factos é óbvia - eles configuram um enquadramento necessário das características e funcionamento do sector das sucatas (pelo menos ao tempo em causa nos autos - o ano de 2002), relativamente ao tipo e dimensão das estruturas humanas e materiais de apoio à actividade, aos procedimentos de abordagem, negociação, contratação, transporte e pagamento, à documentação das transacções, às diferenças de estrutura e procedimentos existentes entre os operadores em patamares distintos de sofisticação e desenvolvimento, bem como dos procedimentos concretos e da forma como nesse quadro se enquadra a actividade da própria C... (que seguia as características típicas de actuação e negociação das suas congéneres);
30. É impossível não conceder que a consideração desses factos era relevante para a solução da lide, no sentido em que, conforme a recorrente sempre defendeu - e independentemente da decisão acerca da sua prova -, eles são susceptíveis dc demonstrar que as condições em que decorreram as operações de aquisição de fornecimentos com os fornecedores da recorrente em causa nos autos não implicam que não tenham sido efectivamente realizadas;
31. Se o Tribunal deu por integralmente provados os factos do Relatório, e se os tratou como «indícios» suficientes, então teria necessariamente de fazer constar do rol da matéria não provada os factos que a C... defendeu serem idóneos à demonstração do contrário, de que aquela natureza indiciária seria de afastar, explicando, com suficiente rigor, o porquê de os não ter considerado credíveis. Se o Tribunal achou que a matéria em causa não resultou provada, devia tê-lo dito claramente, assim como deveria ter desenvolvido circunstanciadamente as razões pelas quais ficou com essa convicção;
32. A falta de especificação dos fundamentos de facto é uma nulidade prevista na al. b) do n.° 1 do art.° 668.° do CPC, bem como no n.° 1 do art.° 125.° do mesmo CPC, sendo que para efeitos deste último a falta de descriminação da matéria de facto não provada é equiparada à falta de indicação da matéria de facto provada;
33. Finalmente, atenta a matéria de facto provada e não provada, tal como a recorrente a sustentou, é forçoso concluir que a mobilização do art.° 23.° por parte da Administração fiscal, e confirmada pelo Tribunal a quo, com vista a negar a dedutibilidade dos custos em causa, não só é inadequada como conduz a um resultado desproporcional e mesmo absurdo;
34. Isto é, a manterem-se as liquidações, a C... teria tido lucros efectivos impossíveis e inimagináveis. Não é concebível que uma empresa deste sector consiga obter margens deste calibre, sinal claro dos vícios de fundamentação e violação de lei indicados.

TERMOS EM QUE O PRESENTE RECURSO. DEVERÁ:
a. SER PROVIDO E, CONSEQUENTEMENTE ANULADA A SENTENÇA RECORRIDA E, CONCOMITANTEMENTE, OS ACTOS IMPUGNADOS TENDO EM CONTA OS ERROS DE FACTO E DE DIREITO INVOCADOS;
b. SER CONDENADO A FAZENDA PÚBLICA NO PAGAMENTO DAS CUSTAS JUDICIAIS AO CASO APLICÁVEIS, POR FORÇA DA ANULAÇÃO DO ACTO IMPUGNADO. “




A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.


Após a subida dos autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, a Exma Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.


Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos vem o processo à Conferência para julgamento.


Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela recorrente nas alegações de recurso e delimitadas pelas respectivas conclusões - artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nº s 3 e 4, actuais 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) - são as de saber (i) se a sentença incorreu em nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto: quer por insuficiente descriminação da matéria de facto não provada, ao recorrer a uma fórmula conclusiva; quer por evidenciar uma contradição e insuficiência ostensivas entre a complexidade e extensão da factualidade que foi carreada para o processo pela Recorrente (na p.i. e nas alegações finais) impondo que sobre os factos alegados o Tribunal se tivesse pronunciado, no sentido de os afastar, individualizando como não provados, através de um juízo de valor ou desvalor que lhe atribui, no momento da seleção dos factos enquanto resultado do julgamento da matéria de facto provada e não provada; quer por falta de apreciação crítica da prova (ii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto; (ii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que os indícios recolhidos pela administração tributária foram suficientes para concluir pela simulação das operações tituladas pelos identificados fornecedores e ao entender que a agora Recorrente não cumpriu o seu ónus da prova de que as facturas emitidas por esses fornecedores corresponderam à efectiva prestação de serviços. E ainda se o artº 23º, nº 1 do CIRC não tem aplicação ao caso, pois a desconsideração tão só dos custos, viola por si só o princípio da tributação pelo lucro real.

II. Fundamentação

II.1. De Facto

No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos:

Factos provados

Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:
a) A Impugnante exerce a actividade de Reciclagem de Sucata e de desperdícios metálicos, CAE 037100, (cfr. Relatório de Inspecção Tributária, a fls. 87 a 119 do PA apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
b) No cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200505264, os Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto desencadearam um procedimento inspectivo à aqui Impugnante, com âmbito parcial, visando o exercício de 2002, tendo em resultado sido efectuado correcções meramente aritméticas à matéria tributável no âmbito de IRC (cfr. Relatório de Inspecção Tributária, a fls. 87 a 119 do PA apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
c) Do Relatório de Inspecção Tributária, junto aos autos, que se dá aqui por reproduzido e que parcialmente se transcreve, consta a seguinte fundamentação de facto e de direito: “ (…)
1. Conclusões da acção inspectiva
Da inspecção efectuada, verificaram-se as seguintes correcções:
i) Para efeitos de imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC).
Correcções aritméticas no valor de €3.638.070,52 , ao lucro tributável declarado no ano de 2002.(…)
2. Objectivos, âmbito e extensão da acção de inspecção
A acção de inspectiva ao sujeito passivo C…, S.A. contribuinte nº 5…, com sede na Travessa…- freguesia de Pedroso , área do 3º Serviço de finanças de Vila Nova de Gaia , ao exercício de 2002, foi credenciada pela Ordem de serviço nº OI200505264 de âmbito parcial para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas
3. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável
3.1 Descrição da actividade exercida
O sujeito passivo C... ,S.A.( doravante designado por C...) exerce, como actividade principal, a actividade de “Reciclagem de sucata e de desperdícios metálicos”, sendo que, no ano de 2002, 86% das vendas de mercadorias foram declaradas para a empresa – Siderurgia... Empresa de Produtos Longos, S.A.
3.2 As compras
Ao longo dos procedimentos inspectivos foi-nos informado pela entidade inspeccionada que, no que diz respeito á recepção das mercadorias por si adquiridas, mais precisamente sucatas, poderia ocorrer uma das três situações:
1. Desde logo, a mais óbvia, que seria a entrega pelos fornecedores das mercadorias nas suas instalações;
2. A recepção poderia também verificar-se noutras instalações que não as da entidade inspeccionada (as do fornecedor envolvido ou de um terceiro);
3. Poderia ainda acontecer que não se verificasse a entrega física das mercadorias (do fornecedor ao adquirente), mas antes a entrega a uma entidade indicada pela sociedade C... , concretamente a Siderurgia....
Através de notificação foi solicitada à entidade inspeccionada que esclarecesse vários aspectos relacionados com estas aquisições de mercadorias (sucatas) efectuadas no ano de 2002, nomeadamente os procedimentos adoptados e os documentos gerados em consequência da realização de tais operações . Foram, assim colocadas, entre outras as seguintes questões:
Pergunta 1
No caso das mercadorias recepcionadas nas instalações dos fornecedores ou nas instalações de terceiros indicados pelos fornecedores:
- Se o transporte das mercadorias origina a emissão do correspondente documento de transporte (indicar se para este tipo de situações á utilizada uma série específica e exclusiva de guias de transporte).
Resposta 1 (citação)
1. O fornecedor emite a guia de remessa, guia de transporte ou guia de trânsito com a indicação da data de carga, local da carga, descrição da carga e indicação da matrícula do n/camião.
2. Se a empresa tiver balança indica directamente na sua guia o peso e a n/ empresa faz a repesagem à chegada às suas instaladores para confirmação da quantidade indicada pelo fornecedor.
3. Senão possuir balança a pesagem é feita nas n( instalações).
Pergunta 2
No caso das mercadorias recepcionadas nas instalações da sociedade C...;
1. Se a entrega das mercadorias se fez acompanhar da entrega do documento de transporte (guia de transporte emitida pelo fornecedor e eventualmente, guia emitida pelo transportador).
2. Se a recepção das mercadorias origina, de imediato ou em momento próximo, a pesagem das mesmas e, em caso afirmativo, se é emitido um documento de pesagem (indicar ainda na hipótese de haver emissão do referido documento de pesagem (indicar na hipótese de haver emissão do referido documento, se o mesmo é objecto de arquivo e se no presente momento está disponível para consulta).
3. Se a recepção das mercadorias origina a emissão de um documento de entrada em armazém (indicar ainda na hipótese de haver emissão do referido documento , se o mesmo é objecto de arquivo e se no presente momento está disponível para consulta).
Resposta 2 (citação):
1. O fornecedor faz acompanhar a mercadoria da sua própria guia de transporte.
2. Procede-se seguidamente à verificação física do material e à sua pesagem.
3. A mercadoria é descarregada, depois, no n/ parque.
4. É emitido um ticket de pesagem e uma guia de recepção em duplicado, um para o fornecedor, e outro para n/ serviços.
5. O fornecedor emite a factura /vendas a dinheiro.
6. O ticket que lhe foi dado na data da descarga serve de prova de entrega da mercadoria nas n/ instalações.
7. Para a n/ empresa o ticket é um documento fundamental para o pagamento.
8. Após conferência e validação pelos n/ serviços administrativos procede-se ao pagamento da factura /venda a dinheiro.
9. Depois de paga a factura era prática normal destruir os tickets de pesagem e guia de recepção e assim dar como concluída a função dos tickets e respectiva guia de recepção para evitar erros /abusos, passando a factura/V.Dinheiro a suportar o montante físico da aquisição.
Pergunta 3
No caso das mercadorias entregues pelos fornecedores à Siderurgia... por conta da C...:
1. Indicar quais os documentos gerados pelos intervenientes em tais entregas (Siderurgia..., notificada e fornecedores), identificando o momento da emissão, assim como os respectivos emitentes.
2. Relativamente às guias de remessa emitidas pela notificada que titulam as entregas dos fornecedores, indicar o momento em que tais guias são disponibilizadas aos fornecedores e o fim a que se destinam (como efectivo documento de transporte ou documento identificativo da entidade por conta de quem são entregues as mercadorias ). Na hipótese de uma distribuição prévia e em bloco de tais guias, indicar se é feito um registo de controlo da distribuição e da utilização dessas mesmas guias e, em caso afirmativo, se tal registo está disponível para consulta.
Resposta 3 (citação):
1. Após prévia negociação de preços é facultado um n/livro de guias de remessa, numerado tipograficamente, a cada FSN (Fornecedor da Siderurgia... por conta de C...) que por sua vez servia para acesso e descarga na fábrica da Maia da Siderurgia...(SN) .
2. O controlo da distribuição e utilização das guias é feito por série a cada fornecedor FSN.
3. A SN ao recepcionar a mercadoria emite um ticket de balança informatizado que serve de comprovativo da entrega da mercadoria por parte do fornecedor C....
4. Após entrega na SN as guias são arquivadas na C... por mês e qualidade e podem ser consultadas.
5. Os tickets de pesagem da SN, dado tratar-se de um cliente e os mesmos suportarem a factura de venda (SN), estão junto dos respectivos processos (guias de remessa /ticket de pesagem e talão de controlo de qualidade) permitindo assim a sua consulta.
Pergunta 4
Indicar osprocedimento utilizados na conferência das mercadorias facturadas com os documentos emitidos aquando das entregas (facturas versus guias de remessa e talões de entrada e pesagem).
Resposta 4 (citação):
1. Mensalmente a SN emite um mapa resumo das entregas feitas por C..., directamente e através de FSN.
2. O mapa resumo é conferido na C... e serve de base à emissão da factura mensal à SN.
Pergunta 5
Identificação das séries de guias de remessa utilizadas pela sociedade C..., S.A. no exercício de 2002 (a identificação deverá ser feita através da indicação do tipo de guia – impresso tipograficamente ou por computador-numeração atribuída e afectação de cada série.
Resposta 5 (citação):
A empresa utilizou e continua a utilizar 2 séries de guias de remessa, uma série Tipográfica (para fornecedores FSN) e outra Informatizada (para fornecedores C...)
Num momento posterior àquele em que foram recolhidas as respostas atrás citadas, a entidade inspeccionada fez entrega de um aditamento aos esclarecimentos que antes havia prestado. Informou assim, que, passa-se a citar:” Em aditamento aos esclarecimentos já prestados em 06.04.2006, somos a informar que relativamente às guias de remessa dos fornecedores, uma vez que já ultrapassou o prazo da obrigatoriedade de arquivo das mesmas, os nossos serviços para aliviarem e consequentemente melhorar o manuseamento das pastas retiraram as guias de remessa que estavam juntas às respectivas facturas.
3.2.2. Procedimentos relativos aos fornecedores N... e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda.
Pergunta 1
Relativamente aos fornecedores N... Limitada e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens Limitada, indicar se foram adoptados os procedimentos comuns á generalidade dos fornecedores ou, se foram adoptados procedimentos específicos. Verificando-se esta última hipótese, solicita-se a indicação desses mesmos procedimentos.
Resposta 1 (citação):
Os procedimentos são exactamente os mesmos praticados em relação a qualquer outro fornecedor.
Pergunta 2
Relativamente às aquisições de mercadorias (…) entregues directamente por estas empresas na Siderurgia..., identificar os documentos que titularam tais entregas (guias de entrada e guias de remessa). Para a identificação atrás solicitada poderá a notificada fazer uso da listagem que se anexa à presente notificação (Nota: listagem elaborada tendo por base as guias de entrada e as guias de remessa mantidas em arquivo).
Resposta 2 (citação):
Temos uma listagem extra contabilística que pode ser consultada. De acordo com os n/ registos há uma diferença de 3.462,23 toneladas entre a v/ listagem (55.303,660kgs) e a nossa (58.765,890kgs).
Pergunta 3
Relativamente às aquisições de mercadorias (…) recepcionadas nas instalações da sociedade C..., S.A., indicar se foi elaborado um registo, ainda que extra – contabilístico, de tais entradas. Em caso afirmativo, indicar se tal registo é mantido em arquivo e se está disponível para consulta.
Resposta 3 (citação):
À data era elaborada uma listagem diária de todos os fornecimentos com base nos tickets de balança que não eram numerados (...). Juntamos listagem em anexo dos fornecedores acima mencionados e ainda a titulo exemplificativo de outros fornecedores como J... ,Lda e Manufaturas... .
3.2.3. Obrigações contabilísticas relevantes
O sujeito passivo não deu cumprimento ao disposto no Decreto Lei nº 44/90, de 12 de Fevereiro , que obriga à adopção do sistema de inventário permanente.
3.2.4.Conclusão
Analisados os procedimentos implementados pela C... nas relações que mantém com os seus fornecedores e com o principal cliente (Siderurgia...) verifica-se, no que diz respeito às compras e subsequente venda que:
i) Nem na C... nem na Siderurgia... existem documentos em arquivo que estabeleçam uma relação inequívoca entre uma determinada entrega e o respectivo fornecedor, isto porque:
i.i) No que diz respeito às entregas na Siderurgia... por conta da C..., por um lado , tais entregas são feitas a coberto de guias de remessa desta última empresa que , evidentemente , não se tratam dos documentos relativos ao transporte das mercadorias, e por outro lado , os documentos de transporte emitidos por aqueles que realizam as entregas não são arquivados pela Siderurgia...;
i.ii)No que concerne à C..., porque esta empresa afirma ter destruído todos os documentos gerados a propósito da recepção de mercadorias ( documentos de transporte , talões de pesagem e guias de recepção), apesar dessa destruição não ter sido geral , uma vez que tivemos ocasião de constatar a existência de alguns documentos de transporte , alguns talões de pesagem e algumas guias de recepção;
i.iii) Para a impossibilidade atrás referida ( estabelecimento de uma relação documental inequívoca entre uma determinada entrega e o respectivo fornecedor) também concorre a inexistência ou a indisponibilidade (o esclarecimento da C... é omisso quanto a esse aspecto) de um registo da atribuição das guias de remessa aos fornecedores que fazem entregas directamente na Siderurgia....
ii) A não implementação do Inventário Permanente impede uma análise temporal , nos aspectos quantitativos e qualitativos das mercadorias transaccionadas.
Dos procedimentos adoptados pela C... bem como do seu principal cliente (Siderurgia...), aliados ao incumprimento no que respeita à ao Inventário Permanente por parte da C... resulta um substancial empobrecimento do circuito documental disponível para consulta e consequente avaliação e confronto com as grandezas declaradas pela entidade inspeccionada.
3.2.5. Fornecimento das empresas N..., Lda e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda.
3.2.5.1. Compras contabilizadas
No exercício de 2002 foram contabilizados os seguintes valores de compras de mercadorias (sucatas) às empresas N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens Lda. (doravante designadas por N..., Lda. e F... , Lda.)
- imagem omissa -
O valor destas compras representaram cerca de 27% do valor total das compras.
3.2.5.2. Insuficiências documentais
i) Apesar dos bens transmitidos incluírem diferentes categorias de sucata, com valores e apresentações distintas, as facturas não as identificam, designando-as apenas pelos termos genéricos de «sucata» e «sucata diversa»:
i.1) No que diz respeito às facturas emitidas pela empresa F..., Lda. das 24.806,53 toneladas facturadas, 23.206,32 foram transmitidas com a nominação de «sucata diversa» e, para estes bens transmitidos, ocorreram 34 preços unitários deferentes, praticados entre o valor de 49,88 e €112,23.
I.2) Das 58.934,47 toneladas facturadas pela empresa N…, Lda. verificou-se que 52.185,05 foram transmitidas com a designação de «sucata diversa», e para estes bens transmitidos ocorreram 36 preços unitários diferentes, variando entre o valor de €10,12 e €109,00.
ii) Consultados os documentos mantidos em arquivo pela C..., verificou-se que se encontravam agrafadas guias de remessa a algumas facturas, tendo como elemento comum a data.
ii.1) Comparadas as quantidades mencionadas nas guias de remessa com aquelas que são indicadas nas facturas que lhes estão associadas , verificou-se que em alguns casos as quantidades não eram coincidentes.
ii.2) Tendo sido contabilizada a compra de 83.741.000 Kg de sucata, verificou-se que apenas 9,4% dessas compras estavam suportadas com Guias de Remessa, conforme quadro resumo a seguir indicado.
- imagem omissa -
Tendo as compras atrás indicadas sido entregues em locais distintos (Siderurgia... e instalações da C...), verificou-se que:
a) Dos 58.765.890 Kgs entregues directamente à Siderurgia..., pelas empresas N…., Lda. e F..., Lda. conforme indicação da C..., apenas 5,6% estavam documentados com Guias de Remessa;
b) Dos 24.975.110 Kgs entregues nas instalações da C... em Pedroso, pelas empresas N..., Lda e F..., Lda., apenas 18% estavam documentados com Guias de Remessa;
ii.3) Inquirida a C... a propósito da razão de ser deste tipo de arquivo parcial das guias de remessa , esta fez entrega do aditamento atrás mencionado onde se limita a indicar uma razão genérica para a inexistência de alguns documentos , não explicando portanto a razão do arquivo parcial.
ii.4) Analisadas as quantidades indicadas nas guias de remessa , verificou-se existirem guias de remessa com quantidades superiores a 190 toneladas , que não poderiam ser transportadas por uma viatura , conforme resumo das guias de remessa no quadro seguinte
- imagem omissa -
ii.5) Através da listagem de registo das entradas de mercadorias , elaborada pelo sujeito passivo , conforme indicação no ponto nº 3.2.2, verificou-se que às compras de mercadorias corresponderam 3.113 entregas .
Da análise das guias de remessa emitidas pela empresa F..., Lda. constatou-se que foi utilizada uma única série de guias de remessa com numeração compreendida entre o nºs e o nº1000, e desta série foram emitidas as seguintes guias de remessa para a C...:
a) No ano de 2001 a última guia de remessa emitida, correspondeu ao nº85 datada de 22-11-2001.
b) No ano de 2002 a primeira guia de remessa emitida, correspondeu ao nº93 emitida em 25-11-2002, e a última ao nº 300 datada de 23-12-2002.
Através das guias de remessa emitidas pela empresa N..., Lda, verificou-se, que foi utilizada uma única série de guias de remessa, com numeração compreendida em o nº 9301 e o nº 14.300, e desta série, foram emitidas as seguintes guias de remessa para a C....
c)No ano de 2001 a última guia de remessa emitida, correspondeu ao nº 9473, datada de 26-11-2001.
No ano de 2001 a primeira guia de remessa emitida correspondeu ao nº 9485 emitida em 19-12-2002, e a última ao nº 11835 datada de 31-12-2002.
Analisada a articulação entre a numeração e as datas presentes nas guias de remessa, conclui-se que a empresa F..., Lda. utilizou 216 guias de remessa no período compreendido entre 22-11-2001 e 23-12-2002, e a empresa N... Lda. utilizou 2363 guias de remessa , no período de 26-11-2001 e 31-12-2002.
Da comparação do registo de entradas de mercadoria (3.113) com o nº de guias de remessa utilizadas pelas duas empresas (2579),verifica-se que o nº de entregas é superior ao nº de guias de remessa emitidas (534).
iii)Relativamente às entregas na Siderurgia... pelas empresas N... , Lda e F..., Lda. por conta do sujeito passivo em análise, verificou-se que naquela empresa não são arquivados documentos de transporte ou entrega de mercadorias , em nome das empresas N..., Lda. e F... Lda., ou de empresas transportadoras por sua conta, sendo, arquivadas como documento de entrega das mercadorias, guias de remessa emitidas pela empresa C..., que de acordo com esta terão sido distribuídas previamente e em bloco a estes fornecedores.
A estes propósito recorda-se que foi pedido à C..., que na hipótese da distribuição atrás descrita, indicasse se foi elaborado um registo de controlo da distribuição e da utilização dessa guias e, em caso afirmativo, se tal registo estava disponível para consulta. Estas questões não mereceram resposta por parte da inquirida.
3.2.5.3.Pagamentos
Através da autorização concedida pela C..., solicitou-se aos bancos intervenientes nos pagamentos efectuados às empresas N..., Lda. e F..., Lda. cópia de todos os cheques emitidos.
Analisadas as cópias dos cheques remetidas pelas Instituições Bancárias, verificaram-se as situações seguintes.
a)Os cheques, na sua grande maioria, foram emitidos ao portador,
b) Frequentemente foram emitidos vários cheques com a mesma data, para pagamento de uma factura;
c) Cheques depositados em contas bancárias particulares dos gerentes das empresas, N..., Lda. e F..., Lda;
d) Cheques levantados em dinheiro pelos gerentes das empresas: N..., Lda e F..., Lda.;
e)Cheques movimentados (levantados em dinheiro ou depositados em contas bancárias particulares, conforme indicação no verso dos cheques) por empregados, e pessoas que desempenham funções no órgão de administração da C...;
f) Excepcionalmente, verificaram-se casos de cheques depositados em contas bancárias abertas em nome dos fornecedores, ou seja , as empresas N... Lda. e F..., Lda..
3.2.5.4. Compras tituladas pela factura nº 282 da empresa F..., Lda.
3.2.5.4.1. Situação verificada
No dia 17 de Janeiro de 2002 foi registado na contabilidade da C... a factura nº282 emitida pela empresa F... , Lda. referente à compra de 2.853 toneladas de “sucata diversa” ao preço unitário de € 89,65 o que perfez o valor de €255.771,45 originando a dedução de IVA pela C... no montante de €43.481,15.
A propósito desta factura, a C... fez entrega de um documento extra contabilístico que titulou por “ mapa de conferência da factura nº282, no qual se indicam as entregas (através das respectivas datas e quantidades ), bem como os pagamentos. De acordo com este mapa as entregas ter-se-ão verificado entre a data da factura e o dia 15 de Outubro de 2002.
Apesar, de acordo com o respectivo título, se tratar de um mapa de conferência, o documento é omisso quanto à identificação dos documentos que terão acompanhado as mercadorias, bem como, no que respeita aos documentos emitidos aquando da entrada das mercadorias na C....
Através das cópias dos cheques facultadas pela C... (conforme indicação no ponto anterior), verificou-se, que para pagamento da factura nº 282, foram emitidos 16 cheques ao portador , tendo-se verificado as seguintes situações :
a)Catorze (13) cheques, no valor de € 245.100, movimentados (levantados em dinheiro ou depositados em contas bancárias particulares, conforme indicação no verso dos cheques) por empregados da C...;
b) Um (1) cheque no valor de €20.000, movimentado (levantado em dinheiro ou depositado em conta bancária particular, conforme indicação no verso do cheque) por pessoa que desempenha funções no órgão de administração da C...;
c) Um (1) cheque (emitido no dia 17 de Janeiro de 2002) no valor de €14.963,94 que foi depositado em conta aberta em nome de Manuel N... (gerente da empresa N... , Lda. e F..., Lda.) sendo de salientar, que neste mesmo dia foi depositado numa conta bancária aberta em nome de um dos membros do conselho de administração da C..., de um cheque no valor de € 15,000 sacado sobre conta bancária aberta em nome de Manuel N... .
d) Um (1) cheque no valor de 29.927,87 que foi depositado em conta aberta em nome da empresa N... , Lda.
Para além destes cheques foi feito um pagamento em numerário no valor de €9.260,79.
3.2.5.4.2. Esclarecimentos da C...
A propósito dos fornecimentos titulados pela factura nº282, datada de 17/01/2002, foi solicitado à C... que esclarecesse o acordo comercial subjacente à emissão dessa mesma factura, nomeadamente:
1. A razão da emissão da factura anteceder a entrega das mercadorias, antecipação essa que, para a maior parte das entregas, foi de vários meses;
2. O calendário de entregas e de pagamentos acordados;
3. Se a notificada participou ou colaborou na antecipação ou na facilitação do pagamento dos cheques emitidos (em caso afirmativo deverá a notificada indicar os procedimentos adoptados com o intuito de antecipar ou facilitar o pagamento);
4. Se algum dos pagamentos efectuados foi anulado ou diminuído o respectivo valor, em consequência de pagamentos efectuados pelo emitente da factura decorrentes de acertos de conta eventualmente pendentes.
A este propósito a C... informou que, passa-se a citar:
“ No que se refere à factura nº282, de Janeiro de 2002 (17/01/2002), a mesma corresponde efectivamente a um conjunto de fornecimentos encomendados (e cumpridos) à sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. ( F...) , ao longo do decurso do ano em causa de 2002.
Com efeito, cumpre também informar que o procedimento adoptado no âmbito dos referidos fornecimentos –titulados, portanto, pela factura em apreço – seguiu os seguintes trâmites e procedimentos , a solicitação do fornecedor:
a)No início do ano de 2002, o Sr Manuel N..., dirigiu-se à C…, expondo-se abertamente sobre dificuldades pontuais de natureza financeira que a F... atravessava. Alegou, então, que “estava com dificuldades de tesouraria e que tinha compromissos financeiros urgentes que não podia deixar de solver” e que face às dificuldades que enfrentava para crédito na Banca solicitava “um adiantamento por conta de fornecimentos a efectuar durante o ano de 2002”.
b) A C…, face ao pedido e atendendo a que a F... era já um fornecedor com uma relação comercial de mais de 25 anos e com um volume de negócios com a empresa (e respectivo Grupo Comercial) extremamente relevante (com uma média anual superior a €8.000.000) entendeu abrir uma excepção fixando, no entanto, condições precisas:
- A F... teria que assumir o compromisso formal de incrementar os seus fornecimentos em cerca de 3.000 toneladas de sucata a um preço previamente fixado (89,65€/tonelada);
-A F... emitiria imediatamente uma factura de 2.853 toneladas (factura global) cuja sucata deveria ser integralmente entregue num prazo relativamente curto (4 meses);
- Contra a emissão da factura seriam imediatamente emitidos pela C… dois cheques no valor total de €44.891,81 (correspondentes à entrega dos primeiros 427.990 kgs).
c) Os fornecimentos foram efectuados durante um período maior do que o previsto (tendo-se estendido até Outubro de 2002) com a seguinte distribuição, devidamente controlada por ambas as partes.
1. Em Janeiro foram entregues 427.000 kgs;
2. Em Março, 383.410 Kgs;
3. Em Abril, 222.700 Kgs;
4. Em Maio, 467.150 Kgs;
5. Em Junho, 156.600 Kgs;
6. Em Julho, 383.410 kgs;
7. Em Setembro, 383.410 kgs;
8. E em Outubro a quantidade remanescente de 190.680 Kgs;
d) Do cumprimento deste acordo, consultados os registos e os serviços da C... , constata-se que:
- A F... procedeu à entrega total de sucata até integral cobertura da factura emitida a 17 de Janeiro de 2002;
- Os fornecimentos a que se refere a factura em causa foram exclusivamente entregues nas instalações da C..., como havia sido acordado.
- Ao longo do cumprimento do acordo de fornecimento, no final de cada mês, a C... procedeu sempre aos pagamentos devidos através de emissão dos respectivos cheques , cujo valor era igual à quantidade entregue nesse mês , multiplicada pelo preço fixado (89.65€ / tonelada ) e incluído o IVA à taxa em vigor;
- Todavia , a solicitação do fornecedor F... , os valores foram entregues em numerário - o que, para a C... não constituiu qualquer constrangimento uma vez que, consultado o seu Técnico Oficial de Contas , havendo a emissão originária de cheques ( para comprovar a venda a dinheiro) ;
-Assim estando emitidos os cheques, os mesmos eram levantados em dinheiro junto do Balcão da Agência da C..., por um funcionário da empresa, sendo posteriormente o dinheiro entregue em mão ao próprio fornecedor F....
Tratou-se de um procedimento – sublinhe-se mais uma vez – absolutamente excepcional que não obedeceu às regras usuais da empresa, e que foi consentido face às circunstâncias, também elas excepcionais, do fornecedor F..., com o seu histórico e peso comercial na C....
Finalmente, cumpre ainda registar que nunca ocorreu qualquer antecipação de pagamentos – o que aliás, jamais esteve previsto. Do mesmo modo, também não houve lugar a qualquer anulação, alteração ou compensação da factura – seja por acerto de contas seja a qualquer outro título.
3.2.5.4.3. Análise do esclarecimento recolhido
Afirma a C... que acordou com a empresa F..., Lda. o fornecimento de uma considerável quantidade de mercadorias com entregas que sucederiam ao longo de quatro meses. Registe-se desde logo que se trata de uma quantidade muito concreta, 2.853 toneladas (não “arredondada” portanto), a um preço também concreto, fixado ao limite do cêntimo. Um acordo em tais termos só faria sentido com o conhecimento exacto das mercadorias (qualidade e quantidade) por parte dos contratantes.
O esclarecimento é omisso no que respeita à razão que terá determinado uma quantificação prévia das mercadorias a transaccionar.
Recorda-se, que é prática do sector, que as pesagens das mercadorias sejam feitas com as mesmas carregadas nos veículos que as transportam. Assim sendo, a quantificação exacta das mercadorias acarretaria a carga e a descarga das mesmas, operação que a uma carga média de 30 toneladas, teria que ser realizada 95 vezes.
Para além dos inusitados termos do contrato, registe-se que os mesmos são contrários à razão que terá levado ao próprio acordo senão, veja-se:
a)Por um lado, a razão do acordo seriam as dificuldades financeiras do fornecedor;
b)Por outro lado, os termos do acordo só seriam implementáveis caso as mercadorias estivessem inequivocamente disponíveis (em stock ou a recolher junto de fonte segura);
c) Assim sendo, as aludidas dificuldades seriam sempre uma razão para antecipar as entregas e os consequentes pagamentos e não postecipar as entregas conforme se teria verificado;
Contrária também à razão do acordo è a sequência dos pagamentos efectuados. Afirma a C... que terá efectuado um primeiro pagamento contra a emissão de factura, pagamento esse que se teria efectivado através da entrega de dois cheques no valor total de €44.891, correspondentes á entrega dos primeiros 427.990 kgs. Para além de não ter sido apresentada uma razão para a emissão de dois cheques , no mesmo dia , sacados sobre a mesma conta , e entregues à mesma pessoa, para pagar algo que já era conhecido antes da emissão dos cheques , note-se que o valor que assim teria sido pago , aproxima-se muito do IVA liquidado na factura, montante que o fornecedor estava obrigado nos cofre do Estado , ou seja tal entrega na prática , não pagou os 427.990 kgs, mas sim o IVA mencionado na factura. Quer isto dizer que as aludidas dificuldades financeiras não foram minoradas, antes pelo contrário, o que se verificou foi o protelamento do recebimento.
Ainda no que diz respeito a este primeiro pagamento, e recordando, que de acordo com a C... ele teria sido feito contra a emissão da factura e para pagamento dos primeiros 427.990 kgs entregues, tenha-se em consideração que a entrega desta quantia só foi finalizada no dia 22 de Janeiro, de acordo com o já referido “mapa de conferência da factura nº 282” ou seja , cinco dias após a emissão da factura, dos cheques e do depósito destes. Foram assim emitidos os cheques por valões que na data da emissão eram desconhecidos.
Registe-se ainda a coincidência de conforme informou a C... “ Os fornecimentos a que se refere a Factura em causa foram exclusivamente entregues nas instalações da C... …”, ou seja, justamente no local onde o circuito documental disponível para consulta é o mais reduzido , ou melhor , inexistente por força da destruição de documentos realizada pela C... (recorda-se o esclarecimento prestado:”…pratica normal destruir os tickets de pesagem e guia de recepção …”).
Acresce ainda referir, no que diz respeito ao pagamento dos fornecimentos em questão, que os mesmos traduzem uma extrema colaboração por parte do adquirente, que de acordo com os esclarecimentos recolhidos, não se limitaria a emitir cheques que poderiam ser pagos junto do banqueiro sacado, mas iria mais além e disponibilizaria um funcionário qualificado, ou até mesmo um membro do Conselho de administração para se deslocar à instituição financeira , e aí recolher o numerário resultante , para depois o entregar ao fornecedor. A tudo acresce que esta colaboração desmesurada se restringiu ao pagamento do preço mencionado na factura nº 282, conforme esclareceu a C.... O que a C... não esclareceu, foi a razão que a levou a reservar a colaboração atrás aludida unicamente para os pagamentos desta factura, quando existiram outros fornecimentos das mesmas entidades e nas mesmas ocasiões.
3.2.5.5. Conclusão
Considerada a informação recolhida, conclui-se que as compras efectuadas às empresas N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. se caracterizaram:
i)Pelas insuficiências documentais verificadas, concretamente:
i.i) Designadamente das mercadorias transaccionadas (adopção de designações genéricas que na prática, impossibilitaram uma análise minimamente pormenorizada);O tratamento das guias de remessa ( a inexistência de uma razão para o arquivo parcial , a emissão de guias por quantidades insusceptíveis de corresponderem a transportes efectivos , a existência de indícios respeitantes à numeração das guias que levam à conclusão de que a uma parte das compras contabilizadas não correspondeu a emissão das correspondentes guias , a inexistência de arquivo de guias respeitantes aos transportes das mercadorias entregues à Siderurgia...);
ii) Pela adopção de formas de pagamento que, na maior parte dos casos , contrariam práticas comerciais generalizadamente adoptadas, além de , em alguns casos, tais formas serem destituídas de razões plausíveis para a respectiva ocorrência , o que diminuiu o valor de tais formas de pagamento enquanto comprovativas do efectivo pagamento a que se referem .
Para além das características gerais atrás elencadas, verificou-se relativamente às compras efectuadas à empresa F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. tituladas pela factura nº 282, a ocorrência de uma série de indícios que levam a concluir que tal factura não terá correspondido a uma efectiva transmissão de bens.
3.2.6. Os fornecedores : N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda.
3.2.6.1. Aspectos contabilísticos e fiscais.
Através das inspecções efectuadas aos sujeitos passivos: N…., Lda. e F... Lda. verificaram-se, entre outras , as seguintes situações consideradas relevantes para a análise das relações com a empresa –C...):
a)Cerca de 70% do suporte documental das compras (N... Lda-93% e F..., Lda.-35%) foi indiciado como fictício;
b) As vendas declaradas para a empresa C... , representam cerca de 53% das vendas totais (N..., Lda. – 60% e F..., Lda. - 40%);
c) Os recebimentos, das vendas declaradas ao sujeito passivo – C..., foram processados contabilisticamente, como tendo sido feitos a dinheiro.
3.2.6.2. Movimentos Financeiros.
Analisados os movimentos efectuados nas contas bancárias particulares dos sócios gerentes das empresas: N..., Lda. e F..., Lda., verificaram-se entre outras, as seguintes situações consideradas relevantes para a situação em análise:
a)Depósitos de cheques, que foram emitidos pela empresa C..., para pagamento de facturas de comprar de mercadorias às empresas: N..., Lda. e F..., Lda.;
b) Cheques emitidos ao portador pelos titulares das contas analisadas (gerentes das empresas N..., Lda. e F..., Lda. que totalizaram no ano de 2002 €3.382.299,07, representativos de 39% das vendas declaradas pelas empresas: N..., Lda. e F..., Lda. para a empresa C... , e que foram depositados em contas bancárias ( contas no Millenium BCP: nº 2..., nº 1..., nº 4...; contas no Banco…: nº 247200039011, nº0247200019245, conta nº1389641210001 do Banco…) abertas em nome de membros do Conselho de Administração da C... conforme resumo no quadro a seguir indicado e relação anexa ao presente documento.
(Quadro comparativo do valor das compras, com o valor dos cheques)

3.2.6.3. Esclarecimentos da C...
Atendendo a que a existência dos cheques atrás referidos bem como o depósito dos mesmos se revela contrária ao que seria expectável do relacionamento comercial entre a C... e os fornecedores em questão, foi solicitado, através de notificação à entidade inspeccionada que esclarecesse a razão de tal ocorrência.
Concretamente foi colocada a seguinte questão:
“Tendo em consideração:
1.O relacionamento comercial verificado nos anos de 2002 e2003 entre a notificada e as empresas N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda.;
2. A existência de um significativo número de cheques (na ordem das centenas), sacados sobre contas abertas em nome de Manuel N... (sócio-gerente das duas firmas atrás citadas) e de E…, (sócia – gerente da firma F... – Comércio e Reciclagens de Sucatas, Lda.),por valores que, na maior parte dos casos, ultrapassa e dezena de milhar de euros, cheques esses que, de acordo com as menções inscritas nos respectivos versos , foram depositados em contas abertas em nome de pessoas que desempenham funções de responsabilidade na empresa agora notificada.
Esclarecer: Se é do conhecimento da notificada, através do respectivo órgão de administração, a razão, ou razões, da emissão desse conjunto de cheques (em caso afirmativo solicita-se a indicação dessa mesma razão ou razões);
1. Na eventualidade da emissão dos cheques atrás referidos ter correspondido ao retorno de meios financeiros colocados à disposição dos gerentes das empresas atrás referidos, solicita-se que seja indicado se tal disponibilização se efectivou através da emissão de cheques ( em caso afirmativo solicita-se a indicação se as contas movimentadas estão , ou estavam abertas em nome da notificada ou em nome de terceiros.
A esta solicitação a C... informou que, passa-se a citar:
“ Analisados minuciosamente todos os registos, e respectivos detalhes, da C..., S.A.(doravante C...) bem como consultados todos os nossos serviços – tarefa esta que cuidamos de empreender com o máximo de rigor e eu , por esse facto , implicou um período de tempo adicional face ao inicialmente previsto - não foram identificados quaisquer cheques sacados sobre contas abertas em nome de Manuel N... e de E… a favor da C...”.
Tendo em consideração o verificado no que respeita ao comportamento contabilístico e fiscal dos fornecedores N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens Lda. , a existência dos movimentos financeiros atrás descritos e a abstenção da C... no que respeita à prestação de um esclarecimento relevante e plausível para a ocorrência dos aludidos movimentos financeiros, tudo isto conjugado ao que atrás se relatou no que tange: a procedimentos contabilísticos, insuficiências e incongruências documentais, bem como as formas de pagamento adoptadas, conclui-se que os montantes mencionados nos cheques emitidos pelos gerentes das sociedades N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., cheques estes sacados sobre contas particulares e depositados também em contas particulares mas estas abertas em nome de administradores da C..., correspondem a diminuição dos montantes mencionados das facturas emitidas pelas duas primeiras empresas e contabilizadas pela entidades inspeccionada.
3.3. Correcções propostas
Tendo em consideração o que aqui ficou expresso, nomeadamente as conclusões extraídas nos pontos 3.2.5.5. e 3.2.6.4., conclui-se que:
a)A compra titulada pela factura nº 282, datada de 17/1/02, não correspondeu a uma efectiva transmissão de bens;
b) O conjunto das restantes facturas emitidas pelas sociedades N..., Lda e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens , Lda. sobrevalorado, resultando essa sobrevalorização à diferença entre os valores mencionados nas facturas e os preços efectivamente acordados para as transmissões, diferença essa que se materializou nos cheques atrás mencionados.

Da conclusão antes extraída resulta:
c)Que os custos contabilizados com a aquisição de mercadorias foram sobreavaliados em €3.638.070,52 (valor dos cheques indicados no ponto 3.2.6.2. do presente documento - €3.382.299,07 e valor inscrito na factura nº 282- €255.771,45);
d) Foi deduzido IVA, mencionado com referência a montantes que não correspondem a efectivas transmissões de bens, no valor de € 674.045,91 (IVA correspondente à sobrevalorização das compras materializada nos cheques indicados no ponto 3.2.6.2 - €630.564,76 e IVA deduzido através da factura nº 282 - €43.481,15, conforme se resume os seguintes quadros.
i) Sobrevalorização da base tributável ( BT) / imposto dedutível (IVA)

ii) Factura nº282
Período de imposto : Janeiro de 2002
Base tributável: € 255.771,45
Imposto deduzido: € 43.481,15
iii) Quadro resumo

d) Foi assim violado o disposto no artigo 23º do CIRC e no artigo 19º CIVA.(…)”
( cfr fls. a 119 do PA apenso aos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
d) Foi junto aos autos, um documento capeado por folha que o intitula manuscritamente de “MAPA DE EMPRÉSTIMOS E REEMBOLSOS DE CHEQUES DO SENHOR MANUEL N...“ (cf. fls. 173 a 181 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
e) Foram juntas aos autos cópias de cheques emitidos ao portador e sacados sobre a conta nº 00111790852 do Banco..., de que é titular “ C... F S.A., alguns dos quais apresentam-se assinados no respectivo verso por V… e aposta outra assinatura ilegível acompanhada de um número correspondente a uma conta bancária (cf. fls. 145 a 172 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
f) O cheque nº7521506648, no valor de 20.000,00 euros, sacado sobre a conta nº00111790852 do Banco..., de que é titular “ C... S.A.”, foi levantado por um dos titulares da conta nº 164362 na qual figura como primeiro titular “C...”, “denominado conhecido do banqueiro” na praxis bancária ( cf. fls. 145 e 146 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais e depoimento da testemunha Luís…);
g) Foram juntas aos autos cópias de cheques sacados sobre a conta nº 00168898826 do Banco..., na qual figura como primeiro titular “ António…, emitidos à ordem de Manuel N..., N..., F... e extractos combinados da referida conta (cfr. fls.188 a 191, 198 e 199, 291 a 293 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
h) Foram juntas aos autos cópias de cheque sacados sobre conta nº 00100002164362 do Banco..., na qual figura como primeiro titular “C... , emitido à ordem de E…, Manuel N..., N... (cfr. fls.181, 281 e 282, 294 a 303 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
i) Foram juntas aos autos cópias de cheques sacados sobre conta nº 00100002164362 do Banco..., na qual figura como primeiro titular “ C... , emitidos ao portador, alguns dos quais apresentam-se assinados no respectivo verso E…, Manuel N..., Paulo Manuel N... (cfr. fls.205 a 290, 304 a 374, 378 a 381 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
j) Foi junta aos autos cópia de um cheque sacado sobre a conta nº 00200019245 do Banco..., na qual figura como primeiro titular “António…”, emitido ao portador e que se apresenta assinado no respectivo verso por E… e extracto combinado da referida conta (cf. fls. 293 e 375 e 376 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
k) Foi junta aos autos cópia o Relatório e Parecer do Fiscal Único da Impugnante relativo ao exercício de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais ( cfr fls 403 a 406 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
l) Foram juntos aos autos dois documentos subscritos por Manuel N..., datados respectivamente de 11.05.2006 e 04.08.2006, acompanhados de um anexo, sob o título “DECLARAÇÃO”, com o seguinte teor: ». Eu , Manuel N... , declaro , sob o compromisso de honra: a) enquanto gerente das empresas N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens , Lda. (contribuinte nº 5…), confirmo que essas duas empresas foram fornecedoras significativas da C... , s.A.(contribuinte nº 5…) , desde há mais de 25 anos – e eram-no em concreto, por valores volumosos em 2002 e anos seguintes, por venda de material de sucata, ou entregue nos seus armazéns, ou entregue directamente nos clientes da C..., S.A. , em concreto na Siderurgia... ( por acordo com a C..., S.A.).b) Por interesse da F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. confirmo em relação à factura 282, datada de 17/01/02, emitida por esta empresa à C..., S.A., o seguintes:
· A meu pedido – que mereceu aceitação por parte da C.... S.A.- essa factura corresponde ao valor total das vendas anuais projectadas – em face do histórico passado – que seriam entregues no armazém da C..., S.A.;
· A factura foi passada contra a entrega da primeira quantia de material e contra o pagamento de parte do preço;
· Nos termos do combinado, se os valores das vendas fossem inferiores ao projectado, far-se-ia um acerto no final do ano , e se fossem superiores ( como o foram ) , o acréscimo cosntaria de novas facturas de vendas de produtos;
· O cliente C..., S.A., bem como a F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., tinham um adequado sistema de controlo de mercadorias entregues que o foram sendo por conta dessa factura, bem como dos correspondentes pagamentos associados a essa factura. Foi isso que ficou acordado entre ambas as partes para evitas quaisquer conflitos ou litígios – que não existiam tendo-se passado tudo na maior normalidade.
· Por meu pedido expresso, todos os pagamentos associados a essa factura ( excepto a tranche inicial no valor de 44.891,81€) foram realizados em dinheiro , recebido por várias vezes, durante o ano de 2002, nas instalações da C..., S.A., ou por mim ou pela minha filha E…– tendo sido entregues ou pelo Sr. António…, ou pela funcionária da C..., S.A., Dra. Elsa…, contra documento que atestava a respectiva quitação.(…) a) Os cheques identificados no Anexo A correspondem a cheques, por mim assinados relativos a contas bancárias da minha esfera, cujos números de conta constam daquele Anexo A; b) estes cheques destinavam-se a pagar, respectivamente, empréstimos nos mesmos montantes, que me foram reiteradamente concedidos pelos responsáveis da sociedade C..., S.A. (C...);c)Na origem dos empréstimos que me foram concedidos pelos responsáveis da C... estão por um lado , as carências de tesouraria que afectaram as sociedades por mim geridas ( a N... , Lda e a F..., Lda.), e por outro lado, a profunda relação de clientela e amizade que me une àqueles responsáveis da C... ( e que teve –e tem origem em mais de 30 anos de relações comerciais permanentes):d) Com efeito , no ano de 2002, as sociedades N..., Lda. e a F..., Lda. atravessavam extremas dificuldades de tesouraria – que persistiram reiteradamente ao longo de todo esse ano. e) Uma das soluções que equacionei para fazer face àquelas persistentes carências de tesouraria foi a de recorrer às pessoas com quem mantinha relações antigas de confiança e amizade. f) Assim , foi nesse contexto que me dirigi aos responsáveis da C... e lhes solicitei que , a título pessoal , me emprestassem uma quantia, entre os €10.000,00 e os € 30.000, prometendo eu, como imediata contrapartida , pagar através de cheque ( ou, por vezes , mais do que um cheque ) pré datado no mesmo montante; Por força da persistência das carências de tesouraria da N... , Lda. e a F..., Lda., a verdade é que , reiteradamente , ao longo do ano de 2002 fui forçado a recorrer a esta solução dos empréstimos. h)E assim, foi-se repetindo sempre o mesmo procedimento: em troca dos empréstimos dos responsáveis da C... (sempre a título pessoal) estes eram pagos imediatamente através de cheques pré datados no mesmo montante ( com uma dilação temporal média não superior a 10 dias) – em verdade, o anexo A ( relativo aos cheques por mim assinados ) e o anexo B ( relativo aos empréstimos que me foram sendo concedidos ) reportam bem esta realidade: i) Excepcionalmente, aqueles empréstimos dos responsáveis da C... foram efectuados através de numerário – o que não terá ocorrido mais do que 3 ou 4 vezes.j) Os sucessivos empréstimos (e devoluções) foram sendo solicitados (e prestados ) havendo todavia, a preocupação de que o montante efectivo em dívida nunca excedesse aproximadamente €30.000(na confrontação entre os sucessivos empréstimos concedidos e os pagamentos efectuados);k) Em suma, maugrado as persistente dificuldades de tesouraria que a N... , Lda. e a F..., Lda. atravessaram, estas foram sendo atenuadas por força da “solidariedade”dos responsáveis da C... , nos termos supra descritos , a quem , manifesto , desde já e para sempre , o meu mais profundo agradecimento e reconhecimento . l) mais confirmo que este procedimento não se esgotou no ano de 2002, mas que se manteve nos anos posteriores.” ( cf. fls 407 a 414 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
m) A Impugnante procedeu ao pagamento à Administração Tributária do montante correspondente ao da liquidação impugnada (cfr. fls.85 e 96 dos presentes autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
n) Em 13.11.2006, inconformada com a liquidação adicional de IRC, a Impugnante apresentou a Impugnação Judicial em apreço (cfr. carimbo de recebimento aposto no rosto da petição inicial a fls. 2 dos presentes autos).

Factos não provados

Não se mostram provados outros factos, além dos supra referidos, concretamente:

a) não resultou provada nos autos a veracidade da operação/aquisição de mercadorias (vulgo sucata) às sociedades F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., titulada pela factura Nº282, identificada no Relatório da Inspecção Tributária e que está na génese da liquidação adicional de IRC, relativo ao exercício de 2002 e respectivos juros compensatórios, posta em crise nos presentes autos;
b ) Não resultou provado nos autos a veracidade do preço indicado nas facturas emitidas quer pela F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., quer pela N..., Lda. e que titulam transacções destas com a Impugnante;
c) Não resultaram provados os alegados mútuos (vulgo empréstimos) efectuados a título pessoal, em benefício do Senhor N... (sócio comum das sociedade N..., Lda. e F..., Lda.), pelos Administradores da Impugnante.

As demais asserções da douta petição constituem meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou direito da Impugnante.

Motivação da decisão de facto

A convicção do Tribunal encontra-se sedimentada na apreciação crítica e conjugada da prova documental junta aos autos pela Administração Fiscal e pela Impugnante à luz das regras da experiência.
A matéria de facto não provada resultou da total ausência de prova produzida para o efeito, não tendo a Impugnante logrado comprovar o invocado, concretamente, a materialidade da transacção titulada pela factura nº282, desconsiderada pela Administração Tributária, bem como a inexistência de sobre valoração das demais facturas relativas às transacções realizadas com as sociedades N..., Lda. e F..., Lda.
No que concerne à prova testemunhal produzida, atento o teor do depoimento prestado, na qualidade de parte, por António…, Administrador da Impetrante, cumpre realçar que o mesmo fez a descrição do “modus operandi” da Impugnante no seu relacionamento com os respectivos fornecedores, bem como, com a Siderurgia..., tendo descrito o circunstancialismo que subjaz à emissão da factura nº282, que reafirmou ter na respectiva origem o relacionamento pessoal e comercial dos sócios e Administradores da Impugnante com o Sr. N... e a necessidade de lhe prestar auxilio, como “amigo e parceiro comercial importante”, num momento em que este ultrapassava dificuldades financeiras.
Relativamente à “sobre facturação” negou a existência da mesma, justificando a sucessiva emissão de cheques sacados sobre contas pessoais dos sócios e Administradores da Impugnante, como meros empréstimos a título pessoal e excepcional ao Sr. N..., os quais não ultrapassariam os 30.000,00€/50.000,00€ em cada momento, situação que, por necessidade deste, acabou por se prolongar pelo ano de 2003.
Porém, urge ter presente que este a fragilidade deste depoimento emerge, não só, do facto de descrever comportamentos inusuais e contrários à praxis comercial das empresas no seu giro comercial, como ao deante se especificará, como ressalta manifesto o interesse directo do depoente na presente causa, o que inelutavelmente abala a sua força probatória.
Relativamente a Luís..., cumpre realçar, que este fez a descrição da vulgarmente denominada “ praxe bancária”, afirmando ter conhecimento dos levantamentos ao balcão dos cheques emitidos pela Impugnante e pelos seus Administradores.
Acrescentou que, uma vez que acompanhava as contas de clientes particulares, tinha conhecimento da emissão de alguns cheques das contas pessoais dos Administradores da Impugnante, os quais, depois de levantados, destinavam-se ao S. N..., tendo-lhe sido cometida, a certa altura, a tarefa de fazer um controlo dos montantes assim facultados àquele, de molde a que se mantivessem dentro do limite de 100.000,00€ (de dívida do Sr. N...), contrariamente aos valores de 30.000/50.000€ referidos por António…). Contudo, afirmou não ter conhecimento concreto das transacções comerciais entre a sociedade N..., Lda. e a Impugnante.
No seu depoimento José… Santos declarou ser fornecedor da Impugnante e conhecer o Sr. N... a quem afirma já ter, no passado, emprestado dinheiro, mediante a emissão de cheque quer pessoal, quer da sua empresa, sendo que era prática o Sr. N..., na mesma data, emitir um cheque no mesmo montante, para ser levantado uns dias depois, prática que, entretanto, abandonou. Mais descreveu, de forma genérica, os procedimentos inerentes à entrega da sua mercadoria na Siderurgia... por conta da Impugnante e respectivo circuito administrativo, até ao pagamento das competentes facturas.
Elsa…, declarou ser funcionária da ora Impugnante como responsável da tesouraria, procedendo aos pagamentos e recebimentos. Afirmou, ser a pessoas que preenchia os cheques, quer das contas bancárias tituladas pela Impugnante, quer das contas pessoais dos respectivos Administradores, estes últimos mediante instruções precisas e prévias dos mesmos.
Relativamente à factura nº282, afirmou que lhe foi transmitido que a Impugnante tinha feito um acordo com o Sr. N... de molde a garantir a vinda de mercadoria para a “C..., S.A.”, e que a mesma seria descarregada no parque da Impugnante, sendo que todas aquelas entregas seriam feitas por conta da factura nº 282 até perfazer o respectivo montante.
Descreveu, ainda, o modus operandi da Impugnante na relação comercial com os seus fornecedores, nomeadamente, com a N.... Lda e F..., Lda. relativamente ao recebimento da carga, descarga, pesagem, controlo, relevância dos respectivo ticket, pagamento em cheque ou em numerário, este último antecedido de emissão e levantamento de cheque por vezes pelo Senhor Joaquim….
Contudo, o seu depoimento centrou-se e assentou no circuito documental das transacções, e dos alegados empréstimos pessoais dos Administradores da C... S.A. ao Sr. N..., relativamente aos quais afirmou ter preenchido alguns dos cheques segundo instruções do Sr. António…, sendo que era este, ou outro administrador, na sua ausência, co-titular da mesma conta que os assinavam, e que posteriormente os entregara ao Sr. N... ou sua filha E…, mediante a entrega por este de cheque ou conjunto de cheques perfazendo igual valor e post datados.
João…, afirmou ser parceiro comercial da Impugnante, procedendo a entregas de mercadoria na Siderurgia..., por conta da C..., tendo feito referência aos procedimentos normais no âmbito do mercado das sucatas, descrevendo de forma genérica o “modus operadi“ da Impugnante nas suas relações comerciais com os fornecedores, nomeadamente no que concerne formas de pagamento (cheque, numerário) assim como locais de carga e descarga das mercadorias, selecção de materiais, circuito documental e procedimentos administrativos até à finalização do negócio.
Joaquim… declarou ser técnico de contabilidade da Impugnante e nessa qualidade ter acompanhado a tomada de decisão quanto à operação comercial a que se reporta a factura 282, e segundo o qual, esta titulava entregas futuras a um preço garantido, cujo ciclo procedimental/documental ficou ao seu cuidado e de outra funcionária, de nome Cecília, que fazia respectivo controlo administrativo das quantidades sucessivamente entregues nas instalações da Impugnante, mediante o registo na “conta corrente” criada para o efeito. Mais declarou que, posteriormente à emissão do respectivo cheque, era a testemunha que procedia ao seu levantamento em numerário e o entregava ao Administrador António… ou à D. Elsa que, posteriormente, procediam à respectiva entrega ao Sr. N... ou à filha deste, de nome E….
Relativamente aos cheques que alegadamente suportariam empréstimos particulares dos Administradores da Impugnante ao Sr. N..., afirma ter preenchido alguns, tal como a D. Elsa, sendo procedimento usual, entregar ao Sr. N... mediante a entrega por este de cheque ou conjunto de cheques perfazendo igual montante, mas datados para mais tarde, cerca de 2 semanas depois. Por último descreveu de forma genérica os procedimentos da Impugnante no seu giro comercial, concretamente, quanto à carga e descarga de mercadoria, documentação relevante, procedimentos administrativos e formas de pagamento, e documentação relevante para efeitos de arquivo.
Fernando…, afirmou ser TOC da Impugnante, e esclareceu que o funcionário Joaquim… actua na Impugnante sob a sua coordenação, relativamente aos procedimentos contabilísticos adoptados. Descreveu de forma genérica o circuito documental definido pela C..., S.A., bem como os mecanismos de controlo internos relativos às operações inerentes ao seu giro comercial, nomeadamente, no que concerne ao acordo de fornecimento subjacente à emissão da factura nº282.
No seu depoimento desvalorizou contabilística e administrativamente a relevância do ticket de pesagem e guias de transporte/remessa após a emissão da factura e efectuado o respectivo pagamento, bem como realçou as dificuldades de elaboração de um inventário permanente neste específico ramo de negócio de sucatas, bem como manifestou discordância quanto aos rácios utilizados pela Administração Fiscal para proceder às correcções aritméticas postas em crise nestes autos.
José Hélder da Silva Gomes, declarou ser funcionário da Impugnante desde 2004, ou seja, em data posterior aos factos a que se reporta a presente impugnação, tendo sido contratado para promover todas as diligências necessárias à implementação do inventário permanente na Impugnante, cujas características descreveu de forma genérica.
Abílio Fernandes Pinho, inspector Tributário, no seu depoimento reafirmou todo o vertido no Relatório Inspectivo que deu origem ao acto impugnado.
Perscrutada, assim, a prova testemunhal produzida pela Impugnante, impera concluir que esta não logrou validar a tese da Impugnante, uma vez que para além dos depoimentos dos seus funcionários e colaboradores se terem alicerçado, essencialmente, no circuito administrativo e documental estabelecido pela impetrante e na respectiva “praxis” comercial, não tiveram a virtualidade de concretizar os termos em que as alegadas transacções ocorreram, de tão vagos e genéricos que se revelaram no que concerne aos intervenientes, quantidades, qualidade/preço das mercadorias, locais de carga e descarga, regularidade de fornecimentos, viatura utilizadas, etc..
Igual constatação emerge relativamente aos seus parceiros comerciais e concorrentes, cujos depoimentos se resumiram ao modus operandi da Impugnante no mercado das sucatas, sem que estes tenham logrado concretizar quaisquer elementos relativamente às facturas em questão e às operações tituladas por estas.


II.2. De Direito

II.2.1 A sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, agora recorrida, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela agora recorrida contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) relativo ao exercício de 2002.
A primeira questão que cumpre apreciar e decidir, suscitada nas conclusões de recurso, é a de saber se a sentença recorrida padece de nulidade porquanto os vícios de que decorre a validade formal da sentença têm prioridade sobre os demais.
A recorrente imputa, à sentença, nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 668º do CPC. Pela insuficiente descriminação da matéria de facto dada como não provada, que se estriba numa fórmula conclusiva sem individualizar os inúmeros factos alegados e carreados para os autos na sua peça processual que foi objeto de produção de prova testemunhal e documental, e pela existência de uma contradição ostensiva entre, por um lado, a complexidade e extensão da factualidade carreada e por outro lado o desleixo com que a sentença a tratou. Por último, pela ausência de exame crítico da prova produzida - cfr. conclusões 24º a 32º das alegações de recurso.

Apreciemos.

No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.T. (Código de Procedimento e de Processo Tributário), norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida em processo judicial tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6871/13; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 15/5/2014, proc.7508/14).

A exigência de fundamentação é justificada pela necessidade de permitir que as partes conheçam as razões em que se apoiou o veredicto do tribunal a fim de as poderem impugnar e para que o tribunal superior exerça sobre elas a censura que se impuser. Dito de forma diversa, a fundamentação, para além de visar persuadir os interessados sobre a correcção da solução legal encontrada pelo Estado, através do seu órgão jurisdicional, tem como finalidade elucidar as partes sobre as razões por que não obtiveram ganho de causa, para as poderem impugnar perante o tribunal superior, desde que a sentença admita recurso, e também para este tribunal poder apreciar essas razões no momento do julgamento.

Deste modo, o julgamento da matéria de facto é um momento essencial da realização da justiça constitucionalmente cometida aos tribunais. De acordo com o disposto no artigo 205º da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. O juiz tem, por isso, o dever de se pronunciar sobre a factualidade alegada e sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente e que se apresente relevante para a decisão, discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação crítica dos elementos de prova e especificando os fundamentos decisivos para a convicção formada - cfr. artigos 123.º, n.º 2, do CPPT.

Exige-se assim, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida. “Não se trata, por conseguinte, de um mero juízo arbitrário ou de intuição sobre a realidade ou não de um facto, mas de uma convicção adquirida através de um processo racional, alicerçado - e, de certa maneira, objectivado e transparente - na análise criticamente comparativa dos diversos dados trazidos através das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações essencialmente determinantes da opção feita e cuja enunciação, por exigência legal, representa o assumir das responsabilidades do julgador inerentes ao carácter público da administração da Justiça” cfr. J. Pereira Baptista, in Reforma do Processo Civil, 1997, pags 90 e ss.

Não podemos deixar de sublinhar, como é doutrina e jurisprudência maioritária, que tal nulidade só ocorre quando faltem em absoluto os fundamentos de facto em que assentou a decisão. Apenas a total e absoluta ausência de fundamentação de facto afecta o valor legal da sentença, acarretando a sua nulidade, o que não ocorre quando a fundamentação é escassa, incompleta, não convincente, deficiente ou errada - cf. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 139/140 e Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra, pág. 687.

Tal exigência de fundamentação reflecte-se, ainda, e de acordo com o artigo 123º, nº 2 do CPPT, em a sentença efectuar a discrimitação dos factos provados dos não provados, fundamentando tais decisões. A fixação de factos não provados decorre de uma exigência suplementar de fundamentação de facto, não prevista no processo civil. A discriminação da matéria de facto não provada cumulativamente com a provada, decorre de no contencioso tributário ser na própria sentença que o juiz faz o julgamento da matéria de facto, havendo, por isso de elencar e separar os factos provados dos não provados, bem como indicar os meios de prova criticamente analisados que lhe permitem consubstanciar, por um lado, os factos provados e, por outro, os factos não provados.
Daí que a não discriminação dos factos não provados seja suscetível de integrar nulidade da sentença, prevista no n.º1 do art. 125º do CPPT.
No presente caso, o tribunal fixou matéria de facto dada como provada, mas sumulou nas expressões que levou aos factos não provados toda a factualidade trazida ao processo pela Recorrente; se nada mais tivesse sido aduzido em sede de análise da prova produzida, poder-se-ia concluir pela nulidade da sentença.
Todavia, da leitura da motivação da sentença sobre o julgamento de facto efectuado, indicou-se na sentença a razão/razões porque não atendeu aos factos alegados pela Recorrente ao analisar os depoimentos das testemunhas que sobre eles depuseram concretamente, afastando-os, de modo mais ou menos individualizado com referência ao depoimento de cada uma das testemunhas sobre tais factos. Neste sentido, sobre a questão idêntuca, ver o Acórdão deste TCANorte, de 25.11.2015, no processo 413/08 BEPRT, onde as partes foram as mesmas e se analisava o IRC de 2003.
Também no que respeita aos documentos que foram trazidos pela Recorrente, mesmo em sede inspetiva, a sentença explicitou o porquê de não terem condições para corroborar os fornecimentos faturados, mesmo em conjugação com a prova testemunhal já que nunca identificavam o tipo ou qualidade da sucata adquirida pela impugnante, que era identificada como “sucata diversa”, o local de descarga, a frequência e prazo para os alegados fornecimentos, não tendo as testemunhas demonstrado os elementos em falta, a inexistência de documentos de transporte. Ali se explanou o porquê de se considerar como não provado os factos alegados pela impugnante. Veja-se a título de exemplo, para além da motivação dos factos não provados, o que se apreciou no corpo da sentença, sobre a factura 282: “Todavia, do cotejo da prova testemunhal produzida e perscrutados os demais elementos constantes dos autos verifica-se que a Impugnante não logrou fazer prova de que a factura nº282 corresponde ao efectivo fornecimento de sucata, nem que as demais facturas emitidas pelas sociedades “F... e N... Lda”., correspondem a fornecimentos de sucata nos precisos termos reflectidos nas mesmas, conservando-se intactos os indícios de simulação apurados pela Administração Tributária, uma vez que, em síntese :
- Quanto à factura nº282, apesar dos depoimentos das testemunhas justificarem a emissão da mesma e a alegada operação que lhe subjaz, com a necessidade de garantir no início do ano o fornecimento pelo Sr Nogueira Costa, através de uma das suas empresas (lembre-se, a F...) de determinada quantia de sucata, e assim auxiliar e, simultaneamente, fidelizar um dos maiores fornecedores da Impugnante, tal explicação não deixa de surpreender pela sua inverosimilhança, não só, pelo valor diminuto do fornecimento em causa face ao volume anual de fornecimentos das empresas do Sr N..., concretamente, a “F..., Lda e N... Lda”, quer face aos estreitos laços de amizade e longos anos de relação comercial existente entre aquele e os sócios da C..., quer quanto ao preço/tonelada acordado face à volatilidade dos preços da sucata, que como é sabido, varia dia a dia, quer por força da cotação internacional, quer pela força natural da lei da concorrência( procura /oferta), quer de acordo com a sua característica específica/qualidade, sendo de realçar que o preço por tonelada alegadamente acordado, à data da respectiva emissão, já se revelava elevado!
Cumpre, ainda, notar que na factura 282 não se mostra minimamente identificado o tipo ou qualidade da sucata adquirida pela Impugnante (lembre-se, identificada como sucata diversa), o local de descarga, a frequência e prazo para os alegados fornecimentos, sendo que as testemunhas inquiridas não lograram demonstrar estes elementos em falta, uma vez que, por um lado, os respectivos depoimentos apresentam-se imprecisos e vagos, dado que se suportam no circuito documental das transacções estabelecido pela impugnante e, por outro, descrevem uma realidade estranha à praxis comercial estabelecida entre os entes intervenientes (lembre-se, nomeadamente, o facto de a totalidade da mercadoria ser descarregada exclusivamente nas instalações da Impugnante, o preço predefinido por um valor considerado elevado e alheio à respectiva cotação diária, indeterminação do tipo de sucata fornecida, ou seja de maior ou menor qualidade/valor, e, por isso, insusceptível de convencer este Tribunal da realidade das operações e/ou da sua dimensão.
Sem prejuízo dos princípios da livre admissibilidade dos meios de prova (cf. art. 115.º, n.º 1, do CPPT) e da livre apreciação da prova (cf. art. 655.º do CPC), a prova testemunhal só poderia servir esse desígnio caso permitisse estabelecer com a certeza necessária - « (Certeza relativa (por oposição a certeza lógica ou absoluta) da realidade do facto, ou seja, «A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto» (cf. ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA E SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, págs. 435/436).)- que à factura em causa corresponde realmente o fornecimento, nas alegadas tranches, da sucata nela referida.(vide citado aresto)
Salvo o devido respeito por opinião diversa, atenta a quantidade de fornecimentos necessários para completar o montante de sucata a que se refere a factura nº 282 e o vários meses em que a Impugnante alega terem ocorrido (de Janeiro a Outubro de 2002), seria uma tarefa assaz difícil a demonstração, mediante prova testemunhal da realidade daquelas operações, porquanto, tal requereria uma pormenorizada e completa descrição da natureza, regularidade e dimensão dos fornecimentos, bem como, que da factura constasse uma detalhada descrição das operações nela aludidas e tipo de sucata em causa, por forma a permitir estabelecer uma relação inequívoca entre umas e outras,.
Se, por um lado, a descrição que na factura é feita da mercadoria (lembre-se, “ sucata diversa”) porque vaga e imprecisa, não possibilita estabelecer com um mínimo de segurança uma relação com os sucessivos fornecimentos ocorridos ao longo dos meses, de igual modo, seria necessário demonstrar com o mesmo grau de certeza que aquela sucata foi efectivamente entregue nas instalações da “C... S.A.” o que, desde logo, exigiria que se soubesse o local onde foram entregues, pormenor relativamente ao qual a factura é de todo omissa e a Impugnante não apresentou as respectivas guias de remessa ou de transporte (alegadamente destruídas).
In casu, não basta as testemunhas afirmarem, de forma genérica, que viam ou sabiam que os camiões da (ou por conta da) sociedade que emitiu a factura (a F..., Lda) ou “do Sr N...”, descarregavam a mercadoria nas instalações da “C..., S.A.” e que tais cargas eram acompanhadas pelos respectivos documentos de transporte que, depois de entregues aos funcionários da Impugnante, conferida a conformidade das mesmas e dada baixa no respectivo documento de controlo da factura nº282, eram destruídos, “uma vez que apenas relevava contabilisticamente a factura e o correspondente meio de pagamento”.
Para alcançar o fim probatório almejado pela Impugnante, era necessário que tudo isso fosse concretizado de forma pormenorizada com referência a datas, quantidades transportadas, número de carga e descargas.
O que, efectivamente, não ocorreu no caso vertente.”

Quanto aos empréstimos invocados para justificar o fluxo financeiro, de cheques e dinheiro, também foram rejeitados, como se retira do seguinte excerto do corpo da sentença: “(…)Desde logo, os termos em que tais acordos de mútuo foram celebrados foram descritos pelo Administrador da Impetrante que alegadamente os celebrou, apenas corroborado pelos funcionários, cuja razão de ciência emerge do facto de se terem limitado a auxiliar na respectiva materialização, concretamente, preenchendo os cheques emitidos pelos mutuantes, recebendo os cheques emitidos como garante/pagamento pelo Sr. N... e filha, controlando os montantes de empréstimos e respectivos reembolsos, não resultando dos autos qualquer prova inequívoca de que aqueles empréstimos efectivamente existiram.
De facto, a documentação apresentada pela Impugnante com esse intuito e alegadamente respeitante à “conta corrente/ mapa de controlo” que mantinha relativamente à regularização dos empréstimos ao Sr N... e respectivos reembolsos, pouco crédito merece, conjuntamente com os demais documentos (nomeadamente, cópias dos extractos combinados das contas pessoais dos Administradores da C... S.A, copias dos cheques emitidos por estes, declaração escrita do Sr. Nogueira Costa ) e não é susceptível de validar a posição assumida nos autos pela impetrante, o que é tanto mais evidente quanto, não basta a proximidade temporal em que os cheques são emitidos, relativamente aos alegados “empréstimos” e “reembolsos” respectivos, uma vez que não só o valor dos mesmos é quase sempre múltiplo de cinco, e os reembolsos são realizados feitos na maior partes das vezes por uma multiplicidade de cheques de valor unitário distinto (mas, igualmente, múltiplo de cinco) não respeitando uma numa ordem cronológica precisa, a que acrescem alegadas entregas em numerário, factos estes que não permitem estabelecer a concreta e exacta relação entre os mesmos.(…)”.
Os depoimentos das testemunhas foram também desvalorizados como ressalta da motivação da matéria de facto, veja-se por exemplo o depoimento de António…: (…)urge ter presente que a fragilidade deste depoimento emerge, não só, do facto de descrever comportamentos inusuais e contrários à praxis comercial das empresas no seu giro comercial, como ao deante se especificará, como ressalta manifesto o interesse directo do depoente na presente causa, o que inelutavelmente abala a sua força probatória.; o de Luis...: (…)este fez a descrição da vulgarmente denominada “ praxe bancária”, afirmando ter conhecimento dos levantamentos ao balcão dos cheques emitidos pela Impugnante e pelos seus Administradores(…)Contudo, afirmou não ter conhecimento concreto das transacções comerciais entre a sociedade N..., Lda. e a Impugnante. (…)
Acresce sublinhar ainda o que ficou registado na motivação da matéria de facto da douta sentença, após a análise a cada um dos depoimentos testemunhais: “(…)Perscrutada, assim, a prova testemunhal produzida pela Impugnante, impera concluir que esta não logrou validar a tese da Impugnante, uma vez que para além dos depoimentos dos seus funcionários e colaboradores se terem alicerçado, essencialmente, no circuito administrativo e documental estabelecido pela impetrante e na respectiva “praxis” comercial, não tiveram a virtualidade de concretizar os termos em que as alegadas transacções ocorreram, de tão vagos e genéricos que se revelaram no que concerne aos intervenientes, quantidades, qualidade/preço das mercadorias, locais de carga e descarga, regularidade de fornecimentos, viatura utilizadas, etc..
Igual constatação emerge relativamente aos seus parceiros comerciais e concorrentes, cujos depoimentos se resumiram ao modus operandi da Impugnante no mercado das sucatas, sem que estes tenham logrado concretizar quaisquer elementos relativamente às facturas em questão e às operações tituladas por estas(…)”
A sentença, deste modo, rejeita que as mercadorias a que aludem as facturas tenham sido adquiridas à “N... Lda.” e à “F..., Lda.”, pela Recorrente, ao não aceitar também o circuito comercial da sucata, ou seja, que as emitentes vendiam a sucata, com prévio ajuste de preço, à Recorrente e que esta, por sua vez, fornecia à Siderurgia..., com a particularidade de muitas vezes, o fornecimento ser feito diretamente à Siderurgia.
O modus operandi [factos alegados] foi rejeitado claramente pelo julgador como se apreende da sua exposição de motivação, escalpelizada no corpo da sentença.
Como referido supra, para que a omissão constitua nulidade da sentença, nos termos do art. 125º, n.º1, do CPPT Neste sentido o Ac do TCA Norte de 15/11/2013, no processo 00331/05, disponível no site da dgsi, itij., é decisivo que as partes tenham alegado factualidade para a decisão da causa que deveria ter sido considerada no julgamento de facto e o não foi.
Ainda sobre a inexistência de factos não provados, adiante-se que não pode fazer-se, como a Recorrente pretende, uma tentativa de isolar um elemento para depois avançar com a nulidade da sentença, dado que, ao nível dos factos não provados, essa definição foi feita por exclusão, impondo-se sublinhar que na discriminação dos factos que há-de fazer, o juiz não tem que se pronunciar sobre todos os factos alegados pela parte, tendo antes o dever de seleccionar os que interessam para a decisão segundo as várias soluções plausíveis de direito, sendo que a tal “conclusão” a que alude a Recorrente no âmbito dos factos não provados foi depois desenvolvida no âmbito da decisão sobre a matéria de facto, tendo a sentença especificado os fundamentos de facto e de direito em que assentou a decisão. Pode-se não concordar com a mesma, mas não podemos imputar-lhe a nulidade invocada.
De resto, só há nulidade da sentença quando a esta falte a absoluta fundamentação, ou nos casos em que a sentença não tenha relação percetível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação. Cons.º Jorge Lopes de Sousa, I Vol., pág. 909, 5ª Edição. “(…) a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão. Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação. Autor e Obra citada.
Do exposto ressalta que as alegações da recorrente poderão configurar um erro de julgamento, e nunca uma nulidade da sentença.
Como se afirmou no acórdão deste TCAN, proferido no processo 413/08.0BEPRT, já acima identificado, e que seguimos de perto: Os problemas que a Recorrente pretende realçar não respeitam a questões de formalidade ou nulidade da sentença, mas antes, e tão só, problemas de ordem substancial, do mérito substancial da decisão, em face do conjunto dos factos elencados.
A sentença externou o processo logico-intelectual que serviu de suporte à decisão, já que na motivação explicou as razões porque chegou àquele resultado. É possível fazer o controlo do juízo ou juízos que presidiram ao julgamento e bem assim como foi apreendida e justificada a realidade em discussão.
Soçobram, pois, as conclusões em matéria de nulidade da sentença.


II.2.3 Invectiva a recorrente contra a sentença, ainda por considerar que esta incorreu em erro de julgamento de facto, considerando mesmo na conclusão 2 das alegações de recurso que se incorreu em “clamorosos erros”, pois, segundo a recorrente e ao contrário do determinado na sentença sob recurso, aquela produziu ampla prova – testemunhal e documental que permitissem concluir que o montante da factura 282 de 17/01/02 emitida pela sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagem, Lda não emanou de qualquer simulação, tendo subjacente uma efectiva transmissão de bens, não sendo por isso uma “factura falsa”, titulando sim um acordo especial e irrepetível entre a recorrente e a F..., explicado e justificado no respectivo contexto de relacionamento empresarial entre os intervenientes; e que os valores constantes das demais facturas emitidas pela sociedade F... Comércio de Sucatas e Reciclagem, Lda, e bem assim, das facturas emitidas pela sociedade N..., Lda, corresponde ao realmente praticado.
E que, ao contrário do que sustentou o Tribunal, ficou demonstrado que os cheques emitidos pelo Sr N... a favor dos Srs C..., F…, J…, A… e António… nada têm a ver com a actividade da recorrente não se inserem num relação comercial ou financeira entre a recorrente e o Sr N... (e empresas por si detidas e geridas); apenas titulam relações de crédito entre pessoas singulares.
E ainda que os argumentos indicados na inspecção a que o tribunal aderiu são totalmente aparentes e irrelevantes, sendo de anular as liquidações impugnadas por não haver indícios fundados de operações fictícias, ou pelo menos por existir fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, de acordo com o artº 100 do CPPT.
Ora, se bem entendemos o almejado pela recorrente, pretende esta que este Tribunal de recurso reapreciasse a prova testemunhal produzida.
Mas, assentando a decisão da matéria de facto, no presente caso, na convicção criada no espírito do juiz e baseada na livre apreciação das provas testemunhal e documental que lhe foram apresentadas, a sindicância de tal decisão não pode deixar de respeitar a liberdade da 1ª instância, na respectiva apreciação.
Dispõe o n.º 1 do art.º 676.º, actual 627º do Código de Processo Civil que “[a]s decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos.”, ou seja, o recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.
Mas, como tem sido jurisprudencialmente aceite, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas - cfr. art. 607º. O juiz a quo, na decisão sobre a matéria de facto, aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que, na formação dessa convicção, não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que, em caso algum, podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio.
Daí que a convicção do tribunal se forme de um modo dialéctico.
É, pois, pela fundamentação invocada para a decisão que normalmente se afere a correcção do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Como se aponta no acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 05/05/11 (processo 334/07.3 TBASL.E1), “O erro na apreciação das provas consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios e leis científicas, nomeadamente, das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório e evidente), seja também quando a valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas, note-se, excluindo este.
Não basta, pois, que as provas permitam dentro da liberdade de apreciação das mesmas, uma conclusão diferente, a decisão diversa a que aludem os artºs690-A nº 1 al. b) e 712º nº 1 al. a) e b), terá que ser única ou, no mínimo, com elevada probabilidade e não apenas uma das possíveis dentro da liberdade de julgamento.”
Sublinhe-se que no que tange à apreciação pelo tribunal de recurso da prova gravada, como é o caso do presente recurso, “deve ter-se em conta, por um lado, que “O tribunal colectivo aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto (art. 655º, nº1 do CPC), pelo que, sob pena de pôr em causa os princípios da oralidade e da livre convicção que informam a nossa lei processual civil, o tribunal de recurso deve reservar a modificação da decisão de facto para os casos em que a mesma seja arbitrária por não se mostrar racionalmente fundada ou em que for evidente, segundo as regras da ciência, da lógica e/ou da experiência que não é razoável a solução da 1ª instância” (acórdão STA de 27.1.10, proferido no recurso 358/09), mas por outro, que “No caso de gravação da audiência de julgamento o tribunal superior deve agir com cautela já que se encontra privado da oralidade e da imediação que foram determinantes da decisão em 1.ª instância,…” – vide, acórdão do STA, de 9/2/2012 (processo nº 967/11).
E, tal como refere Abrantes Geraldes em Recursos em Processo Civil. Novo Regime, pag 268 e ss. a gravação dos depoimentos por registo áudio (…) não consegue traduzir tudo quando pôde ser observado no tribunal a quo. (…)
Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância. Na verdade existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores.(…)
Por certo que as circunstâncias anteriormente apontadas ou outras que podiam ser enunciadas terão de ser ponderadas na ocasião em que o tribunal da relação proceda à apreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações na decisão da matéria de facto quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível, concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro na apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados.(…)
Nestas circunstâncias, se a Relação, procedendo à reapreciação dos meios de prova postos à disposição do tribunal quo, conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, a convicção acerca da existência de erro, deve proceder à modificação da decisão, (…).”
E só quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei é afastado o princípio da livre apreciação. (cfr.artº.371, do CC)
Sobre este entendimento do duplo grau de jurisdição, também já o Tribunal Constitucional se pronunciou(...): “A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis”, de tal modo que a função do Tribunal da 2.ª instância deverá circunscrever-se a “apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1.° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos” Acórdão de 13.10.2001, in Acórdãos do T. C. vol. 51°, pág. 206 e ss..)”.
É pois de concluir do expendido que a modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada e aprendida pela 1ª instância, só se justificaria se, feita a reapreciação, fosse evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada na instância recorrida.
Tendo presente o agora exposto, e para o que aqui nos importa, debrucemo-nos sobre os artigos 640º e o nº 1 do 662º do CPC que determinam os termos da modificabilidade da matéria de facto pelo tribunal de recurso, bem como as regras impostas quanto à impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
O artigo 662 estabelece que: “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”.
Por sua vez o artigo 640º, também do CPC determina que: “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender deve ser proferida sobre questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. (…)”
Sobre o cumprimento do ónus que impende sobre o recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, António Abrantes Geraldes, in Recursos do Novo Código de Processo Civil – Novo Regime. Almedina, 2014, 2º edição, pag 135 e segs, diz-nos que:
“ (…) A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação nas conclusões dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registado (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente ao segmento da impugnação;
f) Apresentação de conclusões deficientes, obscuras ou complexas, a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos que traduzem alguns dos elementos referidos…)
Acrescenta ainda o mesmo autor que as referidas exigências “...devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor.” (op. cit. pag 135).

Compreende-se, assim, que a conjugação do artigo 640.º e n.º1 do art.º 662.º do CPC afaste a possibilidade de o Tribunal de recurso com competência em matéria de facto efectuar um novo julgamento.
Como referido, tais normativos fazem recair sobre o(s)/a(s) recorrente(s) o ónus de, primeiro, indicar a) os concretos pontos de facto que pretende ver modificados e, segundo, b) indicar os concretos meios probatórios constantes do processo, do registo ou da gravação que imponham decisão diversa sobre aqueles pontos de facto, indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso. c) A decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
A ser assim, a Recorrente estava obrigada a indicar os meios de prova constantes dos autos que, no seu entender, conduziriam a que os factos que na sentença não se deram como provados, o fossem.
Como, a este propósito, se referiu no acórdão deste TCAN de 6/1/2011, processo nº 813/09.8BECB: “bem se compreendem estas exigências da lei pois ao tribunal ad quem que tenha competência em matéria de facto não compete reapreciar toda a prova de forma a efectuar um novo julgamento da matéria de facto, como se este não tivesse alguma vez sido efectuado. Quanto ao âmbito do segundo grau de jurisdição em matéria de facto é elucidativo o teor do relatório do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, diploma que introduziu a redacção ao art. 690.º-A que acima deixámos referida. Aí se diz: «A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso. Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1.ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido. A consagração desta nova garantia das partes no processo civil implica, naturalmente, a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação»”.
No caso em apreciação, tendo sido produzida prova testemunhal, a Recorrente estava, desde logo, obrigada a indicar o depoimento, com referência ao assinalado na acta (sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considerasse relevantes) que implicava que a decisão sobre a matéria de facto tivesse sido outra que não a que consta da sentença, sob pena de rejeição do recurso nessa parte, face ao estatuído no artigo 685º-B do CPC, aqui aplicável. Não bastava por isso alegar genericamente que a prova testemunhal era suficiente para afastar os índicios apresentados pela AT, remetendo para o depoimento das testemunhas impunha-se-lhe em concreto, se referisse aos depoimentos prestados e os confrontasse com os concretos factos do relatório que ficam abalados de forma a concluir que apesar dos indícios subjetivos dos emitentes e da Recorrente não há indícios que permitam concluir como no RI.
De facto apesar de concretizar factos que entende que deveriam estar provados, por sua vez, não são destacadas as provas produzidas, em confronto com o Relatório de Inspeção, que evidenciem um erro de julgamento, nomeadamente os segmentos dos depoimentos que entende relevantes em confronto com a indicação dos factos do relatório que são contrariados com aquelas passagens dos depoimentos em que o recorrente se funda.
A discordância sobre a valoração da prova testemunhal produzida e sobre a convicção do julgador, sem precisar ou identificar o vício lógico em que se incorre não permite a alteração da matéria de facto.
Da análise às conclusões de recurso resulta, assim, manifesto que tal ónus de impugnação da matéria de facto não foi minimamente cumprido pela Recorrente, pelo que se rejeita o recurso neste segmento.

II.2.4 A Recorrente insurge-se, também, contra a sentença, dado esta ter concluído pelo cumprimento do ónus da prova, por parte da Adminstração Tributária relativamente à prova dos índicios de que os valores facturados não correspondiam a reais operações económicas, e pela falta de prova feita pela Recorrente, como lhe competia, de que os custos incorridos (registados na contabilidade da Recorrente provindas das sociedades emitentes “N... Lda.” e “F..., Lda.”) foram comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora, tal como decorre dos artigos 17º nº 1 e 23º do CIRC, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois o artigo 100º do CPPT não tem aplicação no caso concreto.E não tem, dado que o ónus consagrado no artigo 100º nº 1 do CPPT, contra a administração tributária (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a administração tributária: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não o contrário. Ou seja, quando é ao sujeito passivo/contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos custos em que alega ter incorrido e que pretende ver reflectidos no apuramento do lucro tributável.
Dito de outro modo, se a recorrida cumpriu o seu ónus probatório de que todas as transacções da C... com F... e N..., Lda são verdadeiras, reais, correspondendo a transacções efectivamente realizadas.
E ainda, que a fatura 282 de 17.01.2002, emitida pela sociedade F..., titulando na óptica da recorrente um acordo especial e irrepetível entre aquela e a F... teve subjacente uma efectiva transmissão de bens. E também que os cheques emitidos pelo sr N... a favor dos Srs C..., F…, J…, A… e António… nada têm a ver com a actividade da recorrente, não se inserindo numa relação comercial ou financeira entre a recorrente e o emitente dos cheques (e empresas por ele detidas e geridas).
Apreciemos.
Não sem antes, para melhor enquadramento desta matéria, se transcreva o exposto no Acordão do T.C.A. Sul de 28-06-2011, proferido no Proc. nº 02477/08, onde se plasmou que “O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (I.R.C.), introduzido no sistema tributário português pelo dec.lei 442-B/88, de 30/11, pode definir-se como um imposto directo, tanto de um ponto de vista jurídico (como tal é classificado no Orçamento do Estado), como de um ponto de vista económico, dado que incide sobre manifestações directas ou imediatas da capacidade contributiva como é o rendimento real (em geral lucros) das empresas com sede ou direcção efectiva em Portugal. É um imposto de características reais, visto não levar em consideração os sinais pessoais que se verificam na pessoa do contribuinte, antes se dirigindo objectivamente à tributação da riqueza. É, igualmente, um tributo de características unitárias, no sentido de abranger tendencialmente todos os rendimentos das pessoas colectivas. Encontramo-nos perante um imposto proporcional, dado a sua taxa ser fixa qualquer que seja o montante da matéria colectável e assentando, em princípio, na tributação do rendimento real ou efectivo, embora admita presunções de rendimento, assim como a sua fixação através de métodos indiciários. Por último, encontramo-nos perante um tributo periódico, visto que a obrigação de imposto se renova nos sucessivos períodos anuais de tributação, dando origem, consequentemente, a sucessivas obrigações tributárias anuais e independentes umas das outras (cfr.artºs.1, 2, 3, 7, 51 e 69, todos do C.I.R.C.; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, Editora Rei dos Livros, 1996, pág.215 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, 8ª.edição, Livraria Almedina, 1996, pág.573 e seg.).
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que inevitavelmente daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para fins fiscais (cfr.J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
Refira-se, ainda, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.artº.98, do C.I.R.C., na versão em vigor no ano de 2001, actual artº.115, do C.I.R.C.; artºs.29 e 31, do C.Comercial).
O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada. …”.
Acresce referir que a jurisprudência considera que o ónus da prova se reparte, em processo onde o contribuinte impugne a actuação da AT, desconsiderando operações consubstanciadas em determinadas facturas existentes na escrita daquele, no sentido de caber a esta (AT) a prova dos pressupostos da sua actuação e àquele (contribuinte) a prova de que as questionadas operações tiveram, efectivamente, lugar. Ou seja, obtendo a AT indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção (neste sentido, Ac. TCAN de 24-01-2008, Proc. nº 02887/04 - VISEU )
A impugnante entende que houve errado julgamento porquanto no relatório não se elencaram factos suficientemente fortes e indiciadores de simulação das operações ou que permitam a demonstração da conclusão de faturação fictícia.
Sublinhe-se que, de acordo com a jurisprudência, veja-se, por todos, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-10-2004, processo n.º 810/04 quando está em causa a correcção de liquidações de IRC por desconsideração dos custos documentados por facturas reputadas de falsas pela AT, e porque a liquidação de IRC tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, não sendo necessário que a Administração Fiscal prove os pressupostos da simulação previstos no art. 240º do C.Civil (a existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros), sendo bastante a prova de elementos indiciários que levem a concluir nesse sentido, isto é, de indícios sérios e objectivos, que traduzam uma probabilidade elevada de que as facturas postas em crise, que suportam os custos desconsiderados, não titulam operações reais.
É de salientar que a Administração Tributária não se pode limitar a uma fundamentação meramente formal do juízo que formula quanto à indevida dedução de custos fiscais em sede de apuramento da matéria tributável em sede de IRC por parte do sujeito passivo. Exige-se-lhe, ainda, que demonstre o bem fundado desse juízo, provando os indícios que o sustentam, possibilitando, dessa forma, a conclusão de é correcta a sua fundamentação material. Neste sentido e sobre esta matéria vide, ainda, o douto acórdão do TCA Norte de 24.01.2008 proferido no recurso 01834/04.
Não sendo imperioso que a Administração Tributária efectue uma prova directa da simulação, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” - cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154.
Ora, o conforme João de Castro Mendes, os indícios são definidos como sendo aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - cfr. citação de José Luís Saldanha Sanches in “ A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311.
Por sua vez, o contribuinte poderá invectivar contra os indícios carreados pela administração fiscal. Ou demonstrando a sua ineptidão para o fim visado, evidenciando que, ainda que sejam verdadeiros, deles não se pode inferir a falsidade das facturas; ou, demonstrar que tais indícios não são verdadeiros.
Haverá, assim, no presente caso, que apurar se a Administração Fiscal logrou carrear indícios suficientes e demonstrativos de que às facturas contabilizadas pela Impugnante não subjazem as operações que nelas se reflectem. E em caso afirmativo determinar se a impugnante afastou tais indícios.
A sentença ponderou, como agora se transcreve:
“….Face ao vertido supra, ainda que apreciados isoladamente cada um dos elementos reunidos pelos Serviços Inspectivos, estes não lograssem traduzir por si só, indícios da falta de materialidade das transacções tituladas pelas facturas em apreço, contudo, conjugados entre si e “lidos” à luz das regras da experiência comum, representam indícios sérios e credíveis da simulação aventada pela Administração Tributária, revelando-se fulcrais, as diligências encetadas por esta, quer em junto dos alegados emitentes das facturas, quer junto da Impugnante.
De facto, os elementos recolhidos em sede inspectiva traduzem uma probabilidade elevada de estas não titularem operações reais, ou seja, de que os apontados fornecedores F... Lda e e N... Lda., efectivamente não venderam à Impugnante a sucata mencionada nas facturas pelos preços nelas constantes e por esta contabilizadas.
No caso vertente, os indícios recolhidos pela Administração Fiscal foram suficientes para que esta concluísse que as operações subjacentes às facturas em causa são simuladas uma vez que, face à míngua da prova produzida pela Impugnante, os factos constantes de relatório junto aos autos, valorados segundo um critério de experiência comum, são bastantes para que se conclua que as facturas são fictícias.
Assim sendo, resulta manifesto ter a Administração Tributária demonstrado cabalmente os pressupostos da sua actuação, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia porquanto os elementos coligidos pela AT configuram elementos probatórios objectivos, que permitem com segurança a sustentação de que estamos perante a emissão de facturas às quais não correspondeu qualquer transacção efectiva de mercadorias ( factura nº 282) ou o preço aposto nas facturas não tem correspondência com a realidade.
Sobre esta matéria pronunciou-se, mui recentemente, o Venerando Tribunal Central Administrativo Norte, no douto Acórdão de 26.04.2012, rec.0964/06.0. BEPRT, cujo sumário por adesão in totum à sua proficiente fundamentação, parcialmente se transcreve:«… III - Não padece de erro de direito a sentença que, tendo concluído que a Administração Tributária reuniu indicadores suficientes de que determinado custo não existiu e a ali Impugnante não comprovou que a operação comercial a que se reportam as facturas respectivas eram reais, invoca o artigo 23.º do C.I.R.C. para sancionar a não dedutibilidade desse custo. IV - Estando em causa uma liquidação de IRC que tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, compete à Administração Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação. V- Feita essa prova, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável.*»
Assim, na esteira do citado aresto, atento os factos apurados pela Administração Tributária, os quais revelam indícios sólidos da falta de materialidade subjacente às facturas emitidas, impendia sobre a Impugnante a prova do contrário, isto é, de que efectivamente e, não obstante esses factos, as transacções foram realmente concretizadas, nos termos constantes nos documentos que as titulam, cabendo-lhe, pois, o ónus de demonstrar a existência dos factos que invoca, como esteio do seu direito à anulação das correcções efectuadas….”

Para alicerçar o agora transcrito, a decisão recorrida considerou os seguintes elementos:
Quanto à factura nº282 emitida pela sociedade F....
No decurso do procedimento inspectivo, a Administração Tributária concluiu que as mercadorias ínsitas na factura nº282 emitida pela F..., não correspondeu a qualquer transacção real atentos os seguintes indícios:
-No dia 17 de Janeiro de 2002 foi registado na contabilidade da C... a factura nº282 emitida pela empresa F... , Lda. referente à compra de 2.853 toneladas de “sucata diversa” ao preço unitário de € 89,65 o que perfez o valor de €255.771,45 originando a dedução de IVA pela C... no montante de €43.481,15.
-A propósito desta factura, a C... fez entrega de um documento extra contabilístico que titulou por “ mapa de conferência da factura nº282, no qual se indicam as entregas (através das respectivas datas e quantidades), bem como os pagamentos. De acordo com este mapa as entregas ter-se-ão verificado entre a data da factura e o dia 15 de Outubro de 2002(…)o documento é omisso quanto à identificação dos documentos que terão acompanhado as mercadorias, bem como, no que respeita aos documentos emitidos aquando da entrada das mercadorias na C....
-Através das cópias dos cheques facultadas pela C..., verificou-se, que para pagamento da factura nº 282, foram emitidos 16 cheques ao portador, tendo-se verificado as seguintes situações :
a) Catorze (13) cheques, no valor de € 245.100, movimentados (levantados em dinheiro ou depositados em contas bancárias particulares, conforme indicação no verso dos cheques) por empregados da C...;
b) Um (1) cheque no valor de €20.000, movimentado (levantado em dinheiro ou depositado em conta bancária particular, conforme indicação no verso do cheque) por pessoa que desempenha funções no órgão de administração da C...;
c) Um (1) cheque (emitido no dia 17 de Janeiro de 2002) no valor de €14.963,94 que foi depositado em conta aberta em nome de Manuel N... (gerente da empresa N... , Lda. e F..., Lda.) sendo de salientar, que neste mesmo dia foi depositado numa conta bancária aberta em nome de um dos membros do conselho de administração da C..., de um cheque no valor de € 15,000 sacado sobre conta bancária aberta em nome de Manuel N... .
d) Um (1) cheque no valor de 29.927,87 que foi depositado em conta aberta em nome da empresa N..., Lda.
Para além destes cheques foi feito um pagamento em numerário no valor de €9.260,79.
(…) Afirma a C... que acordou com a empresa F..., Lda. o fornecimento de uma considerável quantidade de mercadorias com entregas que sucederiam ao longo de quatro meses. Registe-se desde logo que se trata de uma quantidade muito concreta, 2.853 toneladas (não “arredondada” portanto), a um preço também concreto, fixado ao limite do cêntimo. Um acordo em tais termos só faria sentido com o conhecimento exacto das mercadorias (qualidade e quantidade) por parte dos contratantes.
-(…), a quantificação exacta das mercadorias acarretaria a carga e a descarga das mesmas, operação que a uma carga média de 30 toneladas, teria que ser realizada 95 vezes.(…)
-Contrária também à razão do acordo è a sequência dos pagamentos efectuados. Afirma a C... que terá efectuado um primeiro pagamento contra a emissão de factura, pagamento esse que se teria efectivado através da entrega de dois cheques no valor total de €44.891, correspondentes á entrega dos primeiros 427.990 kgs. Para além de não ter sido apresentada uma razão para a emissão de dois cheques, no mesmo dia, sacados sobre a mesma conta, e entregues à mesma pessoa, para pagar algo que já era conhecido antes da emissão dos cheques, note-se que o valor que assim teria sido pago, aproxima-se muito do IVA liquidado na factura, montante que o fornecedor estava obrigado nos cofre do Estado , ou seja tal entrega na prática , não pagou os 427.990 kgs, mas sim o IVA mencionado na factura.(…)
- Ainda no que diz respeito a este primeiro pagamento, e recordando, que de acordo com a C... ele teria sido feito contra a emissão da factura e para pagamento dos primeiros 427.990 kgs entregues, tenha-se em consideração que a entrega desta quantia só foi finalizada no dia 22 de Janeiro , de acordo com o já referido “mapa de conferência da factura nº 282” ou seja , cinco dias após a emissão da factura, dos cheques e do depósito destes. Foram assim emitidos os cheques por valões que na data da emissão eram desconhecidos.
-(…)“ Os fornecimentos a que se refere a Factura em causa foram exclusivamente entregues nas instalações da C... …”, ou seja, justamente no local onde o circuito documental disponível para consulta é o mais reduzido , ou melhor , inexistente por força da destruição de documentos realizada pela C... (…)”…pratica normal destruir os tickets de pesagem e guia de recepção …”).
- no que diz respeito ao pagamento dos fornecimentos em questão, que os mesmos traduzem uma extrema colaboração por parte do adquirente, que de acordo com os esclarecimentos recolhidos, não se limitaria a emitir cheques que poderiam ser pagos junto do banqueiro sacado, mas iria mais além e disponibilizaria um funcionário qualificado, ou até mesmo um membro do Conselho de administração para se deslocar à instituição financeira , e aí recolher o numerário resultante , para depois o entregar ao fornecedor. A tudo acresce que esta colaboração desmesurada se restringiu ao pagamento do preço mencionado na factura nº 282, conforme esclareceu a C.... O que a C... não esclareceu, foi a razão que a levou a reservar a colaboração atrás aludida unicamente para os pagamentos desta factura, quando existiram outros fornecimentos das mesmas entidades e nas mesmas ocasiões.
(…)Considerada a informação recolhida, conclui-se que as compras efectuadas às empresas N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. se caracterizaram:
i)Pelas insuficiências documentais verificadas, concretamente:
i.i) Designadamente das mercadorias transaccionadas (adopção de designações genéricas que na prática, impossibilitaram uma análise minimamente pormenorizada);O tratamento das guias de remessa ( a inexistência de uma razão para o arquivo parcial , a emissão de guias por quantidades insusceptíveis de corresponderem a transportes efectivos , a existência de indícios respeitantes à numeração das guias que levam à conclusão de que a uma parte das compras contabilizadas não correspondeu a emissão das correspondentes guias , a inexistência de arquivo de guias respeitantes aos transportes das mercadorias entregues à Siderurgia...);
ii) Pela adopção de formas de pagamento que, na maior parte dos casos , contrariam práticas comerciais generalizadamente adoptadas, além de, em alguns casos, tais formas serem destituídas de razões plausíveis para a respectiva ocorrência , o que diminuiu o valor de tais formas de pagamento enquanto comprovativas do efectivo pagamento a que se referem .(…)

Relativamente aos demais fornecimentos da N..., Lda. e F... Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda. à Impugnante
Através das inspecções efectuadas aos sujeitos passivos: N..., Lda. e F... Lda. verificaram-se, entre outras , as seguintes situações consideradas relevantes para a análise das relações com a empresa –C...):
a)Cerca de 70% do suporte documental das compras (N... Lda-93% e F..., Lda.-35%) foi indiciado como fictício;
b) As vendas declaradas para a empresa C... , representam cerca de 53% das vendas totais (N..., Lda. – 60% e F..., Lda. - 40%);
c) Os recebimentos, das vendas declaradas ao sujeito passivo – C..., foram processados contabilisticamente, como tendo sido feitos a dinheiro.
-Analisados os movimentos efectuados nas contas bancárias particulares dos sócios gerentes das empresas: N..., Lda. e F..., Lda., verificaram-se entre outras, as seguintes situações consideradas relevantes para a situação em análise:
a) Depósitos de cheques, que foram emitidos pela empresa C..., para pagamento de facturas de compras de mercadorias às empresas: N..., Lda. e F..., Lda.;
b) Cheques emitidos ao portador pelos titulares das contas analisadas (gerentes das empresas N..., Lda. e F..., Lda. que totalizaram no ano de 2002 €3.382.299,07, representativos de 39% das vendas declaradas pelas empresas: N..., Lda. e F..., Lda. para a empresa C... , e que foram depositados em contas bancárias ( contas no Millenium BCP: nº 2..., nº 1..., nº 4...; contas no Banco...: nº 247200039011, nº0247200019245, conta nº1389641210001 do Banco...) abertas em nome de membros do Conselho de Administração da C... conforme resumo no quadro a seguir indicado e relação anexa ao presente documento.
. A existência de um significativo número de cheques (na ordem das centenas), sacados sobre contas abertas em nome de Manuel N... (sócio-gerente das duas firmas atrás citadas) e de E…, (sócia – gerente da firma F... – Comércio e Reciclagens de Sucatas, Lda.),por valores que, na maior parte dos casos, ultrapassa e dezena de milhar de euros, cheques esses que, de acordo com as menções inscritas nos respectivos versos , foram depositados em contas abertas em nome de pessoas que desempenham funções de responsabilidade na Impugnante,(…)»
(…() Apesar dos bens transmitidos incluírem diferentes categorias de sucata, com valores e apresentações distintas, as facturas não as identificam, designando-as apenas pelos termos genéricos de «sucata» e «sucata diversa»:
i.1) No que diz respeito às facturas emitidas pela empresa F..., Lda. das 24.806,53 toneladas facturadas, 23.206,32 foram transmitidas com a nominação de «sucata diversa» e, para estes bens transmitidos, ocorreram 34 preços unitários deferentes, praticados entre o valor de 49,88 e €112,23.
I.2) Das 58.934,47 toneladas facturadas pela empresa N..., Lda. verificou-se que 52.185,05 foram transmitidas com a designação de «sucata diversa», e para estes bens transmitidos ocorreram 36 preços unitários diferentes, variando entre o valor de €10,12 e €109,00.
ii) Consultados os documentos mantidos em arquivo pela C..., verificou-se que se encontravam agrafadas guias de remessa a algumas facturas, tendo como elemento comum a data.
ii.1) Comparadas as quantidades mencionadas nas guias de remessa com aquelas que são indicadas nas facturas que lhes estão associadas, verificou-se que em alguns casos as quantidades não eram coincidentes.
ii.2) Tendo sido contabilizada a compra de 83.741.000 Kg de sucata, verificou-se que apenas 9,4% dessas compras estavam suportadas com Guias de Remessa(…)
a) Dos 58.765.890 Kgs entregues directamente à Siderurgia..., pelas empresas N..., Lda. e F..., Lda. conforme indicação da C..., apenas 5,6% estavam documentados com Guias de Remessa;
b) Dos 24.975.110 Kgs entregues nas instalações da C... em Pedroso, pelas empresas N..., Lda e F..., Lda., apenas 18% estavam documentados com Guias de Remessa;
ii.3) Inquirida a C... a propósito da razão de ser deste tipo de arquivo parcial das guias de remessa , esta fez entrega do aditamento atrás mencionado onde se limita a indicar uma razão genérica para a inexistência de alguns documentos , não explicando portanto a razão do arquivo parcial.
ii.4) Analisadas as quantidades indicadas nas guias de remessa , verificou-se existirem guias de remessa com quantidades superiores a 190 toneladas , que não poderiam ser transportadas por uma viatura , conforme resumo das guias de remessa (…)
ii.5) Através da listagem de registo das entradas de mercadorias , elaborada pelo sujeito passivo , conforme indicação no ponto nº 3.2.2, verificou-se que às compras de mercadorias corresponderam 3.113 entregas .
-Da análise das guias de remessa emitidas pela empresa F..., Lda. constatou-se que foi utilizada uma única série de guias de remessa com numeração compreendida entre o nºs e o nº1000, e desta série foram emitidas as seguintes guias de remessa para a C...(…)
-Analisada a articulação entre a numeração e as datas presentes nas guias de remessa, conclui-se que a empresa F..., Lda. utilizou 216 guias de remessa no período compreendido entre 22-11-2001 e 23-12-2002, e a empresa N... Lda. utilizou 2363 guias de remessa , no período de 26-11-2001 e 31-12-2002.
-Da comparação do registo de entradas de mercadoria (3.113) com o nº de guias de remessa utilizadas pelas duas empresas (2579),verifica-se que o nº de entregas é superior ao nº de guias de remessa emitidas (534).(…)»

Como se afirmou no acórdão deste TCA Norte, no acórdão de 14.04.2016, proferido no processo 450/09BEPRT”…deve salientar-se, porém, que a acima descrita regra do ónus probatório só opera verdadeiramente depois de a administração tributária ter reunido e invocado indícios fundados de que o facto tributário não ocorreu, ou seja, depois da administração tributária ter emitido um juízo administrativo de adequação entre os factos e as valorações em que a administração diz, formalmente, suportar a sua decisão e o resultado desse juízo no sentido de se lhe afigurar ter sido declarado uma dedução superior à devida e com a prova perante o tribunal da pertinência desse juízo ou seja, com a prova, perante o tribunal, da existência dos elementos que tornam possível ter como adequada a consideração por si feita de que o contribuinte declarou uma dedução superior à permitida pela lei.
(…)
reiterando-se tal entendimento, é de concluir que cabe à AT «o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, como factos constitutivos de tal direito, em termos daquele princípio da legalidade, segundo a sua actual compreensão, entendido não como mero limite à actividade da administração mas como fundamento de toda a sua actividade.
O que corresponde ao ensinamento de Vieira de Andrade in Justiça Administrativa, 2ª edição, pág, 269: "há-de caber, em princípio à Administração, o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegalidade do acto, quando se mostrem verificados estes pressupostos"» (ac. do STA, de 30/4/2003, no proc. nº 0241/03).(No qual se referenciam, igualmente, os ac.s de 24/4/02, rec. 102/02, de 17/4/02, rec. 26.635, de 9/10/02, rec. 871/02 e de 14/11/01, rec. 26.015.)
Na verdade, embora a regularidade formal da escrita constitua presunção da sua veracidade - estendida aos seus elementos de apoio (art. 75º da LGT) -, tal presunção cessa no caso da existência de indícios sérios de que as operações escrituradas se não realizaram. Daí que, como se disse, provando a AT a existência de indícios sérios e credíveis de que tais operações não são verdadeiras, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das mesmas.
Sobre esta matéria escreveu-se no Acórdão do STA, de 24/4/2002, Rec. 0102/02:
«Ora, como quem tem a seu favor uma presunção estabelecida na lei está dispensado da prova do facto presumido (cfr. os arts. 349° e 350° do CCivil), a recorrente, tendo a sua escrita organizada conforme as exigências legais, não precisa de provar que são verdadeiros os dados decorrentes.
A não ser que se verifiquem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva.
Quer dizer, a presunção cessa quando, estando, embora, a escrita ou contabilidade organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexactidões, ou haja “indícios fundados” de que, apesar da sua correcta organização, não reflecte a matéria tributável efectiva.
Cabe nesta previsão, claramente, o caso de a contabilidade, impecavelmente organizada, se avaliada do ponto de visto técnico-contabilístico, no entanto omitir operações efectuadas; e cabe o caso inverso - o de incluir operações não efectuadas. Este último é aquele que correntemente se vem chamando de “facturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correcta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem, na verdade, não tiveram lugar.
E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, não impõe à Administração a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protector da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios”.
De todo o modo, quando seja a Administração Fiscal a praticar um acto, designadamente, um acto tributário de liquidação, fundado na existência de determinado facto tributário, por hipótese não revelado pela escrita do contribuinte, não deixa de ser ela a ter que provar tal existência, pressuposto da sua actuação. É isto corolário do princípio da legalidade administrativa, de acordo com o qual a Administração só pode agir se isso lhe permitir a lei, e não pode fazê-lo contra ela. Os pressupostos da sua actuação são, pois, factos constitutivos do seu direito a agir, cuja prova lhe compete, por isso que é o agente.
Voltando ao caso em apreço, e com os contornos da situação descrita nos autos, analisada de acordo com o supra exposto, resulta que a AT logrou evidenciar a realidade que a levou a não aceitar os custos inerentes às operações descritas, matéria claramente susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, o que equivale a dizer que a AT conseguiu desembaraçar-se do ónus que a lei lhe comete neste domínio.
Como se plasmou no acórdão proferido no processo 413/08.0BEPRT, acima melhor identificado, onde estão em causa as mesmas partes e o mesmo imposto, apenas de ano distinto “Desde logo não é possível saber (verificar) quem vende a quem, o quê, quando e em quantidade e preço.
Não é o facto de as faturas mencionarem “sucata diversa” ou não existir um inventário permanente ou ainda de os emitentes estarem indiciados como “emitentes de faturação falsa” que, de per si, impossibilita a confirmação das operações, mas a inexistência de qualquer documentação que materializa o circuito comercial, para além das faturas; as guias de remessa ou de transporte conterem valores de mercadorias incomportáveis para um só transporte, ou não permitirem confirmar a origem da mercadoria, a quantidade e preço negociado.
Os documentos, dos fornecedores ou transportadores, por sistema preenchidos pelos funcionários ou responsáveis da Recorrente (C...), a incerteza quanto à origem de determinados tipos de sucata, o historial que rodeia o modus operandi das emitentes das faturas, a sua inconsistência logística, a falta de credibilidade da escrita e a inexistência, em alguns casos da documentação, sem motivo justificado, como o caso do incêndio nas suas instalações sem que estabeleça uma conexão direta e verificável entre esse facto e a ausência de documentos.
Tal circunstancialismo induz que se trata antes de sobrefaturação, ou faturação que em concreto não corresponde a reais e efetivos fornecimentos à Recorrente (C...).
Os movimentos financeiros de valores na ordem das centenas e milhares de euros que acompanham estas operações, tituladas nas faturas, não abonam também no sentido da confirmação da sua existência, são cheques que na sua maioria são emitidos ao portador, através da análise do circuito dos cheques constata-se que elevadissimas quantias são levantadas por sócios gerentes, empregados ou depositadas em contas particulares destas pessoas e de administradores da C....
Não obstante, se ter aventado relações pessoais entre os representantes das sociedades e a esse título a existência de “empréstimos” e “reembolsos”, o certo é que nada se acrescentou no âmbito da inspeção para abalar os indícios aportados pela AT, pois, não é dada justificação plausível para o movimento financeiro entre e para as contas particulares das pessoas diferentes das sociedades (como gerentes, sócios, empregados e administradores).
Na verdade, este indício, na vertente dos fluxos financeiros, não pode deixar de conter em si uma forte probabilidade de que as faturas contabilizadas não representam reais fornecimentos com o correspondente valor monetário inscrito, e com isto se entra na validade substancial dos factos.
Apresenta-se inexplicável e injustificado que a par da formalidade da contabilidade, suportada em faturas e algumas guias de remessa ou transporte [com valores incomensuráveis de mercadoria], haja um elevado valor de operações financeiras entre os responsáveis das respetivas empresas.
Na verdade, concatenando os elementos colhidos no âmbito das diligências inspetivas, vertidas no relatório, analisando-os à luz das regras da experiência comum, do bom senso, de um homem médio, com mediana sagacidade, não se pode deixar de concluir que a AT condensou fortes indícios de que as operações faturadas não foram realizadas.
De notar, mais uma vez, que a administração não precisa de demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo, ou seja, invocar factos que traduzam uma probabilidade elevada de as operações referidas nas faturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados contantes da sua contabilidade (art. 75º da LGT) Citando o Ac do STA de 27/10/2004 no proc. N.º 810/04 e o Acórdão do Pleno de 7/5/2003 no processo 01026/02, todos disponíveis no site da dgsi, itij.(…)”

Em face do exposto, tendo a AT reunido indícios fundados de que a recorrente contabilizou facturas que não correspondem a transacções reais, importa avançar para o segundo momento da repartição do ónus da prova, que se consubstancia na prova da veracidade das transacções em causa, sendo que será inequívoco que caberá ao contribuinte evidenciar tal realidade, sendo que, neste ponto, competindo ao contribuinte ónus da prova da veracidade das operações em causa, não lhe basta criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o art. 100º do CPPT não tem aplicação. Na verdade, o ónus consagrado no artigo 100º, n.º 1, do CPPT, contra a AT (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a AT: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como in casu, é à contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos factos tributários.
Ora, não obstante a posição assumida pela recorrente reclamando a efectiva realização de todas as transacções referenciadas nas facturas postas em crise pela AT, constata-se que a prova produzida não é suficiente para viabilizar a pretensão da Recorrente.

Como correctamente se apreciou na sentença recorrida:”(…) Apesar de a impetrante esgrimir, em defesa da sua posição, o argumento de que a Administração Fiscal não promoveu todas as diligências no sentido de determinar os recursos financeiros afectos às relações comerciais estabelecidas entre a F... e a N... Lda com a Impugnante, tendo “confundido” aquele domínio societário com o universo das relações pessoais dos administradores com o sócio comum daqueles seus fornecedores (lembre-se, o Sr. N...), concretamente a AF não distinguira os movimentos de valores pecuniários utilizados como meio de pagamento nas transacções entre a impetrante e os seus “fornecedores” (quer em numerário, quer em cheque) daqueles que se reportam a empréstimos pessoais dos administradores da C... S.A. (C...) ao Senhor N..., todavia, não logrou provar a sua tese e consequentemente, demonstrar a veracidade das transacções.
Apesar da utilização do cheque como meio de pagamento verter alguma formalidade, só por si, não basta para conferir credibilidade quer às facturas desconsideradas, quer aos alegados empréstimos, uma vez que atentas as avultadas quantias envolvidas, a regularidade da respectiva emissão, o lapso temporal em que esta ocorreu, traduzem uma prática comercial não generalizada ou comum.
Sobre esta questão se pronunciou o Venerando TCA Norte, no seu acórdão de 01-03-2007, proferido no rec. 00027/00, no sentido de que:“a utilização do meio de pagamento utilizado pela impugnante e considerado pela sua contabilidade, que consiste no recurso ao cheque capaz de documentar cabalmente e sem margem para recusa das autoridades, consubstancia uma actuação típica de facturação falsa.”
Acresce que a Jurisprudência tem considerado reiteradamente que a própria regularidade da contabilidade em utilizadores de facturação falsa constitui um dos indícios da falta de materialidade das operações, pela necessidade de regularização formal face à não efectivação das transacções.
Cabia, pois, à impetrante demonstrar a existência das operações materiais tituladas pelas facturas desconsideradas, sendo que a prova documental e testemunhal apresentada não resultou bastante para criar a convicção no Tribunal sobre a efectiva realização das transacções em causa.
Note-se que se impunha à impetrante uma pormenorizada e detalhada descrição da sucata adquirida (natureza, quantidades, locais de carga e descarga) e datas da realização das operações subjacentes às facturas.
(…)
Todavia, do cotejo da prova testemunhal produzida e perscrutados os demais elementos constantes dos autos verifica-se que a Impugnante não logrou fazer prova de que a factura nº282 corresponde ao efectivo fornecimento de sucata, nem que as demais facturas emitidas pelas sociedades “F... e N... Lda”., correspondem a fornecimentos de sucata nos precisos termos reflectidos nas mesmas, conservando-se intactos os indícios de simulação apurados pela Administração Tributária, uma vez que, em síntese :
- Quanto à factura nº282, apesar dos depoimentos das testemunhas justificarem a emissão da mesma e a alegada operação que lhe subjaz, com a necessidade de garantir no início do ano o fornecimento pelo Sr Nogueira Costa, através de uma das suas empresas (lembre-se, a F...) de determinada quantia de sucata, e assim auxiliar e, simultaneamente, fidelizar um dos maiores fornecedores da Impugnante, tal explicação não deixa de surpreender pela sua inverosimilhança, não só, pelo valor diminuto do fornecimento em causa face ao volume anual de fornecimentos das empresas do Sr N..., concretamente, a “F..., Lda e N... Lda”, quer face aos estreitos laços de amizade e longos anos de relação comercial existente entre aquele e os sócios da C..., quer quanto ao preço/tonelada acordado face à volatilidade dos preços da sucata, que como é sabido, varia dia a dia, quer por força da cotação internacional, quer pela força natural da lei da concorrência( prura /oferta), quer de acordo com a sua característica específica/qualidade, sendo de realçar que o preço por tonelada alegadamente acordado, à data da respectiva emissão, já se revelava elevado!

Cumpre, ainda, notar que na factura 282 não se mostra minimamente identificado o tipo ou qualidade da sucata adquirida pela Impugnante (lembre-se, identificada como sucata diversa), o local de descarga, a frequência e prazo para os alegados fornecimentos, sendo que as testemunhas inquiridas não lograram demonstrar estes elementos em falta, uma vez que, por um lado, os respectivos depoimentos apresentam-se imprecisos e vagos, dado que se suportam no circuito documental das transacções estabelecido pela impugnante e, por outro, descrevem uma realidade estranha à praxis comercial estabelecida entre os entes intervenientes (lembre-se, nomeadamente, o facto de a totalidade da mercadoria ser descarregada exclusivamente nas instalações da Impugnante, o preço predefinido por um valor considerado elevado e alheio à respectiva cotação diária, indeterminação do tipo de sucata fornecida, ou seja de maior ou menor qualidade/valor, e, por isso, insusceptível de convencer este Tribunal da realidade das operações e/ou da sua dimensão.
Sem prejuízo dos princípios da livre admissibilidade dos meios de prova (cf. art. 115.º, n.º 1, do CPPT) e da livre apreciação da prova (cf. art. 655.º do CPC), a prova testemunhal só poderia servir esse desígnio caso permitisse estabelecer com a certeza necessária - « (Certeza relativa (por oposição a certeza lógica ou absoluta) da realidade do facto, ou seja, «A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto» (cf. ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA E SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, págs. 435/436).)- que à factura em causa corresponde realmente o fornecimento, nas alegadas tranches, da sucata nela referida.(vide citado aresto)
Salvo o devido respeito por opinião diversa, atenta a quantidade de fornecimentos necessários para completar o montante de sucata a que se refere a factura nº 282 e o vários meses em que a Impugnante alega terem ocorrido (de Janeiro a Outubro de 2002), seria uma tarefa assaz difícil a demonstração, mediante prova testemunhal da realidade daquelas operações, porquanto, tal requereria uma pormenorizada e completa descrição da natureza, regularidade e dimensão dos fornecimentos, bem como, que da factura constasse uma detalhada descrição das operações nela aludidas e tipo de sucata em causa, por forma a permitir estabelecer uma relação inequívoca entre umas e outras,.
Se, por um lado, a descrição que na factura é feita da mercadoria (lembre-se, “ sucata diversa”) porque vaga e imprecisa, não possibilita estabelecer com um mínimo de segurança uma relação com os sucessivos fornecimentos ocorridos ao longo dos meses, de igual modo, seria necessário demonstrar com o mesmo grau de certeza que aquela sucata foi efectivamente entregue nas instalações da “C... S.A.” o que, desde logo, exigiria que se soubesse o local onde foram entregues, pormenor relativamente ao qual a factura é de todo omissa e a Impugnante não apresentou as respectivas guias de remessa ou de transporte (alegadamente destruídas).
In casu, não basta as testemunhas afirmarem, de forma genérica, que viam ou sabiam que os camiões da (ou por conta da) sociedade que emitiu a factura (a F..., Lda) ou “do Sr N...”, descarregavam a mercadoria nas instalações da “C..., S.A.” e que tais cargas eram acompanhadas pelos respectivos documentos de transporte que, depois de entregues aos funcionários da Impugnante, conferida a conformidade das mesmas e dada baixa no respectivo documento de controlo da factura nº282, eram destruídos, “uma vez que apenas relevava contabilisticamente a factura e o correspondente meio de pagamento”.
Para alcançar o fim probatório almejado pela Impugnante, era necessário que tudo isso fosse concretizado de forma pormenorizada com referência a datas, quantidades transportadas, número de carga e descargas.
O que, efectivamente, não ocorreu no caso vertente.
No que concerne à sobre facturação que a Impugnante nega com veemência, ancorada nos alegados empréstimos pessoais dos administradores da Impugnante ao Sr N..., titulados por cheques, mais uma vez se depara o tribunal com a falta de verosimilhança da tese defendida pela Impugnante, não só, atentos os valores envolvidos, como a regularidade e a amplitude temporal em que tal comportamento se manteve, à revelia das práticas comuns entre parceiros comerciais, sendo que a prova testemunhal produzida revelou-se incapaz de sustentar a posição assumida pela impugnante nos autos.
Desde logo, os termos em que tais acordos de mútuo foram celebrados foram descritos pelo Administrador da Impetrante que alegadamente os celebrou, apenas corroborado pelos funcionários, cuja razão de ciência emerge do facto de se terem limitado a auxiliar na respectiva materialização, concretamente, preenchendo os cheques emitidos pelos mutuantes, recebendo os cheques emitidos como garante/pagamento pelo Sr. N... e filha, controlando os montantes de empréstimos e respectivos reembolsos, não resultando dos autos qualquer prova inequívoca de que aqueles empréstimos efectivamente existiram.
De facto, a documentação apresentada pela Impugnante com esse intuito e alegadamente respeitante à “conta corrente/ mapa de controlo” que mantinha relativamente à regularização dos empréstimos ao Sr N... e respectivos reembolsos, pouco crédito merece, conjuntamente com os demais documentos (nomeadamente, cópias dos extractos combinados das contas pessoais dos Administradores da C... S.A, copias dos cheques emitidos por estes, declaração escrita do Sr. Nogueira Costa ) e não é susceptível de validar a posição assumida nos autos pela impetrante, o que é tanto mais evidente quanto, não basta a proximidade temporal em que os cheques são emitidos, relativamente aos alegados “empréstimos” e “reembolsos” respectivos, uma vez que não só o valor dos mesmos é quase sempre múltiplo de cinco, e os reembolsos são realizados feitos na maior partes das vezes por uma multiplicidade de cheques de valor unitário distinto (mas, igualmente, múltiplo de cinco) não respeitando uma numa ordem cronológica precisa, a que acrescem alegadas entregas em numerário, factos estes que não permitem estabelecer a concreta e exacta relação entre os mesmos.
Logo, não tendo, a Impugnante logrado convencer o Tribunal da autenticidade das transacções ou elementos relativos às operações subjacentes às facturas que estão na génese da liquidação em causa, mediante a produção de prova bastante, ónus que sobre ela impendia, contra ela terão que ser decididos os presentes autos no que a esta matéria respeita.”

Não obstante a posição assumida pela Recorrente, reclamando a efectiva realização de todas as operações referenciadas nas facturas postas em crise pela AT, constata-se que nenhuma dessa relevante factualidade foi demonstrada pela prova produzida no âmbito deste processo de impugnação judicial, como se conlcui do segmento da sentença, agora transcrito.
Pois bem, recaindo o ónus da prova sobre a recorrente, a esta competia demonstrar a materialidade das operações económicas subjacentes às faturas, a saber, os fornecimentos se haviam efectivado com as sociedades emitentes e não com qualquer outra entidade fornecedora; quais as quantidades precisas dos referidos fornecimentos, preços praticados que estariam em causa em cada uma das facturas.
Não tendo cumprido o ónus da prova que sobre ela impendia, contra ela terá de se decidir o presente litígio, quanto ao presente segmento, soçobrando as respectivas conclusões de recurso.
Assim sendo, e na medida em que a ora Recorrente não fez prova da veracidade das transacções em causa, aqui, tal como foi assumido pela AT, só podemos apontar e aceitar o procedimento de desconsiderar os custos correspondentes aos montantes inscritos nas apontadas operações simuladas, na medida em que os mesmos, pura e simplesmente, não foram suportados, pagos, pela impugnante, porquanto, só desta forma, se concretiza e respeita, nomeadamente, a exigência legal de só se poderem considerar custos ou perdas “os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora …” - cfr. art. 23º nº 1 do CIRC, o que significa que bem andou a sentença recorrida ao desatender a pretensão da Recorrente nesta matéria.

II.1.5 A Recorrente termina as suas conclusões de recurso alegando que, mantendo-se as liquidações a C... teria lucros efectivos impossíveis e inimagináveis.
A sentença apreciou, como agora se transcreve: “Ora é manifesto que, se a Impugnante vendeu mercadoria, teve necessidade de obter sucata, todavia, o que está em causa nos autos é saber se as concretas operações a que alude a factura nº282 e as demais facturas desconsideradas pela Administração Fiscal foram as que permitiram a realização da mesma e, na afirmativa, se foi efectuadas pelos valores que constam das facturas.
Refira-se, quanto aos rácios resultantes das correcções efectuadas e contra os quais a impugnante ferreamente se insurge, que a Administração Fiscal não desconsidera, em sede inspectiva que exista um circuito físico de mercadoria que é fornecida, inclusivamente por outras entidades, e daí não tenha colocado em causa o volume de vendas da Impugnante.
Porém, esta hipótese, em nada abala a conclusão da acção inspectiva, devidamente fundamentada, no sentido de que as facturas emitidas pelas entidades supra identificadas e contabilizadas pela Impetrante, são falsas, ou seja, de que aqueles fornecedores não poderiam ter vendido à Impugnante a sucata que consta discriminada na factura nº 282, nem pelo preço constante das demais.
Se, por hipótese, subjacentes às facturas em causa estão reais transacções, designadamente, negócios realizados com outrem, que não com o referido emitente das facturas, tal teria a Impugnante que demonstrar, já que é sobre ela, face às regras que atrás deixámos enunciadas, que recaía o ónus da prova de que suportou os custos titulados pelas facturas que contabilizou e que estas titulam e documentam efectivas aquisições de bens.
Alvitra-se, pretender a interessada, ao colocar em causa os rácios resultantes da correcções aritméticas efectuadas da Administração Tributária, concretamente a circunstância de desconsiderar custos com aquisição de sucata que alegadamente teve lugar, quando, concomitantemente, não desconsiderou os proveitos que a esses custos – rectius, à venda dessas mercadorias – andam objectivamente associados, demonstrar ter esta incorrido em erro na quantificação da matéria colectável.
Perscrutada a petição inicial, afigura-se ressaltar, quanto a esta questão, que a Impugnante não se conforma com o facto de as correcções no plano dos custos não terem sido conjugadas com correcções no plano dos proveitos respectivos, e consequentemente diminuídos os rácios delas resultantes, ou seja, a impetrante pugna no sentido de que a aceitar-se que aqueles custos não foram suportados, teria a Administração Fiscal que aceitar também a existência de outros custos com a aquisição de sucatas que justificassem os proveitos obtidos, ou, em alternativa, impunha-se que teria de aceitar que também os proveitos não foram aqueles, mas outros inferiores, o que constitui argumento suficiente para abalar a posição da Administração Tributária.
Ora, também aqui não perfilhamos o entendimento da Impugnante.
Como é sabido, o nosso sistema tributário, concretamente no que tange à avaliação da matéria tributável, deu uma manifesta preferência à avaliação directa, reservando para os casos e condições expressamente previstas na lei a possibilidade de a Administração Tributária lançar mão da avaliação indirecta (cfr. artigos 81º, nº1 e 85º da LGT).
O artigo 87º, nº1 da LGT consagra os casos em que pode ter lugar a avaliação indirecta, dispondo que a mesma só pode efectuar-se, entre outras hipóteses, perante a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto (cfr. alínea b, do nº1 do artigo 87º da LGT).
No caso sub judice, temos que a Impugnante contabilizou custos com base em facturas que, de acordo com a fundamentação da Administração Tributária, não correspondem a reais e efectivas transacções de bens entre o emitente das facturas e a impetrante, ou seja, estamos perante a contabilização, por parte da C..., Lda de facturas que ou não correspondem à efectiva transacção comercial com o agente que nelas figura como seu emitente, ou, tendo ocorrido não o foi pelo valor indicado na factura.
Destarte, a desconsideração de custos documentados em facturas a que não correspondem reais transmissões de bens e que, portanto, não foram efectivamente suportados, determina que os mesmos não possam reflectir-se negativamente na determinação da matéria colectável do sujeito passivo.
Esta não reflexão dos custos nas situações de facturação falsa, como ocorre no caso em apreço, basta-se com o recurso a correcções técnicas, por via das quais tais custos são, pura e simplesmente, desconsiderados.
Com efeito, in casu, é possível autonomizar e delimitar os factos, as transacções/operações simuladas, pelo que o apuramento da matéria colectável pode - e deve - fazer-se com base na contabilidade do contribuinte, procedendo-se à desconsideração desses mesmos custos nela registados, ou seja, lançar mão da avaliação directa da matéria tributável, via a que o legislador fiscal deu manifesta preferência no nosso ordenamento tributário. (…)”

E concordamos com o vertido na sentença recorrida. Saliente-se que, neste tipo de situações, em que se coloca a hipótese de estarmos perante uma situação de sobrefacturação ou de eventual prestação de serviços por entidades terceiras, a Recorrente manteve a sua posição inicial, reiterando a veracidade da respectiva contabilidade, matéria que, como se viu, não tem sustentação, o que significa que a conduta da Recorrente acaba por ter um efeito contraproducente, na medida em inviabiliza a ponderação dos custos inerentes, pois que, e com referência ao facto de os proveitos serem mantidos, o que no fundo, teria de ter repercussão em termos de custos, diga-se, como se aponta no Ac. deste Tribunal de 12-01-2006, Proc. nº 444/04, www.dgsi.pt, que a “utilização de métodos indiciários numa situação destas em que apenas se não consideram os custos por inexistência de operações correspectivas é que nos parece atentatória dos princípios anteriormente referidos e mais precisamente o da justiça, da legalidade e tributação do lucro real, já que por força do uso de tal método se relevariam custos inexistentes por impossibilidade de suporte dos mesmos, o que a lei não quer. (…), através do uso de métodos indirectos não pode a AF fixar matéria colectável diferente e mais elevada do que aquela que derivaria de uma avaliação directa ou objectiva. No caso dos autos dos factos provados não resulta impossibilidade alguma de comprovação da matéria colectável mas antes indícios sérios e objectivos de que as facturas discriminadas pelos SPIT não titulavam operações efectivamente realizadas sendo que o contribuinte não logrou provar a sua existência. Daí que face ao preceituado no art. 23.º do CIRC os custos delas constantes não possam ser relevados fiscalmente ou dito por outras palavras que não possa ser aceite a sua dedutibilidade.”(neste preciso sentido veja-se o citado ac deste TCAn no processo 450/09 BEPRT, supra identificado)

Também o acórdão proferido no processo 413/08.BEPRT, supra identificado) sobre situação idêntica se pronunciou…”Efectivamente a avaliação indireta tal como decorre do art. 87º, n.º1, da LGT é subsidiária da avaliação direta e a AT só pode proceder a essa avaliação nos casos e condições expressamente previstas na lei [art. 81º, n.º1 da LGT].
Sempre que se convoque a avaliação indireta por impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável apenas abrange os casos enquadráveis na al. b) do n.º1, do art. 87º, isto é, tal só pode resultar das anomalias e incorreções taxativamente indicadas nas várias alíneas do art. 88º da LGT, sendo que a desconsideração de faturas reputadas de falsas ou fictícias não entra no âmbito da referida norma.
Ao contrário do que pugna a Recorrente, nestes casos, a lei expressa e vinculadamente, manda que não sejam elegíveis os custos não comprovados, ou seja, os lançamentos contabilísticos não apoiados em documentos justificativos.
Não há um direito à presunção de custos por parte do utilizador de faturação falsa.
Por outro lado, a Recorrente, em momento algum, alegou que os comprovativos dos custos que, efetivamente, suportou foram emitidos por terceiros e não por aquele[es] com quem contratou a compra das mercadorias [sucata], de molde a poder fazer valer os custos que diz estarem associados aos proveitos, com a revenda de tais mercadoria; com recurso aquaisquer meios de prova admitidos em direito.
Por conseguinte, está afastada a tese de não aplicação do art. 23º, n.º1, do CIRC.”

Transpondo para os presentes autos a jurisprudência apresentada, sucumbem, também, nos presentes autos, as conclusões finais de recurso.
Destarte, soçobrando todas as conclusões de recurso, é de lhe negar provimento, mantendo-se a sentença na ordem jurídica.

III. Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Porto, 24 de Janeiro de 2017
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo