Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03407/11.3BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/30/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE INDEMNIZAÇÃO; CONTAGEM DE PRAZO; CONHECIMENTO DO DANO;
Sumário:1-O prazo de prescrição de 3 anos previsto no artigo 498.º, n.º1 do CC começa a correr no dia em que o credor/lesado tome conhecimento do facto ilícito e culposo que tenha a virtualidade de produzir danos na sua esfera jurídica.

2- O facto danoso, tanto se pode traduzir na prática de um simples ato que se esgota temporalmente num único momento, havendo coincidência entre a conduta violadora realizada ou executada e a produção do dano (infração instantânea), como pode traduzir-se numa série de atos suscetíveis de configurar uma infração de natureza continuada ou permanente na qual os danos se vão produzindo em vários momentos temporais sucessivos (infração continuada).

3- A contagem do início do prazo de prescrição é independente do conhecimento da extensão integral dos danos, e só perante a emergência de danos novos é que o prazo se inicia a partir da sua verificação.

4- O dano que corresponde à perda do registo do domínio “global.info”, verificado em 31 de julho de 2007, cuja manutenção estava dependente da obtenção do registo da marca “Global”, não é um dano novo, por ser um dano previsível a partir do momento em que o INPI ultrapassou o prazo legal para a prática do ato devido, ainda que nesse momento se desconhece-se a extensão integral desse concreto dano. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:J.
Recorrido 1:INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte:

RELATÓRIO

1.1. J., residente na Rua (…), (…), na qualidade de sócio gerente da sociedade “C., Lda” moveu ação administrativa comum contra o INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL, I.P., (INPI) com sede no Campo (…), (…), pedindo a condenação do Réu, com fundamento em alegada responsabilidade civil extracontratual do Estado por facto ilícito, a pagar a quantia de 300.000,00€ a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora legais á taxa legal, desde a citação até integral pagamento e bem assim, nas custas do processo.

Alegou, para tanto, em síntese, que em 1998 a sociedade “C., Lda” apresentou junto do INPI pedido de registo em seu nome da marca “global”;

A referida sociedade, em junho de 2007, transmitiu todos os registos de propriedade industrial, tanto os pendentes como os já efetuados para o autor, que assim adquiriu a respetiva titularidade, tendo sido dissolvida administrativamente no final do ano de 2008, e o respetivo património, liquidado.

O processo de registo da marca global, com o número 332536 atribuído pelo INPI arrastou-se por 12 anos, uma vez que o INPI apenas proferiu o despacho de concessão da marca a 15 de outubro de 2010;

Esta demora não tem qualquer justificação possível, provocou danos patrimoniais à sociedade C. sob a forma de lucros cessantes, constituindo um caso de funcionamento anormal do serviço para efeitos do n.º 4 do art.º 7.º da Lei 67/2007.

1.2. Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Em sede de defesa por exceção invocou a (i) falta de pagamento da taxa de justiça devida, a (ii) caducidade do benefício do apoio judiciário concedido e a impossibilidade do benefício concedido se poder destinar à presente situação, a (iii)ilegitimidade ativa e a (iv) prescrição do direito à indemnização.
Quanto à prescrição, alegou em síntese, que tendo o prazo para conclusão do procedimento administrativo relativo ao registo da marca apresentado pela sociedade C. terminado em dezembro de 2001, há muito prescreveu o eventual direito de indemnização pelo atraso na decisão do procedimento, uma vez que a omissão relevante por parte do R., e em que se fundará o eventual direito de indemnização reclamado pelo A., ocorreu na mesma data. Assim, deve ser a partir daquele momento que deve ser contado o prazo prescricional, visto que desde esta data o A. tem já conhecimento do seu direito, ainda que desconheça a extensão integral dos danos.

Por impugnação, sustentou a improcedência da ação, alegando, em suma, não estarem verificados os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos, pedindo a condenação do Autor como litigante de má-fé.

1.3. O Autor replicou, pugnando pela improcedência das exceções invocadas pelo Réu.
Quanto à prescrição, sustentou, em suma, que o prazo prescricional apenas tem início com o termo da omissão em causa, ou seja, com a prolação do despacho final do processo de registo da marca, isto é, a contar de 15/10/2010. E, seja como for, o A. apenas teve conhecimento do dano em 31/07/2007, data que corresponde à perda do registo do domínio “g-----.info”.

1.4. O R. treplicou, arguindo a nulidade processual decorrente do facto do A. ter replicado, com fundamento em não ter deduzido qualquer matéria excetiva na contestação, á qual coubesse resposta em sede de réplica.

1.5. O TAF do Porto proferiu despacho saneador-sentença que (i) indeferiu a invocada nulidade da tréplica apresentada pelo Réu; (ii) julgou improcedente a invocação da subsistência da falta de pagamento da taxa devida, a caducidade do benefício de apoio judiciário concedido e a impossibilidade de tal benefício ter sido concedido para a presente ação ;(iii) fixou o valor da ação em 300.000,00 Euros, de acordo com o disposto nos art.ºs 31º, n.º 1 e 32º, n.º 1 do CPTA; (iv) julgou procedente a exceção da ilegitimidade ativa do A., para, a título próprio, demandar o R. nos termos da presente ação, reconhecendo-lhe legitimidade para demandar o R. mas limitado ao seu interesse, ou seja, proporcional à respetiva quota de sócio e (v) considerando estar já na posse de elementos probatórios suficientes para prosseguir para a apreciação do mérito da pretensão do A., conheceu da exceção da prescrição invocada pelo R..

1.6. No saneador-sentença, o TAF do Porto julgou procedente a exceção da prescrição, absolvendo o Réu dos pedidos, constando esse saneador-sentença da seguinte parte dispositiva:
« Julgo procedente a excepção da prescrição invocada pelo R. e, em consequência:
A) Julgo a presente acção totalmente improcedente; e
B) Absolvo o R. dos pedidos.
*
Custas a cargo do A., em conformidade com o estabelecido no art.º 527º do CPC, cuja taxa de justiça se fixa nos termos do art.º 6º, n.º 1 do RCP, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que goza o A..
Registe e notifique.»

1.7.O Apelante não se conforma com a decisão recorrida que julgou procedente a invocada exceção da prescrição, tendo interposto o presente recurso jurisdicional que concluiu formulando as seguintes conclusões:

«A - O início do prazo prescricional tem que ser determinado com objectividade, e corresponde à data em que o lesado tem conhecimento do direito que lhe compete, nos termos do nº1 do artigo 498º do Código Civil.

B - Este prazo conta-se desde a data em que o lesado teve conhecimento do seu direito, interpretado este como o conhecimento empírico dos pressupostos que condicionam a responsabilidade civil, isto é: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade entre tal facto e os danos.

C - Ora, sendo certo que o acto danoso se constituiu, na situação sub judice, na omissão da prática do facto devido em tempo razoável, o início da prescrição só pode ser fixado com o termo da omissão, ou seja, com a prolação do despacho final do processo de registo da marca.

D - Despacho esse proferido a 15 de Outubro de 2010.

E - Tendo a prescrição sido interrompida atempadamente.

F - Mesmo que assim não se entendesse, e se considerasse que a prescrição começou a correr ainda antes da prolação do despacho final, teria que se ter por seguro que a mesma nunca poderia começar antes da verificação do dano.

G - Na verdade, e porquanto o dano é elemento essencial para a averiguação da existência do direito indemnizatório, antes da sua verificação não existe conhecimento pelo Autor do direito que lhe compete.

H - O dano cujo ressarcimento é peticionado na presente acção corresponde à perda do registo do domínio “g-----.info”.

I - Tal dano ocorreu apenas a 31 de Julho de 2007, porquanto (tendo o registo do domínio “g-----.info” sido concedido à sociedade representada pelo Autor a 1 de Novembro de 2001) só a 31 de Julho de 2007 é que tal registo expirou, conforme se pode verificar da análise da descrição do registo do domínio na base de dados WHOIS (Documentos nº 12 e 13 da P.I.), em virtude de não ter sido comprovada até àquela data a titularidade da marca GLOBAL.

J - O que não pôde fazer em virtude de no ano de 2007 a Ré não ter ainda proferido despacho final de concessão do registo da marca.

L - Ora, se o único dano peticionado nos presentes autos diz respeito ao cancelamento do registo do domínio “g-----.info”, nunca antes da data do cancelamento se poderia iniciar o prazo de prescrição, porquanto o dano não se havia ainda produzido.

M - Pelo que, considerando-se a acção proposta a 30 de Outubro de 2009, foi interrompido o prazo prescricional de 3 anos muito antes do seu decurso.

N - Na verdade, em acção paralela que correu termos na Unidade Orgânica nº5 do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, sob o número de processo 1158/13.4BEPRT, em que o recorrente peticionava danos morais pelo atraso no processo de concessão da marca G. (isto é, a causa de pedir do processo era a mesma, exactamente o mesmo acto ilícito, mas peticionava-se a compensação de um dano distinto), foi decidida a excepção de prescrição como não procedente (Vide despacho saneador sentença, que adiante se junta como Doc. Nº1), ali se considerando que a prescrição iniciou a 15 de Outubro de 2010, data em que o Réu/recorrido proferiu o despacho de deferimento do registo da marca.

O - Pelo que, deve ter-se como não provada a excepção de prescrição.

Termos em que, e nos melhores de Direito doutamente supridos por Vªs. Exªs., se requer que se dignem julgar o presente recurso procedente, por provado, revogando a douta sentença proferida pelo digníssimo Tribunal a quo, com todas as consequências legais.»

1.8. O Réu contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

« A – A sentença proferida pelo Tribunal a quo andou bem quando decidiu no sentido de se haver verificado o período de tempo necessário para que opere a prescrição dos alegados danos sofridos pelo Recorrente;
B – Com efeito, nos termos da lei, e considerando os prazos previstos para a concessão do registo, o correspondente processo deveria ter conhecido o seu final até Março de 2004, momento após o qual a sociedade não poderia deixar de ter consciência e conhecimento de que ocorria o alegado atraso ilegal por banda do Recorrido;
C – Nesse sentido, o início do decurso do prazo prescricional teve lugar nessa data, havendo os três anos sido completados em Março de 2007;
D — Ora, havendo a presente ação iniciado os seus termos em Outubro de 2009, o alegado direito a que o Recorrente se arroga estaria, já nessa altura, irremediavelmente prescrito;
E — Acresce que o próprio direito de registo a que o Recorrente se arroga não pode deixar de ser considerado como nulo;
F — Com efeito, o Recorrente confessa que registava marcas não para assinalar quaisquer produtos, serviços ou bens, mas sim para lhe ser possível registar nomes de domínio, no que se denomina de cybersquatting;
G — Ora, são nulos os registos de marca concedidos em violação do disposto no artigo 238.º do CPI, designadamente por não cumprirem com o disposto no artigo 225.º do mesmo código (se destinem a assinalar bens, produtos ou serviços);
H — Pelo que o Recorrente não tem qualquer expetativa a ser indemnizado com base na tardia concessão de um registo a que, confessadamente, não teria direito;
I — Por último, deve notar-se ainda que o Recorrente não fez prova, em momento algum, dos danos alegadamente sofridos, limitando-se a referir o montante de € 300.000,00, sem qualquer suporte fatual, termos em que incumpre o ónus de alegação e prova que sobre si impendia;
J — Pelo que a sentença recorrida deve ser mantida nos seus precisos termos e, mesmo que assim não se entenda no que concerne à prescrição, sempre deveria o pedido formulado improceder.

Nestes termos, e nos demais de direito que V. Exa., Venerando Senhor Juiz Desembargador Relator mui doutamente suprirá requer-se seja negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.»

1.9.O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º1 do CPTA, emitiu parecer, pronunciando-se pela improcedência do recurso e pela confirmação da decisão.

1.7. Prescindindo-se dos vistos legais mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*

II.DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado em função do teor das conclusões do Recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso –cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e artigos 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do NCPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA – e, por força do regime do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem no âmbito dos recursos de apelação não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

2.2. Nos presentes autos, a questão que a este tribunal cumpre ajuizar, cifra-se em saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito por nela se ter julgado procedente a exceção da prescrição.
**
III. FUNDAMENTAÇÃO
III.A DE FACTO

3.1. O Tribunal de 1.ª instância considerou provados os seguintes factos (não objeto de sindicância por parte do Recorrente, que limitou o seu recurso à interpretação e aplicação do direito, como resulta nomeadamente da falta de qualquer referência - e cumprimento - ao ónus de impugnação previsto no art. 640.º, nº 1 do CPC):
«I - Em 16/09/1998, a sociedade C., Ld.ª, apresentou nos serviços do R. pedido de registo de marca nacional, para a classe de serviços 38, concretamente para a marca “I.” (cfr. fls. 1 do processo administrativo apenso);
II - A tal pedido foi atribuído o n.º de processo 332536 J MNA (cfr. fls. 1 do processo administrativo apenso);
III - Em 23/10/1998, a sociedade C. apresentou requerimento para alteração da reprodução do sinal e da classe, e em 17/11/1998 apresentou novo requerimento para alteração da classe da marca “I.” (cfr. fls. 3 e 4 do processo administrativo apenso);
IV - Em 02/03/1999, e na sequência de publicação no Boletim da Propriedade Industrial, foi apresentada reclamação quanto ao pedido de registo da marca “I.” (cfr. fls. 5 a 12 do processo administrativo apenso);
V - Em 04/03/1999, a sociedade C. apresentou requerimento em que formulou pedido de substituição do sinal e serviços, desta feita pretendendo o registo da marca “G.”, e em 04/08/1999 procedeu ao pagamento das taxas (cfr. fls. 13 a 16 do processo administrativo apenso);
VI - Em 29/11/2000, a sociedade C. apresentou requerimento em que esclarece que, tendo requerido o registo da marca nacional n.º 332536, com o sinal misto “G.”, pretende efectuar o registo da marca nos precisos termos do n.º 2 do art.º 166º do Código da Propriedade Industrial, não pretendendo reivindicar a exclusividade do sinal (cfr. fls. 17 e 18 do processo administrativo apenso);
VII - Em 04/06/2001, tal pedido foi indeferido provisoriamente, e a sociedade C. notificada da decisão de recusa provisória por ofício datado de 06/06/2001 (cfr. fls. 19 a 21 do processo administrativo apenso);
VIII - Em 29/06/2001, a sociedade C. pediu ao R. a prorrogação do prazo por dois meses para responder à recursa provisória, o que foi deferido pelo R. e notificado à sociedade C. por ofício datado de 12/07/2001 (cfr. fls. 22 a 27 do processo administrativo apenso);
IX - Em 16/10/2001, a sociedade C. apresentou nos serviços do R. resposta à recusa provisória e pedido de reivindicação de cores (cfr. fls. 28 a 42 do processo administrativo apenso);
X - Em 24/10/2001, o R. indeferiu o pedido de registo da marca “G.”, formulado pela sociedade C., tendo esta sido notificada de tal decisão por ofício datado de 16/01/2002 (cfr. fls. 43 a 49 do processo administrativo apenso);
XI - Em 30/01/2002, a sociedade C. apresentou nos serviços do R. recurso hierárquico (cfr. fls. 50 a 62 do processo administrativo apenso);
XII - Em 19/03/2002, o R. proferiu decisão sobre o recurso hierárquico, pelo qual, dando razão à sociedade C., revogou a decisão de indeferimento do pedido de registo, tendo esta decisão sido notificada à sociedade em 26/03/2002 (cfr. fls. 63 a 77 do processo administrativo apenso);
XIII - Em 31/01/2002 foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial o pedido de reivindicação de cores da marca “G.”, pelo que, em 09/05/2002 a sociedade C. apresentou requerimento em que deu por satisfeita a exigência de publicação (cfr. fls. 78 a 86 do processo administrativo apenso);
XIV - Em 17/07/2003, a sociedade C. apresentou nos serviços do R. pedido de suspensão de estudo pelo prazo de dois meses, o que foi deferido pelo R. e notificado à sociedade (cfr. fls. 87 a 89 do processo administrativo apenso);
XV - Em 15/10/2010, o R. proferiu decisão de deferimento do pedido de registo da marca nacional n.º 332536- “G.”, tendo esta decisão sido notificada à sociedade por ofício com a mesma data (cfr. fls. 90 a 95 do processo administrativo apenso);
XVI - Por decisão emitida em 08/10/2008, e transitada em julgado em 21/10/2008, foi dissolvida e encerrada a liquidação da sociedade C., Ld.ª (cfr. certidão remetida a estes autos pela Conservatória do Registo Comercial do Porto em 17/03/2015);
XVII - Em 30/10/2009, o A. apresentou pedido de concessão de apoio judiciário, tendo sido proferida decisão em 22/10/2010 pela qual foi deferido o pedido em causa nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo e nomeação e pagamento da compensação a patrono (cfr. documentos remetidos aos autos pelo Instituto da Segurança Social, IP, em 22/12/2011);
XVIII - A petição inicial deu entrada neste Tribunal em 23/11/2011.

Inexistem outros factos relevantes para apreciação da excepção de prescrição.

A selecção da factualidade acabada de elencar resulta, essencialmente, do alegado pelo A. e pelo R. nos respectivos articulados, sendo que se cuidou de realizar uma enunciação dos factos mais rigorosa em atenção ao que resulta também do processo administrativo junto aos autos pelo R.. Ressalta-se, também, que o A., conhecendo a factualidade por si invocada, e a invocada pelo R., bem como tendo sido notificado da apensação do processo administrativo, não realizou nem a impugnação dos factos que se espraiaram no probatório, nem a impugnação do acervo documental de que o Tribunal se socorreu.»
**

III.B. DO DIREITO

3.2. O Apelante pretende ver reapreciada e revogada a decisão que julgou verificada a prescrição do direito indemnizatório que pretendia fazer valer no âmbito da ação que intentou contra o INPI.
Ora, in casu, verifica-se que tal exceção peremptória foi suscitada no respetivo articulado de contestação por parte do R. e a ela respondeu o A., tendo-se o tribunal a quo pronunciado no despacho saneador – sentença, nos seguintes termos:
«Colhida a factualidade relevante, impõe-se assentar que o pedido de registo da marca “global” apenas foi apresentado nos serviços do R. em 04/03/1999, sendo que o pagamento das taxas devidas para prosseguimento do pedido apenas foi concluído em 04/08/1999 (cfr. ponto V do probatório). O que quer significar que, apenas a partir de 04/08/1999 é que o pedido de registo reuniu todas as condições para ser apreciado á luz do disposto nos art.ºs 181º e ss. do Código da Propriedade Industrial (doravante, CPI) então em vigor (aprovado pelo Decreto- Lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro, com as alterações posteriores).
Sucede que, e após novo pedido de alterações efectuado pela sociedade C., o R. prolatou, em 04/06/2001, decisão de recusa provisória de registo, decisão esta que veio a tornar-se definitiva em 24/10/2001 e que, após diversas vicissitudes e recurso hierárquico, viria a ser revogada e substituída pela decisão de concessão provisória do registo, emitida em 19/03/2002 (cfr. pontos VI, VII, VIII, IX, X, XI e XII do probatório). E tendo sido demonstrado, em 09/05/2002, que a publicação exigida no art.º 185º do CPI já tinha ocorrido em 31/01/2002, assoma como cristalino que, pelo menos a partir de Junho de 2002, iniciou-se o decurso do prazo de 18 meses, previsto no art.º 187º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPI. Por conseguinte, tal prazo terminaria em Dezembro de 2003.
Contudo, é de assinalar que, em 17/07/2003, ou seja, antes do terminus de tal prazo de 18 meses, a sociedade C. apresentou pedido de suspensão do estudo do processo por 2 meses, tendo tal pedido sido deferido. Sendo assim, e porque a sociedade C. nada mais requereu após essa data, resulta inequívoco que o R., em cumprimento do prazo descrito no art.º 187º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPI, deveria ter proferido a decisão final sobre o pedido de registo da marca até Março de 2004. A partir desta data, e não resultando do processo administrativo a existência de qualquer outra vicissitude posterior, é de assumir que o R., porque esgotados os prazos procedimentais para decidir do pedido de registo apresentado pela C. para a marca “G.”, se encontra em situação de omissão, situação esta susceptível de causar prejuízo à sociedade C..
Ora, em nosso entendimento, o momento relevante para fixar o início da contagem do prazo prescricional de 3 anos, descrito no art.º 498º, n.º 1 do Código Civil e aplicável à vertente situação quer por via do disposto no Decreto-Lei n.º 48051, de 21/11/1967, quer por via da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, é precisamente o do termo do prazo para o R. proferir a decisão quanto ao pedido do registo da marca “G.”, uma vez que, a partir desse momento a sociedade C. estava em condições de percepcionar não só o atraso para além dos prazos prescritos na lei, como o resultado danoso, nomeadamente a título de diminuição ou perda de expectativa de ganho, que resultavam da não prolação de decisão quanto ao registo da marca. E tal convicção sai reforçada pela alegação do A. no que concerne à disputa internacional que a sociedade C. encetou relativamente a um domínio, disputa essa que ficou resolvida em 01/11/2001 de acordo com as alegações do A..
Sendo assim, sabendo a sociedade C. que o registo do domínio “g-----.info” ficou definitiva e somente condicionado, a partir de 01/11/2001, pela decisão a proferir pelo R. quanto ao registo da marca “G.”, apresenta- se como evidente que, a partir de Março de 2004, a dita sociedade não poderia deixar de ter consciência e conhecimento de que ocorria atraso ilegal por banda do R. quanto à emissão da decisão relativa ao pedido de registo, e de que tal atraso era causador de danos na sua esfera jurídica, muito embora com desconhecimento da respectiva amplitude e dimensão.
Por outro lado, refira-se que não faz sentido a tese do A. de que, tendo a decisão quanto ao pedido de registo sido proferida pelo R. em 15/10/2010, o prazo prescricional apenas iniciaria a respectiva contagem em tal data, uma vez que apenas naquela data é que o A. teve conhecimento do dano. É que, quando muito, a prolação da decisão em 15/10/2010 colocou um termo na produção de um prejuízo, não constituindo, por isso, elemento imprescindível para o exercício do direito de indemnização por banda do A.. Ademais, refira-se que, nos termos do disposto no art.º 33º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, a presente acção considera-se proposta em 30/10/2009, pelo que, manifestamente, não pode o A. sustentar que apenas se encontrava em condições de exercer o seu direito indemnizatório em 15/10/2010 dado que propôs a vertente acção em data muito anterior.
Destarte, atenta a fundamentação exposta, bem como ao disposto no art.º 498º, n.º 1 do Código Civil, impõe-se concluir que, na data em que a presente acção se considera proposta- 30/10/2009-, já há muito tinha decorrido o prazo de prescrição de três anos para o A. exercer o seu direito de indemnização.»

3.3.Entende o Apelante que o direito a ser indemnizado pelos danos provocados pelo arrastar no tempo da decisão a proferir pelo INPI ainda não prescreveu, contrariamente ao que diz o tribunal a quo, porque o início do prazo prescricional só pode ser fixado com o termo da omissão, ou seja, com a prolação do despacho final do processo de registo da marca, que foi proferido a 15 de outubro de 2010, uma vez que o ato danoso se constituiu, na situação sub judice, na omissão da prática do facto devido em tempo razoável ( conclusões A a D).
Por outro lado, acrescenta que a prescrição nunca poderia começar antes da verificação do dano que corresponde à perda do registo do domínio “g-----.info”, que apenas ocorreu a 31 de julho de 2007, sendo este o único dano peticionado nos presentes autos.
Mas esta sua alegação não poderá proceder.
Vejamos.

3.4.A invocação da prescrição de direitos constitui uma exceção peremptória, cuja procedência importa a absolvição total ou parcial do pedido, uma vez que o seu beneficiário tem a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (cfr. o disposto nos arts. 576º/1 e 3 do CPC e 304º/1 do CC).
Logo, a prescrição assenta no reconhecimento da repercussão do tempo nas situações jurídicas e visa, no essencial, tutelar o interesse do devedor.

Por outro lado, como decorre do disposto nos arts. 303º do Cód. Civil e 579º do C.P.C., a prescrição não é de conhecimento oficioso, sendo necessário, para que o tribunal dela conheça, a sua invocação pela parte que dela beneficia.


À prescrição estão sujeitos todos e quaisquer direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição (art. 298º/1 do C.C.) e, uma vez completado o prazo prescricional, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer forma, ao exercício do direito prescrito (art. 304º/1 do C.C.), desse modo, bloqueando e paralisando a pretensão do credor, na configuração de
exceção peremptória (art. 576º/3 do CPC).

3.5.Ora, revertendo para o caso sub judice, resulta, quer do artigo 5.º do Regime da Responsabilidade Civil do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de novembro de 1967, quer do mesmo artigo do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, quando conjugados como o artigo 498.º do Código Civil, que, em matéria de responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas públicas e dos titulares dos seus órgãos ou agentes decorrente de atos de gestão pública, o respetivo direito de indemnização prescreve no prazo de 3 anos, a contar da data em que o lesado dele teve conhecimento.

Determina o n.º 1 do art.º 498.º do Código Civil que "o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso."

E de acordo com o previsto no n.º 1 do artº 306º do CC, «O prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo de prescrição.»
Com interesse, numa abordagem que se reporta a todos os pressupostos do direito de indemnização, Rodrigues Bastos escreve que o prazo de prescrição se inicia “com o conhecimento, por parte do lesado … da existência, em concreto, dos pressupostos da responsabilidade civil, que se pretende exigir”, concluindo que “o prazo corre desde o momento em que o lesado tem conhecimento do dano (embora não ainda da sua extensão integral), do facto ilícito e do nexo causal entre a verificação deste e a ocorrência daquele” . Cfr. notas ao CC, vol. II, pág. 299).
O início do prazo é “factor estruturante do próprio instituto da prescrição, existindo, a tal propósito, no Direito comparado dois grandes sistemas: o objectivo e o subjectivo Cfr. António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, V, 2ª edição revista e actualizada, Almedina, 2015, pág. 202..

O primeiro “
é tradicional, dá primazia à segurança e o prazo começa a correr assim que o direito possa ser exercido e independentemente do conhecimento que disso tenha ou possa ter o respectivo credor, sendo compatível com prazos longos Idem.. O segundo privilegia, porém, a justiça, iniciando-se o prazo apenas “quando o credor tiver conhecimento dos elementos essenciais relativos ao seu direito e joga com prazos curtos”. Idem.

Nesta matéria, o art. 306º/1 do CC, adotou o
sistema objetivo Idem, págs.202/203. , que dispensa qualquer conhecimento, por parte do credor, dos elementos essenciais referentes ao seu direito, iniciando-se o decurso do prazo de prescrição quando o direito puder ser exercido.

Tal expressão constante dessa disposição (art. 306º/1 do CC) deve ser interpretada no sentido de o prazo de prescrição se iniciar quando o direito estiver em condições (objetivas) de o titular o poder atuar, portanto desde que seja possível exigir do devedor o cumprimento da obrigação
Cfr. Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade, 2ª edição, pág. 83., o que, no caso das obrigações sem prazo, também chamadas de obrigações puras, ocorre a todo tempo (art. 777º/1 do CC).

Uma vez iniciado o prazo de prescrição de qualquer direito, a respetiva contagem prossegue a menos que ocorra qualquer suspensão ou interrupção (arts. 318º e ss. do CC), não relevando sequer a sua transmissão (art. 308º/1 e 2 do CC).

Tal não significa que não se prevejam casos em que o início do prazo de prescrição ocorra a partir de outro evento. Assim será, porventura, quando se invoque a responsabilidade civil do Estado decorrente da função jurisdicional, dependente da revogação da decisão judicial (art. 13º da Lei nº 67/07, de 31-12), ou a responsabilidade do Estado por omissão legislativa, dependente da declaração de inconstitucionalidade por omissão, nos termos do art. 15º, nº 5, da mesma Lei.

3.6.Retira-se do exposto que o prazo de prescrição de 3 anos previsto nas identificadas disposições legais começa a correr no dia em que o credor/lesado tomar conhecimento do facto danoso, isto é, do facto ilícito e culposo que tem a virtualidade de produzir danos na sua esfera jurídica. E o facto danoso, tanto se pode traduzir na prática de um simples ato que se esgota temporalmente num único momento, havendo coincidência entre a conduta violadora realizada ou executada e a produção do dano (infração instantânea), como pode traduzir-se numa série de atos suscetíveis de configurar uma infração de natureza continuada ou permanente na qual os danos se vão produzindo em vários momentos temporais sucessivos (infração continuada).

Nesse sentido, existe abundante e consolidada jurisprudência do STA.

Como exemplo, veja-se o Acórdão proferido pelo STA no processo n.º 01203/02, de 04-12-2002, em cujo sumário se fixou que « I- O prazo especial de prescrição do direito de indemnização por responsabilidade civil extracontratual, previsto no art. 498.º, n.º 1, do Código Civil, conta-se desde a data em que o lesado teve conhecimento do seu direito de indemnização, que é aquela em ele, conhecendo a verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade, soube ter direito à indemnização pelos danos que sofreu. II - No caso de ser invocado como fundamento da responsabilidade um facto ilícito de natureza continuada, não é necessário para exercer o direito de indemnização que tenha cessado tal facto, pelo que, à face do n.º 1 daquele art. 306.º, com o conhecimento inicial dos pressupostos do direito à indemnização começou a correr o prazo de prescrição.» Cfr. Entre muitos, os Acórdãos do STA de: 12/12./89, Proc.º n.º 24 814-A; de 29/01/91, Proc.º n.º 28505; de 03/05/2001, Proc.º n.º 46599; de 13/11/2001, Proc.º n.º 47842; de 18-4-2002, Proc. n.º 950/02; de 27/04/2006, Proc. n.º 0304/05,


Ainda em relação á questão do momento a partir do qual se inicia a contagem do prazo em relação a condutas que pela sua natureza prolongam no tempo o surgimento de danos, permitimo-nos chamar à colação o acórdão do STA, de 04.12.2002, Proc. 01203/02 no qual se afirma que «a solução estabelecida não impede que, mesmo depois de decorrido o prazo de três anos e enquanto a prescrição ordinária não se tiver consumado, o lesado requeira a indemnização correspondente a qualquer novo dano de que só tenha tido conhecimento dentro dos três anos anteriores» (Das Obrigações em Geral, volume I, 6.ª edição, página 598.).
Esta possibilidade justifica-se por, relativamente a esses danos, só posteriormente o lesado conhecer a sua existência, pelo que só então ficará em condições de exercer o direito de indemnização correspondente. (Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 19-3-1998, proferido no recurso n.º 41682, publicado em Apêndice ao Diário da República de 17-12-2001, página 2188.).
No entanto, se os danos são uma mera consequência ou desenvolvimento normal dos danos iniciais, eles podem ser invocados desde início, pois o n.º 1 do art. 498.º permite o exercício do direito independentemente do conhecimento da extensão integral dos danos.
Por isso, «os danos têm de apresentar novidade no sentido de não serem a consequência ou o desenvolvimento normal e objectivamente previsível da lesão inicial. Tem de ser uma outra consequência do acto lesivo não conhecida nem cognoscível para o homem médio suposto pela ordem jurídica (segundo um critério de razoabilidade), não a simples extensão das consequências lesivas já conhecidas inerente à sua natureza duradoura», pois, «a lei tornou o início do prazo de prescrição independente do conhecimento da extensão integral dos danos, equilibrando a situação do lesado com a possibilidade de formulação de
pedidos genéricos».

Igual compreensão sobre a questão tem também o TCAN, conforme se retira do acórdão de 03.05.2013, Proc. 00905/12.6BEPRT no qual se refere o seguinte:
« A nossa mais alta jurisprudência tem sublinhado que o prazo de prescrição é um só, e será dentro dele que tem de ser exercido o direito de indemnização relativamente à «extensão integral» dos danos, o que se percebe, e se louva nas razões de certeza e segurança que justificam o instituto em causa [entre outros, o AC STA 01.06.2006, Rº0257/06].
Assim, uma conduta lesiva, mesmo sendo de natureza «continuada», não é suscetível de afetar o «termo inicial» de contagem do prazo de prescrição aqui em causa, seja de modo a deferir o seu início para o momento da cessação da conduta danosa, seja de modo a gerar o contínuo surgir de novos prazos de prescrição relativos a cada dano instantâneo.
Todavia, se assim é, pela perspetiva da ação lesiva, já assim não terá de ser, necessariamente, pela perspetiva do dano, já que é este que, constatado pelo prejudicado, despoleta o fluxo cognitivo e volitivo que o leva a conhecer o seu direito e a reagir, ou não, contra o responsável pela agressão da sua esfera jurídica.
Destarte, se um determinado dano, porque leve ou tolerado, pode não desencadear qualquer reação do respetivo prejudicado, tal não pode obstar a que novo dano, causado pela ação lesiva continuada, possa pôr termo a essa tolerância inicial, sendo certo que o «início do prazo de prescrição» relativo ao direito de indemnização por este «novo dano» não poderá, cremos, ficar refém do conhecimento, pelo lesado, do direito que lhe competia relativamente aos «danos iniciais».
Tudo depende, assim, de estarmos perante «novo dano», ou seja, perante um dano que não se traduza em mero agravamento quantitativo ou qualitativo de danos anteriores, iniciais. E neste sentido restritivo deverá, a nosso ver, ser interpretada a expressão «extensão integral dos danos» presente no nº1 do artigo 498º do CC. »

Ou ainda o Acórdão deste TCAN de 05.02.2016, proferido no processo nº 00949/14.3BEPRT: «1. O prazo da prescrição começa a contar a partir do momento em que o direito pode ser exercido (artigo 306º, nº1, do Código Civil), sendo que, no âmbito específico da prescrição do direito de indemnização, presume o legislador que o mesmo pode ser exercido a partir do momento do seu conhecimento pelo lesado, embora desconheça ainda a pessoa do responsável e a extensão integral dos danos (artigo 498º, nº1, do Código Civil).
2. Este conhecimento não implica um conhecimento jurídico, bastando um conhecimento empírico dos factos constitutivos do direito; tal conhecimento do direito não terá de coincidir, nem exige, qualquer reconhecimento judicial de algum dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos.» Cfr. Ainda Ac. Do TCAN de 05.02.2016, Proc. nº 00949/14.3BEPRT; de 28/02/2014, no Proc. n.º 00332/04.9BEVIS,


Também a doutrina tem chegado à mesma conclusão, referindo, Carlos Alberto Fernandes cadilha, in, Regime da responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais entidade públicas, pág. 96, ainda que em anotação ao artigo 5º da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, mas cujo conteúdo é perfeitamente aplicável ao caso dos autos, que:
De todo o exposto é perfeitamente claro que o prazo de prescrição corre a partir da data em que o lesado teve conhecimento do seu direito ou, dito de outro modo, o “ dies a quo” ocorre no momento em que o lesado soube que se iniciara a conduta lesiva”.

Assim, não tem razão o Apelante quando pretende que o início do prazo prescricional só pode ser fixado com o termo da omissão, ou seja, com a prolação do despacho final do processo de registo da marca, que foi proferido a 15 de outubro de 2010.

Como bem decidiu o Tribunal a quo, o momento a partir do qual o prazo de prescrição passou a correr, é o momento em que expirou o prazo legal de que o INPI dispunha para efetuar o registo da marca em causa, momento esse que é aquele em que o Apelante teve conhecimento do seu direito, ou seja, aquele em que se iniciou a conduta lesiva do INPI e não aquele em que essa conduta lesiva terminou, por então ter sido praticado o ato em causa.
É a partir do fim do prazo de que o INPI dispunha para proceder ao registo da marca “global”, ou seja, março de 2004, que ocorre a conduta lesiva do INPI, pois só a partir de então é que em relação ao INPI se lhe pode assacar estar a violar o direito do autor á obtenção do ato requerido dentro do prazo previsto na lei.
Só a partir de então- março de 2004- se poderá imputar ao INPI a omissão da prática do ato devido em tempo razoável.

Diz ainda o Apelante que a prescrição nunca poderia começar antes da verificação do dano que corresponde à perda do registo do domínio “g-----.info”, que apenas ocorreu a 31 de julho de 2007, sendo este o único dano peticionado nos presentes autos.
Mas sem razão.

Para que seja admitida a invocação de danos para além do prazo de três anos em que o facto danoso foi conhecido (danos novos) não é suficiente a demonstração de que os danos se produziram em momento posterior; os novos danos são apenas aqueles que constituem uma consequência do ato lesivo não conhecida ou cognoscível por um homem médio (pessoa razoável e diligente).
Se os danos, embora ocorrentes em momento posterior ao ato lesivo, constituírem um mero desenvolvimento normal e objetivamente previsível da lesão inicial não estaremos perante danos novos..

No caso, conforme bem notou a Meritíssima juiz a quo no aresto sob sindicância « sabendo a sociedade C. que o registo do domínio “g-----.info” ficou definitiva e somente condicionado, a partir de 01/11/2001, pela decisão a proferir pelo R. quanto ao registo da marca “G.”, apresenta- se como evidente que, a partir de Março de 2004, a dita sociedade não poderia deixar de ter consciência e conhecimento de que ocorria atraso ilegal por banda do R. quanto à emissão da decisão relativa ao pedido de registo, e de que tal atraso era causador de danos na sua esfera jurídica, muito embora com desconhecimento da respectiva amplitude e dimensão.».

Sabendo o autor que o registo do domínio “g-----.info” «ficou definitiva e somente condicionado, a partir de 01/11/2001, pela decisão a proferir pelo R. quanto ao registo da marca “G.”», não pode aceitar-se a tese do Apelante em como o dano decorrente da conduta omissiva do INPI apenas ocorreu em 2007.

No caso, tal como considerou o Tribunal a quo, resultando do probatório que o Apelante teve conhecimento de todos os pressupostos de verificação da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, desde, pelo menos, março de 2004, então é seguro que, quando a presente ação administrativa comum foi intentada — 30/10/2009 — e, consequentemente, quando o R. foi citado para os termos da presente ação, o direito por ele invocado já se encontrava prescrito.


Por conseguinte, o direito do Apelante prescreveu, pelo decurso do prazo prescricional de três anos previsto no nº 1 do art. 498º do CC, em março de 2009 pelo que, quando a ação foi proposta, já se havia verificado a prescrição.
**
IV-DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
*
Custas pelo Apelante, nos termos do artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
*
Registe e notifique.
*
Porto, 30 de abril de 2020.

Helena Ribeiro
Conceição Silva
Alexandra Alendouro