Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01377/16.1BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/05/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA; INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL;
DL 220/2006, DE 03 DE NOVEMBRO; ATRIBUIÇÃO DE SUBSÍDIO DE DESEMPREGO;
MEMBROS ESTATUTÁRIOS;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
«EMP01...», UNIPESSOAL, LDA., NIPC ..., com sede na Rua ..., Parque Industrial ..., ... ... ..., ..., instaurou ação administrativa contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., Centro Distrital ..., sito na Praça ..., freguesia ..., ... ....
Pediu a procedência da acção e, em consequência, que seja declarado nulo ou anulado o despacho da Diretora do Núcleo de Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos de 04.04.2016.
Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a ação e
absolvida a Entidade Demandada do pedido.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
1. Ocorreu um erro de julgamento da matéria de facto e de direito e foi violado o n° 1 do art. 6° do DL 119/99, de 14.04, e o n° 1 art. 2° do DL 220/2006, de 03.11.
2. O facto não provado “A) Em janeiro de 2012, a Autora tinha 19 trabalhadores ao seu serviço (cfr. documento n° ... junto com a PI e fls 23 a 25 do PA cujo teor se dá por integralmente reproduzido) deve ser dado como provado.
3. Para fundamentar ter julgado como não provado, aquele facto A), diz a douta sentença ora em crise: “O facto A) encontra-se infirmado pelo teor do documento n° ... junto com a petição inicial e das folhas 23 a 25 do PA, resultando da análise destes elementos que, em janeiro de 2012, a Autora tinha dezassete trabalhadores ao seu serviço (...), à taxa contributiva global de 34,75€%, e dois membros de órgãos estatutários ([AA] e [BB]), à taxa contributiva global de 29,60%.” e apelando ao Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social (Código Contributivo), concluiu o seguinte: “atendendo ao elemento literal e teleológico´ (...) subjacente ao artigo 10°, n° 4, alínea a) e 5 do Decreto-lei 220/2006, de 3 de novembro, entendemos que, tal como sustenta a Entidade Demandada, se devem considerar apenas os trabalhadores com potencial para poder vir a receber subsídio de desemprego.”.
4. Todavia (e aqui encontra-se o primeiro equívoco) os referidos, [AA] e [BB], apesar de membros estatutários sempre e à data dos factos teriam direito ao subsídio de desemprego caso os seus contratos de trabalho tivessem cessado de forma involuntária.
5. Já em outubro de 2010, quase um ano e meio antes de janeiro de 2012 (data em discussão nestes autos), existiam decisões dos Tribunais Superiores, no sentido da atribuição de subsídio de desemprego aos membros estatutários com fundamento nas seguintes normas:
- art. 6° n° 1 do DL 119/99, de 14.04: “1 - Para efeitos do presente diploma, é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho.”
- art. 2° n° 1 do DL 220/2006, de 03.11: “Para efeitos do presente decreto-lei é considerado desemprego toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego.”
6. Essa questão foi discutida pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n° 1209/12 de 14.03.2013 e no âmbito do qual veio a ser fixada jurisprudência através do seu Acórdão Uniformizador n° 4/2013, cujo sumário nos elucida que:
“I – Para efeitos de recurso para uniformização de jurisprudência, a circunstância de os acórdãos em confronto terem sido proferidos na vigência de diplomas legais diversos não obsta à existência de oposição de julgados, se as normas aplicadas contiverem regulamentação jurídica essencialmente idêntica;
II – Na caracterização da situação de desemprego, para efeitos da atribuição do correspondente subsídio, o que releva é a inexistência de emprego remunerado, enquanto elemento essencial do contrato de trabalho;
III – Assim, a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, sem direito a qualquer remuneração, de um trabalhador por conta de outrem, cujo contrato de trabalho cessou, não obsta à caracterização da respectiva situação como de desemprego, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 6, número 1, do Dl 119/99, de 14 de Abril, e 2, número 1, do DL 220/2006, de 3 de Novembro.”.
7. Nos termos do entendimento vertido naquela douta decisão, reportada a factos ocorridos muito antes de janeiro de 2012, determinou-se que, a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, mesmo sem direito a qualquer remuneração, não obsta à caracterização da respetiva situação como de desemprego.
8. Pelo que, deve cair por terra o elemento literal e teleológico utilizado pela douta sentença para julgar a ação improcedente por não provada,
9. A douta sentença ora em crise ao decidir em sentido contrário ao que aqui vem exposto, violou de forma flagrante o art. 6° n° 1, do DL n° 119/99, de 14.02 e o art. 2° n° 1 do DL 220/2006, de 03.11.
10. Pelo que cumulativamente, padece de erro de julgamento a “Motivação da matéria de facto” constante da douta sentença ora em crise quando a mesma refere que, aquele facto A) encontra-se infirmado pelo teor do documento n° ..., junto com a petição inicial e das folhas 23 a 25 do PA.
11. Pois que, a qualidade de membros estatutários de, [AA] e [BB] e o facto de estes estarem sujeitos a uma taxa contributiva global de 29,60% não exclui o seu direito ao subsídio de desemprego,
12. Em conformidade, aquele facto A) dos Factos não provados ser alterado, passando o mesmo a ser dado como provado sendo que, da matéria sujeita a julgamento não haverão factos não provados.
13. Permitindo considerar que, em janeiro de 2012, a Autora/Recorrente tinha 19 (dezanove) trabalhadores ao seu serviço (cfr. documento n° ... junto com a PI e fls 23 a 25 do PA cujo teor se dá por integralmente reproduzido),
14. Daí devendo resultar necessariamente a procedência deste recurso, visto que se em janeiro de 2012 era 19 (dezanove) os trabalhadores da Autora/Recorrente com potencial para poder vir a receber subsídio de desemprego, sendo esse número o relevante para efeitos de cálculo do limite previsto no artigo 10°, n° 4, alínea a) do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro.
15. Nestes termos, com a aplicação da percentagem de 25% (vinte e cinco) por cento sobre o universo de 19 (dezanove) trabalhadores, para efeitos do cálculo das quotas de cessação de contrato de trabalho, por acordo, fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho, para o triénio em causa, se cifra em 4,75% (quatro vírgula setenta e cinco por cento), o que equivale a um limite de cinco cessações.
16. Conforme consta dos factos provados, pontos 4 a 8, entre 27.02.2012 e 27.02.2015, a Autora/Recorrente, cessou por acordo, o contrato de trabalho com cinco trabalhadores, o último dos quais, [CC].
17. As cinco cessações em causa respeitam o limite previsto no artigo 10°, n° 4, alínea a) do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro.
18. Assim sendo, nenhuma restituição é exigível à Autora/Recorrente, devendo o despacho da Sra. Diretora do Núcleo de Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos de 04.04.2016, ser anulado por manifesta violação da lei.
19. SEM PRESCINDIR, sempre se dirá que a douta sentença ora em crise viola igualmente o disposto no n° 5 do art. 10° do DL n° 220/2006 de 03.11.
20. Dispõe o n° 5 daquele art. 10° do Decreto-Lei 220/2006 de 03.11 que: “Os limites estabelecidos no número anterior são aferidos por referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive (...).”.
21. A douta sentença ora em crise faz incorreta apreciação da norma supratranscrita ao utilizar os referidos três anos como referência para aplicar a lei em vigor nessa data e não a lei em vigor na data dos factos, a saber a vigente em 27.02.2015 (cfr. facto provado 8).
22. Com efeito, o facto de a lei impor que a contagem dos trabalhadores tenha por referência os três últimos anos, não significa que a lei a aplicar fosse a lei em vigor no início da contagem do triénio mas, e como nos parece óbvio, a lei em vigor à data da cessação do contrato de trabalho do trabalhador em causa, ou seja a 27.02.2015.
23. Falando de uma forma simplista, o Tribunal a quo devia ir “para trás” contando o início do triénio ao abrigo da lei existente à data da cessação e não, fazer essa contagem aplicando a lei que se encontrava em vigor no início desse triénio!
24. Ao atuar desta forma, incorreu em violação da lei, aplicando uma lei que à data dos factos – data da cessação do contrato de trabalho – já não estava em vigor.
25. Por conseguinte, a 27.02.2015 vigorava o DL n° 12/2013 de 25.01 que estabelecia o regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos trabalhadores independentes com atividade empresarial e dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas.
26. Tal diploma legal estabelecia no seu n° 1 que: “A proteção social regulada no presente diploma abrange: b) Os membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração.”.
27. Assim sendo e à data da cessação do contrato de trabalho, a 27.02.2015, a legislação em vigor estabelecia especificamente a atribuição do subsídio de desemprego aos membros dos órgãos estatutários.
28. Sendo, pelo exposto e em janeiro de 2012, 19 (dezanove) e não 17 (dezassete) os trabalhadores da Autora/Recorrente com tal “potencial”.
29. Donde, conforme consta dos factos provados, pontos 4 a 8, entre 27.02.2012 e 27.02.2015, a Autora/Recorrente, cessou por acordo, o contrato de trabalho com cinco trabalhadores, o último dos quais, [CC], respeitando o limite previsto no artigo 10°, n° 4, alínea a) do DL 220/2006, de 03.11, pelo que nenhuma restituição é exigível à Autora/Recorrente.
30. Acresce ainda complementar que o n° 5 daquele art. 10° do DL n° 220/2006 de 03.11: “Os limites estabelecidos no número anterior são aferidos por referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data do início do triénio, com observância do critério mais favorável.”.
31. Esta imposição quanto à observação do critério mais favorável impõe que, perante um exercício de interpretação se deva restringir o que é prejudicial e ampliar o que é favorável.
32. A douta sentença ora em crise ao decidir como decidiu violou a parte final da norma transcrita, porquanto, não respeitou o critério mais favorável, acabando por diminuir os limites estabelecidos no n° 4 daquela norma, ao não considerar os dois membros dos órgãos estatutários para efeitos de cálculo do limite previsto no artigo 10°, n° 4, ali. a), do DL n° 220/2006 de 03.11,
33. Fazendo precisamente o contrário de forma a que perante a contabilização de apenas 17 (dezassete) trabalhadores, se considerasse ter a Autora/Recorrente ultrapassado o limite constante do n° 4 do artigo 10° do Diploma legal em causa.
34. Nestes termos e por violar de forma flagrante a Lei e o princípio nesta consagrado, deve a douta sentença ser revogada e substituída por outra que dê como provado que, em janeiro de 2012 eram 19 (dezanove) os trabalhadores da Autora/Recorrente com potencial para poder vir a receber subsídio de desemprego, sendo esse número o relevante para efeitos de cálculo do limite previsto no artigo 10°, n° 4, alínea a) do DL 220/2006, de 03.11.
TERMOS EM QUE,
Deve o presente recurso ser considerado provado e procedente, e em conformidade ser revogada a douta sentença proferida e substituída por outra que declare a ação procedente por provada e em consequência anule o despacho da Diretora do Núcleo de Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos de 04.04.2016.
Não foram juntas contra-alegações.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta, notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. A Autora encontra-se inscrita na Segurança Social como entidade empregadora com o NISS ... (cfr. documentos n.°s ... e ... juntos com a petição inicial (PI) e fls. 7 a 12 e 20 a 25 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
2. Em data não concretamente apurada, a Autora entregou à Entidade Demandada documento denominado “EXTRATO DE DECLARAÇÃO DE REMUNERAÇÕES”, do qual consta, designadamente, o seguinte:
Identificação da Entidade Empregadora:
Nome: «EMP01...», UNIPESSOAL LDA
Número de Identificação da Segurança Social: ...
[...]
Taxa: 34,75 %
Mês de Referência: ...1
NISS
PS
Nome
Data Nascimento
Mês Referência
Dias de Trabalho
Valor das
Remunerações
Código Remun
[...][DD]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][EE]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][FF]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][GG]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][HH]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][II]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][JJ]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][KK]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][LL]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][MM]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][NN]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][OO]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][OO]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][PP]’ SANTOS
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][QQ]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][RR]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][SS]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][TT]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P

[...]”. (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 24 e 25 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
3. Em data não concretamente apurada, a Autora entregou à Entidade Demandada documento denominado “EXTRATO DE DECLARAÇÃO DE REMUNERAÇÕES”, do qual consta, designadamente, o seguinte:
“Identificação da Entidade Empregadora:
Nome: «EMP01...», UNIPESSOAL LDA
Número de Identificação da Segurança Social: ...
[...]
Taxa: 29,6 %
Mês de Referência: ...1
NISS
PS
Nome
Data Nascimento
Mês Referência
Dias de Trabalho
Valor das
Remunerações
Código Remun
[...][AA]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...][BB]
[...]
2012/01
[...]
[...]
P
[...]” (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 23 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
4. Em 10.09.2012, a Autora cessou, por acordo, o contrato de trabalho com [MM] (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 13 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
5. Em 10.09.2012, a Autora cessou, por acordo, o contrato de trabalho com [RR] (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 13 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
6. Em 10.09.2012, a Autora cessou, por acordo, o contrato de trabalho com [II] (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 13 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
7. Em 06.02.2015, a Autora cessou, por acordo, o contrato de trabalho com [UU] (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 13 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
8. Em 27.02.2015, a Autora cessou, por acordo, o contrato de trabalho com [CC], NISS ... (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 13 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
9. Em 04.03.2015, [CC] apresentou, junto da Entidade Demandada, requerimento para atribuição de prestações de desemprego com o fundamento “AE – 15 - Acordo de revogação nos termos do n.º 4 do art.º 10'” (cfr. fls. 7 e 9 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
10. Em 06.03.2015, a Entidade Demandada deferiu o requerimento referido no ponto anterior, tendo concedido o subsídio de desemprego por um período de 630 dias, com início a 04.03.2015, nos primeiros 180 dias no montante diário de € 31,96 e nos 450 dias seguintes no montante diário de € 28,76, perfazendo um montante total de € 18.694,80 (cfr. fls. 7 e 8 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
11. A Entidade Demandada remeteu à Autora ofício datado de 12.08.2015, sob o assunto “Notificação de pagamento de prestações de desemprego”, por referência ao beneficiário [CC], do qual consta, designadamente, o seguinte:
Notifica-se de que vai ser exigido o pagamento de 18.694,80 EUR (dezoito mil seiscentos e noventa e quatro euros e oitenta cêntimos), correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido ao beneficiário acima identificado se, no prazo de 5 dias úteis a contar da data deste ofício, não der entrada nestes serviços, reposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar a esta decisão, juntando meios de prova se for caso disso.
Os fundamentos para a exigência do pagamento das prestações de desemprego são os a seguir indicados:
Ter sido deferido o pagamento das prestações de desemprego no montante diário de 31,96 EUR
(trinta e um euros e noventa e seis cêntimos) por um período de 630 dias, por ter havido cessação do contrato de trabalho por acordo e ter sido criada no trabalhador, acima identificado, a convicção de que se encontrava dentro do limite de quotas estabelecido para acesso às prestações de desemprego, conforme consta na declaração de situação de desemprego entregue ao trabalhador, e tal não se verificou (n.º 4 do artigo 10.º e artigo 63.º do Decreto-Lei n.º 220/2006).
Mais se informa de que, na falta de resposta, esta decisão se torna definitiva no primeiro dia útil seguinte ao do termo do prazo acima referido, data a partir da qual se inicia a contagem de prazos de:
- 3 meses para recorrer hierarquicamente para o Presidente do Conselho Diretivo do
Instituto da segurança social;
- 3 meses para recorrer contenciosamente. [...]” (cfr. fls. 6 do PA, cujo teor se dá por
integralmente reproduzido)
12. A Autora apresentou resposta escrita ao ofício constante do ponto anterior, a qual foi rececionada nos serviços da Entidade Demandada em 10.04.2015. (cfr. fls. 1 a 4 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
13. Na sequência do referido no ponto anterior os Serviços da Entidade Demandada emitiram informação, da qual se extrai:
Feita uma análise verificou-se o seguinte:
Esta dívida deve-se ao facto da entidade, a 2015-02-27, ter cessado o contrato de trabalho com o beneficiário ...65 – [CC], com o motivo AE – 15 – Acordo de revogação nos termos do n.° 4 do art.º 10°.
Através da análise em SISS, confirma-se que a prestação continua registada como tendo ultrapassado os limites legalmente estabelecidos, sendo a quinta por acordo, quando a entidade apenas possuía uma quota disponível de 4, conforme anexo.
Propõe-se explicar à entidade, que de acordo com o m.° 5 do art.º 10°, do decreto-lei n° 220/2006, os limites estabelecidos, são aferidos por referência aos últimos 3 anos, cuja contagem se inicia na data de cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data de início do triénio (2012-01-01). Data de cessação do contrato: 2015-02-27
Data de início do triénio: 2012-02-28 Data de fim do Triénio: 2015-02-27
N.° de empregados: 17 Valor da quota: 4
N° de Prestações Deferidas: 5 Saldo: 0
Assim, deverá ser notificada que se mantém os fundamentos do despacho proferido a 2015-03-06, bem como que se encontram a decorrer os prazos de recurso” (cfr. fls. 11 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
14. Em 04.04.2016, na sequência da informação referida no ponto anterior, a Diretora do Núcleo de Prestações, Desemprego e Benefícios Diferidos, proferiu despacho de concordância (cfr. fls. 12 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
15. A Entidade Demandada remeteu à Autora o ofício n.° ...84, datado de 18.04.2016, sob o assunto “Notificação de Pagamento de prestações de desemprego”, do qual consta, designadamente, o seguinte:
Leva-se ao conhecimento de V. Ex.ª de que, por Despacho de 2016-04-04, da Sra. Diretora de Núcleo Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos, foi considerado ter sido ultrapassado o número de cessações dos contratos de trabalhos por acordo fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento colectivo ou por extinção do posto de trabalho relativamente ao(s) seguinte(s) trabalhador(es):
NISS: ... – [CC]
Data cessação do contrato: 2015-02-28
- Tendo o triénio tido início em 2012-02-28 e termo em 2015-02-27, a firma tinha no mês anterior ao triénio, de acordo com o n.° 5 do art.°10.° do Decreto-Lei n.°220/2006, de 03 de Novembro, 17 trabalhador(es) vinculado(s), o que garantia apenas um valor de quota de 4. Como a cessação celebrada com o trabalhador foi a 5ª, foi excedido o limite estabelecido no n.° 4 do citado artigo.
Assim, e porque subsiste o fundamento factual e legal para a exigibilidade do montante assegurado ao(s) beneficiário(s), foi proferida decisão final, com manutenção da obrigação de pagamento das prestações em dívida, no(s) valor(es) respetivamente de 18.694,80, nos termos do art.° 63.° do citado Diploma.” (cfr. documento n.º ... junto com a PI e fls. 13 a 15 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
16. A Entidade Demandada remeteu à Autora o ofício n.° ...85, datado de 18.04.2016, sob o assunto “Restituição de prestações indevidamente pagas”, do qual se extrai, o seguinte:
Na sequência da Reclamação apresentada por V.Exª, relativamente à Nota de Reposição acima indicada no valor de 18694,80 €, pelo(s) motivo(s) a seguir indicado(s): Foi deferido o pagamento de prestações de desemprego, relativamente ao beneficiário ...65 – [CC], no montante diário de 31,96€, por um período de 630 dias, sendo excedido o limite estabelecido nos termos do n.° 4 do art.º 10.° do Decreto-Lei n.°220/2006.
A entidade, no mês anterior ao triénio (2012-02-28), tinha 17 trabalhador(es) vinculado(s), o que garantia apenas um valor de quota de 4, de acordo com o n.° 5 do art.°10.° do Decreto-Lei n.°220/2006, de 03 de Novembro. A cessação celebrada com o trabalhador foi a 5ª.
De acordo com o n° 5 do artigo 10°, do decreto-lei n° 220/2006, os limites estabelecidos, são aferidos por referência aos últimos 3 anos, cuja contagem se inicia na data de
cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data de início do triénio” (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 16 e 17 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
Em sede de factualidade não provada o Tribunal exarou:
Factos não provados
A) Em janeiro de 2012, a Autora tinha 19 trabalhadores ao seu serviço (cfr. documento n.° ... junto com a PI e fls. 23 a 25 do PA cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
E, em sede de motivação da matéria de facto assente consignou:
A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise crítica dos documentos constantes dos autos e do PA, para os quais se remete no final de cada facto assente, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do Tribunal.
O facto A) encontra-se infirmado pelo teor do documento n.° ... junto com a petição inicial e das fls. 23 a 25 do PA, resultando da análise destes elementos que, em janeiro de 2012, a Autora tinha dezassete trabalhadores ao seu serviço ([MM], [SS], [FF], [JJ], [EE], [DD], [NN], [TT], [RR], [KK], [QQ], [II], [VV], [HH], [GG], [OO] e [LL]), à taxa contributiva global de 34,75%, e dois membros de órgãos estatutários ([AA] e [BB]), à taxa contributiva global de 29,60%.
DE DIREITO
É objecto de recurso a sentença que julgou improcedente a ação administrativa instaurada contra o Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital ....
Na óptica da Recorrente esta padece dos seguintes vícios:
I. De erro de julgamento da matéria de facto e de direito e da violação do n° 1 do artº 6° do DL 119/99, de 14.04, e do n° 1 artº 2° do DL 220/2006, de 03.11;
II. De errada interpretação do n° 5, do artº 10° do DL n° 220/2006 de 03.11 e da violação de Lei.
Cremos que lhe assiste razão.
Vejamos,
Do erro de julgamento da matéria de facto e de direito/da violação do n° 1 do artº 6° do DL 119/99, de 14.04, e do n° 1 do artº 2° do DL 220/2006, de 03.11 -
A sentença recorrida dá como não provado o seguinte facto: “A) Em janeiro de 2012, a Autora tinha 19 trabalhadores ao seu serviço (cfr. documento nº ... junto com a PI e fls. 23 a 25 do PA cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
Ora, conforme infra se explicará, o aludido facto deveria ter sido dado como provado.
Com efeito, para fundamentar ter julgado como não provado, aquele facto A), refere a sentença ora em crise: “O facto A) encontra-se infirmado pelo teor do documento n° ... junto com a petição inicial e das folhas 23 a 25 do PA, resultando da análise destes elementos que, em janeiro de 2012, a Autora tinha dezassete trabalhadores ao seu serviço (...), à taxa contributiva global de 34,75€%, e dois membros de órgãos estatutários ([AA] e [BB]), à taxa contributiva global de 29,60%.”.
Ora, da análise do referido documento n° ..., junto com a petição inicial, resulta como provado o teor do facto A) já transcrito. Ou seja, resulta como provado que, em janeiro de 2012, a Autora tinha 19 (dezanove) trabalhadores ao seu serviço.
Com efeito e apesar de daquele documento n° ... constar a existência de dois membros de órgãos estatutários, tal não desqualifica os identificados, [AA] e [BB], como sendo trabalhadores da aqui Recorrente.
Na verdade, a sentença, para fundamentar a não qualificação daqueles membros dos órgãos estatutários como “trabalhadores” vem chamar à colação o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social (Código Contributivo),
E com base em tal legislação conclui o seguinte: “atendendo ao elemento literal e teleológico “(...) subjacente ao artigo 10°, n° 4, alínea a) e 5 do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro, entendemos que, tal como sustenta a Entidade Demandada, se devem considerar apenas os trabalhadores com potencial para poder vir a receber subsídio de desemprego.”.
Todavia encontra-se aqui um primeiro equívoco; os referidos, [AA] e [BB], apesar de membros estatutários sempre e à data dos factos teriam direito ao subsídio de desemprego caso os seus contratos de trabalho tivessem cessado de forma involuntária. Caso tal tivesse sucedido e em relação ao referidos, [AA] e [BB], a situação de desemprego involuntário sempre os tornaria beneficiários do direito ao correspondente subsídio de desemprego.
E tal sucederia mesmo que estes não auferissem, naquela qualidade de membros estatutários qualquer remuneração,
O que torna inútil o recurso ao Código Contributivo para dirimir esta questão.
Veja-se neste sentido, a questão discutida pelo Supremo Tribunal Administrativo, no processo n° 1209/12 de 14.03.2013 e no âmbito do qual veio a ser fixada jurisprudência através do seu Acórdão Uniformizador n° 4/2013.
Ali, "O Instituto de Segurança Social (ISS), invocando oposição de julgados, recorre para ... Tribunal Pleno do acórdão, de 23.3.2012, da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) que, concedendo provimento ao recurso do acórdão, de 20.10.2010, do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, revogou essa decisão e julgou procedente a acção administrativa especial, intentada por …..contra aquele ISS, para anulação do despacho, de 4.12.2008, do Director do Núcleo de Prestações de Desemprego, pelo qual foi declarado nulo o acto que atribuíra a esse … subsídio de desemprego e determinada a restituição das quantias pelo mesmo recebidas a esse título, entre 3.8.2005 e 2.8.2006. Segundo a entidade recorrente, a invocada oposição verifica-se entre o acórdão recorrido, de 23.3.2012, e o acórdão da mesma Secção de Contencioso Administrativo do TCAN, de 13.5.11, proferido no processo nº 491/08.". Ou seja, já em outubro de 2010, quase um ano e meio antes de janeiro de 2012 (data em discussão nestes autos), existiam decisões dos Tribunais Superiores, no sentido da atribuição de subsídio de desemprego aos membros estatutários com fundamento nas seguintes normas:
-artº 6° n° 1 do DL 119/99, de 14.04: "1 - Para efeitos do presente diploma, é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho."
-artº 2° n° 1 do DL 220/2006, de 03.11: "Para efeitos do presente decreto-lei é considerado desemprego toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego."
Assim e com base nestas disposições legais foi fixada jurisprudência nos termos constantes do sumário daquele acórdão uniformizador de jurisprudência n° 4/2013: "I - Para efeitos de recurso para uniformização de jurisprudência, a circunstância de os acórdãos em confronto terem sido proferidos na vigência de diplomas legais diversos não obsta à existência de oposição de julgados, se as normas aplicadas contiverem regulamentação jurídica essencialmente idêntica;
II - Na caracterização da situação de desemprego, para efeitos da atribuição do correspondente subsídio, o que releva é a inexistência de emprego remunerado, enquanto elemento essencial do contrato de trabalho;
III - Assim, a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, sem direito a qualquer remuneração, de um trabalhador por conta de outrem, cujo contrato de trabalho cessou, não obsta à caracterização da respectiva situação como de desemprego, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 6, número 1, do Dl 119/99, de 14 de Abril, e 2, número 1, do DL 220/2006, de 3 de Novembro.”.
Neste contexto, nos termos do entendimento vertido naquela decisão, reportada a factos ocorridos muito antes de janeiro de 2012, determinou-se que, a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, mesmo sem direito a qualquer remuneração, não obsta à caracterização da respetiva situação como de desemprego, pelo que, cai por terra o elemento literal e teleológico utilizado pela sentença recorrida para julgar a ação improcedente por não provada, porquanto, se conforme da mesma consta para cálculo das quotas de cessações de contrato de trabalho por acordo, se devem considerar apenas os trabalhadores com potencial para poder vir a receber subsídio de desemprego, então nestes - nos termos das normas em vigor em janeiro de 2012 e já transcritas e do Acórdão mencionado -, devem incluir-se os membros estatutários, [AA] e [BB].
A sentença ora em crise ao decidir em sentido contrário ao que aqui vem exposto, violou o artº 6°/1, do DL n° 119/99, de 14.02 e o artº 2°/1 do DL 220/2006, de 03.11.
Pelo que cumulativamente e, como alegado, padece de erro de julgamento a “Motivação da matéria de facto” constante da sentença quando a mesma refere que, aquele facto A) encontra-se infirmado pelo teor do documento n° ..., junto com a petição inicial e das folhas 23 a 25 do PA.
É que, a qualidade de membros estatutários dos apontados [AA] e [BB] e o facto de estes estarem sujeitos a uma taxa contributiva global de 29,60% não exclui o seu direito ao subsídio de desemprego.
Conforme fixado pelo Acórdão supratranscrito: “Na caracterização da situação de desemprego, para efeitos da atribuição do correspondente subsídio, o que releva é a inexistência de emprego remunerado, enquanto elemento essencial do contrato de trabalho;”.
Em conformidade, aquele facto A) dos Factos não provados é alterado, passando o mesmo a ser dado como provado sendo que, da matéria sujeita a julgamento não haverão factos não provados.
Assim, é de considerar que, em janeiro de 2012, a Autora/Recorrente tinha 19 (dezanove) trabalhadores ao seu serviço (cfr. documento n° ... junto com a PI e fls. 23 a 25 do PA cujo teor se dá por integralmente reproduzido). Daí resulta necessariamente a procedência deste recurso, visto que se em janeiro de 2012 eram 19 (dezanove) os trabalhadores da Autora/Recorrente com potencial para poderem vir a receber subsídio de desemprego, esse é o número relevante para efeitos de cálculo do limite previsto no artigo 10°/4/alínea a) do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro. Nestes termos, com a aplicação da percentagem de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o universo de 19 (dezanove) trabalhadores, para efeitos do cálculo das quotas de cessação de contrato de trabalho, por acordo, fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho, para o triénio em causa, se cifra em 4,75% (quatro vírgula setenta e cinco por cento), o que equivale a um limite de cinco cessações.
Conforme consta dos factos provados, pontos 4 a 8, entre 27.02.2012 e 27.02.2015, a Autora/Recorrente, cessou por acordo, o contrato de trabalho com cinco trabalhadores, o último dos quais, [CC].
As cinco cessações em causa respeitam o limite previsto no artigo 10°/4/alínea a) do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro.
Assim sendo, nenhuma restituição é exigível à Autora/Recorrente, tendo o despacho da Sra. Diretora do Núcleo de Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos de 04.04.2016, de ser anulado por manifesta violação de lei.
Procedem as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se concede provimento ao recurso, revoga-se a sentença e julga-se procedente a acção.
Custas pelo Réu/Recorrido, e, nesta instância, sem custas, atenta a ausência de contra-alegações.
Notifique e DN.
Porto, 05/5/2023

Fernanda Brandão
Hélder Vieira
Alexandra Alendouro