Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00226/12.4BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/17/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:PROCEDIMENTOS CONCURSAIS; TÉCNICO SUPERIOR; BINÓMIOS DE AVALIAÇÃO
Sumário:1 – Tendo o legislador nos nºs 1 e 2 do artigo 53º da Lei 12-A/2008 compartimentado os métodos de seleção obrigatórios em dois binómios, dependentes da natureza dos candidatos, não podia a Administração escolher um único método a utilizar indistintamente a todos os candidatos, desrespeitando a natureza, objeto e objetivo desses binómios.

2 – Uma vez que o referido regime jurídico compartimentava os dois binómios avaliativos os métodos de seleção aplicáveis, não era licito à Administração tratar os dois números do artigo, relativos expressamente a realidades distintas, como se um único número de tratasse, sendo que a “unificação” dos candidatos nos era dada unicamente na graduação final (artigo 54º nº 1 al. c) da Lei 12-A/2008).

3 - Efetivamente, o referido regime concursal impunha que no recrutamento teriam de ser utilizados, em regra e obrigatoriamente os seguintes métodos de seleção:
a) - Provas de conhecimentos e avaliação psicológica, para os candidatos em geral;
b) - Avaliação curricular e Entrevista de avaliação das competências, para outros candidatos, designadamente para os que fossem já titulares da categoria.

4 – O "elevado número de candidatos" podia constituir um "caso excecional" justificativo da aplicação de um único método de seleção, escolhido de entre o grupo em que se inserem os respetivos candidatos, não sendo lícito “ir buscar” um método avaliativo a grupo funcional diverso.
O nº 4 do artigo 53° da Lei n° 12-A/2008, de 27/02, previa que, preenchidos que estivessem os pressupostos e requisitos nele enunciados, a entidade empregadora poderia utilizar apenas os métodos referidos nas alíneas a) dos nºs 1 ou 2, sendo que não havia intercomunicabilidade de métodos de seleção entre os dois números do referido normativo.

5 – A diferença de métodos de recrutamento decorria do posicionamento funcional dos candidatos, aplicando-se excecionalmente apenas um dos métodos previstos para cada um dos grupos de candidatos, sem que os mesmos se pudessem cruzar.
Assim, nas situação excecionais a que se reporta o nº 4° do art. 53° da LVCR, a escolha do único método de avaliação a utilizar era sempre feita entre os dois métodos do respetivo grupo, sem recurso aos dois métodos do outro grupo funcional.
Importava assim respeitar a independência e a ausência de intercomunicabilidade dos dois binómios relativos aos métodos de seleção obrigatórios definidos nos n.ºs 1, 2 do artigo 53.° da LVCR. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Administração Regional de Saúde do Centro IP
Recorrido 1:Ministério Público
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
O Ministério Público intentou Ação Administrativa Especial contra a Administração Regional de Saúde do Centro IP, na qual peticionou a declaração de nulidade dos seguintes Atos:
1- Deliberação do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., de 11 de Março de 2010, que autorizou a abertura de procedimentos concursais comuns para o preenchimento de postos de trabalho, previstos e não ocupados, na carreira e categoria de Técnico Superior – área de serviço social, dos mapas de pessoal dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., na modalidade de relação jurídica de emprego público a constituir por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, publicada no DR, 2ª Série, nº 61, de 29/03/2010, Aviso nº 6408/2010, com a declaração de retificação nº 723/2010, no DR, 2ª série, nº 72, de 14/04/2010 (docs. nºs 1 e 2);
2- Deliberações do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., de 12 de Abril de 2011, que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos procedimentos concursais comuns para recrutamento de técnicos superiores (área de serviço social), em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, para ocupação de postos de trabalho nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., com as Referências A (Baixo Vouga I), B (Baixo Vouga II), C (Baixo Vouga III), D (Cova da Beira), E (Baixo Mondego I), F (Baixo Mondego II), G (Baixo Mondego III), H (Pinhal Interior Norte I), I (Pinhal Litoral I), J (Pinhal Litoral II), K (Pinhal Interior Norte II), M (Dão Lafões II) e N (Dão Lafões III), publicadas no DR, 2ª Série, nº 88, de 06/05/2011, Aviso nº 10350/2011 (doc. nº 3);
B) Mais pede:
3 - que seja declarada a nulidade consequente de todos os atos subsequentes dos procedimentos concursais em causa e dos contratos de trabalhos já outorgados e dos que venham a ser outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais;
4 – que a Ré seja condenada ao restabelecimento da situação que existiria se esses atos não tivessem sido praticados e a praticar os atos legalmente devidos, em substituição daqueles, designadamente, procedendo a nova abertura dos referidos procedimentos concursais comuns sem que a falta de apresentação dos documentos que devam acompanhar o formulário de candidatura – à exceção dos que efetivamente se destinem a comprovar os requisitos de admissão legalmente exigidos – constitua causa de exclusão dos candidatos, e bem assim com a utilização de, pelo menos, dois métodos de seleção obrigatórios (prova de conhecimentos e avaliação curricular) a aplicar a universos distintos de candidatos, nos termos supra expostos e em conformidade com o disposto no art. 53º, nºs 1, 2 e 4, da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, e no art. 47º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, e cujos critérios de classificação a aplicar na avaliação curricular sejam também expurgados dos supra indicados vícios.

Correspondentemente, decidiu o Tribunal a quo em 25 de fevereiro de 2013, julgar a ação parcialmente procedente e assim:
“1- Anula, por violação, no programa do concurso, do artigo 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008 na redação anterior à introduzida pela Lei nº 55-A/2010 de 31/12, as deliberações do conselho de administração do Réu, de 12 de Abril de 2011, que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos procedimentos concursais comuns para recrutamento de técnicos superiores (área de serviço social), em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, para ocupação de postos de trabalho nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., com as Referências A (Baixo Vouga I), B (Baixo Vouga II), C (Baixo Vouga III), D (Cova da Beira), E (Baixo Mondego I), F (Baixo Mondego II), G (Baixo Mondego III), H (Pinhal Interior Norte I), I (Pinhal Litoral I), J (Pinhal Litoral II), K (Pinhal Interior Norte II), M (Dão Lafões II) e N (Dão Lafões III), publicadas no DR, 2ª Série, nº 88, de 06/05/2011, Aviso nº 10350/2011 (doc. nº 3).
2- Declara a nulidade dos contratos de trabalhos já outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais;
3- Condena o Réu a retomar os procedimentos concursais no ato da decisão de abertura, inclusive, com as seguintes vinculações:
a) Utilização de, pelo menos, dois métodos de seleção obrigatórios (prova de conhecimentos e avaliação curricular) a aplicar a universos distintos de candidatos em conformidade com a interpretação aqui feita do nº 4 do art. 53º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02
b) Fixação dos parâmetros de avaliação diferenciados em função de cada um dos dois métodos de seleção.
No mais, julga-se a ação improcedente.”

A Administração Regional de Saúde do Centro IP, Inconformada com o Acórdão proferido no TAF de Coimbra, veio a interpor Recurso Jurisdicional para esta Instância, aí tendo concluído:
“A - O Ministério Público (MP) junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (TAF de Coimbra), instaurou ação administrativa especial contra a Administração Regional de Saúde do Centro, IP, na qual pedia a declaração de nulidade de duas deliberações por esta tomadas.
B - Por Acórdão de 25 de fevereiro de 2012, do TAF de Coimbra, foi proferida sentença anulatória, “por violação, no programa do concurso, do artigo 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008 na redação anterior à introduzida pela Lei nº 55-A/2010 de 31/12, das deliberações do conselho de administração do Réu, de 12 de abril de 2011, que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos procedimentos concursais comuns para recrutamento de técnicos superiores (…)” - Cfr. fls. 29 do Acórdão.
C - Tendo sido formulado pedido de declaração de nulidade das deliberações tomadas pela Recorrente, cabia ao tribunal a quo (só) julgar este pedido do MP, fundando a decisão nos factos por este alegados, com exceção dos factos notórios e de conhecimento oficioso, e nas questões suscitadas pelas partes - Arts. 264º, nº 2 e 660º, nº 2 ambos do CPC.
D - No entanto, apesar de ter decidido que “(…) a sanção que corresponde à invalidade dos atos impugnados é, por este ponto de vista, a da mera anulabilidade (Cfr. Artigo 135º do CPA)” e não a nulidade, como sustenta o MP (Cfr. fls. 24 e 25 da Sentença), o Tribunal a quo anulou uma das deliberações da Recorrente, a última tomada em 12 de abril de 2011, julgando parcialmente procedente a ação de nulidade intentada pelo MP.
E - O tribunal decidiu, assim, uma questão que não havia sido chamado a resolver e que não é de conhecimento oficioso (Arts. 264º, nº 2 e 660º, nº 2 do CPC), o que tem como consequência a nulidade da sentença, nos termos do disposto no Art. 668º, nº 1, al. d), 2ª parte, do CPC.
F - É entendimento da Recorrente que abriu os procedimentos concursais nos termos da lei então vigente e em respeito pelo disposto no Art. 53º, nº 4 (versão original) da Lei nº 12-A/2008, de 17 de fevereiro (LVCR).
G - Por via deste nº 4, o legislador estabeleceu uma possibilidade excecional e residual, afastando a regra geral enunciada nos nºs anteriores do referido Art. 53º permitindo aplicar, em qualquer recrutamento, um único método de seleção obrigatório, nos seguintes termos:
- Nos recrutamentos por tempo indeterminado, a prova de conhecimentos ou a avaliação curricular;
- Nos recrutamentos por tempo determinado ou determinável, apenas a avaliação curricular, por força da remissão efetuada pelo nº 2 do Art. 39º da LVCR para os nºs 2, 3 e 4 do Art. 53º também da LVCR.
H - Para tanto, bastaria identificar, fundamentadamente, o requisito cuja verificação em concreto conduziria à sua aplicação, no caso em apreço, a natureza urgente dos referidos procedimentos;
I - Fundamentação que o tribunal a quo aceitou, declarando existir a urgência que legitimou o recurso à exceção prevista nº 4 do Art. 53º da Lei nº 12-A/2008: “Quanto à fundamentação da urgência, a menção da criação maciça dos ACES e a necessidade de os tornar operacionais cumpre com tal exigência” - Cfr. fls. 20 do Acórdão.
J - A opção adotada pela Recorrente e por outros serviços da administração pública, incluindo o próprio Instituto Nacional de Administração (INA), de utilizar os métodos de seleção da avaliação curricular e da entrevista profissional de seleção, conforme se pode atestar pelos diversos avisos de abertura referidos, só foi possível porque o legislador abriu essa exceção, desde que devidamente fundamentada.
K - Com a alteração do Art. 54º da LVCR, introduzida pela Lei nº 55-A/2010, de 31 de dezembro, foi expurgado o seu caráter de excecionalidade e salvaguardado, agora sim, o tratamento distinto dos candidatos.
L - Em consequência desta alteração, nos recrutamentos por tempo indeterminado, pode utilizar-se um único método de seleção obrigatório: a prova de conhecimentos, em relação a quem não é titular da categoria e não exerce funções idênticas às dos postos de trabalho a ocupar; a avaliação curricular para quem detém a categoria e se encontre a exercer as funções caracterizadoras dos postos de trabalho a ocupar (incluem-se aqui os candidatos colocados em SME que, por último, exerceram funções idênticas às do posto de trabalho), salvaguardado, neste último caso, o direito de opção pela prova de conhecimentos, de acordo com o n.º 2, do Art. 54º.
M - O que não sucedia na redação ao Art. 53º, nº 4, pela qual o legislador admitia, verificada a exceção, a utilização do método de avaliação curricular para os candidatos que sejam titulares da categoria posta a concurso ou que tenham exercido ou exerçam funções correspondentes às do posto de trabalho em concurso.
N - Não salvaguardando tratamento distinto para o universo dos candidatos.
O - O Tribunal a quo faz uma interpretação errónea da redação do Art. 53º, nº 4 da LVCR, sendo, por isso ilegal a decisão de anular a deliberação da Recorrente, tomada em 12 de abril de 2011 e, consequentemente, aqueloutra tomada em 11 de março de 2010, uma vez que as mesmas, por tudo o exposto, foram tomadas ao abrigo do quadro normativo então vigente, aliás, tal como o fizeram outros serviços da administração pública em outros procedimentos concursais.
Termos em que dando provimento ao presente recurso e em consequência:
a) Declarando nulo o Acórdão recorrido, por violação do disposto no Art. 668º, nº 1, al. d), 2ª parte do CPC; Ou, caso assim não se entenda
b) Revogando o Acórdão recorrido, declarando que as deliberações tomadas pela Recorrente não são inválidas e, consequentemente, anuláveis, por não violarem o disposto no Art. 53º, nº 4 da LVCR, na redação primitiva; Farão Vªs Exªs a costumada JUSTIÇA!”

Os Contrainteressados M. e Outros vieram igualmente Recorrer, em 10 de abril de 2013, tendo concluído:
“1ª O Aresto em recurso enferma da nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artº 668 do CPC, em virtude de não se ter especificado o fundamento de facto que era essencial e determinante para se poder alcançar a decisão a que o Tribunal a quo chegou. Com efeito,
2° Para se poder concluir que deviam ter sido empregues dois métodos principais e, portanto, para fundamentar a decisão anulatório alcançada pelo Tribunal a quo, era essencial que, se tivesse dado por provado que havia candidatos que não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso - ou seja, os factos que permitiam alicerçar o entendimento de que o universo dos candidatos era distinto - pelo que ao não dar por provado tal facto e ao considerar ilegais os atos homologatórios por apenas ter sido realizado um método de seleção principal, o aresto em recurso enfermo do nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artº 668° do CPC - por não ter especificado e dado por provado o facto determinante da decisão. Por outro lado.
3ª O único vicio que o tribunal considerou procedente foi a violação do n° 4 do artº 53° da Lei na 12-A/2008, uma vez que no entender do aresto em recurso aquela norma impunha que fossem realizados dois métodos de seleção consoante o universo dos candidatos, de tal forma que uns seriam sujeitos a avaliação curricular e ouros a prova de conhecimentos. Porém,
4° Mesmo que por mera hipótese a tese sufragada pelo Tribunal a quo fosse correta - e não o é, como se verá -, sempre o aresto em recurso teria Incorrido em flagrante erro de julgamento, uma vez que para se poder concluir que a utilização de um só método de seleção principal – a avaliação curricular - violava o nº 4 do artº 53 da Lei nº 12-A/2008 era de todo necessário que o Tribunal o quo tivesse dado por provado que o universo dos candidatos era diferente. Isto é, que havia candidatos que não eram titulares da categoria nem vinham exercendo as funções próprias da categoria posta o concurso, pois só assim se poderia afirmar e concluir que tais candidatos deveriam ter sido submetidos o umo prova de conhecimentos e não a uma avaliação curricular Contudo.
5° A verdade é que o aresto em recurso enferma de um claro erro de julgamento ao considerar Ilegal o presente concurso pelo facto de não terem sido aplicados dois métodos de seleção distintos aos vários candidatos, pois, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, o n° 4 do artº 53° do Lei 12-A/2008 permite à Administração optar por selecionar os candidatos com base apenas na realização de um dos métodos de seleção previstos nas alíneas a) dos nºs 1 e 2, pelo que, ocorrendo circunstâncias excecionais referidas nesta norma – e a sua ocorrência não foi questionada pelo aresto em recurso - pode a Administração sujeitar todos os candidatos, Independentemente da natureza do recrutamento, a um só método de seleção, desde que tal método seja uma avaliação curricular ou uma prova de conhecimentos.
6° Neste sentido, veja-se que este preceito constitui, até pela sua Inserção sistemática (no final do artigo), uma "válvula de escape" para fazer face a situações excecionais e onde, designadamente, se revela de todo Inviável sujeitar os candidatos aos métodos de seleção referidos nos nºs 1 e 2 do citado art° 53°, pelo que a intenção do legislador foi dar à Administração a possibilidade de optar entre os dois métodos de seleção ditos principais, isto é, entre a realização da prova de conhecimentos ou a realização da avaliação curricular. .
7ª Aliás, se um dos fundamentos excecionais que permite à Administração recorrer possibilidade prevista no nº 4 do citado arfo 53° é, justamente, o elevado número de candidatos, seguramente é de todo contraditório que, perante esse elevado número de candidatos, a Administração ainda tenha de estar a realizar dois métodos de seleção, com todas as dificuldades que Isso pressupõe e com todo o prejuízo que Isso causa à celeridade concursal. Por fim,
8ª O aresto em recurso Incorre num flagrante erro de julgamento ao declarar a nulidade dos contratos de trabalho outorgados pelas recorrentes, violando frontalmente o disposto nos artºs 173° e segs do CPTA. uma vez que, sendo o ato anulado renovável, antes de em sede de execução de sentença se reconstituir a situação atual hipotético não pode ser declarada a nulidade dos contratos celebrados na sequência do ato homologatório anulado (v. neste sentido, VIEIRA DE ANDRADE, in Revista de Legislação e de Jurisprudência - A 141, nº 3970, Set/Out. 2011. pgs. 3-18 e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Anulação de Atos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes, Almedina, Coimbra, 2002, págs. 671 e 672).
Nestes termos, Deve ser dado provimento ao recurso, e revogada a decisão recorrida, com as legais consequências. Assim será cumprido o Direito e feita JUSTIÇA

Em 13 de junho de 2013 veio o Ministério Público apresentar as suas Contra-alegações de Recurso, no qual concluiu:
“1. A sentença recorrida não padece da invocada nulidade prevista no art. 668°, n" 1, alínea d), 2ª parte, do CPC, porquanto se mostra indubitável que, no domínio de uma ação que tem por objeto pretensões emergentes da prática ilegal de atos administrativos (art. 46°, n.ºs 1 e 2. alínea a). do CPTA), a questão da legalidade/invalidade dos atos que nela foram impugnados (e que, assim, constituem o objeto do processo) integra questão que o juiz devia apreciar e decidir - v. arts. 50° e 95°, do CPTA;
2. Sendo certo, desde logo, e por estrita aplicação dos princípios gerais do processo civil (ex vi o art. 1°, do CPTA), que o Tribunal a quo, na apreciação de tal questão, não está vinculado à específica qualificação jurídica dos factos/vícios/ilegalidades que o Ministério Público tivesse efetuado na petição inicial e da(s) forma(s) de invalidade que, na sua perspetiva, os mesmos acarretariam (nulidade/anulabilidade) - cfr. art, 664°, do CPC;
3. E que, mesmo que porventura se verificasse no caso a hipotética situação de ter sido peticionada unicamente a declaração de nulidade dos atos impugnados (o que não sucedeu), enquanto a forma de invalidade mais gravosa, tal não obstaria a que o Tribunal, atento o disposto no art, 661°. n" I, do CPC, pudesse declarar a mera anulação dos atos objeto de impugnação, enquanto forma de invalidade menos gravosa;
4. Ao que acresce o facto de, no domínio especifico dos processos impugnatórios, os princípios processuais clássicos. v.g, da vinculação do juiz ao pedido e da limitação do juiz pela causa de pedir, sofrerem uma compressão, na perspetiva da tutela judicial plena, "como tentativa de resolver de uma vez a questão sobre a legalidade do ato";
5. De tal forma que o tribunal poderia até, oficiosamente, identificar a existência de outras causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas - v. art. 95° nº 2, in fine, do CPTA;
6. De qualquer modo, o certo é que, no presente caso, o Ministério Público, ao invés do alegado no recurso, não peticionou só a declaração de nulidade das deliberações da recorrente, mas também, e subsidiariamente, que fossem anuladas as deliberações finais dos procedimentos concursais;
7. Também não se verifica a invocada nulidade da sentença por violação do disposto no art. 668°, n" 1, alínea b), do CPC, porquanto, desde logo, os procedimentos concursais em causa, pela sua própria natureza, obrigatoriamente (sob pena de violação do direito fundamental consagrado no art. 47°, n? 2, da Constituição da República Portuguesa), e tal como decorre da deliberação que autorizou a abertura desses procedimentos concursais e do respetivo aviso de abertura (v.g. do seu ponto 7.). se destinavam a um universo de potenciais candidatos que, à partida, não era determinável;
8. E que, desde que reunissem os requisitos enunciados naquele ponto 7" tanto poderiam ser titulares da categoria a que respeitavam os postos de trabalho a que se destinava o recrutamento e ter vindo a exercer as funções postas a concurso, como podiam ser titulares de categoria diferente; como podiam ainda, apesar de titulares da mesma categoria, exercer, ou terem exercido, funções diferentes;
9. O que, não só consubstancia um corolário lógico a extrair da factualidade dada provada, como constitui, de resto, um facto notório, que não carecia de prova nem de alegação - v. arts. 264°~ nº 2, e 514° do CPC;
10. Por outro lado, a argumentação dos recorrentes - ao invocar tal nulidade da sentença erigindo, em "fundamento de facto (...) essencial e determinante" para a decisão recorrida, que tivesse sido dado como provado que "havia candidatos que não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso", para se poder afirmar e concluir que "tais candidatos deveriam ter sido submetidos a uma prova de conhecimentos e não a uma avaliação curricular" - parece pretender reconduzir o ponto fulcral da questão da decidida invalidade dos atos impugnados ao facto de, em concreto, terem sido admitidos candidatos aos procedimentos concursais que, efetivamente, não reuniam os requisitos cumulativos para serem submetidos ao método de seleção da avaliação curricular e que, assim, deveriam ter sido sujeitos a provas de conhecimentos;
11. Quando, na realidade. tal visão redutora não se mostra compatível com a natureza e função do concurso, que é, na citada jurisprudência do TC, dirigido a um elenco não pré-determinado ou indeterminável de destinatários, em regime de concorrência, visando escolher os candidatos mais hábeis para integrar lugares na Administração Pública;
12. Constituindo, antes, o ponto essencial para a decidida questão da invalidade dos atos impugnados (que considerou anuláveis "quer a deliberação do conselho de administração do Réu, de 11 de Março de 2010, por veicular diretamente a violação de Lei ordinária, quer a deliberação do mesmo conselho de administração, de homologação das listas finais, por se basear naquele outro ato assim viciado"), não é que tenha sido - ou não - efetivamente aplicado o único método de seleção obrigatório adotado (avaliação curricular) a candidatos que não reunissem os requisitos para esse efeito, mas antes, e tão-só, a possibilidade de, em face da própria deliberação de abertura do concurso (que logo emerge como padecendo de vício de violação de lei), de vir a sê-lo;
13. pois que o referido vício de violação de lei (numa interpretação que, segundo o próprio acórdão recorrido, se mostra incompatível com a Constituição, maxime, com o disposto no seu art. 47º n° 2) pode verificar-se, segundo a jurisprudência citada, "sem que seja necessária a comprovação de que dessa violação de lei tenha concretamente resultado para qualquer interessado uma lesão efetiva do seu direito", bastando que houvesse o perigo de que tal pudesse acontecer;
14. Pelo que, também por esta via, seria irrelevante para a decisão proferida ¬que anulou as deliberações finais dos procedimentos concursais, por violação, no programa do concurso (e desde a indicada deliberação que determinou a sua abertura), do disposto no art. 53°, nº 4, da Lei nº 12-A/2008, na redação anterior à introduzida pela Lei nº 55-A/2010, de 31/12 - que tivesse sido dado como provado que, em concreto, "havia candidatos que não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso ";
15. Não obstante, a existência, em concreto, de candidatos nessas específicas circunstâncias - isto é, que "não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso" e que, de todo o modo, foram submetidos ao único método de seleção obrigatório adotado (avaliação curricular) quando deveriam ter sido ao método de seleção obrigatório das provas de conhecimentos - resulta também, como corolário lógico e necessário, da factual idade dada como provada;
16. Assim resultando também inverificado o invocado erro de julgamento por não ter sido dado como provado que o universo de candidatos era diferente;
17. O acórdão recorrido não padece igualmente do invocado erro de julgamento. por errada interpretação do disposto no art. 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008, na redação anterior à introduzida pela Lei n° 55-A/2010, de 31/12;
18. Pelo contrário, nos termos e pelas razões supra-expostas, resulta a manifesto que a interpretação efetuada pelo Tribunal a quo do disposto no nº 4 do art. 53°, da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, na redação então vigente, é a única que se mostra conforme com uma leitura integrada de todo esse preceito legal (e, assim, com a letra e a teleologia da lei) e com a observância do preceituado no art. 47°, n? 2, da Constituição da República Portuguesa;
19. E que, portanto, a interpretação e aplicação de dele foi efetuada pela entidade demandada nos citados procedimentos concursais - logo desde a deliberação que determinou a sua abertura (adotando como único método de seleção obrigatório a avaliação curricular a aplicar a todos os candidatos, independentemente de preencherem, ou não, as condições cumulativas de que a norma do nº 2 fazia depender a sua aplicação), inquinando-os, assim, em toda a sua extensão até às deliberações fineis neles proferidas - padece de vício de violação de lei;
20. Acrescendo referir que, tal como oportunamente já se argumentou, a indicada deliberação que determinou a abertura dos procedimentos concursais padeceria ainda de vício de violação de lei numa outra vertente, decorrente do facto de nela não ter sido identificada, e muito menos fundamentada, a existência, em concreto, de um "caso excecional" que justificasse o recurso a essa norma do nº 4 do art. 53°, da Lei n° 12-A/2008, de 27/02, que, como expressamente dele constava, se reporta a "casos excecionais, devidamente fundamentados ... ";
21. Pois que, a mera menção do "carácter urgente dos procedimentos e a necessidade de repor a capacidade de resposta dos ACES no âmbito das atribuições que lhe estão cometidas, por carência de recursos humanos na área a que respeita o presente recrutamento", não releva, por si só, a existência de uma qualquer situação excecional; mas, apenas e tão-só, a se reconduzem aos fundamentos ordinários da abertura de um qualquer procedimento concursal;
22. Revelando-se falaciosa a argumentação dos recorrentes de que, nos casos excecionais, com elevado número de candidatos, a realização de dois métodos de seleção (obrigatórios) resultaria em prejuízo para a "celeridade concursal", tanto mais que, no caso em apreço, a par do único método de seleção obrigatório que foi adotado para todos os candidatos (avaliação curricular), acabou por ser também estabelecido um outro método complementar, facultativo, da entrevista profissional de seleção;
23. Por outro lado, não se pode pretender justificar a interpretação e aplicação que a entidade pública recorrente efetuou de tal preceito legal com o facto de idêntico entendimento ter sido sufragado por outros serviços;
24. Pois que, além de, obviamente, não poder haver igualdade na ilegalidade, resulta claramente do docs. nºs 7 e 8 juntos com a petição inicial, nos termos supra-referidos, que a interpretação do nº 4 do art. 53°, da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, defendida pela entidade demandada foi reputada como violadora do princípio da igualdade e do direito da igualdade pela própria Administração Central;
25. De tal forma que, para lhe obstar, "o Governo propôs, em sede da Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2011, a adequada alteração ao disposto na referida disposição legal, no sentido, não só de clarificar o alcance da possibilidade de aplicação de apenas alguns do métodos de seleção obrigatórios, mas também de limitar as situações em que tal aplicação se pudesse efetuar", acabando tal proposta por ter acolhimento e "pelo artigo 33° da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro, procedeu-se à alteração do nº 4 do artigo 53.º da LVCR";
26. Clarificando, mediante a expressa inserção da expressão "consoante os casos", que nos procedimentos concursais para a constituição de relações jurídicas de emprego público, aberto, como foi o caso dos autos, ao abrigo do disposto no nº 4 do art. 6º da Lei n° 12-A/2008, pode ser aplicado apenas o método de seleção de prova de conhecimento ou avaliação curricular, aos candidatos que, respetivamente, se encontrem nas situações dos n.ºs 1 ou 2 desse art. 53°;
27. De resto, se porventura se entendesse, como a recorrente, que aquele preceito legal (art. 53°, n" 4), na sua redação então vigente, "não salvaguardava tratamento distinto para o universo dos candidatos - v. conclusão N), então sempre teria que se concluir que esse preceito legal violava o direito fundamental previsto no art. 47°, n" 2, da Constituição da República Portuguesa, que, em qualquer caso, caberia à Administração salvaguardar - v. art. 266°, nºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa;
28. Pelo que, também por esta perspetiva, as deliberações impugnadas padeceriam de vício de violação de lei;
29. Também não ocorre, por fim, a invocada violação do disposto nos arts. 173°e segs. do CPTA;
30. Pois que, no atual regime do contencioso administrativo, se prevê a possibilidade de, com qualquer dos pedidos principais enunciados no nº 2 do art. 46°, poderem ser cumulados outros pedidos que, no regime anterior, apenas poderiam relevar em sede de execução de sentença, designadamente, e tal como sucedeu na petição inicial, dos previstos no art. 47°, n" 2, alínea a) a c), do CPTA;
31. Sem prejuízo de, obviamente, e tal como se encontra consagrado no nº 3 desse art. 47°. essas pretensões continuarem a poder ser acionadas no âmbito do processo de execução de sentença de anulação se não tiverem sido, desde logo, cumuladas no respetivo processo impugnatório;
32. No caso em apreço, por virtude da cumulação de pedidos oportunamente efetuada nos termos e ao abrigo do disposto no art. 47º, n° 2, do CPTA (v. ainda o art. 95°, nº 3, do mesmo diploma legal), o Tribunal a quo foi chamado, logo no âmbito do próprio processo impugnatório, a pronunciar-se sobre as demais pretensões formuladas na petição inicial, v.g, as dirigidas à determinação judicial do conteúdo dos atos e operações que a Administração devia adotar para reconstituir a situação que deveria existir se os atos ilegais não tivessem sido praticados;
33. Tendo em conta as causas de invalidade que em concreto foram julgadas procedentes - segundo as quais foi determinada a anulação das deliberações finais dos procedimentos concursais, por inquinadas, logo desde a deliberação que determinou a sua abertura, de violação do disposto no art. 53°. nº 4, da Lei nº 12-A/2008, na redação então vigente -, mostra-se evidente que a condenação da entidade administrativa demandada ao restabelecimento da situação que existiria se esses atos não tivessem sido praticados e a praticar os atos legalmente devidos, em substituição daqueles, teria, por um lado, que recuar até ao momento em que aquele vício começou a inquinar os procedimentos (ou seja, até àquele ato de decisão de abertura) e, por outro lado, teria que estabelecer as necessárias vinculações da Administração a retomar esses procedimentos, a partir daquele momento, com expurgação das ilegalidades nelas ocorridas;
34. Tal como veio a suceder sob o ponto 3°, alíneas a) e b), do segmento decisório do acórdão recorrido;
35. Mostrando-se, pois, inequívoco que, ao contrário do que defendem os contrainteressados recorrentes, o Tribunal a quo podia e devia, logo nesta sede, determinar a nulidade dos contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado já outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais;
36. Atenta a nulidade consequente de que os mesmos padecem, nos termos do disposto no art. 134°, n" 2, alínea i), do CPA (v. ainda arts. 280° e 294°,do Código Civil);
37. E, certo como é, que, face à natureza do vício em causa - material (vicio de violação de lei) - e que o mesmo se verificou ab initio - inquinando todos os procedimentos desde a decisão da respetiva abertura até à deliberações finais neles proferidas -, tais contratos, por incompatíveis com a execução da sentença de anulação, não se poderiam manter na ordem jurídica ~ v. art, 173°, nºs 1 e 2. do CPTA;
38. Já que, contrariamente ao defendido pelos recorrentes, as deliberações finais foram anuladas na presente ação não podem, em concreto, e por si só, ser renovadas com o mesmo conteúdo, não podendo a Administração, no presente caso, substituir, pura e simplesmente, um ato ilegal por um ato legal idêntico, já depurado do vicio que determinara a anulação anterior;
39. Pela simples razão que não está em causa um vício meramente formal do ato decisório final, mas antes uma ilegalidade material (vicio de violação de lei), que afetou os procedimentos concursais desde o seu inicio e que, assim, se veio a refletir e a inquinar todos os subsequentes atos procedimentais, assim viciando as respectivas deliberações finais;
40. Implicando a expurgação de tais ilegalidades a retoma dos procedimentos concursais a partir do momento em que começou a verificar-se o vicio de violação de lei (ou seja, desde o próprio ato que decidiu a sua abertura), com as vinculações estritamente necessárias para esse efeito, tal como foi decidido no acórdão recorrido;
41. Não podendo, pois, no caso, ser aproveitado o que quer que seja desses procedimentos concursais, com a inelutável impossibilidade de. manutenção (por incompatibilidade com a execução da decisão que, com aquele fundamento, anulou aquelas deliberações finais) dos contratos de trabalho que neles vieram a ser subsequentemente outorgados.
TERMOS EM QUE, e sem prejuízo do recurso subordinado que também se interpôs, deverá ser negado provimento aos recursos interpostos, mantendo-se a decisão recorrida.
ASSIM, Farão V. Exas., como sempre, JUSTIÇA”

Igualmente em 13 de junho de 2013 veio o Ministério Público apresentar Recurso Subsidiário, no qual concluiu:
“1. Contrariamente ao decidido no acórdão recorrido, considera-se que as deliberações do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, LP., impugnadas de 1 de Março de 2010 (que autorizou a abertura de procedimentos concursais comuns) e de 12 de Abril de 2011 (que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos identificados procedimentos concursais comuns) ofenderam o conteúdo essencial de um direito fundamental (direito de acesso à função pública em condições de igualdade), sendo, pois, nulas, nos termos e por força do disposto no art. 133°, n" 2, alínea d), do CPA, com referência ao disposto nos arts, 4, n 2, e 266°, nº 2, da Constituição da República Portuguesa;
2. Quer porque a interpretação e aplicação nelas efetuada do disposto no nº 4 do artigo 53°, da LVCR, à margem dos requisitos fixados nos seus nºs 1 e 2 para a aplicação dos diferentes métodos de seleção obrigatórios em função dos candidatos que deles são destinatários, tem necessariamente um efeito profundamente desigualitário, que, mais do que a simples violação daquele preceito da lei ordinária (que o visa densificar), atinge o próprio conteúdo essencial do direito fundamental consagrado no art. 4, n° 2, da Constituição da República Portuguesa, de acesso a emprego público em condições de igualdade;
3. Quer porque o estabelecimento de causas de exclusão dos candidatos, para além das que taxativamente são fixadas na lei, em matéria sujeita a numerus clausus sob forma legal ex vi artigos 18° no 2 (reserva de lei restritiva) e 47° n" 2 CRP (direito de acesso à função pública), ofende também o conteúdo essencial de um direito fundamental.
4. Efetivamente, e quanto à primeira questão, em divergência com o entendimento do acórdão recorrido, considera-se que também os atos administrativos estão sujeitos às normas e princípios constitucionais, maxime, à observância do disposto no art. 47°, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, invocado na petição inicial - v. arts. 266° e 18°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa;
5. Sendo indubitável que o direito de "liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública" consagrado no invocado art. 47°, da Constituição da República Portuguesa, enquanto inserido Capítulo I do Titulo n da Constituição da República Portuguesa, precisamente epigrafado de "Direitos, liberdades e garantias pessoais" goza de aplicabilidade direta, vinculando tanto as entidades públicas como as privadas;
6. E enquanto DLG, constitui um direito fundamental para efeitos da previsão do art. 133°, n° 2. alínea d), do CPA;
7. O que seja o "conteúdo essencial de um direito fundamental" constitui uma questão jurídica, em cuja apreciação o Tribunal não estaria vinculado, nem dependente. da concreta alegação das partes, máxime, do autor, a esse propósito (v. art. 664°, do CPC);
8. Não se concordando, de todo em todo, por extremamente redutor, com o entendimento do Tribunal a quo quanto ao que seja o conteúdo essencial do direito fundamental consagrado no art. 47°, n° 2, da Constituição da República Portuguesa, ao considerar que, no caso em apreço, só ocorreria a "uma violação do núcleo essencial dos direitos à igualdade de tratamento dos candidatos do universo "externo" (...) se estes de todo ficassem privados da possibilidade de serem selecionados";
9. Pois que, embora se aceite que possa existir, face à indeterminação de al conceito, alguma dificuldade na determinação do "núcleo essencial de um direito fundamental" para efeitos de integração da previsão do disposto no art. 133°, n° 2, alínea d), do CPA, considera-se, contudo, atentos os próprios termos da previsão legal, que a ofensa desse "núcleo essencial de um direito fundamental" não poderá equivaler à total privação do direito fundamental que assim esteja em causa;
10. Importando, em primeiro lugar, determinar o âmbito do concreto direito fundamental, para, em face dos próprios termos em que se encontre constitucionalmente consagrado, se procurar determinar o que seja o seu núcleo fundamental;
11. No caso específico do invocado art. 47°, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, decorre do próprio enunciado constitucional que este direito fundamental compreende três elementos essenciais: ajo direito à função pública, não podendo nenhum cidadão ser excluído da possibilidade de acesso, seja à função pública em geral, seja a uma determinada função em particular, por outro motivo que não seja a falta dos requisitos adequados à função (v. g. idade, habilitações académicas e profissionais); b) a regra da igualdade e da liberdade, não podendo haver discriminação nem diferenciações de tratamento baseadas em fatores irrelevantes, nem, por outro lado, regimes de constrição atentatórios da liberdade; c) regra do concurso como forma normal de provimento de lugares, desde logo de ingresso, devendo ser devidamente justificados os casos de provimento de lugares sem concurso;
12. Resultando, quer da jurisprudência citada (v.g. do Tribunal Constitucional), quer do próprio texto constitucional que o consagra, que o núcleo essencial do direito fundamental previsto no art. 47º, nº 2, integra, para além dos demais elementos acima citados, a regra da igualdade e da liberdade, segundo a qual não pode haver discriminação nem diferenciações de tratamento baseadas em fatores irrelevantes, nem, por outro lado, regimes de constrição atentatórios da liberdade;
13. Bastando, pois, que esse elemento essencial (ou qualquer um dos outros) seja afetado para que ocorra uma ofensa ao conteúdo essencial desse direito fundamental;
14. Importando, assim, no caso em apreço, apurar se a fixação dos métodos de seleção e dos critérios de classificação que foi efetuada pela entidade demandada, bem como a sua aplicação nos respetivos procedimentos concursais, respeitou esse direito fundamental dos cidadãos, na indicada vertente de igualdade de oportunidades no acesso à função pública;
15. Direito que, desde logo, e conforme a jurisprudência citada. "vincula a administração a fixar métodos de seleção e critérios de classificação que permitam a igualdade de tratamento dos candidatos, proibindo-lhe a fixação de critérios geradores de desigualdades injustificadas, e exigindo-lhe que consagre os métodos e critérios respeitadores das situações desiguais ";
16. No presente caso, verifica-se, porém, que a entidade demandada, ao recorrer à norma prevista no nº 4 do art. 53°, da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, na redação então vigente, para fundamentar a aplicação de "um único método de seleção obrigatório, a saber, a avaliação curricular" à totalidade dos candidatos admitidos aos procedimentos concursais, efetuou uma errada interpretação e aplicação da lei, que, para além da violação desse preceito legal (que o pretende densificar no plano do direito ordinário), atinge o próprio conteúdo essencial do direito fundamental consagrado no art. 47°, n? 2, da Constituição da República Portuguesa, na dimensão que visa precisamente garantir a igualdade de oportunidades no acesso à função pública;
17. Na medida em que a interpretação e aplicação que a entidade demandada efetuou de tal preceito legal descaracterizou manifestamente "a ordem de valores, nesse domínio, positivada pela Constituição", assim violando o dito "conteúdo essencial" desse direito fundamental;
18. Pois que a aplicação do método da avaliação curricular, com fundamento naquele preceito legal, aos candidatos que não preencham os requisitos do n° 2 do artigo 53° (desde logo, o requisito relativo ao exercício prévio de funções caracterizadoras do posto de trabalho a que se destina o recrutamento, isto é, aos candidatos que se subsumem ao n° 1 do artigo 53°), tem o efeito necessário de os colocar em desigualdade de condições face aos candidatos que os preenchem;
19. Em termos tais que, como decorre dos factos dados como provados, determinaram a sua eliminação em sede de aplicação desse método de seleção (avaliação curricular) ou o seu posicionamento relativo que, na prática, precludiu a possibilidade de vir a estabelecer relação jurídica de emprego público;
20. É que, sendo o método de avaliação curricular dos candidatos especialmente incidente sobre as funções que têm desempenhado na categoria e no cumprimento ou execução da atribuição, competência ou atividade caracterizadoras dos postos de trabalho a que o procedimento se destina e o nível de desempenho nelas alcançado, é por demais evidente que, aplicá-lo aos candidatos que não tenham exercido previamente essas funções, é, no fundo, pretender avaliá-los em função de requisitos que, à partida, se sabe que os mesmos não preencherão;
21. Acabando, assim, por consubstanciar, ab initio, um instrumento (ilegal) de redução do universo dos candidatos;
22. Ou seja, aplicar o método da avaliação curricular a candidatos que não reúnam os requisitos cumulativos do n° 2 do artigo 53° da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, é assumir manifestamente o seu tratamento desigual, votando-os ao insucesso, numa interpretação da norma do nº 4 do artigo 53°, da Lei n? 12-A/200S, de 27/02, que é contrária à Constituição da República Portuguesa e que ofende o conteúdo essencial do direito fundamental à igualdade de acesso à função pública nela consagrado (v. arts. 130,470, n° 2, e 266º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, e § 2° do preâmbulo da Portaria nº 83-A/2009, de 22/01);
23. Acresce que, no decurso do procedimento, e no que respeita à concreta aplicação daquele único método de seleção obrigatório, vieram também a ser fixados e/ou aplicados pelo júri critérios de classificação que igualmente ofenderam o conteúdo essencial daquele direito fundamental' à igualdade de acesso à função pública, permitindo o afeiçoamento da seleção aos candidatos com prévio exercício da atividade objeto dos postos de trabalho a concurso, em detrimento dos demais;
24. Resultando manifesto que, em virtude dessa utilização de um único método de seleção obrigatório (avaliação curricular), o concurso acabou, na prática, por circunscrever o universo legal possível de candidatos a um grupo mais estrito e predeterminável de candidatos, colocando em posição de vantagem os candidatos que já exerciam, ou tivessem exercido, as funções a concurso; e sendo evidente que os candidatos que as não pré-exerciam, ou pré-exerceram, tinham, à partida, excluída qualquer possibilidade efetiva de disputar os empregos em causa;
25. Tal como emerge inequivocamente da factualidade dada como provada. da qual resulta que todos os candidatos admitidos a que foi atribuído O valores na avaliação de desempenho (porque não a tinham, nem a podiam ter, por não exercerem ou não terem exercido as funções postas a concurso) vieram a ser excluídos dos procedimentos concursais - v. pontos 20° a 24°, 28° e 29° dos factos dados como provados;
26. Por outro lado, e quanto à segunda questão acima enunciada, considera-se, em dissonância com a decisão do acórdão recorrido, que as deliberações finais dos procedimentos concursais em referência nos autos são ainda nulas em decorrência de outro vicio procedimental, atinente às causas de exclusão que resultam do ponto 12 do próprio aviso de abertura do concurso, que igualmente afeta o conteúdo essencial do direito fundamental à igualdade de acesso à função pública consagrado do art. 470, nº 2, da Constituição da República Portuguesa (art. 133°, nº 2, alínea d), do CPA);
27. Na medida em que, e salvo o documento comprovativo das habilitações académicas (para a prova deste requisito nos termos do art. 510, n" 1, da Lei nº 12-A/200S, de 27/02), nenhum dos demais documentos referidos no ponto 12 do aviso de concurso poderia ser causa de exclusão dos concursos em causa;
28. Não só porque esses documentos têm carácter instrumental relativamente aos requisitos legais de recrutamento, não sendo, pois, possível/admissível a exclusão de candidato por falta de documentos que não servem para provar qualquer um de tais requisitos legais;
29. Porque, além disso, os requisitos de admissão são taxativos, sendo apenas os fixados por lei parlamentar ou decreto-lei autorizado (artigo 47°, nº 1 e nº 2, e artigo 165°, n° 1, alíneas b) e t), da Constituição da República Portuguesa), apenas podendo ser excluídos do concurso os candidatos que não "reúnam os requisitos legalmente exigidos" (artigo 25°, n? 1. da Portaria n° 83-A/2009, de 22/01);
30. Desta feita, o ato homologatório final proferido nos procedimentos concursais em referência, radicando num aviso de abertura de concurso que, no seu ponto 12, erigiu, sem qualquer base legal, a causas de exclusão a falta de 6 documentos que não se destinam a comprovar os requisitos de admissão legalmente estabelecidos, é nulo, por, também por esta via, violar o conteúdo essencial do direito fundamental consagrado no art. 47°, n° 2, da Constituição da República Portuguesa;
31. Pois que, conforme a jurisprudência supra mencionada, "a natureza taxativa das causas de exclusão dos candidatos deriva da integração do direito de acesso à função pública no catálogo constitucional dos direitos fundamentais - cf. art, 47° n? 2 CRP (...)". "sendo matéria sujeita a numerus clausus sob forma legal ex vi artigos 18° no 2 (reserva de lei restritiva) e 47° nº 2 CRP (direito de acesso à função pública), trata-se de vício cuja sanção integra o regime próprio dos atos nulos por ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, expressamente previsto no artigo 133° n° 2 alínea d) do CPA" (v. ainda Ac. TCA Sul de 11110/2006, proc. n? 12917/03, e Ac. do STA de 12/07/2005, proc. n," 0876/03);
32. E isto independentemente do facto de ter - ou não - ocorrido a concreta exclusão de qualquer candidato por não apresentar documentos que não relevam para a verificação dos requisitos legais de admissão a concurso (mas que relevariam apenas para a subsequente fase da seleção);
33. Já que o invocado vício de violação de lei, por desrespeito do princípio constitucional da igualdade de condições e de oportunidades para todos os candidatos, pode verificar-se "sem que seja necessária a comprovação de que dessa violação de lei tenha concretamente resultado para qualquer interessado uma lesão efetiva do seu direito", bastando que haja o perigo de que tal possa acontecer;
34. Verificando-se, no entanto, que sua 38 reunião, em 17 de Junho de 2010, o júri procedeu à análise das candidaturas, chegou mesmo a excluir duas candidatas "por não ter apresentado a declaração conforme alínea e) do ponto 12 do aviso de abertura", só vindo a admiti-las posteriormente, por deliberação de 02 de Agosto de 2010, após a junção da declaração em causa - v. factos provados sob os pontos 16° a 19°;
35. As deliberações impugnadas ofenderam, pois, pelos motivos invocados, o conteúdo essencial de um direito fundamental (direito de acesso à função pública em condições de igualdade);
36. Pelo que deveriam ter sido declaradas nulas, nos termos e por força do disposto nos arts. 133°, n° 2, alínea d), e 134° do CPA, com referência ao disposto nos arts. 47°, nº 2, e 266°, n° 2, da Constituição da República Portuguesa;
37. Devendo, em consequência do exposto, e para além do já decidido sob as alíneas a) e b) do ponto 3° da decisão recorrida, ser também a entidade administrativa demandada condenada a observar, como vinculação a acrescer às restantes já aí determinadas, de a falta de apresentação dos documentos que devam acompanhar o formulário de candidatura - à exceção dos que efetivamente se destinem a comprovar os requisitos de admissão legalmente exigidos - não constituir causa de exclusão dos candidatos;
38. Pelo que o acórdão recorrido, ao considerar meramente anuláveis as deliberações em causa e ao julgar no mais a ação improcedente, violou as indicadas disposições legais.
Termos em que, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, de forma a ser declarada a nulidade das deliberações impugnadas, nos termos e com os fundamentos expostos, com o consequente aditamento da vinculação acima enunciada. Assim, farão V. Exas., como sempre, Justiça”.
Por Despacho de 26 de julho de 2013, foram admitidos os Recursos jurisdicionais interpostos.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

O presente Processo foi-nos concluso para decisão em 13 de novembro de 2019.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, designadamente os suscitados “erros de julgamento de direito”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
1º Por deliberação de 11 de Março de 2010, o Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., autorizou a abertura de treze procedimentos concursais comuns, na modalidade de relação jurídica de emprego público a constituir por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, nos termos dos nºs 3 e 4 do art. 6º da Lei nº 12-A/2008, de 17/02 (LVCR), com a constituição de um único júri, aí designado, com vista ao preenchimento de 18 postos de trabalho, previstos e não ocupados, na carreira e categoria de Técnico Superior – Licenciatura de serviço social, dos mapas de pessoal dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), nos termos constantes das cópias certificadas de fls. 1 a 4, extraídas do correspondente Processo Administrativo junto com a PI, que se dá integralmente por reproduzidas, sendo:
- Baixo Vouga I – 2 postos de trabalho;
- Baixo Vouga II – 1 posto de trabalho;
- Baixo Vouga III – 1 posto de trabalho;
- Cova da Beira – 2 postos de trabalho;
- Baixo Mondego – 1 posto de trabalho;
- Baixo Mondego II – 1 posto de trabalho;
- Baixo Mondego III – 1 posto de trabalho;
- Pinhal Interior Norte I – 1 posto de trabalho;
- Pinhal Litoral I – 1 posto de trabalho;
- Pinhal Litoral II – 3 postos de trabalho;
- Pinhal Interior Norte II – 1 posto de trabalho;
- Dão Lafões II – 2 postos de trabalho;
- Dão Lafões III – 1 posto de trabalho.
2º Segundo essa deliberação, os postos de trabalho a ocupar na carreira/categoria técnica superior tinham em vista “o exercício de funções nos ACES supra indicados, cuja missão, atribuições, organização e funcionamento se encontram previstos no Decreto-Lei n° 28/2008, de 22 de Fevereiro, e caracterizam-se pelo exercício de atividades inerentes à carreira/categoria técnica superior, nos termos do mapa anexo à LVCR, e que se indicam:
- Desempenho de funções consultivas, de estudo, planeamento, programação, avaliação e aplicação de métodos e processos de carácter técnico na área de serviço social; elaboração, autonomamente ou em grupo, de pareceres e projetos com diversos graus de complexidade, e execução de outras atividades de apoio geral ou especializado nas áreas de atuação comuns, instrumentais e operativas necessárias à prossecução dos objetivos e projetos a decorrer nos Agrupamentos dos Centros de Saúde; funções exercidas com responsabilidade e autonomia técnica, ainda com enquadramento superior qualificado; representação do órgão ou serviço em assuntos da sua especialidade, tomando opções de índole técnica, enquadradas por diretivas ou orientações superiores.”
3º Quanto aos métodos de seleção, foi adotado nessa deliberação “um único método de seleção obrigatório, a saber, a avaliação curricular” e o método complementar de entrevista profissional de seleção, “nos termos conjugados dos nºs 3 e 4 do artigo 53° da Lei n° 12-A/2008, n° 2 do artigo 6° e 7º da Portaria n° 83-A/2009, de 22 de Janeiro”, “considerando o carácter urgente dos procedimentos e a necessidade de repor a capacidade de resposta dos ACES no âmbito das atribuições que lhe estão cometidas, por carência de recursos humanos na área a que respeita o presente recrutamento”.
4º E, com menção da “urgência dos presentes procedimentos”, foi deliberada a utilização faseada desses métodos de seleção, da seguinte forma:
- Aplicação, num primeiro momento, do único método obrigatório à totalidade dos candidatos admitidos aos procedimentos concursais;
- Aplicação do método complementar apenas aos primeiros 5 (cinco) candidatos de cada procedimento concursal aprovados no método de seleção anterior, a convocar por tranches sucessivas, por ordem decrescente de classificação, até satisfação das necessidades;
- Dispensa da aplicação do segundo método aos restantes candidatos, que se consideram excluídos, quando os candidatos aprovados nos termos atrás referidos satisfaçam as necessidades que deram origem aos presentes procedimentos concursais”.
5º Em 26 de Março, na sequência daquela deliberação, o júri nela designado efetuou a primeira reunião para “fixar os parâmetros de avaliação, a sua ponderação, a grelha classificativa e o sistema de valoração final de cada método de seleção, a saber: avaliação curricular e entrevista profissional de seleção”, deliberando a esse propósito nos termos constantes da respetiva ata (cópias certificadas de fls. 5 a 9 do P.A vindo a referir), que se dá por inteiramente reproduzida.
6º No que especificamente concerne ao único método de seleção obrigatório (avaliação curricular), deliberou o júri que “a classificação a atribuir resultará dos parâmetros: Habilitação Académica (HA), Formação Profissional (FP), Experiência Profissional (EP) e Avaliação de Desempenho (AD)”. E que a “classificação final deste método de seleção é expressa numa escala de 0 a 20 valores, com valoração até às centésimas, e resulta da média aritmética ponderada das classificações obtidas em cada um dos fatores, de acordo com a fórmula AC = (2HA+FP+6EP+AD)/10”.
7º Sendo que, para o parâmetro “Experiência Profissional”, fixou patamares valorativos e o acréscimo de 4 valores relativamente à “experiência profissional desenvolvida na área de Cuidados de Saúde Primários”.
8º E, relativamente ao parâmetro “Avaliação de Desempenho”, fixou que na avaliação desse item seria “considerada a Avaliação de Desempenho (AD) relativa ao último período não superior a 3 anos, em que o candidato executou funções ou atividades idênticas às do posto de trabalho a ocupar” e que a pontuação seria “atribuída numa escala de 0 a 20 valores, resultando da média aritmética simples das valorações atribuídas às classificações obtidas na avaliação de desempenho dos últimos três anos, expressa até às centésimas, nos seguintes termos:
- Avaliação de desempenho ao abrigo da Lei nº 10/2004, de 22 de Março, e Decreto Regulamentar nº 19º-A/2004, de 14 de Maio:
- Desempenho Excelente – 20 valores;
- Desempenho Muito Bom – 16 valores;
- Desempenho Bom – 14 valores;
- Desempenho Necessita de Desenvolvimento – 10 valores;
- Desempenho Insuficiente – 8 valores.
- Avaliação de desempenho ao abrigo da Lei nº 66-B/2007, de 22 de Dezembro:
- Desempenho Relevante – 20 valores;
- Desempenho Adequado – 14 valores;
- Desempenho Inadequado – 8 valores.”;
9º Nada definindo quanto à sua aplicação aos candidatos sem avaliação de desempenho.
10º Sequencialmente, em 29 de Março de 2010, foi publicado no DR, 2ª Série, nº 61, de 29/03/2010, o respetivo aviso de abertura desses procedimentos concursais comuns – Aviso nº 6408/2010, que veio a ser objeto da declaração de retificação nº 723/2010, publicada no DR, 2ª série, nº 72, de 14/04/2010, nos termos constantes dos docs. nºs 1 e 2 da PI, que se dá por integralmente reproduzidos.
11º Constando, designadamente, desse aviso de abertura do concurso, sob o ponto 13, relativo aos “métodos de seleção”, que: “Considerando o carácter urgente dos procedimentos e a necessidade de assegurar a capacidade de resposta dos ACES no âmbito das atribuições que lhe estão cometidas, por carência de recursos humanos na área a que respeita o presente recrutamento, é adotado um único método de seleção obrigatório, a saber, a avaliação curricular, sendo o método complementar a entrevista profissional de seleção, nos termos conjugados dos nºs 3 e 4 do artigo 53° da Lei n° 12-A/2008, n° 2 do artigo 6° e 7º da Portaria n° 83 -A/2009, de 22 de Janeiro. O método de seleção obrigatório é eliminatório, pelo que a entrevista profissional de seleção só será aplicada nos casos em que, no método obrigatório, tenha sido obtida classificação igual ou superior a 9,5 valores (nove vírgula cinco valores)”;
12º Conforme o ponto 14 do aviso do concurso: “A valoração final dos candidatos expressa-se na escala de 0 a 20 valores, em resultado da média aritmética ponderada das classificações quantitativas obtidas em cada método de seleção considerada até às centésimas, obtida através da seguinte fórmula: CF100% = 70%(AC) + 30%(EPS)”, sendo CF = Classificação Final, AC = Avaliação Curricular e EPS = Entrevista Profissional de Seleção.
13º Conforme o ponto 15: “Atenta a urgência dos presentes procedimentos, aos mesmos será aplicada a utilização faseada dos métodos de seleção, conforme previsto no artigo 8º da Portaria, da seguinte forma:
a) Aplicação, num primeiro momento, do único método obrigatório à totalidade dos candidatos admitidos aos procedimentos concursais;
b) Aplicação do método complementar apenas aos primeiros 5 (cinco) candidatos de cada procedimento concursal aprovados no método de seleção anterior, a convocar por tranches sucessivas, por ordem decrescente de classificação, até satisfação das necessidades;
c) Dispensa da aplicação do segundo método aos restantes candidatos, que se consideram excluídos, quando os candidatos aprovados nos termos atrás referidos satisfaçam as necessidades que deram origem aos presentes procedimentos concursais”.
14º Conforme o ponto 12 do aviso do concurso, o formulário das candidaturas “deve ser obrigatoriamente acompanhado dos seguintes documentos:
a) Curriculum profissional, datado e assinado, dele devendo constar, designadamente as habilitações literárias, as funções que exerce, bem como as que exerceu, com indicação dos respetivos períodos de duração e atividades relevantes, assim como a formação profissional detida, com indicação de cursos, seminários, encontros, jornadas, palestras, conferências e estágios, com identificação das entidades promotoras, duração e respectivas datas de frequência;
b) Documento comprovativo das habilitações literárias;
c) Documentos comprovativos da formação profissional;
d) Documentos comprovativos de experiência profissional;
e) Declaração emitida pelo serviço de origem, devidamente atualizada e autenticada, da qual conste de maneira inequívoca, a relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, previamente estabelecida, a carreira e categoria de que é titular, bem como a avaliação de desempenho, nos termos da alínea d) do n° 2 do artigo 11º da Portaria;
f) Declaração autenticada pelos serviços competentes, comprovativa das atividades inerentes ao posto de trabalho que ocupa, ou ocupou por último, no caso de trabalhadores em SME, e respetivos períodos de duração;
g) Fotocópia do bilhete de identidade ou do cartão de cidadão.”
15º Estatuía ainda o aviso de abertura do concurso, sob o seu ponto 12.2., que: “A falta de apresentação dos documentos exigidos no presente aviso determina a exclusão dos candidatos, nos termos da alínea a) do n° 9 do artigo 28° da Portaria”.
16º Formalizadas as candidaturas, em 17 de Junho de 2010, na sua terceira reunião, o júri procedeu à sua análise, deliberando admitir e excluir dos procedimentos concursais em causa, identificados por referência, os candidatos constantes das listas em anexo à respetiva ata, que dela faziam parte integrante – cópias certificadas de fls. 16 a 47do PA vindo a referir.
17º Tal deliberação incluiu, para além dos demais aí referenciado sob as alíneas a) a c) (entrega de candidatura fora de prazo, não possuir uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, não possuir licenciatura em Serviço Social), o seguinte motivo da exclusão de candidatos, identificado sob a alínea d): “Por não ter apresentado a declaração conforme alínea e) do ponto 12 do aviso de abertura”.
18º Ao abrigo do qual foram excluídas as candidatas A., nas Referências F, I, J e K; e S., nas Referências I e J.
19º Todavia estas candidatas, após a ulterior pronúncia em sede de audiência de interessados e a respetiva junção da declaração em causa, vieram a ser admitidas por deliberação do júri de 02 de Agosto de 2010 – cópias certificadas de fls. 49 e 50 do PA vindo as referir.
20º Em 12 de Novembro de 2010, na sua 5ª reunião, o júri “procedeu à valoração da avaliação curricular relativamente a todos os candidatos admitidos, aplicando os critérios previamente definidos na ata da primeira reunião, elaborando as fichas de avaliação curricular individuais, que constam do anexo à (…) ata e que dela fazem parte integrante (Anexo 1)” e deliberou “atribuir as valorações aos candidatos admitidos aos presentes procedimentos concursais, identificados por referência, constantes das listas em anexo, que fazem parte integrante da (…) ata (Anexo II)” – cópias certificadas de fls. 85 a 255 do PA vindo a referir e doc. nº 4 junto com a PI.
21º Aos candidatos sem avaliação de desempenho no exercício de funções/atividades idênticas às do posto de trabalho a ocupar foi atribuída nota de zero no item correspondente.
22º Nomeadamente, a A., A-., A--., A., C., C-., C--., C---., L., M., M-., O., P., S-., S., S--., S---., T. e T-..
23º Estas, em consequência, obtiveram a classificação na avaliação curricular indicada nas respectivas fichas de avaliação curricular e nas listas anexas à ata acima indicada, que se dão por reproduzidas.
24º Como ali consta, de entre aqueles a quem foram atribuídos 0 valores no item Avaliação de Desempenho, os candidatos A--., A., C-., C--., C---., L., M., O., P., S-., S., S--., S---., T. e T-. obtiveram uma avaliação curricular inferior a 9,5 valores.
25º Na indicada reunião de 12/11/2010, e nos termos constantes da respetiva ata, o júri deliberou ainda convocar os candidatos aprovados e melhor posicionados na avaliação curricular para o método complementar de seleção: a realização da entrevista profissional de seleção; deliberando também convocar, em simultâneo, a primeira e a segunda tranches de candidatos.
26º Depois de realizadas essas entrevistas, em 16 de Dezembro de 2010 o júri efetuou a sua 6ª reunião, nos termos constantes da respetiva ata, em que, além do mais deliberou “elaborar os projetos de listas unitárias de ordenação final dos candidatos aprovados em cada procedimento concursal, identificado por referência, (…), efetuadas de acordo com a escala classificativa de zero a vinte valores, em resultado da média aritmética ponderada das classificações quantitativas obtidas em cada método de seleção, tendo em consideração as exclusões ocorridas no decurso da aplicação dos métodos de seleção” – (cópias certificadas de fls. 326 a 395 do PA vindo a referir).
27º Em 21 de Fevereiro de 2011, na sua 8ª reunião, o júri, para além do mais e depois reformular a classificação da candidata C. no método de avaliação curricular, quanto ao item da Formação Profissional, e de, em consequência, reformular as listas dos resultados obtidos na avaliação curricular pelos candidatos admitidos no que diz respeito às referências A, B, M e N a que aquela se candidatara, deliberou “em conformidade com o disposto no nº 2 do artigo 36º da mencionada Portaria, submeter a homologação do Conselho Diretivo da ARSC, IP, as listas unitárias de ordenação final dos candidatos aprovados, que constam do Anexo V, que fazem parte integrante da (…) ata” – cópias certificadas de fls. 456 a 487.
28º De tais listas constava, além do mais, a exclusão, por terem obtido valoração inferior a 9,5 valores no único método de seleção obrigatório – Avaliação Curricular, dos seguintes candidatos (aos quais, como referido supra, haviam sido atribuídos 0 valores no item de Avaliação de Desempenho) relativamente a todos os procedimentos a que, respetivamente, se haviam candidatado:
- A--., nas Referências A, B, C, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- A., nas Referências F, I, J, K;
- C-., nas Referências I, J;
- C--., nas Referências A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- C---., nas Referências A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- L., nas Referências A, E, F, G, I;
- M., na Referência E;
- O., nas Referências A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- P., nas Referências E, F, G;
- S-., nas Referências A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- S., nas Referências I, J;
- S--., na Referência J;
- S---., nas Referências A, B, C, E, F, J;
- T., nas Referências A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, M;
- T-., nas Referências E, F, G, H, I.
29º Das mesmas listas constava também a exclusão, por aplicação da metodologia indicada na alínea c) do ponto 15 do Aviso de Abertura do concurso, das seguintes candidatas (às quais também tinham sido atribuídos 0 valores no item de Avaliação de Desempenho):
- A., relativamente às Referências E, F, G;
- A-., relativamente às Referências A, B, C, E, F, G, H, I, J, K, M, N;
- C., relativamente às Referências A, B, M, N;
- M-., relativamente às Referências E, F, G, I, J.
30º Essas listas unitárias de ordenação final dos procedimentos concursais comuns, com as Referências A (Baixo Vouga I), B (Baixo Vouga II), C (Baixo Vouga III), D (Cova da Beira), E (Baixo Mondego I), F (Baixo Mondego II), G (Baixo Mondego III), H (Pinhal Interior Norte I), I (Pinhal Litoral I), J (Pinhal Litoral II), K (Pinhal Interior Norte II), M (Dão Lafões II) e N (Dão Lafões III), foram homologadas pelas deliberações impugnadas do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., de 12 de Abril de 2011, exaradas sobre cada uma delas, e publicadas no DR, 2ª Série, nº 88, de 06 de Maio de 2011, Aviso nº 10350/2011 – cópias certificadas de fls. 476 a 487 e doc. nº 3.
31º Subsequentemente, por deliberação do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., de 06 de Julho de 2011, foi autorizada a celebração dos respetivos contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, ao abrigo da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, e da Lei nº 59/2008, de 11/09, aos candidatos admitidos e aprovados nos procedimentos concursais comuns, nos termos constantes das cópias certificadas de fls. 542 a 546 do PA vindo a referir, sendo os ora contrainteressados:
- M. e T--., para ocupação de dois postos de trabalho no procedimento concursal com a Referência A;
- A----., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência B;
- D., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência C;
- A-., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência D;
- A., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência E;
- A., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência F;
- M., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência G;
- P., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência H;
- A., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência I;
- R. e M., para ocupação de dois postos de trabalho no procedimento concursal com a Referência J;
- M-., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência K;
- F. e N., para ocupação de dois postos de trabalho no procedimento concursal com a Referência M;
- H., para ocupação de um posto de trabalho no procedimento concursal com a Referência N.
32º Por posterior deliberação do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., de 27 de Dezembro de 2011, foi autorizada a celebração desses contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado com efeitos a 23 de Janeiro de 2012, com exceção dos contratos a celebrar com as candidatas D. e N., que serão celebrados e produzirão efeitos no termo das respectivas licenças de maternidade – cópias certificadas de fls. 696 e 697.
33º Na sequência de tais deliberações, vieram a ser efetivamente outorgados, em 23 de Janeiro de 2012, os correspondentes contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado com os contrainteressados acima identificados – cópias certificadas de fls. 759 a 814 e doc. nº 5;
34º à exceção dos das duas referidas contrainteressadas D. e N., que, tendo já subscrito declaração a aceitar o correspondente posto de trabalho (cópias certificadas de fls. 524 e de fls. 534), foram autorizadas, nos termos da deliberação supra, a celebrá-los no termo suas licenças de maternidade, previsto, respetivamente, para 02/04/2012 e para 14/05/2012 (cópias certificadas de fls. 752 e de fls. 815).”

IV – Do Direito
Analisemos então o suscitado.
Como se aludiu já, o Acórdão recorrido, julgou parcialmente procedente a presente ação, e:
1- Anula, por violação, no programa do concurso, do artigo 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008 na redação anterior à introduzida pela Lei nº 55-A/2010 de 31/12, as deliberações do conselho de administração do Réu, de 12 de Abril de 2011, que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos procedimentos concursais comuns para recrutamento de técnicos superiores (área de serviço social), em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, para ocupação de postos de trabalho nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) da Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., com as Referências A (Baixo Vouga I), B (Baixo Vouga II), C (Baixo Vouga III), D (Cova da Beira), E (Baixo Mondego I), F (Baixo Mondego II), G (Baixo Mondego III), H (Pinhal Interior Norte I), I (Pinhal Litoral I), J (Pinhal Litoral II), K (Pinhal Interior Norte II), M (Dão Lafões II) e N (Dão Lafões III), publicadas no DR, 2ª Série, nº 88, de 06/05/2011, Aviso nº 10350/2011 (doc. nº 3).
2- Declara a nulidade dos contratos de trabalhos já outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais;
3- Condena o Réu a retomar os procedimentos concursais no ato da decisão de abertura, inclusive, com as seguintes vinculações:
a) Utilização de, pelo menos, dois métodos de seleção obrigatórios (prova de conhecimentos e avaliação curricular) a aplicar a universos distintos de candidatos em conformidade com a interpretação aqui feita do nº 4 do art. 53º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02
b) Fixação dos parâmetros de avaliação diferenciados em função de cada um dos dois métodos de seleção.
No mais, julga-se a ação improcedente.

Pela sua relevância para a perceção do que aqui se mostra controvertido, infra se transcreverão os segmentos mais relevantes do “direito” do acórdão Recorrido:
“I (…) Quanto à questão de saber se havia urgência que legitimasse o recurso ao nº 4 do artigo 53º da Lei 12-A/2008, por um lado, o próprio Autor, na PI, isto é, no que diz motu proprio, é parco em argumentos e não chega a reclamar invalidade alguma por essa via. De qualquer modo sempre se dirá que a urgência é um conceito aberto, suscetível de vários graus e cronologias que à Administração pertence apreciar quando e por que modo e tempo ocorre, numa valoração que aos tribunais não cumpre sindicar, salvo manifesto erro de facto ou de valoração, sob pena de se pôr em causa a separação entre os poderes judicial e executivo. Quanto à fundamentação da urgência, a menção da criação maciça dos ACES e a necessidade de os tornar operacionais cumpre com tal exigência. Aliás, não foi expressamente alegada violação do dever de fundamentar o ato administrativo.
Assim, em rigor, nem foi pedido nem pode o Tribunal sindicar o pressuposto “urgência” do primordial ato impugnado.
Alegar a violação do princípio da boa fé e do princípio da prossecução do interesse público, por sua vez, não tem sentido quando se dá uma resposta positiva à primacial questão acima exposta, pois se é já a lei que, ao preconizar essa eleição de um único método de seleção, transige com as desvantagens de uma espécie de candidatos possíveis, o que se pode é questionar a constitucionalidade da lei em face de normas e princípios constitucionais, não a ação concreta da Administração no exercício de uma prerrogativa legal. Como se sabe, salvo caso de tipicidade criminal, não assiste à Administração abster-se de usar de poderes que a Lei lhe cometa por motivo de inconstitucionalidade de tal lei.
Também a alegação da ilegalidade de alguns dos critérios de classificação com que o júri densificou o único método de seleção obrigatório escolhido deixa de ter lugar se aceitarmos a interpretação do nº 4 do artigo 53º da Lei nº 12-A sustentada pelo Réu. Com efeito, se é admissível que concorram perante o método de avaliação curricular candidatos que estiveram e candidatos que não estiveram a executar a atividade objeto dos postos de trabalho em disputa nos últimos três anos, candidatos, portanto, que foram avaliados em tal atividade nos últimos três anos e candidatos que não foram avaliados em tal atividade nos últimos três anos (porque a não exerceram) então não se pode pôr a questão de saber se saíram violadas, pelos atos administrativos impugnados, as alíneas c) e d) do artigo 11º da portaria e os princípios administrativos da igualdade e da justiça, já que é a própria lei que prevê a existência de candidatos sem o curriculum ali pressuposto e que, naturalmente, tais candidatos, nesses aspetos do curriculum, estejam em desvantagem relativamente aos demais, o que, aliás, não quer dizer que não possam suprir essa desvantagem mediante as classificações obtidas em outros aspetos do curriculum, designadamente os referidos nas alíneas a) e b) dos mesmos números e artigo.
A própria valoração com zero, no item notação de desempenho para efeitos da al. d) do nº 2 do artigo 11º da Portaria, aos candidatos que, brevitatis causa, designaremos por “externas” à entidade empregadora, resulta previsível e legítima, enquanto simples consequência lógica de notação alguma haver.
Neste contexto também não destoa a atribuição – prévia – de um bónus de 4 pontos aos candidatos detentores de experiência em concreto, na área doas cuidadosa de saúde primários, que são e vão ser prestados nos ACES, pelos candidatos afinal contratados.
Todos estes elementos de diferenciação das candidaturas de um e outro universos passam, em concreto, ao lado das imputações de violação dos princípios da Igualdade e da Boa fé, da Justiça, se admitirmos a resposta positiva à questão inicialmente enunciada, pois nesse caso é a própria lei que assim quer, não sendo aqueles critérios de avaliação mais do que desenvolvimentos da opção legislativa.
Note-se que os sobreditos princípios jus-administrativos não regem em matéria de vinculação legal, não valem mais do que a Lei. E além disso não são absolutos, antes têm de coexistir com outros, desde logo o da prossecução do interesse público (artigo 4º do CPA) de que decorre ser legítimo valorizar os curricula em função da maior adequação ao posto de trabalho em disputa.
Pressuposta que seja a interpretação do nº 4 do artigo 53º da Lei nº 12-A/2008 feita pelos atos impugnados, também não se vê que a escolha feita in casu, do método avaliação curricular, em detrimento do método de prova de conhecimentos, revele um erro de facto ou de valoração flagrante e manifesto, no sentido de ser este o melhor, de entre os dois métodos obrigatórios alternativos para demandar o interesse público, a ponto de poder ser sindicado judicialmente (cf. supra). Na verdade, conforme alega o Réu, a prova de conhecimentos também envolve logísticas nem sempre imediatamente disponíveis e tempo nem sempre breve. Por outro lado não se pode confundir a prossecução do interesse público, hoc sensu, como a licitude da atuação da administração em face da Lei e dos princípios que a regem, sob pena de toda a ilicitude, sem distinção, ser violação do princípio da prossecução do interesse público, pelo que não adianta invocar este vício de cada vez que se entender violados outros princípios ou normas.
Passemos, agora, à questão acima enunciada como decisiva.
Importa eleger a resposta certa e, depois, deduzir dela as consequências quanto à validade dos atos impugnados.
Convirá começar por considerar que as normas e os princípios constitucionais têm como objeto, em princípio, a atividade do legislador ordinário, são referência de validade das normas de fonte imediatamente inferior na hierarquia das fontes do Direito, não, em princípio, dos atos administrativos enquanto estatuições de direito individuais e concretas.
É certo que nos termos do artigo 18º nº 1 da CRP, “os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são diretamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas”, tendo-se vindo a entender que destes, apenas o Direitos liberdades e garantias (DLG) pessoais, integrantes do capítulo I do título II da CRP, e os de natureza análoga gozam desta aplicabilidade direta. Porém isso não significa que eles não se apliquem antes de tudo à atividade legislativa e, portanto, à atividade jurisdicional, enquanto critérios da boa e da má interpretação da lei ordinária, desde logo no sentido de entre várias interpretações que se perspetivem de um texto legal, ser de eleger aquela que realiza ou que mais plenamente realiza ou ao menos respeita os desígnios constitucionais presentes naqueles direitos fundamentais.
Assim, antes de nos perguntarmos se o ato administrativo é ferido de nulidade por violação do conteúdo essencial do direito fundamental à igualdade no acesso à função pública, consagrado no artigo 47º nº 2 da CRP, haveremos de confrontar o ato em crise com a norma legal em que ele se louvou, designadamente o artigo 53º da lei nº 12-A, maxime o seu nº 4, a fim de nos perguntarmos se ele viola, diretamente, este regime legal. Mas nesta pergunta, em caso de dúvida sobre o sentido do comando legal, e sendo plausível, segundo a melhor metodologia do Direito, um sentido mais conforme com aqueles DLGs, haver-se-á de eleger este, em detrimento de qualquer interpretação de que resulte violar a norma legal aqueles desígnios constitucionais e os direitos subjetivos que eles reconhecem. Aqui é que reside, em princípio, a eficácia direta da norma constitucional invocada. Só em caso de se concluir pela inconstitucionalidade da lei ordinária invocada e, portanto, pela sua inaplicabilidade, é que terá sentido passar por cima da lei aplicável, para aferir da validade de um ato em função da norma constitucional consagradora de um DLG.
Em nosso entender, aliás, não é preciso recorrer à Constituição, seja ao artigo 47º nº 2 seja aos princípios constitucionais da Igualdade em geral, da Boa Fé nas relações com os administrados, do Estado de Direito, etc., para surpreender como acertada, no texto de todo o artigo 53º, a interpretação que dele faz o Autor, especialmente do seu nº 4, então em vigor.
Para comodidade de quem lê, eis o teor do artigo, na redação aplicável:
Artigo 53.º
Métodos de seleção
1 — Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os métodos de seleção a utilizar obrigatoriamente no recrutamento são os seguintes:
a) Provas de conhecimentos, destinadas a avaliar se, e em que medida, os candidatos dispõem das competências técnicas necessárias ao exercício da função; e
b) Avaliação psicológica destinada a avaliar se, e em que medida, os candidatos dispõem das restantes competências exigíveis ao exercício da função.
2 — Exceto quando afastados, por escrito, pelos candidatos que, cumulativamente, sejam titulares da categoria e se encontrem ou, tratando-se de candidatos colocados em situação de mobilidade especial, se tenham por último encontrado, a cumprir ou a executar a atribuição, competência ou atividade caracterizadoras dos postos de trabalho para cuja ocupação o procedimento foi publicitado, os métodos de seleção a utilizar no seu recrutamento são os seguintes:
a) Avaliação curricular incidente especialmente sobre as funções que têm desempenhado na categoria e no cumprimento ou execução da atribuição, competência ou atividade em causa e o nível de desempenho nelas alcançado;
b) Entrevista de avaliação das competências exigíveis ao exercício da função.
3 — Podem ainda ser adotados, facultativamente, outros métodos de seleção legalmente previstos.
4 — Em casos excecionais, devidamente fundamentados, designadamente quando o número de candidatos seja de tal modo elevado que a utilização dos métodos de seleção referidos nos números anteriores se torne impraticável, a entidade empregadora pública pode limitar-se a utilizar, em qualquer recrutamento, os referidos nas alíneas a) dos n.os 1 ou 2.
Uma vez que se preconiza dois diversos binómios de métodos de seleção obrigatórios para dois diversos tipos de candidatos (nºs 1 a) e b) e nºs 2 a) e b)) desenvolvidos, quer na Lei quer na Portaria, no claro pressuposto de que cada um deles se aplica ao respetivo universo, sendo unitária apenas a graduação final (artigo 54º nº 1 al. c) da mesma Lei, de tal modo que um dos binómios, designadamente o do nº 2, resulta em várias perplexidades se objeto de tentativa de aplicação ao outro universo (cf. desde logo e por exemplo, as alíneas c) e d) do nº 2 do artigo 11º da Portaria) então é claro que quando no nº 4 do artigo 53º da lei 12-A se diz que “em casos excecionais, devidamente fundamentados (…) a entidade pública pode limitar-se a utilizar, em qualquer recrutamento, os referidos nas alíneas a) dos nºs 1 e 2” - e não um dos referidos – está a dispor que consoante o universo de candidatos, assim o método das alíneas a) dos nºs 1 e 2 a aplicar, enfim, que o que a excecionalidade das circunstâncias justifica é que se prescinda do outro método obrigatório de cada binómio, ou seja, e respetivamente, as entrevistas psicológica e de avaliação de competências.
Mas se for entendido haver dúvidas razoáveis sobre a interpretação a adotar, então elas só podem resolver-se pala adoção daquela que melhor se coaduna com aquele direito fundamental invocado pelo Autor (o do artigo 47º nº 2 da CRP).
Ora é manifesto que a interpretação subjacente ao ato de abertura do concurso desemboca não só em perplexidades metodológicas – como essa da pontuação a dar a quem não teve nem podia ter avaliação de desempenho nos últimos três anos de exercício de funções idênticas às do posto de trabalho em disputa – como em assimetrias que, por muito significativas na economia do concurso, comprimem, sem justificação visível, aquele direito à igualdade no acesso e no progresso na Função Pública, por parte de uma espécie de concorrentes. Por isso, e secundando, de algum modo o Autor, converge o Tribunal no entendimento de que a interpretação do nº 4 (redação inicial) do artigo 53º da Lei 12-A não pode colher, por incompatível com a Constituição.
Deste ponto de vista, quer a deliberação do conselho de administração do Réu, de 11 de Março de 2010, por veicular diretamente a violação de Lei ordinária, quer a deliberação do mesmo conselho de administração, de homologação das listas finais, por se basear naquele outro ato assim viciado, são anuláveis.
Mas não serão nulas, como sustenta o Autor, por, em concreto, terem resultado ou terem a virtualidade de causar a violação do conteúdo essencial do DLG de igualdade no acesso à função Pública, consagrado no artigo 47º nº 2?
Convém notar, antes de mais, que não é o acesso, se não, quando muito, o progresso na Função Pública (jus in officium) o que aqui está em causa, uma vez que, conforme o ponto 7 do aviso, todos os candidatos tinham que ter já uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado.
O que seja isso de conteúdo essencial de um direito fundamental não diz o artigo 133º do CPA; e muito menos diz o que seja o núcleo essencial do direito à igualdade no acesso ou no progresso na função pública.
Tão pouco o Autor diz expressamente por que entende violado o núcleo fundamental daquele DLG.
Se tem de haver uma distinção entre violação de um DLG e a violação do seu núcleo essencial, ela terá de residir em que essa do núcleo essencial haverá de ser de tal modo injustificada, injustificável ou extrema que feita ela nada resta desse direito ao ofendido. Um exemplo, em abstrato, poderia ser uma qualquer deliberada discriminação entre sexos, raças, religião, etc. Para o nosso caso, numa perspetiva de extremidade (hoc sensu) da violação, dir-se-á que uma violação do núcleo essencial dos direitos à igualdade de tratamento dos candidatos do universo “externo” ocorreria se estes de todo ficassem privados da possibilidade de serem selecionados.
Isso, porém, não foi alegado, nem é o caso, pois os tais candidatos podiam concorrer, com desvantagens ligadas ao seu concreto historial na Função Pública, fora da entidade promotora, é certo, mas ainda assim com a possibilidade de, no cômputo final do procedimento, serem selecionados.
Assim, face aos factos alegados e provados nem a deliberação de abertura do procedimento concursal nem a de homologação das listas finais contendem com um núcleo essencial de um DLG, pelo menos por via da errada e inconstitucional interpretação que fizeram do nº 4º do artigo 53º da Lei nº 12-A, pelo que a sanção que corresponde à invalidade dos atos impugnados é, por este ponto de vista, a da mera anulabilidade (cfr. Artigo 135º do CPA).
Dir-se-ia que se assim é já não é impugnável, nem mesmo pelo Mº Pº, essa deliberação de abertura do procedimento, tomada e publicitada nos idos de Março de 12010, pois a ação foi instaurada em 22/3/2012: cf. artigo 58º nº 2 alª a) do CPPT.
Com efeito esta deliberação, enquanto meramente anulável, já não é impugnável em si mesmo. Porém, o vício que se lha assaca é fundamento da anulação, essa, sim, em tempo, da deliberação de homologação das listas de ordenação final dos candidatos, o que arrastará, logicamente, desde logo em execução de sentença, a anulação de efeitos do ato de 2010.
(...)
Sem embargo, como se viu, procede a alegação do vício de violação do artigo 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008 na decisão de abertura do concurso, o que inquina de anulabilidade a decisão de homologação da lista de ordenação, e de consequente nulidade os consequentes contratos celebrados, pelo que haverão de proceder, na parte correspondente, que abaixo se especifica, as pretensões formuladas na parte II da alínea A e na alínea B do pedido.
Pode perguntar-se pela legitimidade do Mº Pº para, em tutela, apenas, da legalidade objetiva, apresentar o que parece ser uma pretensão de condenação à prática de ato devido como é o pedido supra enunciado sob B)4.
Porém, do que se trata aqui não é da condenação do Réu a satisfazer um direito subjetivo de quem quer que seja, mas sim de o Tribunal fixar as vinculações legais da Administração emergentes da procedência do pedido de anulação (hoc sensu) com base nas causas de invalidade que em concreto foram julgadas procedentes, nos tem nos termos do artigo 95º nº 3 do CPPT
(...)”

Vejamos:
Vieram interpostos dois Recursos Independentes, decorrentes do Acórdão proferido no TAF de Coimbra, que julgou parcialmente procedente a presente ação administrativa especial e, consequentemente, anulou por violação, no programa do concurso, do artigo 53º nº 4 da Lei nº 12-A/2008 as deliberações do conselho de administração do Réu que homologaram as identificadas listas de ordenação final dos candidatos ao referido concurso, mais tendo declarado a nulidade dos emergentes contratos de trabalho já outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais.

Esclareça-se desde já que se não vislumbram razões para divergir do entendimento adotado em 1ª instância, mormente, atenta a circunstância de terem sido desrespeitados concursalmente os binómios de avaliação constantes dos diplomas aplicáveis e adequadamente interpretados pelo tribunal a quo.

Como bem se explicitou na decisão recorrida, o legislador compartimentou os métodos de seleção obrigatórios em dois binómios, dependentes da natureza dos candidatos, em face do que não poderia a Administração escolher um único método a utilizar indistintamente a todos os candidatos, desrespeitando a natureza, objeto e objetivo desses binómios.

Analisemos então em concreto os Recursos Independentes interpostos, sendo que antecipadamente se afirma que se não vislumbra a verificação de qualquer das nulidades invocadas, nem de qualquer dos erros de julgamento que lhe foram assacados em ambos os recursos independentes interpostos.

Da nulidade da sentença por violação do disposto no art. 668°, nº 1, alínea d), 2ª parte, do CPC:
A suscitada nulidade resultará do facto de alegadamente o tribunal a quo ter decidido questão que não teria sido suscitada e que não seria de conhecimento oficioso.

Objetivando, refira-se que estando-se em presença de uma Ação que tem por objeto pretensões emergentes da prática ilegal de atos administrativos (art, 46°, nºs 1 e 2, alínea a), do CPTA), naturalmente sempre se imporia aferir da legalidade dos atos objeto de impugnação, enquanto objeto do processo, como resulta dos artigos 50º e 95°, do CPTA, não estando, aliás, o tribunal vinculado à qualificação jurídica dada pelo Ministério Público, aqui como Autor, aos vícios invocados na PI.

Resulta lapidar do Artº 664°, do CPC, que o tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, sendo que, em qualquer caso, não resultam da PI unicamente pedidos tendentes à declaração de nulidade de atos.

Por outro lado, e como resulta já do afirmado, em bom rigor, o MP na sua Petição Inicial, não se cingiu a peticionar a nulidade de atos, antes tendo igualmente peticionado a anulação, designadamente das deliberações finais dos procedimentos concursais.

Em qualquer caso, sempre se reafirmará que, peticionada a nulidade de um qualquer ato, o tribunal não está impedido de se limitar a anular o mesmo, desde que estejam reunidos os correspondentes pressupostos e requisitos, designadamente quanto ao prazo impugnatório.

Não se reconhece pois a verificação da suscitada nulidade.

Da nulidade da sentença por violação do disposto no art. 668°, nº 1, alínea b), do CPC:
Entendem os Contrainteressados no seu Recurso Jurisdicional que o acórdão sob censura padeceria ainda da nulidade prevista nos alínea b) do nº 1 do art. 668º do CPC, uma vez que não terá sido especificado o fundamento de facto determinante para a perceção do invocado, ao se ter concluído "(...) que deviam ter sido empregues dois métodos principais e portanto, para fundamentar a decisão anulatória alcançada pelo Tribunal a quo, era essencial que se tivesse dado por provado que havia candidatos que não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso - ou seja, os factos que permitiam alicerçar o entendimento de que o universo dos candidatos era distinto (...)".

Diga-se desde logo que se não reconhece o invocado vicio, tanto mais que estamos em presença de um procedimento concursal relativamente ao qual, à partida, se desconhece o universo de concorrentes.

Como se afirmou no Ac. do TC nº 282/2011, proferido no proc.º n.º 815/09, o "concurso público para provimento de cargos públicos é um procedimento administrativo dirigido a um elenco não pré-determinado ou indeterminável de destinatários, em regime de concorrência, visando escolher os candidatos mais hábeis para integrar lugares na Administração Pública".
Mais se refere no identificado aresto, que o "concurso foi erigido em regime-regra a observar em matéria de recrutamento de pessoal para os quadros dos serviços e organismos da Administração Publica, desde que a Constituição passou a prescrever, no n.º 2 do seu artigo 47º que «Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso.”

Constava aliás do ponto 7 do aviso de abertura do concurso, no que concerne ao âmbito do recrutamento, que "podem candidatar-se aos presentes procedimentos concursais trabalhadores com uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, nos termos do n° 4 do artigo 6° da LCVR, e que, até ao prazo fixado para a apresentação de candidaturas, reúnam” os requisitos aí indicados.

Podiam assim candidatar-se Licenciados em Serviço Social, quer fossem titulares da categoria a que respeitavam os postos de trabalho a que se destinava o recrutamento, ou ter categoria diversa ou terem anteriormente exercido funções diversas, o que necessariamente alargava significativamente o leque de potenciais candidatos, não se justificando aplicar a todos o mesmo método de avaliação, atentas as suas origens funcionais dispares.

Por outro lado, a argumentação dos recorrentes, ao invocar a nulidade da sentença assente em "fundamento de facto (...) essencial e determinante" para a decisão recorrida, não tendo sido alegadamente dado como provado que "havia candidatos que não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso", para se poder afirmar e concluir que ''tais candidatos deveriam ter sido submetidos a uma prova de conhecimentos e não a uma avaliação curricular", reconduz-se a fixar o cerne da questão controvertida quanto à invalidade dos atos impugnados, no facto de terem sido admitidos candidatos ao procedimento concursal que não reuniam os requisitos cumulativos para serem submetidos ao método de seleção da avaliação curricular e que, como tal deveriam ter sido sujeitos a provas de conhecimentos.

Em qualquer caso, é incontornável que foi a deliberação que autorizou a abertura do procedimento concursal que fixou a adoção de um único método de seleção obrigatório (avaliação curricular) a aplicar a todos os candidatos admitidos, independentemente de reunirem - ou não - os requisitos cumulativos previstos para esse efeito, como decorre do nº 2 do citado art. 53°, da Lei n° 12°-A/200S, de 27/02.

Foi esta estatuição que desde logo determinou a prática de um procedimento contrário ao estatuído no regime jurídico aplicável, que expressamente prevê a necessidade de uma dicotomia procedimental e concursal em função da origem e experiencia precedente dos candidatos.

Dêem-se as voltas que se derem, não é possível escamotear que no controvertido concurso, não obstante as referidas dicotomias legalmente estabelecidas em termos concursais, em função da origem dos candidatos, o que é facto é que, quer os concorrentes que "não eram titulares da categoria ou não vinham exercendo as funções postas a concurso" quer os restantes, foram todos simplesmente submetidos ao único método de seleção, de avaliação curricular, quando aqueles deveriam ter tido como método de seleção, a prova de conhecimentos, o que se mostra dado como provado, entre os facto 5º e 9º, mormente a respeito da "Avaliação de Desempenho".

Decorre da referida factualidade uma das principais incongruências do procedimento concursal em apreciação e que em boa medida determinou a sua anulação e que se prende com a circunstância de ter havido candidatos admitidos aos quais foi atribuída a nota de zero no item da avaliação de desempenho, pela singela razão que a não poderiam ter, por, designadamente, não terem exercido funções idênticas, suscetíveis de serem como tal avaliadas, o que só por si teria justificado a utilização de um método de avaliação diverso, como resulta do 53º da Lei nº 12-A/2008.

É pois manifesto que o Acórdão Recorrido objetivou suficiente e adequadamente os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão nele proferida quanto à matéria apreciada, em face do que se não reconhece a verificação da suscitada nulidade prevista no art. 668°, nº 1, alínea b), do CPC.

Do erro de julgamento por não ter sido dado como provado que o universo de candidatos era diferente:
Invocaram os Recorrentes que a falta de prova de que "o universo de candidatos era diferente" se consubstanciaria em erro de julgamento, uma vez que, "para se poder concluir que a utilização de um só método de seleção principal - a avaliação curricular - violava o nº 4 do art. 53º da Lei n° 12-A/2008 era de todo necessário que o Tribunal a quo tivesse dado por provada que o universo dos candidatos era diferente".

O afirmado seria exato, se efetivamente a matéria dada como provada não tivesse comtemplado a existência de candidatos com origens díspares, o que como demonstrado no precedente item analisado, não corresponde à verdade, na medida em que a matéria dada como provada reflete exatamente essa circunstância, em face do que, sem necessidade de acrescida argumentação ou fundamentação, improcede o suscitado vicio.

Aliás, a argumentação dos Recorrentes acerca-se da litigância de má-fé, pois que não é questionada a existência de candidatos oriundos de grupos funcionais diversos, referindo-se singelamente que tal não constaria da matéria de facto dada como provada, procurando-se, no entanto, com base em argumentação meramente falaciosa e formal, que se não confirma, obter ganho de causa, sendo que este tribunal, se fosse caso disso, sempre poderia “alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto”, nos termos e para os efeitos do Artº 662º do CPC.

Do erro de julgamento, por errada interpretação do disposto no art. 53º nº 4, da Lei nº 12-A/2008, na redação anterior à introduzida pela Lei n° 55-A/2010, de 31/12:
Entende a Recorrente ARS que que o Tribunal a quo terá feito uma errada interpretação do artº 53°. n° 4 (versão original), da Lei n° 12-A/2008.

No mesmo sentido se pronunciam os Recorrentes contrainteressados, sustentando que o n° 4 do art. 53° da Lei 12-A/2008, permitirá "à Administração optar por selecionar os candidatos com base apenas na realização de um dos métodos de seleção previstos nas alíneas a) dos nºs 1 e 2, pelo que ocorrendo circunstâncias excecionais referidas nesta norma (...), pode a Administração sujeitar todos os candidatos, independentemente da natureza do recrutamento, a um só método de seleção, desde que tal método seja uma avaliação curricular ou uma prova de conhecimentos".

Não é isso, no entanto, que decorre manifestamente do referido normativo, uma vez que compartimenta os dois binómios avaliativos, não sendo licito à Administração tratar os dois números do artigo, relativos expressamente a realidades distintas, como se um único número de tratasse, sendo que a “unificação” dos candidatos nos é dada unicamente com a graduação final (artigo 54º nº 1 al. c) da mesma Lei.

Efetivamente, do regime concursal então vigente, resulta que no recrutamento têm que ser utilizados, em regra e obrigatoriamente os seguintes métodos de seleção:
a) - Provas de conhecimentos e avaliação psicológica, para os candidatos em geral;
b) - Avaliação curricular e Entrevista de avaliação das competências, para outros candidatos identificados, designadamente para os que sejam já titulares da categoria.

Poderão ainda, para além dos referidos métodos obrigatórios, ser adotados, facultativamente, outros métodos de seleção, de entre os legalmente previstos.

Enquanto os métodos das provas de conhecimentos e da avaliação psicológica podem ser aplicados a quaisquer candidatos, já os métodos da avaliação curricular e da entrevista de avaliação das competências só podem ser aplicados aos candidatos que reúnam, cumulativamente, um duplo requisito:
a) Sejam titulares da categoria a que respeita(m) o(s) posto(s) de trabalho a que se destina o recrutamento;
b) Se estiverem em situação de mobilidade especial, "a cumprir ou a executar a atribuição, competência ou atividade caracterizadoras dos postos de trabalho para cuja ocupação o procedimento foi solicitado".

Decorre do referido que aos candidatos “externos” e aos candidatos da Administração Pública, mas com diversa categoria ou que, embora com a mesma categoria, exerçam, ou tenham exercido, funções diferentes são obrigatoriamente aplicáveis os métodos de seleção das provas de conhecimentos e da avaliação psicológica.

Por outro lado, a regra é que, para os dois diferentes grupos de candidatos a que se reportam os nºs 1 e 2 do citado art. 53°, serão utilizados para cada um deles, dois métodos obrigatórios de seleção, a saber,
a) - provas de conhecimentos e avaliação psicológica;
b) - avaliação curricular e entrevista de avaliação das competências.

Não obstante o referido, que constitui a regra, poderá, excecionalmente ser utilizado apenas um desses dois métodos obrigatórios em função do grupo em que se inserem.

Efetivamente, o "elevado número de candidatos" pode constituir um "caso excecional" justificativo da aplicação de um único método de seleção, escolhido de entre o grupo em que se inserem os respetivos candidatos, não sendo lícito “ir buscar” um método avaliativo a grupo funcional diverso.

Efetivamente, o nº 4 do artigo 53° da Lei n° 12-A/2008, de 27/02, na indicada redação, previa que, preenchidos que estivessem os pressupostos e requisitos nele enunciados, a entidade empregadora poderia utilizar apenas os métodos referidos nas alíneas a) dos nºs 1 ou 2, sendo que não há intercomunicabilidade de métodos de seleção entre os dois números do referido normativo.

Reafirma-se que a diferença de métodos de recrutamento decorre do posicionamento funcional dos candidatos, aplicando-se excecionalmente apenas um dos métodos previstos para cada um dos grupos de candidatos, sem que os mesmos se possam cruzar, impedindo-se, por assim dizer, a promiscuidade de métodos de avaliação entre grupos.

Em síntese, nas situação excecionais a que se reporta o nº 4° do art. 53° da LVCR, a escolha do único método de avaliação a utilizar é sempre feita entre os dois métodos do respetivo grupo, sem recurso aos dois métodos do outro grupo funcional.

A interpretação que ora se adotou já havia sido preconizada no recente acórdão deste TCAN, proferido no Procº nº 200/11.8BECBR de 14-02-2020, ainda com contornos não inteiramente coincidentes, mas onde, em qualquer caso, se sublinhou igualmente a necessidade de respeitar a independência e a ausência de intercomunicabilidade dos dois binómios relativos aos métodos de seleção obrigatórios definidos nos n.ºs 1, 2 do artigo 53.° da LVCR.

Sublinha-se finalmente e em qualquer caso, que o decidido em 1ª Instância, e que aqui se ratificará, no sentido de se condenar “o Réu a retomar os procedimentos concursais no ato da decisão de abertura, inclusive, (...) com (...) Utilização de, pelo menos, dois métodos de seleção obrigatórios (prova de conhecimentos e avaliação curricular) a aplicar a universos distintos de candidatos ...”. significa que para cada um dos “grupos”, será obrigatoriamente aplicado apenas um dos referidos métodos, em função do segmento em que se inserem.

Em face do que precede, não se reconhece a verificação do vício recursivamente suscitado.

Da violação do disposto nos arts. 173º e segs. do CPTA
Entendem os contrainteressados aqui recorrentes que o acórdão recorrido terá incorrido igualmente em erro de julgamento em virtude de ter declarado a nulidade dos contratos de trabalho outorgados no seguimento do procedimento concursal controvertido, o que terá violado o disposto nos arts. 173° e segs do CPTA, uma vez que, sendo o ato anulado renovável, e antes da execução de sentença reconstituir a situação atual hipotética, não poderá ser declarada a nulidade dos contratos celebrados na sequência da anulação do ato homologatório.

Não se reconhece que assim seja, tanto mais que uma questão não invalida a outra, pois que a devida renovação do procedimento concursal não impedirá, naturalmente, que as relações contratuais constituídas ao abrigo de concurso anulado, sejam declaradas nulas, até por terem perdido o suporte legal que as havia justificado, sem prejuízo de, se for caso disso, poderem os entretanto nomeados ser considerados, ainda que transitoriamente, como agentes putativos, de modo a salvaguardar a sua situação remuneratória precedente.

Refira-se a este propósito e a título meramente colateral que, se entendem como agentes putativos “os indivíduos que em circunstâncias normais exercem funções administrativas de maneira a serem reputados, em geral, como agentes regulares, apesar de não estarem validamente providos nos respetivos cargos” (cfr. Sérvulo Correia, in Noções de D. Administrativo, pág. 366 - Igualmente Marcelo Caetano in Manual de Direito Administrativo", Almedina, vol. II, p. 644).

Mas voltando ao vício invocado, refira-se que o pedido de declaração de nulidade dos contratos constituiu um pedido legitimamente cumulado nos termos do nº 2 do art, 46° do CPTA, na versão então em vigor, em face do que o tribunal se limitou a julgar procedente o peticionado.

Efetivamente, peticionou-se no ponto 3 do pedido, “que seja declarada a nulidade consequente de todos os atos subsequentes dos procedimentos concursais em causa e dos contratos de trabalhos já outorgados e dos que venham a ser outorgados ao abrigo desses procedimentos concursais”

Na realidade, o pedido de declaração de nulidade ou de anulação de um ato administrativo pode ser cumulado com o pedido de condenação à prática do ato devido, em substituição do ato praticado, com o pedido de condenação da Administração à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como com o próprio pedido de anulação de nulidade do contrato em cujo procedimento de formação se integrava o ato impugnado, como decorria do art. 47°, nº 2, alínea a) a c), do CPTA, na versão então em vigor.

Em face do que precede, improcederá igualmente o vicio vindo de analisar.

Do Recurso Subordinado
Uma vez que se julgarão improcedentes os Recursos Jurisdicionais Independentes, mostra-se prejudicada a análise do Recurso Subordinado, no qual, relativamente às “deliberações do Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde do Centro, (...) de 1 de Março de 2010 (que autorizou a abertura de procedimentos concursais comuns) e de 12 de Abril de 2011 (que homologaram as listas unitárias de ordenação final dos identificados procedimentos concursais comuns)”, se pedia que deveria “ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, de forma a ser declarada a nulidade das deliberações impugnadas, nos termos e com os fundamentos expostos, com o consequente aditamento da vinculação acima enunciada”.

Na realidade, uma vez que a determinada retoma do Procedimento concursal imporá necessariamente a reforma da instrumentalidade conexa com o referido procedimento, naturalmente que a ARS terá de conformar o mesmo com aquilo que foi censurado e estatuído pelo tribunal.

Efetivamente o novo concurso a realizar terá de se conformar, designadamente com o art. 53°, nº 4, da Lei nº 12-A/2008, ficando assim sujeito às vinculações necessárias à expurgação dos vícios detetados e declarados, devendo fixar-se, designadamente, parâmetros de avaliação diferenciados em função dos candidatos, atenta a sua origem funcional, no cumprimento dos binómios constantes dos nºs 1 e 2 do referido normativo.

Não se tomará pois conhecimento do Recurso Subordinado, pois que a sua análise se mostraria inútil e redundante.
* * *
Assim, não tendo os Recursos Independentes (Artigo 682.º CPC) logrado infirmar o entendimento adotado em 1ª instância, importa aqui ratificar tudo quanto aí se decidiu, julgando-se improcedentes os referidos Recursos.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento aos Recursos Independentes, ficando prejudicado o conhecimento do recurso subordinado, confirmando-se o Acórdão Recorrido.

Custas pelos Recorrentes Independentes

Porto, 17 de abril de 2020

Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa