Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02316/08.9BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/17/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:João Beato Oliveira Sousa
Descritores:PDM; ARMAZÉM
Sumário:1 - O PDM de G... não poderia cumprir cabalmente a função prevista no artigo 1º do seu Regulamento - estabelecer “as regras e orientações a que deverá obedecer a ocupação, uso e transformação do solo no âmbito do Plano Director Municipal de G...” - se as mesmas ficassem “ab initio” enredadas nas minudências terminológicas e conceptuais das alterações legislativas que se foram sucedendo e, a seu tempo, presidiram à aprovação das construções pré-existentes.
2 – O PDM lida com realidades consumadas com as quais tem que compatibilizar as pretensões construtivas que ocorram na sua vigência.
3 - Considerando este imperativo legal, os dados da experiência e do bom senso apontam no sentido de descomprometer a expressão “lote” constante do referido Artigo 17º/3 do RPDMG com qualquer dos sentidos técnicos estritos que a expressão “lote” historicamente designou, associando-a antes num modo mais abrangente, sem deixar de ser operativamente delimitado e rigoroso, à noção de talhão, ou área de terreno autónoma para construção resultante de uma operação de divisão com essa finalidade de qualquer prédio, ou seja, como se diz na sentença constituída em “situações similares às operações de loteamento”. *
*Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:CMG
Recorrido 1:Ministério Público
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO

Município de G... veio interpor recurso do acórdão do TAF do Porto que, em conferência, decidiu indeferir a reclamação apresentada e, em consequência, manter a sentença reclamada que julgou procedente a presente acção administrativa especial instaurada pelo Ministério Público, em que figura como contra-interessada a sociedade L..., Ld.ª e , em consequência, declarou nulos os despachos proferidos pelo Presidente da Câmara Municipal de G... em 11/06/2002 e 10/10/2002, pelos quais foi aprovado, respectivamente, o projecto de arquitectura e o licenciamento da construção, constituída por armazém, a edificar na parcela B resultante do reparcelamento dos lotes n.ºs 20 e 21 do talhonamento autorizado em 14/08/1963, no âmbito do processo camarário n.º 19…/63, confinante actualmente com a Rua de S..., em RT, em G....

*

Em alegações o RECORRENTE formulou as seguintes conclusões:

CONCLUSÕES

1. Resulta da planta, aprovada em 14 de Agosto de 1963, a existência de 18 talhões destinados à habitação, tendo sido atribuída a numeração 19, 20 e 21 às restantes parcelas, ou seja, as parcelas 19, 20 e 21 não foram incluídas no talhonamento.

2. A confinar com prédio objecto do talhonamento foram construídos os armazéns em causa, estes situam-se num prédio urbano, num terreno para construção com área de 2000 m2, inscrito da matriz sob o número 13…, descrito na conservatória de Registo Predial de G... sob o n.º 31…, cfr fls 15 a 18 do p.a, ou seja, não se encontram inseridos num loteamento urbano.

3. Face ao exposto o Recorrente não pode concordar com a matéria assente na parte final do ponto 1.

4. O artigo 1 do Decreto-lei n.º 46673 menciona “entende-se por loteamento urbano, para efeito deste diploma, a operação ou o resultado da operação que tenha por objecto ou tenha tido por efeito a divisão em lotes de um ou vários prédios fundiários, situados em zonas urbanas ou rurais, para venda ou locação simultânea ou sucessiva e destinados à construção de habitações ou de estabelecimentos comerciais ou industriais.”

5. Ora e conforme já foi referido resulta da planta ao talhonamento, aprovada em 14 de Agosto de 1963, a existência de 18 talhões destinados à habitação, tendo sido atribuída a numeração 19, 20 e 21 às restantes parcelas, ou seja, a parcela de terreno onde se encontram inseridos os armazéns não tinha qualquer destino, correspondia a parcela restante do talhonamento, e não se destinava a venda ou locação simultânea ou sucessiva,

6. pelo que esse artigo não está preenchido.

7. O talhonamento criou 18 talhões, a restante parcela não faz parte do mesmo, isto porque está-se diante de um talhonamento parcial, ou seja, que não engloba a totalidade da área da parcela.

8. A admissibilidade do loteamento parcial estava prevista no artigo 1º do DL nº289/73, de 6 de Junho, ou seja, essa norma previa a possibilidade de operações urbanísticas que tinham por objecto ou simplesmente como efeito a divisão em lotes de parte da área de um determinado prédio.

9. Conforme refere Fernando Paula Oliveira - Regime Jurídico da Urbanização e Edificação comentado 2011 - “na nossa óptica, contudo, para que se possa afirmar estarmos perante um loteamento urbano, a existência do elemento “destino sucesso ou imediato para construções” dos novos prédios terá de ocorrer no momento da divisão fundiária e não posteriormente….Deste modo, consideramos, para que se possa afirmar estarmos perante um loteamento urbano, que o destino para construção (ainda que não imediato) tem de estar verificado no momento do fracionamento (ou reparcelamento) só assim estaremos na presença de lotes (novas unidade prediais destinadas a edificação).”

10. “Se a transformação fundiária não der origem a lotes, mas apenas a parcelas não destinadas imediatamente a edificação urbana, não estamos perante um loteamento”.

11. Face ao exposto a parcela de terreno em causa não pode ser considerada como um lote.

12. O legislador do PDM diferenciou os conceitos de “Lote” e “Parcela” de terreno.

13. “Lote” é a área de terreno resultante de uma operação de loteamento licenciada ou autorizada nos termos da lei, e “Parcela” é todo o terreno físico ou juridicamente autorizada, não resultante de uma operação de loteamento.

14. Ora, e uma vez que o n.º 3 do artigo 17 dispõe “…Só serão licenciadas construções em prédio autónomo desde que a frente do lote confrontante com a via de acesso seja igual ou superior à dimensão da fachada da construção principal correspondente, não sendo aceitáveis situações de interioridade, alinhamento e afastamento de fachada dissonantes dos existentes ou dos prevísseis, por força da configuração do terreno.”

15. O mesmo só se aplica às construções que se integrem num loteamento urbano,

16. Que não é o caso dos presentes autos.

17. Por outro lado, o artigo 18º do PDM consagra uma disciplina diversa da norma geral do artigo 17º PDM, para os licenciamentos industriais ou de armazéns, nomeadamente do n.º 3 do mencionado artigo, o que resulta do seu contexto e do facto de no mesmo normativo se mostrar regulado um sector restrito de relações que, atentas as suas particularidades, consagra um regime oposto ao da norma geral, por razões especiais privativas daquele sector.

18. As regras a aplicar aos presentes autos são as definidas no artigo 18º do RPDM

19. Este artigo define os índices, cércea e afastamentos, não estabelecendo nada sobre os alinhamentos, como o faz o n.º 3 do artigo 17º PDM para as restantes construções.

20. Nas zonas residenciais, como é caso dos presentes autos, a implantação de armazéns e indústrias no mesmo alinhamento das habitações não é aconselhável, a nível urbanístico, por alterar uma frente urbana de habitações com a interposição de fachadas de armazéns dissonantes, sendo preferível, que a nível urbanístico, a implantação seja interior relativamente às fachadas habitacionais, sendo esta a razão de ser da mencionada norma.

21. A alínea e) do n.º 1 do artigo 18 estabelece:

“Só é permitida a localização de indústrias, em cumprimento dos critério definidos do Decreto Regulamentar n.º 25/93 de 17 de Agosto, ou armazéns em área predominantemente residencial desde que:

e) Seja assegurado o afastamento mínimo da construção de 5 m ao limite da frente do lote e de 10 m ao limite posterior e ainda, apenas para as indústrias de classe C, de 5 m aos limites laterais.”

22. Apesar do recorrente considerar que a alínea em causa não se aplica aos presentes autos, uma vez que a norma faz referência a lote e conforme já foi referido o terreno não se insere no âmbito de um loteamento.

23. Mesmo que fosse de aplicar essa norma, o afastamento ao limite posterior, no local e no projecto, é de 10 metros.

24. Sucede que devido à forma irregular do terreno, a parte mais desfavorável da fachada foi implantada a 4,20 m ao limite posterior, a contra-interessada, apresentou um aditamento ao projecto onde, através de um acerto dos limites posteriores com o vizinho, possui a construção um afastamento de 15 metros do limite posterior, de acordo com a alínea e) do n.º1 do artigo 18º PDM.

25. Assim sendo o cumprimento dessa norma terá de ter em conta a implantação do edifício bem como o aditamento ao projecto supra referido.

26. Refere o Acórdão do STJ de 22 de Abril de 2001 “a demarcação pode ser feita por mero acordo verbal/extrajudicial. Esta, não constituindo “a se” um meio de aquisição da propriedade, poderá validamente ser feita por simples acordo verbal (artº. 219º do C. Civil)”.

27. Assim sendo e face ao acordo escrito de demarcação, o artigo 18º e) não foi violado devendo ser alterado a matéria de facto assente no ponto 11.

28. A alínea c) do artigo 18º menciona:

“Só é permitida a localização de industrias, em cumprimento dos critério definidos do Decreto Regulamentar n.º 25/93 de 17 de Agosto, ou armazéns em área predominantemente residencial desde que:

C) A cércea máxima não ultrapasse os 6 metros, excepto por questões técnicas devidamente justificadas”

29. O Recorrente alega que a cércea é inferior a 6 metros,

30. Contudo o tribunal considerou que a mesma é superior.

31. Sucede que se a matéria se encontra controvertida, não poderia ter sido dada como provada,

32. Como ocorreu nos presentes autos

33. Acrescenta ainda o Tribunal a quo que uma vez que não foi impugnado o despacho proferido em 20/03/2009 o recorrente aceitou a inexistência de factualidade controvertida.

34. Ora carece de qualquer fundamento o supra mencionado, isto porque o n.º 4 do artigo 83 CPTA dispõe “…a falta de contestação ou a falta nela de impugnação especifica não importa a confissão dos factos articulados pelo Autor, mas o tribunal aprecia livremente essa conduta para efeitos probatórios”, acrescentado o artigo 342 do CC que “àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direto alegado”.

35. Assim sendo e uma vez que cabia ao MP provar os factos, não fazia sentido ser o recorrente a provar a legalidade o acto em causa, se não há factualidade controvertida, o tribunal a quo não podia dar como provado facto que a cércea é superior a 6 metros, uma vez que o Recorrente impugnou tal facto.

36. Por outro lado e conforme é referido pelo tribunal a quo, se o que está em causa é uma subsunção jurídica, o Tribunal não poderia dar como provado um facto sem resolver “juridicamente” como deve ser medida a cércea, e sendo uma definição de direito em nada se relaciona com a produção (ou não produção) de prova.

37. Face ao exposto a sentença recorrida sofre do vício de erro de julgamento sobre a matéria de facto nos pontos 1 (2ª parte), 10 e 11.

38. E erro de julgamento de direito, uma vez que viola o disposto no nos artigo 229º CC, artigo 17º e 18º PDM.

TERMOS EM QUE, DEVE O ACORDAO RECORRIDO SER REVOGADO, COM TODAS AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, COMO É DE JUSTIÇA.


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Contra-alegando o RECORRIDO concluiu:

1 – Inexiste vício de erro de julgamento sobre a matéria de facto nos pontos 1 (2ª parte), 10 e 11 da douta sentença, pois:

a) O talhonamento foi efetuado uma década antes da publicação do DL 289/73 e do teor dos documentos juntos resulta que operação de divisão do terreno efetuada em 1963 - altura em que ainda não estava instituída legislação atinente às operações de loteamento - da área indicada na ação em 21 terrenos ou talhões, sendo 18 para construção e três (nºs 19, 20 e 21) sem destino definido, como, aliás, (pelo menos) implicitamente a Recorrente aceita conforme ponto 5 das suas conclusões.

b) A Ré recorrente nada juntou ou indicou, no que à cércea respeita, que fosse capaz de abalar quer o teor dos documentos juntos quer a evidente concludência resultante desses documentos dos autos e plasmada nas referidas sentença e acórdão, pelo que não se nos mostra que o decidido neste âmbito mereça qualquer reparo, não tendo havido, destarte, desrespeito por qualquer normativo como o artº 83º, nº4 do CPTA ou 342º do CC mas a mera constatação de que a Ré nada disse quanto ao despacho de 29.03.2009, aceitando «a inexistência de factualidade controvertida que determinasse a elaboração de base instrutória e produção de outro meio de prova para além da documental»;

c) No que concerne ao ponto 11 da factualidade considerada provada, afigura-se-nos indubitavelmente como certo que das plantas de construção dos dois armazéns, em escala de 1/200, decorre o afastamento às estremas aí discriminados, pelo que nada há corrigir, anotar ou aditar a esse ponto, atendendo, desde logo, à matéria provada constante dos pontos 25 a 27;

2 – Não existe, por parte da decisão recorrida, qualquer erro de julgamento de direito, não acontecendo, assim, violação do disposto nos artigo 229° CC, artº 17° e 18° do RPDM de G..., pois:

a) Estando a construção em causa numa área predominantemente residencial, atento o disposto no artº 15º do RPDM, há necessariamente que ter em atenção o regrado no artº 17º, nº3, que expressamente submete os estabelecimentos e armazéns industriais - em área predominantemente habitacional - às condições de edificabilidade exigidas para o local, e à compatibilidade com a actividade habitacional, pelo que apenas poderão ser licenciadas construções desde que satisfeito o aí exigido;

b) No artº 18.º estabelecem-se, em suma, particularidades para a edificação de estabelecimentos e armazéns industriais, adaptando o regime geral de edificabilidade da secção (predominantemente residencial) em que se integra, reificando-se, assim, a concreta necessidade de integrar e compatibilizar os armazéns ou estabelecimentos industriais com o uso dominante (residencial) da área em que insere;

c) Aliás, a edificabilidade de instalações industrias ou armazéns em área predominantemente residencial é regulada pela generalidade das disposições da secção II do Capítulo III do RPDM - artºs 15º a 22º - tendo sempre em conta as regras especiais previstas no artº 18º;

d) Para a teleologia das normas em questão - artºs 17º nº3, e 18º, n.º 1, al. e), do RPDM, a circunstância de se tratar de um «lote», «de mera parcela» ou de «talhão» mostra-se-nos indiferente, pois, atenta a finalidade destas normas, não se vislumbra razão, motivo ou sentido para a dispensa de aplicação dos condicionamentos relativos à integração dos estabelecimentos e armazéns industriais situados em área predominantemente habitacional para o caso de inexistência de uma operação de loteamento; e

e) Mostra-se, no que à cércea respeita, a existência de desconformidade com o legalmente permitido, por ser superior a 6 metros - v. artº 18º nº1, al. c), do RPDM.

3 - Por conseguinte, deve o recurso interposto pela Ré ser rejeitado e confirmada nos seus precisos termos a douta decisão recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça.


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As questões a resolver consistem em apurar se existem os erros de julgamento em matéria de facto e de direito apontados ao acórdão recorrido nas conclusões da Recorrente, que, de resto, persiste em apontar ao acto impugnado a violação das normas previstas no artigo 17º/3 e 18º/1/c) e e) do PDM de G....

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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em termos de Fundamentação de Facto o acórdão recorrido remete para a sentença reclamada, onde se consigna o seguinte:

Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:

1. Foi aprovado em 14 de Agosto de 1963, pela Câmara Municipal de G..., uma operação de divisão de um terreno da Castanheira, em RT, designada como talhonamento (proc. n.º 1933/63), resultando na constituição de 21 terrenos: 18 para construção e três (n.º 19, n.º 20 e n.º 21) sem destino definido – cfr. fls. 13 a 15 dos autos.

2. A Câmara Municipal de G... em 8 de Março de 1973 deliberou nos seguintes termos:
“A Câmara Municipal de G..., em face do exposto e dos pareceres emitidos, deliberou por unanimidade aprovar a alteração introduzida no loteamento em referência, isto é com a criação de mais três lotes” – cfr. fls. 85 dos autos.


3. Em 8 de Março de 1973 foi pela Câmara Municipal de G... proferido o seguinte parecer:
“LOTEAMENTO DE UM TERRENO SITO NA RUA DA CASTANHEIRA - RT - EM QUE FIGURA COMO REQUERENTE A SENHORA D. MAFAF E QUE JÁ FOI APROVADO POR ESTA CÂMARA MUNICIPAL EM SUA REUNIÃO REALIZADA EM 14 DE AGOSTO DE 1963 - ALTERAÇÃO DO LOTEAMENTO COM A AMPLIAÇÃO COM MAIS TRES LOTES

Foi presente o processo de loteamento de um terreno sito na Rua da Castanheira - RT - em que figura como requerente a Senhora D. MAFAF e que já foi aprovado por esta Câmara Municipal em sua reunião realizada em 14 de Agosto de 1963.

Transcreve-se, para os devidos efeitos, o requerimento junto ao referido processo a fIs. 24. do teor seguinte:

"EMAF, residente na Rua …, actual proprietário da parcela A do loteamento aprovado em 14 de Agosto de 1963 em nome de MAFAF (herdeiros de Dr. EF) já devidamente executado no Lugar da Castanheira da freguesia de RT, vem em aditamento apresentar a V. Excia. a localização do terreno para o Posto de Transformação e acesso, bem como a mancha de construção para o Lote n.º 19.".

A informação prestada pelos Serviços Municipalizados de Eletricidade e Água desta Câmara Municipal é do teor seguinte (fls. 26):

"Com referência ao ofício de V o Exª. acima indicado, cumpre-me informar que estes Serviços nada têm a objectar quanto ao plano de urbanização apresentado, porquanto na zona em causa já existe rede eléctrica, cuja remodelação e reforço está previsto e incluído no plano de obras para 1973."

O parecer emitido pela Comissão de Arte e Arqueologia é do teor seguinte: (fls. 29)

A Comissão, actuando dentro do artº. 2º.-1 do Decreto-Lei nº 46 673, é de parecer que nada impede a construção do aditamento ao loteamento já aprovado desde que se integre na construção global.

O parecer emitido pelos Serviços de Urbanização deste distrito é do teor seguinte: (fIs. 32)

“ - O loteamento foi aprovado em data anterior à publicação do Decreto-Lei nº. 46 673 de 29/11/65 que determina a audiência destes Serviços.

- A alteração proposta é decorrente da localização dum posto de transformação de energia eléctrica, ajustamento de alguns lotes., e rectificação duma parcela de terreno, permitindo a implantação de um bloco de 3 prédios dentro do critério adoptado para o loteamento em causa.

- Assim, considerando os antecedentes e dado que é mantida a composição global do loteamento, julga-se não haver inconveniente no deferimento da pretensão.” (…)” – cfr. fls 87 e 88 dos autos.

4. Com o aditamento descrito em 2., foram introduzidas modificações ao terreno n.° 19, passando este a compreender três terrenos para edificação, o 19a, 19b e 19c.

5. Da operação identificada em 2., resultou o reparcelamento dos terrenos n. ° 20 e 21, dando origem a três novos terrenos, denominados A, B, e C.

6. A operação de divisão descrita em 1. e 2. – terreno B - corresponde à área onde se insere o actual artigo inscrito na matriz predial urbana sob o n.º 13… descrita na Conservatória do Registo Predial de G... sob o número 31… – cfr. fls. 167 do processo administrativo (pa) junto aos autos.

7. Em 18 de Outubro de 2001, no Cartório Notarial de G... foi lavrada escritura pública de “Compra e Venda” entre MTAMPSS e a aqui contra-interessada, em que a primeira outorgante declarou vender “parcela de terreno, destinada a construção, com a área de dois mil metros quadrados, sita na Travessa da Castanheira”, e inscrita na matriz sob o artigo 13… e descrita na Conservatória do registo Predial de G... sob o número 31… – cfr. fls. 15 a 18 e 130 do pa junto aos autos.

8. Em 21 de Janeiro de 2002, a Contra-Interessada apresentou projecto de licenciamento para a construção de dois armazéns em terreno que possui na Rua do S..., freguesia de RT – cfr. fls. 19 do pa junto aos autos.

9. Do projecto de licenciamento apresentado e referenciado em 8., consta memória descritiva com o seguinte teor:


“MEMÓRIA DESCRITIVA

Refere-se a presente memória ao projecto de arquitectura para a construção de dois armazéns que a firma L..., Lda. Pretende levar a efeito na Rua do S... em RT.

O terreno tem acesso à via pública através de uma passagem com cerca de 8m, desenvolvendo-se na sua maior parte numa bolsa interior situada nas traseiras das habitações contíguas, ou seja, do ponto de vista urbanístico será a solução mais favorável, pois está garantido o acesso à via pública e a volumetria foi remetida para um segundo plano, no interior do quarteirão.

A solução adoptada de germinar o conjunto no seu flanco Poente, baseia-se num acordo já estabelecido com o proprietário meante, para o que será apresentada a respectiva anuência. Relativamente aos afastamentos laterais foram previstos grandes espaços de aparcamento e circulação exterior.

A proposta consiste na construção de dois armazéns, sendo um com 550m2 e o outro com 406m2. Ambos os armazéns possuem uma área de apoio constituída por sanitário masculino e feminino, dotados de duche e uma área de arrumes. Num piso superior será prevista uma área de escritórios com apoio de um outro sanitário. Ambos os pisos da área de apoio têm 3m de pé direito, tendo a restante área do armazém 6m de altura. (…)” – cfr. fls, 11 do pa junto aos autos.

10. Com o projecto identificado em 9. foram juntas plantas da construção de dois armazéns, sendo a cércea, medida em planta de 6,20m – cfr. fls. 1 do pa junto aos autos.

11. Das plantas da construção dos dois armazéns, em escala de 1/200, decorre o afastamento às estremas, em que o corpo “A” dista a Norte 6,6m, a Sul entre 4,8 e 10m, a Nascente entre 22 e 30m, a Ponte 0m e o armazém “B” dista entre 5 e 12m a Norte, entre 6,4 e 9,1m a Sul, entre 6 e 15m a Nascente e 20m a Poente – cfr. fls. 3 do pa junto aos autos.

12. A construção do prédio em causa, encontra-se integrado em zona classificada como “área predominantemente residencial”.
13. Em 11 de Março de 2002, a Câmara Municipal de G... comunicou à aqui contra-interessada, através do ofício n.º 000726 o seguinte:
“Assunto: CONSTRUÇÃO DE 2 ARMAZENS

Local da Obra: Rua do S... – RT

Proc. N.º 271/02 Requ. N.º 271/02

Por meu despacho de 4/2/02, foi indeferido o processo acima referenciado, com base na alínea a) do n.º 1 do art.º 24° do Dec. Lei 555/99 de 16 de Dezembro, com nova redacção dada pelo Dec. Lei 177/01 de 4 de Junho, por contrariar o disposto no n.º 3 do art.º 17 (situação de interioridade) e a alínea e) do n.º 1 do art.º 18 (afastamento mínimo de 5m aos limites laterais e de 10m ao limite posterior), do P.D.M..
Mais informo que, o art.º 15° do P.D.M., permite a implementação de outros usos, para além de residencial, desde que integrados nas condições de edificabilidade exigidas para o local. Estas condições estão definidas no art.º 17°, nomeadamente no seu n.º 3, não permite situações de interioridade.
O art.º 18° permite armazéns e indústrias em áreas residenciais, mas com condicionantes, sem contudo que esteja sujeita à aplicabilidade dos artigos anteriores, ou seja o art.º 17º do P.D.M.. (…)” – cfr. fls. 23 do pa junto aos autos.

14. Por exposição de 10 de Março de 2002, a Contra-Interessada requereu novamente à Câmara Municipal de G... o deferimento da sua pretensão – cr. Fls. 25 do pa junto aos autos.
15. Em 3 de Maio de 2002, foi proferido pela Chefe de Divisão da Divisão Jurídica da Câmara Municipal de G... o parecer n.º 133/02 nos seguintes termos:


“PARECER N° 133/02
ASSUNTO: INTERPRETAÇÃO DO RPDM - ARTIGOS 17° E 18° L..., Lda.
O PEDIDO
Como decorre da informação técnica de 3.4.02, a requerente vem solicitar de novo o deferimento da sua pretensão, invocando:
«- A interpretação do articulado do PDM (art. 17° e 18°)
- O PU prever a abertura de um arruamento na parte posterior do terreno.»
A RESPOSTA
1 - No requerimento entrado nesta câmara em 2.3.19, a requerente vem dizer em abono da sua pretensão:
- que o artigo 17° não se aplica aos armazéns, dando-se a título de exemplo o caso da determinação da área de construção permitida, em que não se aplicam os índices de utilização do artigo 17°, mas sim os do artigo 18º.
- Que o regulamento do plano de urbanização de RT não é tão restritivo, estando previsto um arruamento que irá confinar com o terreno, deixando a construção de ser interior.
- Que o afastamento lateral de 5 metros apenas é de exigir para as indústrias de classe C, o que não é o caso da pretensão.
2 - Por ofício expedido em 11.3.02 foi a requerente notificada do indeferimento do seu pedido, porque contraria o artigo 17° nº 3 e a alínea e) do nº 1 do artigo 18°.
3 - Nos termos do artigo 15° do RPDM permite-se em área predominantemente residencial a instalação de actividades complementares, desde que "...compatíveis com a actividade residencial e estejam integradas nas condições de edificabilidade exigidas para o local."
4 - E, no artigo 18º do referido RPDM, definem-se as condições que devem observar o licenciamento de industrias e armazéns, as quais só são admitidas desde que cumpridos os requisitos ali expressamente previstos.
5 - Assim, no artigo referido e que regula o licenciamento dos armazéns, não são proibidas as situações de interioridade, não parecendo portanto de aplicar o nº 3 do artigo 17° do RPDM.
6 - Já no tocante à alínea e) do nº 1 do artigo 18° do regulamento referido só é de aplicar o afastamento lateral de 5 metros para as indústrias classe C e não para os armazéns pretendidos.
CONCLUSÕES
A - Face ao exposto, sou de parecer que assiste razão à requerente, não sendo portanto de aplicar ao licenciamento pretendido o nº 3 do artigo 17° do RPDM, mas somente as condições exigidas e constantes do artigo 18° do regulamento referido.
B - Parece ainda não ser de assegurar o afastamento lateral de 5 metros, o qual só se aplica às indústrias da classe C - artigo 18° nº 1 aI. e) do RPDM.
C - Termos em que, parece de praticar um novo acto administrativo que acautele a pretensão da requerente, revogando-se assim, implicitamente o acto de 4.3.02 e notificado por oficio expedido em 11.3.02.
D - Fica deste modo prejudicada a apreciação da apreciação do invocado Regulamento do Plano de Urbanização de RT, que ainda não está em vigor e que por isso não é de atender, em obediência ao princípio "tempus regit actus" - os actos administrativos regem-se pela lei ou regulamento existente à data da sua prática. (…)” – cfr. fls. 27 a 29 do pa junto aos autos.

16. Por despacho do Presidente da Câmara de G... foi aprovado em 11 de Junho de 2002, no âmbito do processo n.º 271/02, a construção dos dois armazéns – cfr. fls. 4 do processo n.º 271/02, anexas ao pa junto aos autos.

17. Por ofício n.º 001716 de 14 de Junho de 2002 da Câmara Municipal de G..., foi comunicado à aqui Contra-Interessada a aprovação do projecto descrito em 8. – cfr. fls. 30 do pa junto aos autos.

18. Por despacho do Presidente da Câmara de G... de 10 de Outubro de 2002, foi aprovado o licenciamento da construção – cfr. fls. 4 do processo n.º 271/02, anexas ao pa junto aos autos.

19. Em 8 de Novembro de 2002 foi emitido pela Câmara Municipal de G... o “Alvará de Obras de Construção n.º 308/02”, com o seguinte teor:

PROCESSO N° 271/02

Nos termos do artigo 74° do Decreto-Lei N° 555/99, de 16 de Dezembro, é emitido o Alvará de licenciamento de obras de construção N° 30…/02 em nome de L..., LDA, Contribuinte nº 5…, que titula a aprovação das obras que incidem sobre o prédio sito em RUA DE S..., da freguesia de RT, descrito na Conservatória do Registo Predial de G..., sob o nº 03187/08… e inscrito na matriz Urbana, sob o artigo 138… da respectiva freguesia.

As obras, aprovadas por despacho de 11 de JUNHO de 2002, respeitam o disposto no Plano Director Municipal e apresentam as seguintes características:

Área de Construção: 1065 m2.

Área de implantação: 960,00 m2.

Volume de construção: 5760 m3.

N° de Pisos: 2 acima e 0 abaixo da cota de soleira.

Cércea: 6 metros de altura

Uso a que se destina a edificação: CONSTRUÇÃO DE DOIS ARMAZENS NO LOCAL ACIMA MENCIONADO.

CONDICIONAMENTOS DAS OBRAS:

Quaisquer intervenções em zonas do domínio público nomeadamente, passeios ou arruamentos não poderão ser efectuadas sem prévia autorização da Câmara.

- Não deve dar início à obra, sem que o pedido de alinhamento e cotas de soleira seja verificado pela Câmara.

PRAZO DE VALIDADE DA LICENÇA: Início em 2002/11/08; Termo: 2003/11/08.

Dado e passado para que sirva de título ao requerente e para todos os efeitos prescritos no Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro. (…)” – cfr. fls. 50 do pa junto aos autos.

20. A construção dos armazéns a que corresponde o processo n.º 271/2002, com o alvará 308/2002 foi implantada na parcela B, não confrontando directamente com a Rua do S..., dispondo de uma via de acesso para esse arruamento - cfr. fls. 167 do pa junto aos autos.
21. Em 25 de Novembro de 2004 a Câmara Municipal de G... remeteu à contra-interessada o ofício n.º 003970 com o seguinte teor:

“ Assunto: CONSTRUÇÃO DE ARMAZÉNS - NOTIFICAÇÃO.

Local da Obra: RUA DE S... - RT •
Proc. N°.: 271/02 Requer. N°.: 271/02
Constatou-se através das queixas apresentadas pelos moradores junto da Provedoria de Justiça e Inspecção-geral da Administração do Território, que o afastamento posterior dos armazéns não é de 10m em todos os pontos.
Nesta conformidade e nos termos do despacho de 23111/2004 do Exm". Presidente, ficam desde já notificados para, no prazo máximo de 30 dias a contar da data de recepção da presente comunicação, procederem às necessárias correcções para que seja cumprido na íntegra a alínea e) do nº. 1 do art.18 do Regulamento do Plano Director Municipal. (…)” – cfr. fls. 83 do pa junto aos autos.

Em 10 de Março de 2005, a Câmara Municipal de G... procedeu ao embargo da obra nos seguintes termos:


“AUTO DE EMBARGO

Aos dez dias do mês de Março de dois mil e cinco, pelas 16.00 horas, na sequência do despacho de 09/03/2005, do Sr. Presidente da Câmara Municipal, onde eu, VMTP, com residência profissional na sede desta Câmara Municipal de G... (Repartição Administrativa de RT), freguesia de RT, procedi, nos termos e para os efeitos do art.º 102.° e para os efeitos do art.º 103.° do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações do Decreto-Lei n." 17712001 de 04 de Junho, à notificação de LC, representante legal da firma L... - EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA., com sede na Rua …, freguesia de RT, Concelho de G..., na qualidade de proprietária, do embargo total da obra de construção de dois armazéns, sita na Rua de S..., n.º 199, freguesia de RT, deste Concelho, o que se formaliza com este auto e a entrega do duplicado ao notificado.

Fica ainda notificado para proceder à imediata suspensão dos trabalhos de execução da obra, sob pena de, em caso de incumprimento, o notificado incorrer em crime de desobediência, previsto e punido pelo art.º 348.° do Código Penal, de acordo com o prescrito no art.º 100.° do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações do Decreto-Lei n." 177/2001 de 04 de Junho, e, independentemente da responsabilidade criminal, da selagem do estaleiro da obra e do equipamento que se encontrar no local e que estiver a ser utilizado no local e que estiver a ser usado em desobediência, nos termos do art. 107.° do diploma citado.

Será ainda interdito o fornecimento de energia eléctrica, gás e água à obra embargada, nos termos do n.º 3 do art.º 103.° do mesmo Diploma, e comunicada a ordem de embargo à Conservatória do Registo Predial (nº" 8 do art.º 102.°) para o necessário averbamento.

Verifica-se que a obra executada viola o disposto na alínea a), n.º 1 do art.º 98.° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro com as alterações do Decreto-Lei n." 177/2001 de 04 de Junho, encontrando-se no seguinte estado:

Verifica-se que o prédio, referente ao processo de construção n.º 271/02, se encontra em execução, nomeadamente com a colocação de portões e janelas, execução do pavimento do logradouro e colocação de revestimento exterior, tudo sem que possuísse a necessária licença camarária válida, dado o Alvará de Obras de Construção n.º 30…/02 se encontrar caducado desde 08 de Maio de 2004. (a firma requereu uma prorrogação de licença especial apenas para acabamentos indeferida com base no n.º 3 do art.º 53.0 do Decreto-Lei n." 555/99 de 16 de Dezembro). (…)” – cfr. fls. 93 do apa junto aos autos.

22. Em 18 de Março de 2005, a Câmara Municipal de G... remeteu à aqui contra-interessada o ofício n.º 000812 com o seguinte teor:

“Assunto: EMBARGO - NOTIFICAÇÃO.
Local da Obra: RUA DE S..., - RT
Proc. N°.: 271/02 Requer. N°.: 271/02
Nos termos do despacho de 09/03/2005 do Exmº. Sr. Presidente, e ao abrigo do disposto no nr.2 do art. 102 do Dec. Lei nr.555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Dec. Lei nr. 177/2001, de 04 de Junho, ficam Vªs. Exªs. notificados de que foi embargada a obra que está a ser executada no local acima referenciado, até resolução posterior, conforme auto de embargo que se anexa por fotocópia, uma vez que não estavam munidos de alvará válido para o efeito.
A continuação dos trabalhos, sujeita Vªs. Exas. às penalidades previstas na Lei, nomeadamente no art. 100, nr.1 daquele diploma e constitui crime de desobediência nos termos do art.348 do Código Penal.

Nesta conformidade deverão Vªs. Exªs., no prazo máximo de 30 dias a contar da data de recepção da presente comunicação, proceder às necessárias correcções para que seja cumprido na íntegra o disposto na alínea e) do nr. 1, art.18 do Regulamento do Plano Director Municipal, uma vez que se constatou que o afastamento posterior dos armazéns não é de 10m em todos os pontos. (…)” – cfr. fls. 118 do pa junto aos autos.

23. A Chefe de Divisão Jurídica da Câmara Municipal de G... proferiu em 11 de Abril de 2005, o parecer n.º 119/05 nos seguintes termos:


“PARECER N° 119/05

ASSUNTO: Levantamento do embargo
Local da obra: Rua de S..., 199 - RT L..., Lda.
Proc. n° 271/02

OS FACTOS

1 - Vem solicitado parecer sobre o requerimento registado sob o n° 104…, de 14 de Março de 2005, do qual resulta, em síntese, o seguinte:

Que, a requerente foi notificada do Auto de Embargo total da construção de dois armazéns, bem como para proceder à imediata suspensão dos trabalhos;

Que, considera tal decisão injusta e ilegal;

Que, a decisão se fundamenta na violação do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 98° do DL 555/99, de 16 de Dezembro, " ... dado que o alvará de obras de Construção se encontra caducado desde 8 de Maio de 2004", o que não corresponde à verdade;

Que, o alvará, de facto, caducava na referida data e nessa conformidade a requerente requereu em 6 de Julho de 2004 licença especial para conclusão da obra;

Que, em 5 de Janeiro de 2005, a requerente tomou conhecimento que a CM fazia subordinar o aludido pedido de prorrogação a determinadas condições e só nessa data foi notificada de que a licença especial ficava pendente do cumprimento da notificação de 25 de Novembro de 2004, registada sob o nº 3970;

Que, da referida notificação resultava que o afastamento posterior dos armazéns não era de 10 metros em todos os pontos e para no prazo de 30 dias proceder às necessárias correcções para dar cumprimento integral à alo e) do n° 1 do artigo 180 do RPDM;

Que, a licença especial para a conclusão da obra foi requerida em 6 de Julho de 2004 e que a mesma terá sido deferida tacitamente dado que a Câmara só se pronunciou seis meses depois;

Que, nos referidos termos, termina por requerer o imediato levantamento do embargo, por ser injusto e ilegal.

2 - No processo de construção verifica-se:

Que, foi emitido o alvará de obras de construção n° 308/02, cujo prazo de validade teve o seu início em 2002/11/08 e termo em 2003/11/08 e que foi prorrogada por 6 meses, conforme despacho de 2003/11/17;

Que, por requerimento registado sob o nº 1700, de 4 de Maio de 2004, foi requerida a prorrogação da licença por mais 1 ano, pelo facto da obra ainda não estar concluída, sobre o qual recaiu o despacho do Sr. Presidente da Câmara, de 31 de Maio de 2004, o que foi notificado requerente em 4 de Junho de 2004, e cujo teor é no sentido de que é " ... intenção desta Câmara indeferir o pedido de prorrogação de licença, uma vez que de acordo com o disposto no n° 3 do artigo 530 do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, a segunda prorrogação se destina a obras em fase de acabamentos.";

Que, posteriormente, em 7 de Julho de 2004, foi requerida licença especial para conclusão da obra pelo prazo de 6 meses, por a obra se encontrar em fase de acabamentos;

Que, pelo oficio n° 3970, de 25 de Novembro de 2004, foi a requerente notificada, para no prazo de 30 dias proceder às necessárias correcções por forma a dar cumprimento à al. e) do n° 1 do artigo 18° do RPDM, dado que o afastamento posterior dos armazéns não é de dez metros em todos os pontos.

Que, por ofício registado sob o n° 4208, de 15 de Dezembro de 2004, foi a requerente notificada no sentido de que a licença especial para conclusão da obra ficaria pendente do cumprimento da notificação referida na alínea anterior, sob pena de embargo total da obra, notificação que, em virtude de não ter sido recebida por via postal, foi remetida à Policia Municipal e que se consumou em 2 de Março de 2005, como melhor consta da respectiva certidão;

Que, em 10 de Março de 2005, foi levantado auto de embargo à obra, notificado por carta registada com A/R, oficio n° 812, de 18 de Março de 2005, por a execução da obra ter continuado, apesar do alvará ter caducado em 8 de Maio de 2004.

Sendo estes os factos mais relevantes importa agora fazer a sua subsunção ao direito aplicável.

O DIREITO

3 - Encerra, desde já, o presente processo duas questões de direito, que importa dilucidar para apurarmos se assiste ou não razão à requerente. São elas:

1 - A violação da al. e) do artigo 18° do RPDM

2 - O alegado deferimento tácito

Quanto à violação do Regulamento do Plano Director Municipal

Prevê a al. e) do n° 1 do artigo 18° do RPDM que "seja assegurado o afastamento mínimo da construção de 5m ao limite da frente do lote e de 10 metros ao limite posterior. .. "

E, conforme se mostra informado, tecnicamente, a construção não respeita, em todos os pontos, o referido afastamento de 10 metros, facto que é, expressamente, aceite pela requerente no requerimento ora em apreciação.

Assim, a circunstância da construção não respeitar o afastamento posterior dos 10 metros, "em todos os pontos", determina que a mesma viola a norma regulamentar acima identificada e inserta no respectivo Plano Director Municipal de G..., a qual é directamente aplicável à construção da requerente.

E, o facto da construção ter sido aprovada e licenciada, não impede, legalmente, que a violação em análise, seja, posteriormente, reparada, quando se constate que a mesma não está conforme com o Plano Director Municipal.

Neste sentido, determina o n° 2 do artigo 101° do DL 380/99, de 22 de Setembro, que "A conformidade dos actos praticados com os instrumentos de gestão territorial aplicáveis é condição da respectiva validade."

Por isso, o acto administrativo de aprovação e licenciamento, porque violador da al. e) do n° 1 do artigo 18° do Regulamento do Plano Directo Municipal de G..., é inválido, e como decorre, expressamente, do artigo 103° do DL 380/99, de 22 de Setembro, tal invalidade é sancionada com a nulidade, que dispõe,

"São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável."

E, os actos nulos, nos termos do artigo 134° do Código do Procedimento administrativo, aprovado pelo DL 442/91, de 15 de Novembro, não produzem quaisquer efeitos jurídicos, sendo que a nulidade dos mesmos é invocável a todo o tempo e pode, também, ser declarada a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou tribunal.

Assim, parece-nos de declarar a nulidade do acto administrativo de aprovação e licenciamento, com fundamento na al. e) do n° 1 do artigo 18° do RPDMG.

Chegados aqui, isto é, após a declaração de nulidade do acto administrativo, vemo-nos confrontados com uma operação urbanística realizada ao abrigo de um acto de licenciamento nulo, porque violador de uma norma regulamentar em vigor, para a qual a lei prevê como "possível" a demolição e reposição de terreno, nos termos do artigo 106º do DL 555/99, de 16 de Dezembro.

Contudo, tal como tem sido reconhecido, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, a demolição terá que ser sempre considerada como a ultima ratio, presumindo-se que em cumprimento do referido principio, foi a requerente notificada em 2 de Março de 2005, para em 30 dias proceder às correcções necessárias para dar cumprimento à disposição regulamentar do Plano Director Municipal.

Assim, por força do referido principio e da impugnação apresentada, terá que ser novamente notificada a requerente, dando-se-lhe um novo prazo para cumprimento da notificação referida no parágrafo anterior, sob pena de, findo aquele prazo, e em caso de incumprimento, ser ordenada a demolição da operação urbanística. Paralelamente, deve ser reformulado o embargo decretado, com indicação da fundamentação de facto e de direito, em conformidade com este parecer.

De salientar que, a legalização da operação urbanística, implica, sempre, a prática de um novo acto administrativo, atendendo ao principio da insanabilidade dos a. a. nulos.

A este propósito refere-se, José Manuel da S. Santos Botelho e Outros, in Código do Procedimento Administrativo, pág. 625, " o acto nulo não é susceptível de se tornar em acto válido por qualquer forma de convalidação" e "a declaração de nulidade produz efeitos "ex tunc, ou seja, tem efeitos declarativos e retroage à data da prática do acto; o acto é nulo "ab initio".

Quanto ao alegado deferimento tácito

Refere, a requerente que o seu requerimento de 7 de Julho, e não de 6 de Julho, se mostra deferido tacitamente. Vejamos se lhe assiste razão.

"Ab initio", e por força do referido quanto à invalidade e consequente nulidade do acto de aprovação e licenciamento dos armazéns, em virtude deste violar a al. e) do n° 1 do artigo 18° de RPDMG, mostra-se prejudicada a apreciação do deferimento tácito invocado, atendendo a que os actos nulos não produzem quaisquer efeitos jurídicos, (veja-se neste sentido o n° 1 do artigo 134° do CPA).

Assim, padecendo de nulidade o acto administrativo que aprovou a construção dos armazéns, são nulos todos os demais actos que tenham sido praticados no âmbito do mesmo procedimento administrativo.

"A nulidade de um acto administrativo acarreta a nulidade dos actos consequentes." Ac. do STA de 2 de Outubro de 1998, publicado in Acórdãos Doutrinais, 329, 667

CONCLUSÕES

A - O acto de aprovação e licenciamento dos armazéns, como informado tecnicamente, não está em conformidade com o estatuído na al. e) do n° 1 do artigo 18° do RPDMG, porque não se mostra assegurado, em todos os pontos, o afastamento ali exigido.

B - A desconformidade existente determina a invalidade do acto em apreciação, a qual é sancionada com a nulidade, nos termos do artigo 103° do DL 380/99, de 22 de Setembro, parecendo-nos, assim, de declarar a nulidade do a. que aprovou a construção dos armazéns, nos termos do artigo 134° do CP A.

C - Por isso que, sendo o acto administrativo que aprovou e licenciou a construção nulo e considerando que a nulidade de um acto administrativo acarreta a nulidade dos actos consequentes, não tem razão a requerente ao invocar o deferimento tácito da licença especial para a conclusão da obra.

D - E, quanto ao embargo decretado, o mesmo parece de manter, mas com reformulação dos seus fundamentos, quer de facto, quer de direito, em conformidade com o referido no corpo deste parecer.

E - Por último, atendendo a que o acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos na ordem jurídica, parece-nos que a consequência natural da situação de nulidade, após a declaração de nulidade do a. a. praticado é a destruição das situações de facto daí decorrentes, o que significa por dizer a demolição das operações urbanísticas executadas. Só assim não será, e por força do princípio já instituído no ordenamento jurídico de que a demolição é a "ultima ratio", se a requerente der cumprimento ao ofício recebido em 2 de Março de 2005, o que lhe deverá ser de novo notificado, por forma a dar-lhe a possibilidade de legalização da operação urbanística, praticando-se, depois, um novo acto administrativo, sem o vício causador daquela nulidade. (…)” –cfr. fls 121 a 127 do pa junto aos autos.

24. MAAM emitiu em 5 de Julho de 2007, declaração com o seguinte teor:

“Declaração

MAAM (Casado, Empresário Agrícola, residente na Rua …, Portador do B.I. nº … do Arquivo de Lisboa, Contribuinte nº 1… declara que os devidos e legais efeito o seguinte:

1 - O declarante é proprietário do prédio rústico com o nº de matriz nº 21… situado na Rua da Castanheira em RT.

2 - Tal prédio é contíguo à obra que está construída na Rua de S..., 19 da Freguesia de RT, ao abrigo do Alvará nº 271/2002, passado pela Câmara Municipal de G..., pela confrontação Poente;

3 - Apesar de nesta confrontação a distância de implantação da obra à extrema dos prédios ser inferior a 10 metros, ignorando o declarante se tal distância é exigível, o declarante nada tem a opor à existência de tal construção que em nada afecta a sua propriedade ou os seus interesses.

Por me ter sido pedida e ser verdade, vai assinar. (…)” – cfr. fls. 198 a 200 do pa junto aos autos.

25. Em 15 de Julho de 2005 a Contra-Interessada apresentou um aditamento ao projecto de licenciamento descrito em 8., com a seguinte memória descritiva:

“Memória Descritiva
Refere-se a presente memória ao aditamento do projecto de arquitectura para a construção de dois armazéns que a firma L…, Lda levou a efeito na Rua S... em RT.
O aditamento refere-se unicamente à ampliação do logradouro posterior, no sentido de toda a fachada posterior dos armazéns possua uma distância superior ao limite da propriedade igual ou superior a 10 metros. (…)” - cfr. fls. 135 a 140 do pa junto aos autos.

26. Dos documentos entregues aquando do aditamento ao projecto de licenciamento identificado em 26., consta documento intitulado “acordo”, como o seguinte teor:


“ACORDO

PRIMEIRA: A... - IMOBILIÁRIA, S.A., NIPC 5…, com sede na Rua …, representada pelo seu Administrador e Legal Representante JCC S..., com domicílio profissional na sede da Representada; --------------------------------------
SEGUNDA: L...·EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA, NIPC 5…, com sede na Rua..., representada pelo seu sócio-gerente LAC, com domicilio profissional na sede da sua representada; -----------------------------------------------

CONSIDERANDO QUE:

A primeira outorgante é dona e legítima proprietária do terreno para construção designado por LOTE nº 3, sito na Rua do S..., freguesia de RT, concelho de G..., omisso à matriz e descrito na Conservatória do Registo Predial de G... sob o n° 041…; ---------------------------------------------------

CONSIDERANDO AINDA QUE:

A segunda outorgante é dona e legítima proprietária do lote de terreno confinante, inscrito na matriz sob o artigo 138… e descrito na Conservatória do Registo Predial de G... sob o n° 031…onde actualmente se encontram dois armazéns em fase final de construção; -----------------

CONSIDERANDO FINALMENTE QUE:

As outorgantes têm interesse recíproco em definir a linha divisória dos respectivos domínios relativamente a dúvidas comuns; ---------------------------------------------------

É celebrado o presente acordo, que se rege pelas cláusulas seguintes: --------------


PRIMEIRA

O limite de ambas as propriedades, em toda a extensão da extrema confinante, é o determinado pela linha marcada a encarnado na planta anexa, a qual traduz fielmente o reconhecimento e aceitação mútua da demarcação ora efectuada. ----

SEGUNDA

Por lógica implicância, a área de terreno com forma triangular situada na parte posterior, devidamente assinalada na planta anexa, faz parte integrante do domínio da segunda outorgante. ----------------------------------------------------------

TERCEIRA

A segunda outorgante, a quem é plenamente reconhecido o direito de propriedade sobre a área de terreno de forma triangular identificada na cláusula anterior, poderá vedá-Ia e anexá-Ia ao logradouro do prédio em construção. ---------------------

O presente acordo é aceite pelas partes com todas as suas cláusulas, é reduzido a escrito e vai ser assinado pelos legais representantes para que conste e dê fé de ser esta a vontade recíproca. --------- (…)” - cfr. fls. 136 e 137 do pa junto aos autos.


*

DE DIREITO

Julgamento em matéria de facto

Facto 1 (2ª parte)

O Recorrente discorda da redação do ponto 1 da Fundamentação de Facto na parte em que (na sua visão) aí se assenta que os terrenos n.ºs 19, 20 e 21 fazem parte do “talhonamento” aprovada em 14-08-1963, pois, na sua tese, o dito talhonamento apenas englobaria os 18 talhões destinados à habitação e não as 3 “parcelas” referidas.

Mas a preocupação do Recorrente é infundada. Na verdade, tal como se refere no acórdão recorrido «no ponto factual em discussão, a sentença não utiliza - deliberadamente - os conceitos de “lote” ou de “parcela”, recorrendo ao termo “terrenos” por não implicar qualquer compromisso posterior em termos de subsunção dos factos ao direito aplicado».

Ou seja, neste ponto a sentença utilizou uma formação neutra que permite acomodar as teses contrapostas das partes, sendo certo que todos esses terrenos, talhões ou parcelas, de 1 a 21 estão identificados e numerados na planta do talhonamento em causa, como o Recorrente reconhece na sua conclusão 5.

Assim, a impugnação improcede neste ponto.

Facto 10

O Recorrente opõe-se a este facto pretendendo que a medição em planta referida pelo TAF (6,20 m) não é fidedigna por se basear numa planta não cotada, susceptível de erros de escala e de reprodução, e que a cércea não deve ser aferida nos alçados mas sim nos cortes do projecto e que nestes se verifica que a cércea de 6 metros é cumprida.

Afigura-se que o Recorrente tem razão neste ponto e que realmente as plantas juntas não afiançam a resolução da margem de erro de 20 cm, em que as partes divergem.

De todo o modo, como se diz no acórdão recorrido “o objecto da presente acção impõe a indagação da conformidade do licenciamento com os normativos de natureza urbanística então aplicáveis mas afasta, evidentemente, a indagação da conformidade do efectivamente edificado com o licenciado através dos sobreditos actos”.

Ora, segundo o ponto 19 da matéria de facto assente, consta no Alvará da obra em causa que esta apresenta uma Cércea de “6 metros de altura”, donde não pode assacar-se ao acto de licenciamento o desrespeito da norma do Artigo 18º/1/c) do PDM de G..., podendo quando muito existir algum erro técnico na apreciação das peças desenhadas que não está suficientemente caracterizado pelo Autor, ou algum excesso construtivo de facto que não contende com a legalidade do acto de licenciamento.

Assim, julgando-se neste ponto a impugnação procedente, considera-se não provado o facto descrito em 10 que, assim, se elimina da Fundamentação de Facto.

Facto 11

No âmbito das conclusões 21 a 27 o Recorrente alega que os afastamentos dos armazéns construção relativamente aos limites do terreno, para efeitos do artigo 18º/1/e) do RPDM não são os descritos em 11 da Fundamentação de Facto, constantes das plantas da construção, sendo necessário, em sua opinião, levar em conta as alterações resultantes do acordo de demarcação efectuado com o vizinho.

No entanto, não lhe assiste razão, visto que a factualidade provada no n.º 11, como expõe no acórdão recorrido “é a que resulta do projecto de arquitectura inicialmente apresentado, sendo certo que, quer a celebração do referido acordo privado de delimitação das propriedades, quer o aditamento citado, constam também dos pontos 25, 26 e 27 da factualidade dada como provada na sentença recorrida”.

Ou seja, está devidamente registada toda a matéria de facto que permitirá, em sede de fundamentação de direito, confrontar as teses divergentes das partes, sendo certo que o registo da matéria de facto precede a tarefa de subsunção normativa e não deve, à partida ser afeiçoada de modo a conferir prevalência a qualquer daquelas teses.

Em suma, a impugnação pelo Recorrente da matéria de facto tem êxito parcial limitado ao facto 10, nos termos já supra expostos, mantendo-se intacta, no demais, a fundamentação de facto constante da sentença e do acórdão recorrido.


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Julgamento de direito

Da violação do Artigo 17º/3 do PDM

O Recorrente sustenta que esta disposição só se aplica às construções integradas em loteamentos urbanos, o que não seria o caso dos presentes autos visto a “parcela” de terreno para construção dos armazéns não poder ser considerada lote, fazendo cavalo de batalha desta ideia que contraria e desdiz o que aprovou no pertinente procedimento.

O sentido disto é demonstrar a inaplicabilidade do artigo 17º/3 do Regulamento do PDMG que na sua óptica “só se aplica às construções integradas num loteamento urbano”.

Importa destacar, com nota de concordância, o que a este propósito se refere na sentença (confirmada em Conferência pelo acórdão recorrido):


*

«Invoca o Autor uma desconformidade ao estatuído pelo n.º 3 do artigo 17º do PDM.

A Entidade Demandada por sua vez sustenta que a interioridade decorrente do normativo legal invocado só é de aplicar às construções que se integrem num loteamento urbano, o que não é o caso presente. Defendendo no mais que as regras a verificar são as definidas pelo artigo 18º do RPDM, estabelecendo os índices, cércea e afastamentos.

Vejamos.

Num primeiro momento impõe-se apreciar e decidir se a construção em dissídio se encontra inserida num lote, por força de loteamento ou não.

Socorrendo-nos do probatório assente, em 14 de Agosto de 1963 foi aprovado pela Câmara Municipal de G..., uma operação de divisão, designada como talhonamento - ponto 1. Divisão essa aprovada antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 46.673, de 29.11.1965.

Ora, regulando a aplicação da Lei no tempo, o artigo 18º do Decreto-Lei n.º 46.673, de 29.11.1965, estatuiu a aplicação imediata dos seus normativos “aos loteamentos anteriores à publicação deste decreto-lei”, onde não se tivesse iniciado qualquer edificação.

Consequentemente, as situações anteriores similares às operações de loteamento, acolheram a mesma qualificação jurídica – lotes, situação que, no presente caso é de admitir, uma vez que, uma qualquer operação de divisão em talhões em tudo se assemelha a uma operação de loteamento.

Para o efeito veja-se o plasmado na alínea i) do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16.12, definindo operações de loteamento como “as acções que tenham por objecto ou por efeito a constituição de um ou mais lotes destinados imediata ou subsequentemente à edificação urbana, e que resulte da divisão de um ou vários prédios, ou do seu emparcelamento ou reparcelamento”.

Mas, se dúvidas subsistissem de que estamos perante um lote, com a alteração ocorrida em 8 de Março de 1973, que resultou na criação de mais 3 lotes e o reparcelamento dos terrenos 20 e 21 em A, B e C (cfr. pontos 2., 4. e 5. do acervo probatório), não persiste qualquer indecisão de que estamos perante lotes.

Acresce que, a Câmara Municipal de G... nos seus escritos, sempre empregou a designação “loteamento” para se referir ao “talhonamento” aprovado pela mesma em 14 de Agosto de 1963 – cfr. pontos 2 e 3 da matéria de facto assente - além de que, dos mesmos não se vislumbra a distinção entre lote e parcela. Veja-se a título de exemplo o que consta do parecer pela mesma proferido em 8 de Março de 1973 (ponto 3. do probatório): “A alteração proposta é decorrente da localização dum posto de transformação de energia eléctrica, ajustamento de alguns lotes., e rectificação duma parcela de terreno, permitindo a implantação de um bloco de 3 prédios dentro do critério adoptado para o loteamento em causa.”

Por conseguinte, os terrenos onde foram edificados as construções aqui em causa são lotes, por terem advindo de uma operação de loteamento.»


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Assim é. O Recorrente descreve a evolução legislativa do “conceito de lote” e procura no PDM de G... os reflexos convenientes à sua tese, como por exemplo quando afirma que «o legislador do PDM diferenciou os conceitos de “Lote” e “Parcela” de terreno», embora reconhecendo mais adiante que «O PDM do Município de G... não prevê as definições de “Lote” e “Parcela” de terreno».

Ora, afigura-se claro que o Regulamento do PDMG não poderia cumprir cabalmente a função referida no seu Artigo 1.º, de estabelecer “as regras e orientações a que deverá obedecer a ocupação, uso e transformação do solo no âmbito do Plano Director Municipal de G...” se tais regras devessem ficar “ab initio” enredadas nas minudências terminológicas e conceptuais das alterações legislativas que se foram sucedendo e, a seu tempo, presidiram à aprovação das construções pré-existentes, realidades consumadas com as quais, como é evidente, têm que ser compatibilizadas as pretensões construtivas que ocorram na sua vigência.

Nestas águas navega também o acórdão recorrido, quando refere:

«Com efeito, impera salientar que, tendo a operação de talhonamento sido realizada em Agosto de 1963, não pode ser acolhida a tese elaborada pelo reclamante, visto que esta assenta a diferenciação entre os conceitos de lote e de parcela em opções legislativas que só muito mais tarde vieram a cursar no direito positivo e na praxis construtiva e administrativa, mormente, o PDM em discussão que foi ratificado em 1995, o RJUE que foi publicado em 1999, e os conceitos urbanísticos, que foram publicados em 2009 sob forma de Portaria. Evidentemente, todas as considerações realizadas pelo reclamante sobre a citada querela constituem direito positivo vigente ou próximo temporalmente, que não pode ser decalcado automaticamente sobre a realidade subsistente em 1963 e sobre a constituição de talhões oriunda das operações de talhonamento.»

Considerando este imperativo legal, os dados da experiência e do bom senso apontam no sentido de descomprometer a expressão “lote” constante do referido Artigo 17º/3 do RPDMG com qualquer dos sentidos técnicos estritos que a expressão “lote” historicamente designou, associando-a antes num modo mais abrangente, sem deixar de ser operativamente delimitado e rigoroso, à noção de talhão, ou área de terreno autónoma para construção resultante de uma operação de divisão com essa finalidade de qualquer prédio, ou seja, como se diz na sentença constituída em “situações similares às operações de loteamento”. O que é manifestamente o caso, mantendo-se portanto o entendimento do TAF no sentido de esta disposição regulamentar ser aplicável à situação dos autos.

Mas isto ainda não é decisivo porque, na ideia do Recorrente, só o Artigo 18º do PDM é aplicável ao caso, consagrando-se aí “uma disciplina diversa da norma geral do Artigo 17º PDM para os licenciamentos industriais ou de armazéns”.

Esta linha argumentativa é infrutífera. Na realidade a regulação específica para a “edificabilidade” de armazéns encontra-se na SECÇÃO VII, “Área predominantemente de armazenagem” do Capítulo III do Regulamento do PDMG, significando que as normas relativas a armazéns disseminadas pelas demais Secções, Artigo 18º da SECÇÃO II, “Área predominantemente residencial” e Artigo 25º da SECÇÃO III, “Área predominantemente de serviços”, não constituem excepções mas sim novas condicionantes adicionais, que acrescem à regulação geral destas áreas, para que nelas seja permitida a implantação dessas edificações “estranhas” que são os armazéns.

Ou seja, os armazéns, para serem edificados em área predominantemente residencial, como no caso vertente, têm que respeitar a regulação geral do Artigo 17º e ainda a regulação específica do Artigo 18º do PDM. Não se trata de condicionantes diferentes mas sim de condicionantes acrescidas e cumulativas.

E assim improcede a tese do Recorrente nesta questão.


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Da violação do Artigo 18º do PDM

É claro que as normas do PDM são de ordem pública e as demarcações entre prédios para efeitos de aplicação do Artigo 18º do RPDMG não podem flutuar ao sabor das conveniências conjunturais dos proprietários dos prédios confinantes. Trata-se de exigência legal que tem a ver com o afastamentos das edificações entre si e relativamente às estremas dos lotes tal como constam dos projectos licenciados.

Como se refere na sentença:

«Ora, conforme decorre do probatório (ponto 11), considerando a planta da construção dos dois armazéns, o afastamento mínimo das construções não estão conforme os mínimos estabelecidos por este normativo.

Mesmo após o aditamento ao projecto inicial, descrito em 26. do probatório, a construção não respeita, em todos os pontos, o referido afastamento de 10 metros.

No que respeita ao acordo descrito no ponto 25 do acervo probatório e tal qual aqui já explanado, as licenças e autorizações urbanísticas são actos administrativos submetidos exclusivamente a regras de direito público, não se compadecendo com acordos privados por forma a ultrapassar requisitos legais impostos por planos directores municipais.

Consequentemente, procede o fundamento alegado, na medida em que se constata uma desconformidade com o estabelecido na alínea e) do n.º 1 do artigo 18º do PDM de G....»


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E assim claudica no essencial o presente recurso, concluindo-se em consonância com a sentença e o acórdão recorrido pela nulidade do acto de licenciamento da construção dos dois armazéns aqui em análise, nos termos do preceituado na alínea a) do artigo 68º do Decreto-Lei n.º n.º 555/99 de 16.12, pois o projecto de construção desrespeitou o PDM, nomeadamente o disposto no n.º 3 do artigo 17, por criar uma situação de interioridade e o estatuído na alínea e) do n.º 1 do artigo 18º, por desconformidade com o afastamento posterior mínimo de 10 metros ao limite do lote.

Considera-se, porém, inverificado o fundamento de nulidade invocado pelo Autor respeitante à violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 18º, por pretensa violação da cércea máxima de seis metros.


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DECISÃO

Pelo exposto acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

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Porto, 17 de Abril de 2015

Ass.: João Beato Sousa
Ass.: Hélder Vieira
Ass.: Alexandra Alendouro