Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00136/00 - PORTO |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 03/25/2010 |
Relator: | Francisco Rothes |
Descritores: | MAIS-VALIAS - IRS - REGIME TRANSITÓRIO - ART. 5.º DO DECRETO-LEI N.º 442-A/88, DE 30 DE NOVEMBRO |
Sumário: | I - Por força do disposto no art. 5.º, n.º 1, do DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, diploma que aprovou o CIRS, fixando um regime transitório para os rendimentos da categoria G, os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado após a entrada em vigor daquele código, em 1 de Janeiro de 1989. II - Assim, não estão sujeitos a tributação em IRS os ganhos resultantes da venda efectuada em 1993 de um prédio adquirido em 1979 como prédio rústico e que mantinha essa natureza à data da entrada em vigor do CIRS. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | 1. RELATÓRIO 1.1 A administração tributária (AT) considerou que os ganhos resultantes da alienação de um terreno efectuada por ANTÓNIO DE OLIVEIRA e mulher, BELANDINA (adiante Contribuintes, Impugnantes ou Recorridos) no ano de 1993 estão sujeitos a tributação em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), a título de mais-valias. Assim, e porque os Contribuintes omitiram esses rendimentos na declaração que apresentaram, corrigiu os rendimentos declarados e procedeu à liquidação adicional do imposto considerado em falta e respectivos juros compensatórios. 1.2 Os Contribuintes impugnaram judicialmente essa liquidação, pedindo ao Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto que a anulasse, com os seguintes fundamentos: 1.3 Quando da apreciação do pedido efectuada nos termos do art. 130.º do Código de Processo Tributário (CPT), a AT revogou parcialmente o acto impugnado reconhecendo que na liquidação não fora tido em conta o valor de aquisição do terreno, de Esc. 2.300.000$00, o qual deverá ser devidamente actualizado mediante o coeficiente de desvalorização da moeda de 6,42. 1.4 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (() Entretanto, o Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto foi extinto, tendo-lhe sucedido na sua competência o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. ) julgou a impugnação judicial procedente. Para tanto, depois de enunciar as questões a apreciar e decidir como sendo as de indagar da eventual ilegalidade da liquidação adicional por «preterição de formalidades legais e inexigibilidade do imposto» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.-() Salvo o devido respeito, é manifesto o lapso na qualificação do vício como «inexigibilidade», como, aliás, resulta do parágrafo seguinte da sentença, onde o mesmo vício é, correctamente, qualificado como «de natureza material, resultante do facto de se ter tributado operação não sujeita a imposto». ), considerou, em síntese, o seguinte: 1.5 Quer a Fazenda Pública quer o Impugnante recorreram da sentença, sendo que o recurso interposto pelo Impugnante foi-o subordinadamente, e ambos os recursos foram admitidos, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. 1.6 A Fazenda Pública apresentou alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida». 1.7 O Impugnante apresentou as alegações de recurso e as contra alegações ao recurso da Fazenda Pública, o que tudo resumiu em conclusões do seguinte teor: «A - Deveria ter sido considerada a seguinte matéria de facto: B - Desta matéria, resulta a preterição de formalidades legais, por violação do disposto no Art.º 68º n.º 1 e 4 do CIRS e Art.º 84º do C.P.T, em especial, porque no caso, ocorreu erro na quantificação da matéria colectável, por não ser considerado o custo de aquisição do terreno na liquidação do imposto; C - Na douta sentença recorrida, não se atendeu à concreta redacção das normas fiscais referentes ao ano da tributação, sendo consideradas as normas com a redacção do Dec.-Lei n.º 7/96, que é posterior ao ano fiscal a que se reporta o rendimento; D - Na douta sentença, não se apreciou o invocado erro de quantificação da matéria colectável, por não ter sido considerado o preço de aquisição do imóvel pelos impugnantes, o que determinaria que no caso, a liquidação tinha que ser anulada, por força do erro cometido; E - Assim, a sentença em causa, não apreciou o conjunto dos vícios invocados em sede de Impugnação, sendo que da sua apreciação, deveria resultar a procedência da presente; EM RESPOSTA F- A Fazenda não logrou trazer aos autos a prova de que o terreno em causa, se encontrava ao abrigo de qualquer situação a que se reporta o Art.º 1º do CIMV, nem a inscrição do terreno para efeitos de CA tem reflexo para a sujeição do mesmo ao IMV, ou a IR decorrente de ganhos de mais valias, dado que se trata de contribuição de natureza distinta, e com regras distintas das regras inerentes à tributação do rendimento; E- Em segundo lugar, o apelo ao critério único do preço praticado, sem que seja presente qualquer dado ou elemento de comparação, não permite que se conclua sem mais que houve intenção de aproveitar ganhos do eventual destino do terreno para efeitos de construção, devendo dizer-se em todo o caso que a lei não comporta tal conceito; Nestes termos e nos mais de direito, deve dar-se provimento ao recurso subordinado e desatender-se o recurso principal. Assim fazendo, farão V. Exas. sã e inteira JUSTIÇA». 1.8 A Fazenda Pública não contra alegou o recurso do Impugnante. 1.9 Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Norte, o processo foi com vista ao Ministério Público, que se absteve de emitir parecer. 1.10 Entretanto os Impugnantes vieram invocar a prescrição da obrigação tributária, ao que a Fazenda Pública respondeu que o prazo prescricional se encontra suspenso por força da suspensão do processo de execução fiscal face à garantia prestada pelos Executados, aqui Impugnantes. 1.11 Foram colhidos os vistos dos Juízes adjuntos. 1.12 As questões sob recurso, delimitadas pelas conclusões dos Recorrentes, são as de saber: Previamente, porque os Impugnantes invocaram perante esta Tribunal Central Administrativo Norte a prescrição da obrigação tributária que teve origem no acto ora impugnado, cumpre também tecer alguns considerandos em torno da questão. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO2.1 DE FACTO 2.1.1 Na sentença recorrida o julgamento de facto foi efectuado nos seguintes termos: « III. FACTOS PROVADOS Compulsados os autos e vista a prova produzida, dão-se como provados os seguintes factos: * * * * * * * * IV. FACTOS NÃO PROVADOS Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação judicial admitida liminarmente, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita. * * * * * * * * III. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO A convicção do Tribunal efectuou-se com base no exame do teor dos documentos e certidões, que dos presentes autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório». * 2.2.1 DA PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA Vieram os Impugnantes, em sede do presente recurso, invocar a prescrição da obrigação tributária. 2.2.1.1 Como é sabido, a prescrição da obrigação tributária não pode constituir fundamento da impugnação da liquidação pois respeita, não à validade deste acto, mas à exigibilidade da obrigação criada com a liquidação. Ou seja, a prescrição da obrigação tributária determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva. Assim, a sede própria para invocar a prescrição da obrigação tributária, quando esta não seja oficiosamente conhecida – como deve ser, nos termos do art. 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) – é a execução fiscal, onde o executado pode argui-la, ou mediante requerimento endereçado ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável, nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT, ou, se estiver em tempo, mediante oposição à execução fiscal (cf. arts. 203.º e 204.º, n.º 1, alínea d), do CPPT). Em todo o caso, o prosseguimento da impugnação, no caso de a obrigação tributária não estar ainda solvida e de ser inquestionável o decurso do prazo da respectiva prescrição, constitui acto inútil: a AT, ainda que a impugnação seja julgada improcedente, não poderá instaurar execução com vista à cobrança da dívida correspondente, bem como deverá oficiosamente declarar extinta a execução, caso esta tenha já sido instaurada. Assim, apesar de a prescrição não poder constituir fundamento de impugnação judicial da liquidação, a jurisprudência tem vindo a admitir que pode ser apreciada nessa sede como motivo da inutilidade superveniente da lide: verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade; nesse circunstancialismo, deve extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide (cf. art. 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC) (() Neste sentido, · na doutrina, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 5.ª edição, I volume, anotação 5 ao art. 99.º, pág. 708/709, e II volume, anotação 4 ao art. 175.º, pág. 205, e Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, págs. 21 a 23; · na jurisprudência, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: – de 16 de Janeiro de 2008, proferido no processo com o n.º 451/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Maio de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32210.pdf), págs. 38 a 42 e com texto integral disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/22e98ba36e893ecc802573d90040950e?OpenDocument; – de 11 de Março de 2009, proferido no processo com o n.º 659/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 378 a 384, e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1b119221f4bccaa48025757b00441aaa?OpenDocument.). No entanto, a nosso ver, a referida possibilidade de conhecer prejudicialmente da prescrição em sede de impugnação judicial apenas se impõe ao tribunal caso constem dos autos todos os elementos que permitam uma avaliação segura dessa questão (() Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, pág. 22.), tanto mais que, se a obrigação tributária estiver realmente prescrita, sempre a prescrição deverá ser conhecida oficiosamente na execução fiscal, bem como sempre o impugnante aí poderá invocá-la com sucesso, nos termos que deixámos já referidos. Dito isto, passemos a apreciar se os elementos constantes dos autos permitem concluir no sentido de que a obrigação tributária correspondente à liquidação impugnada está prescrita. 2.2.1.2 Porque estamos perante IRS do ano de 1993, suscita-se desde logo uma questão de sucessão de leis no tempo: à data em que ocorreram os factos, o art. o art. 34.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Tributário (CPT), fixava o prazo da prescrição em dez anos a contar do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto tributário. Entretanto, em 1 de Janeiro de 1999 entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT) (() Cf. art. 6.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma legal que aprovou a LGT.), que veio regular a matéria da prescrição da obrigação tributária nos seus arts. 48.º e 49.º, encurtando o prazo da prescrição, de dez para oito anos (cf. art. 48.º, n.º 1). Assim, para se decidir a questão da sucessão das leis no tempo, impõe-se observar o disposto no art. 297.º, n.º 1 do Código Civil (CC) (() Disposição legal que dispõe: «A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».), aplicável ex vi do art. 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprovou a LGT. Vejamos: Se o prazo da prescrição, que teve o seu termo inicial em 1 de Janeiro de 1994, tiver corrido ininterruptamente e sem qualquer suspensão até 1 de Janeiro de 1999 (sendo que a respectiva averiguação se fará à luz da legislação então em vigor), poderemos concluir que o prazo aplicável é o de dez anos previsto no art. 34.º do CPT – pois, nesta última data, só faltariam três anos para o termo do prazo, ou seja, menos que os oito anos fixados pela LGT como prazo de prescrição. Nesse caso, e se após 1 de Janeiro de 1999 não tivessem ocorrido outros motivos de interrupção ou de suspensão da prescrição (sempre na legislação em vigor à data) para além da instauração da impugnação judicial em 27 de Abril de 1999, facto a que a lei em vigor (art. 49.º, n.º 1, da LGT) atribuía efeito interruptivo do prazo, poderia concluir-se pela prescrição da obrigação tributária. Na verdade, estando adquirido que a impugnação judicial parou em 26 de Junho de 2001 (data em que foi aberta conclusão após o parecer do Ministério Público) e que se manteve parada por mais de um ano, sendo manifesto que tal paragem não pode imputar-se ao Impugnante, haveria de se concluir pela prescrição da obrigação tributária. Isto, porque, no cômputo do prazo prescricional haveria então que somar o tempo decorrido desde o seu termo inicial até à data da instauração da impugnação judicial (1 de Janeiro de 1994 até 27 de Abril de 1999, ou seja, 5 anos 4 meses e 27 dias) com o que decorreu após um ano da paragem até ao presente (() Reportamo-nos à data da decisão porque a estamos a sindicar. No entanto, isso não significa que o prazo tenha deixado de correr nessa data.) (27 de Junho de 2002 até 25 de Março de 2010, ou seja, 7 anos 8 meses e 28 dias), o que perfaria bem mais que os dez anos de prazo de prescrição. Note-se que aquela paragem da impugnação judicial por mais de um ano por motivo não imputável ao Impugnante determinaria que o efeito interruptivo decorrente da instauração da impugnação se degradasse em suspensivo, nos termos do n.º 2 do art. 49.º da LGT, na redacção inicial do preceito (() A Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Lei de Orçamento do Estado para 2007), através do seu art. 83.º-B, revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT. No entanto, à data da sua entrada em vigor – 1 de Janeiro de 2007 (cf. o seu art. 163.º) – já se tinha verificado a paragem do processo de execução fiscal por mais de um ano.), havendo que retomar a contagem do prazo nos termos indicados naquele preceito legal: «somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período [de paragem por mais de um ano] ao que tiver decorrido até à data da autuação». Mas, reiteramos, tudo se passará assim apenas se não existirem outras causas de interrupção ou de suspensão que se imponha considerar na contagem do prazo, o que os autos não nos permitem afirmar com segurança, por carência de todos os elementos para uma apreciação segura no sentido da prescrição da obrigação tributária (com a consequente extinção da presente instância por inutilidade superveniente da lide). Aliás, a verdade é que dispomos desde já de elementos que apontam em sentido diverso. Vejamos: Apurou-se nos autos que, para cobrança coerciva da dívida que teve origem na liquidação impugnada foi instaurada em 23 de Junho de 1999 a execução fiscal com o n.º 1872199901030930, no âmbito da qual os executados, aqui Impugnantes, foram citados pessoalmente em 2 de Julho de 1999. Ora, se é certo que à data nem a instauração da execução fiscal nem a citação produziam efeitos interruptivos da prescrição (cf. art. 49.º, n.º 1, da LGT, na redacção inicial (() Note-se que no âmbito da vigência do CPT, a lei concedia efeito interruptivo à instauração da execução fiscal (art. 34.º, n.º 3). Com a LGT, tal efeito deixou de resultar da instauração da execução, como resulta do n.º 1 do art. 49.º, passando, na redacção dada a este preceito pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, a verificar-se com a citação do executado.)), a verdade é que, a fazer fé no ofício de fls. 216, em 8 de Outubro de 1999 os Executados vieram pedir a suspensão da execução fiscal, invocando a pendência da impugnação judicial e prestando garantia, mediante penhora, pelo que o prazo da prescrição se terá suspendido nos termos do n.º 3 do art. 48.º da LGT, na redacção então vigente. Seja como for, não dispomos dos elementos que nos permitam um julgamento seguro no sentido da inutilidade superveniente da lide, sendo que, para esse efeito, se impunha que os autos fornecessem todos os elementos necessários à apreciação de eventuais causas de interrupção e suspensão da prescrição, que poderão ter ocorrido noutros processos administrativos ou contenciosos. Assim, não podemos formular um juízo seguro no sentido da prescrição da obrigação tributária. * 2.2.2 A TRIBUTAÇÃO DOS GANHOS RESULTANTES DA VENDAA primeira questão a decidir relativamente ao julgamento efectuado em 1.ª instância, como adiantámos em 1.12, é a de saber se a sentença fez correcto julgamento quando considerou que a transmissão em 1993 de um terreno adquirido como prédio rústico em 1979 não está sujeita a tributação em sede de IRS, a título de mais valias, ou dela está isenta por se encontrar abrangida no regime transitório da categoria G, previsto no n.º 1 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, na redacção do Decreto-Lei n.º 142/92, de 17 de Junho. Considerou a sentença, em síntese, que o prédio em causa foi adquirido antes da entrada em vigor do CIRS, motivo por que, atento o disposto no art. 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, os ganhos resultantes da referida venda só seriam tributáveis em IRS caso o fossem já em sede de IMV, o que não se verificava pois no âmbito da vigência do CIMV só estavam sujeitos a tributação àquele imposto os ganhos resultantes das transmissões onerosas de terrenos para construção, qualidade que o terreno seguramente não tinha na data em que foi adquirido. A Fazenda Pública sustenta tese contrária, de que o prédio em causa era um terreno para construção, sendo que o momento relevante a considerar é o da venda e não o da aquisição. Vejamos, pois, com quem está a razão (() Na exposição subsequente vamos seguir de perto o acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Janeiro de 2010, proferido no processo com o n.º 969/09, ainda não publicado no jornal oficial, mas com texto integral disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/38aff4d70ed1f7c4802576bf00508d43?OpenDocument.). Nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 9.º do CIRS, constituem incrementos patrimoniais, desde que não considerados rendimentos de outras categorias, as mais-valias. E estas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do CIRS, na redacção em vigor ao tempo, são constituídas pelos ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis. Por sua vez, o art. 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, diploma que aprovou o CIRS, estabelece, no seu n.º 1, um regime transitório, nos termos do qual os ganhos que não eram sujeitos ao IMV criado pelo Decreto-Lei n.º 46373, de 9 de Junho de 1965, só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor do CIRS. Ora, o art. 1.º do revogado CIMV dispunha que o IMV incidia sobre os ganhos realizados através de, entre outros actos, transmissão onerosa de terreno para construção, qualquer que fosse o título por que se operasse, quando dela resultassem ganhos não sujeitos aos encargos de mais-valia previstos no artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, ou no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41616, de 10 de Maio de 1958, e que não tivessem a natureza de rendimentos tributáveis em contribuição industrial. Já nos termos do § 2.º deste mesmo art. 1.º do CIMV, eram havidos como terrenos para construção «os situados em zonas urbanizadas ou compreendidos em planos de urbanização já aprovados e os assim declarados no título aquisitivo». Resulta da matéria de facto que foi dada como assente que o prédio em causa foi adquirido em 1979 como rústico e foi vendido em 8 de Setembro de 1993, tendo sido declarado na respectiva escritura como prédio rústico, apesar de o vendedor em 21 de Agosto de 1989 ter apresentado declaração para inscrição do mesmo na matriz predial urbana como terreno para construção. Ou seja, o imóvel em causa era um prédio rústico na data da respectiva aquisição -1979 – e manteve essa mesma qualidade até à data da entrada em vigor do CIRS – 1 de Janeiro de 1989 (() Nos termos do disposto no art. 2.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro.). O que é decisivo para a questão da tributação em IRS, dado que para saber se se verificam os pressupostos da tributação, releva a qualidade que o bem detinha no momento da entrada em vigor do CIRS, uma vez que, como se viu, no regime transitório estabelecido para a categoria G de IRS (regime previsto no n.º 1 do art. 5.º do citado Decreto-Lei n.º 442-A/88), se estabelece que os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor deste Código. Daí que não se possa relevar a argumentação da Recorrente, de que quer o vendedor quer a compradora, o primeiro antes da venda e a segunda depois, declararam o prédio como terreno para construção para efeitos da sua inscrição na matriz, pois uma e outra declaração ocorreram em momento ulterior ao da entrada em vigor do CIRS. Daí também que não se possa relevar quaisquer indicadores (como o preço da venda) no sentido de caracterizar o prédio como terreno para construção. Salvo o devido respeito, a Recorrente não tem razão ao alegar que os ganhos são sujeitos a IRS porque estamos perante a venda de um lote de terreno para construção urbana. Como ficou dito no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 6 de Junho de 2007 (() Acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 6 de Junho de 2007, proferido no processo com o n.º 179/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 24 de Abril de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2007/32220.pdf), págs. 1160 a 1164 e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7e01622bc57f9a09802572ff003bbf55?OpenDocument.), a não tributação em IRS, a título de mais-valias, dos ganhos obtidos com a transmissão de terrenos que à data da entrada em vigor do CIRS eram qualificados como terrenos agrícolas (citado art. 5.º do DL 442-A/88) compreende-se «pelo facto de, tendo-se optado pelo cálculo dos ganhos tributáveis a título de mais-valias com base na diferença entre o valor da aquisição e o valor da transmissão, a tributação em IRS da valorização de terrenos agrícolas que haviam sido adquiridos antes da sua entrada em vigor incluiria, parcialmente, a aplicação retroactiva do novo regime de tributação a ganhos obtidos com a valorização dos prédios rústicos, pois forçosamente se iriam tributar, além dos ganhos correspondentes à valorização gerada na vigência do novo Código, também alguns correspondentes à valorização que, como prédios rústicos, pode ter tido ocorrido antes da sua entrada em vigor. Ora, essa aplicação retroactiva de normas de incidência tributária, que, a partir da revisão constitucional de 1997 é absolutamente proibida pela nova redacção dada ao art. 103°, nº 3, da CRP, só era tolerável anteriormente em situações especiais em que estivesse em causa o interesse geral (Essencialmente neste sentido, pode ver-se o acórdão do Tribunal Constitucional nº 216/90, de 20-6-1990, processo nº 203/89, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 398, página 207), que não se vislumbram em matéria de tributação de mais-valias». No caso sub judice, já o dissemos, o prédio em causa era, à data da entrada em vigor do CIRS – 1 de Janeiro de 1989 – um prédio rústico tendo sido adquirido, também nessa qualidade, antes da vigência do referido diploma legal, em 1979. Independentemente, pois, de posteriormente ter ocorrido algum facto modificativo do conteúdo do respectivo direito de propriedade (por via do pedido de inscrição na matriz de um lote de terreno para construção urbana) se não estavam, na vigência do abolido IMV, sujeitos a esse tributo os ganhos resultantes da sua transmissão, afastados estão, também, da sujeição a IRS, porque abrangidos no regime transitório previsto no n.º 1 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88 na redacção do Decreto-Lei n.º 141/92, de 17 de Junho (() Neste sentido, para além dos já referidos, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: – de 13 de Fevereiro de 2008, proferido no processo com o n.º 763/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Maio de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32210.pdf), págs. e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/c6a979bef815eeee802573f3004bcbea?OpenDocument – de 29 de Outubro de 2008, proferido no processo com o n.º 539/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Fevereiro de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32240.pdf), págs. 1215 a 1220 e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/13fb605e9132bc4c802574f7003f8ea1?OpenDocument; – de 4 de Fevereiro de 2009, proferido no processo com o n.º 872/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 185 a 189 e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8136109cc1ba5c75802575580056ac1e?OpenDocument. No mesmo sentido, por mais recente, o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 4 de Março de 2010, com texto integral disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/83b8ca1875272555802576e10054b68d?OpenDocument.). Face ao exposto, o recurso da Fazenda Pública não pode ser provido, sendo de manter a decisão recorrida, que anulou a liquidação impugnada, motivo por que fica prejudicado o conhecimento do recurso subordinado. * 2.2.3 CONCLUSÕESPreparando a decisão, formulam-se as seguintes conclusões: I - Por força do disposto no art. 5.º, n.º 1, do DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, diploma que aprovou o CIRS, fixando um regime transitório para os rendimentos da categoria G, os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado após a entrada em vigor daquele código, em 1 de Janeiro de 1989. II - Assim, não estão sujeitos a tributação em IRS os ganhos resultantes da venda efectuada em 1993 de um prédio adquirido em 1979 como prédio rústico e que mantinha essa natureza à data da entrada em vigor do CIRS. * * * 3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo acordam, em conferência, negar provimento ao recurso da Fazenda Pública e, em consequência, não tomar conhecimento do recurso subordinado apresentado pelos Impugnantes. Sem custas, uma vez que a Fazenda Pública delas estava isenta na legislação aplicável. * Porto, 25 de Março de 2010 (Francisco Rothes) (Álvaro Dantas) (Moisés Rodrigues) |