Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00118/2002.TFPRT.32
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/26/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Fernanda Esteves
Descritores:RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA
IRC
FACTURAS FALSAS
ÓNUS DA PROVA
Sumário:1. As informações oficiais, em que se integra o relatório de inspecção e respectivos anexos, fazem fé, quando devidamente fundamentadas (artigos 76º, nº 1 da LGT e 115º, nº 2 do CPPT).
2. A presunção legal de que as declarações apresentadas pelos contribuintes à administração tributária são verdadeiras cessa nomeadamente se essas declarações ou os respectivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75º da LGT).
3. Quando a liquidação de IRC tem por fundamento a não aceitação de custos declarados pelo contribuinte, por considerar que as facturas em que este os pretende suportar não correspondem a operações realmente efectuadas, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação.
4. Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável.
5. Pretendendo a Recorrente impugnar o julgamento sobre a matéria de facto efectuado pelo tribunal de 1ª instância, tem de cumprir o ónus decorrente do disposto no artigo 690º-A, do CPC, na redacção aqui aplicável.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Construções..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. Relatório

Construções ..., Lda. (Recorrente), CF 5…, com sede na Rua…, Ermesinde, Valongo, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), referente ao ano de 1999.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

1ª. Por força do disposto nos art.s 1º, 2º, 13º, 18º.2, 32º.1, 2 e 5, aplicável por força do artº 18º.1, todos da Constituição, 9º.1 do CC, 93º.2, 40º.3, 48º, 52º, 59º, 67º e 119º do Tratado de Roma, e 2º.1, 4º e 5º.1 da 6ª Directiva sobre o IVA, com, pelo menos, força supra - ordinária em relação às normas nacionais de direito ordinário, e levando-se ainda em conta o teor do Acórdão de 12.1.2006 do Tribunal de Justiça Europeu, o processo de impugnação de um acto tributário é de plena jurisdição, e, em consequência o valor da prova produzida em procedimento administrativo - tributário esgota-se com a decisão final produzida nesse procedimento (acto administrativo).

2ª. Os factos dados como provados pela FP, em procedimento administrativo - tributário, iniciado, tramitado e concluído, com base em possível violação do disposto no artº 19º, 3 e 4 do CIVA, por força dos princípios e direitos decorrentes nas normas invocadas na conclusão anterior, têm que ser provados pela FP, no processo judicial, caso a FP declare a existência dos factos violadores, e não reconheça o direito à dedução do imposto, desde que o sujeito passivo impugne judicialmente esse acto.

3ª. Em matérias dessas espécies, dos nºs 3 e 4 do artº. 19º do CIVA, a FP não goza de presunção de legalidade dos seus actos, pois tais matérias têm relevância jurídico-penal. A atribuição à FP dessa presunção perverteria assim aqueles princípios e direitos.

4ª. Em atenção a esses princípios e direitos, o disposto nos arts. 74º., 75º e 76º. da LGT têm que ser interpretados em função das normas invocadas, sendo certo que o disposto nos nºs. 1 e 4 do artigo 76º é matéria inconstitucional.

5ª. Atento este quadro normativo, é indubitável que a FP não produziu qualquer meio de prova no âmbito deste processo; por isso, o acto tributário deve ser anulado ou revogado.

6ª. Embora não se reconheça qualquer valor à prova do procedimento administrativo, desde logo porque é obtida sem controlo judicial e sem submissão ao contraditório, sempre se dirá que, desse procedimento, resulta que a Impte adquiriu todos os serviços correspondentes aos valores das facturas.

7ª. Os indícios que sustentam a decisão de liquidar o imposto não são suficientemente consistentes e credíveis para suportar tal decisão.

8ª. Ao contrário da FP, que não logrou fazer prova dos constitutivos do direito à liquidação, a Recorrente provou a falta dos factos constitutivos daquele direito.

9ª. Ficou provado que a Recorrente não dispunha de meios para efectuar uma obra de tal dimensão sem recurso ao trabalho de sub - empreiteiros, que a obra foi adjudicada ao J... que arranjava trabalhadores para nela trabalharem e que os pagamentos, em regra, eram feitos em dinheiro.

10ª.Apesar de não terem sido recolhidos outros elementos de prova, nomeadamente a reinquirição da testemunha J..., ou a inquirição de outras pessoas, a decisão sob recurso altera completamente a valoração da prova produzida em relação à primeira sentença anulada por este Tribunal.

11ª. Em sede de contraprova, pois a prova compete à FP, os factos alegados pela Recorrente na sua petição estão suficientemente provados, quer por força dos depoimentos das testemunhas inquiridas, coerentes, objectivos e isentos, quer pela experiência comum.

12ª. Por força do alegado, quanto a factos deve ser julgada provada a realidade de operações consubstanciadas nas facturas.

13ª. Por força de tudo o que vai alegado, o acto tributário deverá ser anulado ou revogado.

JUSTIÇA!

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmo. Procurador - Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir, já que a tal nada obsta.

Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões [cf. artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nº s 3 e 4 e 690º, nº 1 todos do CPC, na redacção aplicável, “ex vi” artigo 2º, alínea e), e artigo 281º do CPPT], são as de saber: (i) se a sentença recorrida, ao relevar a prova produzida pela Fazenda Pública no decurso do procedimento administrativo sem que essa prova tivesse sido reproduzida e examinada em audiência pública, violou, entre outros, os artigos 75º, nº 1 da Lei Geral Tributária, 32º, n.º 2, 202º, nº 2 e 203º, da Constituição da República Portuguesa e 345º e 350º do Código Civil; (ii) da inconstitucionalidade do artigo 76º, nº 1 e 4 da LGT; (iii) se a sentença errou ao considerar que os indícios apontados no RIT, e a que o Tribunal a quo aderiu, são suficientemente sérios e credíveis para se poder concluir pela não prestação dos serviços titulados pelas facturas em causa nos autos; (iv) se a sentença recorrida incorreu em erro no julgamento de facto e de direito ao não ter dado como provados os factos alegados pela Impugnante no sentido de demonstrar que os serviços constantes das facturas foram efectivamente prestados e, consequentemente, ao ter concluído pela falta de demonstração da materialidade das operações tituladas pelas facturas em causa.

2. Fundamentação

2.1. Matéria de Facto

2.1.1. O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma:

Factos provados:

A). A Impugnante Construções ..., Lda., NIPC 5…, com sede na Rua…, em Valongo, foi objecto de uma acção inspectiva que teve início no dia 06.04.2001 e termo em 04.12.2001, com base na Ordem de Serviço n.º 28 094 - cfr. Relatório de Inspecção junto a fls.182 a 214 do processo administrativo;

B). Na sequência da acção inspectiva, acima referida, os Serviços de Inspecção Tributária, elaboraram um relatório, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido, e do qual consta, para além do mais, o seguinte:

I.CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA

No âmbito da presente acção inspectiva, produziram-se todo um conjunto de fundamentos, quer em sede das empresa utilizadora, quer em sede dos supostos emitentes, que claramente apontam para que as facturas de A…, n.º 137, 139, 144 e 147, de Ab..., n.º 017 e 051, de D..., n.º 155, 156 e 189, de M..., n.º 043 e de R..., n.º 0003 e 0004, movimentadas como custos do exercício de 1999 sob a rubrica de “subcontratos”, encerram factos e operações que não se deram e que, portanto, são documentos falsos.

Nessa medida, e porque se tratam de despesas fictícias, por falta de enquadramento no preceituado no artigo 23º do Código do IRC, tais valores não podem ser considerados como custos fiscais, pelo que, será de promover as correcções técnicas em sede do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, através do acréscimo ao lucro tributável declarado do valor de 51.074.160$00.

I. OBJECTIVO, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA

(…)

B – MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL

(…) Motivo: A acção inspectiva teve por motivo determinante a suspeita de utilização de facturas falsas, atribuídas ao operador A... por serviços supostamente prestados de aplicação de gessos projectados e colocação de molduras em obras de construção civil.

(…)

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL

1. FACTOS QUE DESPOLETARAM A PRESENTE ACÇÃO INSPECTIVA

No âmbito de uma acção inspectiva anteriormente efectuada ao contribuinte A..., NIF 1…, colectado como empresário em nome individual, no exercício da actividade de fornecimento de gessos e outros materiais relacionados com a construção civil, assim como a sua aplicação no âmbito das prestações de serviços, na sequência do cruzamento da informação obtida através de solicitação via postal dos elementos relativos às relações económicas entre aquele agente e as Construções ..., Lda., apurou-se que esta empresa lançou na sua escrita as facturas n.º 137 de 30/06/99, 139 de 30/06/99, 144 de 30/07/99 e 147 de 28/07/99, que pretendem traduzir a “aplicação de gessos projectados e molduras na obra de Ermesinde”

No âmbito da referida acção, verificou-se que os elementos que integravam a escrita do referido A... não reflectiam o registo das mencionadas facturas, assim como se constatou que o valor contido nas mesmas não foram declaradas à Administração Fiscal, quer em sede do IRS, quer do IVA.

Por essa razão, indagou-se o referido indivíduo, exibindo-se para tanto fotocópias das mencionadas facturas, que pelos vistos apresentam uma letra manuscrita diferente da sua, tendo para o efeito prestado as seguintes declarações:

- Quanto às facturas n.º 137, 139, 144 e 147 todas emitidas em 1999 à firma “Construções ..., Lda.”, declarou não ser sua a letra que nelas surge manuscrita nem autorizou alguém a fazê-lo por si, acrescentando que durante o ano de 1999 não exerceu qualquer actividade comercial ou de prestação de serviços para a aludida empresa;

- Desconhece quem utilizou as suas facturas, isto é, a 137, 139, 147 e 144, sabe sem dúvida que não emitiu essas facturas e que não prestou os serviços que delas constam, até porque não costumava passar facturas por valores tão elevados. Admite que alguém tenha tido acesso a essas facturas e que abusivamente se tenha servido das mesmas para fins em relação aos quais é completamente alheio. Desconfia que as mesmas possam ter sido fornecidas ou emitidas por J..., que chegou a trabalhar consigo até Março/Abril de 1998, sendo por isso uma pessoa que teve acesso às facturas que normalmente utilizava;

- O depoente fez questão de precisar que durante o ano de 1998 e mais particularmente no ano 1999, exerceu a actividade mas em escala reduzida.

As declarações obtidas do suposto emitente das facturas, vieram de algum modo confirmar a suspeita quanto à autenticidade das mesmas, devido aos montantes elevados das facturas, à deficiente discriminação dos serviços, mas também à conduta de manifesto incumprimento fiscal por parte daquele, em sede do IRS e do IVA. (…)

2. ANALISE INSPECTIVA FACTUAL

2.1. Factos iniciais

Numa primeira abordagem, foram confrontados os responsáveis da empresa “construções ..., Lda.”, na pessoa do gerente ... e do filho, o sócio Eng.º D…, quanto às facturas nº 137, 138, 144 e 147, atribuídas a A..., contabilizadas como custo do exercício de 1999 sob a rubrica de “subcontratos”, que referem a somente a “Aplicação de gessos projectados e molduras na obra de Ermesinde”, tendo ambos afirmado que as mencionadas facturas, traduzem serviços efectivamente subcontratados de aplicação de gessos projectados e molduras, durante o ano de 1999, na obra sita na Rua… em Ermesinde, e que, portanto, eram verdadeiras.

Referiram que a empresa procedeu à entrega de trabalhos e serviços de subempreitada das obras de gesso e molduras a J..., pessoa a quem normalmente recorriam, nomeadamente para o fornecimento de gessos e colocação de gessos e molduras a metro, conhecido na empresa como “S… GESSOS”.

De A... apenas sabiam que trabalhava juntamente com o J..., no fornecimento de gesso e colocação de equipas de pessoal nas obras, que em determinada altura lhes tinha sido apresentado como tal. Contudo, frisaram que era com o Sr. J... que a empresa trabalhava directamente, quer em relação à subcontratação das obras quer em relação aos pagamentos efectuados pelos trabalhos prestados.

Em relação à facturação das obras, acrescentaram que as facturas chegavam sempre à empresa pela mão do Sr. J..., umas em nome de MARIA… (“S… GESSOS”), segundo o dito individuo sua companheira, (…) outras em nome de A…, sendo que as facturas emitidas por ambos totalizavam o valor da obra subcontratada ao Sr. J....

(….)

C) Meios de pagamento apresentados

Segundo os responsáveis das Construções ..., Lda. foi paga a totalidade da obra subcontratada ao Sr. J..., pagamentos esses efectuados de forma parcial ao longo do ano de 1999, umas vezes em cheque, outras vezes em dinheiro, exibindo, como prova, fotocópias de cheques emitidos pelas Construções ..., Lda. todos assinados pelo sócio Eng.º D…, para fazerem face ao pagamento do total das facturas de Maria… e de A..., sendo que uns dos cheques são nominativos e outros ao portador, os últimos levantados pelos sócios da empresa e, de acordo com estes, para efectuar os ditos pagamentos em dinheiro. (…).

2.2. Análise da evolução da actividade da empresa

Tendo por base os valores registados/ declarados nos anos de 1998 e 1999, quando comparados, torna-se bastante notória a discrepância existente quanto à rentabilidade fiscal declarada de 51% em 1998 e 4% em 1999. No ano de 1999 este rácio é fortemente influenciado, entre outras rubricas dos custos, pelo elevado crescimento de subcontratos, verificando-se paralelamente um decréscimo na construção (vendas + obras em curso), conforme se demonstra: (…)

2.3. Áreas Examinadas

(…)

2.3.1. Compras/ Subcontratos/ Fornecedores

Decorrente da análise efectuada às facturas representativas dos inputs das Construções ..., Lda. quer de aquisições de materiais aplicados nas obras, quer de fornecimentos e serviços externos – “subcontratos”, foram identificados um conjunto de documentos reflectidos na contabilidade na rubrica “subcontratos”, na sua maioria supostamente representativos do recurso à subcontratação de terceiros para a aplicação de gessos projectados e molduras em obras de construção civil, sobre os quais recaíram, desde logo, fundadas suspeitas da sua autenticidade, concretamente aos fornecedores a seguir identificados:

1. AB... (…)

2. ANTÓNIO… (…)

3. D... (…)

4. M... (…)

5. R... (…)

Esses indícios sustentam-se na verificação dos seguintes factos:

- Incumprimento das obrigações fiscais por parte de quase todos os supostos emitentes;

- Deficiente discriminação dos serviços prestados;

- Em todas as facturas, a letra que surge manuscrita é idêntica, parece mesmo corresponder à que consta das facturas n.º 137, 139, 144 e 147, atribuídas a A...;

- A empresa não possui meios de pagamento que comprovem sustentavelmente as referidas operações;

- Foram facultados cheques emitidos pelas Construções ..., Lda. que representam tão-só o pagamento de 50% do valor do IVA repercutido nas facturas, o que faz supor tratar-se da comissão auferida pelo agente que terá colocado as facturas na empresa;

- Os referidos cheques, supostamente representativos do pagamento, nomeadamente, dos 50% do valor do IVA, surgem emitidos à ordem de J..., indivíduo que terá colocado as facturas na empresa utilizadora;

2.3.2. Os documentos em causa são os seguintes: (…)

- As facturas n.º 017 de Ab..., n.º 0007 de António…, n.º 156 e 189 de D..., nº 043 de M... e n.º 0003 e 0004 de R..., traduzem os serviços supostamente prestados de “Aplicação de gessos projectados e molduras na obra de Ermesinde”

- As facturas nº 051 de Ab... e 155 de D..., são supostamente representativas de, respectivamente, “serviços de trolha executados na obra de Ermesinde” e “assentamento de tijolo na obra de Ermesinde”

3. DOS INDÍCIOS E DA PROVA DA EXISTÊNCIA DE FACTURAS FALSAS.

3.1. “Intermediário” que terá colocado as facturas na empresa.

3.1.1. Facturas atribuídas a A....

Visando obter esclarecimentos relativos às facturas n.º 137, 139, 144 e 147 todas de 1999, atribuídas a A... e interceptadas nas Construções ..., Lda. e, na sequência das declarações prestadas pelo suposto emitente, à data de 06/12/2001, segundo o qual as facturas a si atribuídas pudessem ter sido fornecidas ou passadas por J..., NIF 1…, individuo que chegou a trabalhar consigo até Março/ Abril de 1998, sendo por isso uma pessoa que teve acesso aos documentos que normalmente utilizava, ouvimos, em 12/04/2001, o Sr. J..., sendo as suas declarações reproduzidas em auto, do qual passamos a transcrever as seguintes:

- Que trabalhou na área da construção civil, sobretudo na colocação de gessos projectados e molduras;

- Que mantinha um acordo verbal e de cavalheiro com o Sr. A..., que consistia na angariação e execução de obras com a distribuição dos resultados a meias. Quem procedia à emissão de facturas pela realização das obras era o Sr. A...;

- Questionado se executaram serviços para a empresa Construções ..., Lda. respondeu que sim, que fizeram muitos trabalhos em obras de Rio Tinto e Ermesinde, pelo menos nos anos de 1997 e 1998 e não sabe ao certo no ano de 1999.

- O depoente referiu que era mais ele quem estabelecia os contactos e acordava a realização das obras com os responsáveis das Construções ..., Lda. mas sempre com o acordo do Sr. A..., que sabia de tudo, visto que não fazia nada sem lhe dizer a ele;

- Exibidas fotocópias das facturas números 137, 139, 144 e 147, bem como dos recibos números 95, 96, 101 e 104, documentos atribuídos a A..., e perguntado se a letra neles manuscrita lhe pertencia, disse que lhe parecia ser sua, está mesmo convencido que é a que consta das facturas 137, 144, e 147 assim como dos recibos 96,101 e 104, já no que se refere à factura 139 e ao recibo 95 disse que a letra não era sua;

- Admitiu que o valor real da obra fosse inferior ao que consta das facturas, neste momento não sabe precisar de quanto foi, sabe que pelo valor efectivamente recebido pelo trabalho efectuado recebia o IVA correspondente, em relação ao IVA que incidia sobre o valor que não recebia lhe era pago uma percentagem de cerca de 5% a 7,5% do valor não cobrado como foi o caso respeitante às facturas nºs 137, 139, 144 e 147;

- No sentido de melhor esclarecer as declarações antes proferidas, o depoente afirmou que os serviços de projecção de gessos e de colocação de molduras foram executados, no entanto, por acordo com os responsáveis da empresa e a troco dos tais 5% a 7,5% o valor das facturas era aumentado. Neste momento não sabe precisar de quanto é que aquelas facturas foram aumentadas. Como antes já disse, do valor correspondente ao aumento e que não traduzia a prestação de serviços, só recebia a 5% a 7,5% desse valor;

- Questionado como lhe era feito os pagamentos disse que umas vezes recebia em cheques e outras vezes em dinheiro.

3.1.2 Facturas atribuídas a outros operadores

Na sequência do declarado por J... quanto a facturas atribuídas a A..., e porque foram interceptadas na contabilidade das Construções ..., Lda. outras facturas que pretendem justificar o recurso à subcontratação de terceiros, nomeadamente a aplicação de gessos projectados em obras de construção civil, manuscritas com letra que parece corresponder à do depoente, designadamente as facturas nºs 017 de 06/10/99 e 051 de 17/11/99 de Ab...; nº 0007 de 21/05/99 atribuído a António...; nº 155 de 10/02/99, nº 156 de 26/03/99 e 189 de 04/05/99 de D...; nº 043 de 09/08/99 atribuído a M...; nº 0003 de 29/01/99 e nº0004 de 25/02/99 atribuídos a R..., cujas fotocópias lhe foram exibidas, ouvimos novamente o depoente, em 18/09/2001, sendo as suas declarações reproduzidas em auto, do qual passamos a transcrever as seguintes:

- que com excepção das facturas nº 156 de D… e nº 051 de Ab..., todas as restantes e que antes estão identificadas foram por si processadas;

- que todas as facturas, inclusive aquelas nº 156 e 051, foram por si entregues à firma “construções ..., Lda.”, na pessoa do Sr. Engenheiro D…;

- as mencionadas facturas, todas elas, não correspondem às prestações de serviços que constam dos respectivos discriminativos, adiantou que a troco da entrega dessas facturas recebia tão só das Construções ..., Lda. um valor correspondente a cerca de 50% do IVA facturado. Desse valor que recebia ficava com uma parte e o restante distribuía pelas pessoas em nome das quais passava as facturas, por serem do seu conhecimento pessoal com excepção do R..., que não conhece;

- admite que as facturas do R... lhe tenham sido entregues pelo seu cunhado, M..., tal como aconteceu em relação às facturas de Ab...;

- quis ainda referir que lhe parece que as facturas n.º 051 de Ab... e nº 156 de D..., terão sido passadas pelo Engº D… por lhe parecer que a letra lhe pertence;

- que as verbas que recebia lhe eram pagas geralmente em cheque, passado em seu nome, e por vezes em dinheiro;

Refira-se que o depoente fez questão de referir que colocava pessoal a trabalhar nas Construções ..., Lda. na colocação de molduras e de gessos a metro sendo esses trabalhos facturados pela sua companheira Maria..., que se encontra colectada no exercício da actividade. O valor desses serviços prestados era pago à sua companheira, sempre através de cheque e pelo valor total das facturas, apesar de na maioria dos casos os cheques terem sido passados em nome do depoente.

3.2. NA OPTICA DOS EMITENTES

3.2.1. A....

Visitado o contribuinte, (…), verificamos os seguintes factos:

- Trata-se de um empresário em nome individual, conectado com o exercício da actividade de fornecimento de gessos e outros materiais relacionados com a construção civil, assim como a sua aplicação no âmbito das prestações de serviços;

- As facturas nº 137, 139, 144 e 147, interceptadas nas Construções ..., Lda. contabilizadas como custo do exercício de 1999, sob a rubrica de “subcontratos” não se encontram reflectidas na escrita e declaradas à Administração Fiscal, quer em sede do IRS quer do IVA.

- Desde logo foram observados indícios susceptíveis de questionar a credibilidade das mencionadas facturas, devido aos montantes elevados das mesmas, a deficiente discriminação dos serviços prestados, mas também à conduta de manifesto incumprimento fiscal por parte do suposto emitente, em sede do IVA e do IR. Por outro lado as declarações proferidas pelo suposto emitente, já referenciadas no ponto 1, vieram reiterar a suspeita de autenticidade das facturas.

3.2.2. Ab....

Visitado o contribuinte, (...), visando obter esclarecimentos em torno das facturas 017 de 06/10/99 e 051 de 17/11/99, (…), ouvimo-lo em 2001/08/23, sendo as suas declarações reproduzidas em auto, do qual se passam a transcrever as seguintes:

- que iniciou actividade de Estucagem em Maio de 1998, tendo prestado serviços nessa área até finais de 1998. Referiu que durante esse período de tempo apenas trabalhou para a empresa “R… – Construções e Revestimentos”, empresa para a qual emitiu as únicas facturas;

- a partir de finais de 1998 deixou de exercer qualquer actividade em virtude de se ter tornado toxicodependente de drogas e , por tal motivo, estar incapacitado para trabalhar;

- perguntado se conhecia a empresa “Construções ..., Lda.” … declarou conhecer a empresa, de nome, bem como o proprietário da mesma, o Sr. ..., uma vez que mora na sua zona;

- exibidas fotocópias das facturas nº 17 de 06/10/99 e nº 51 de 17/11/99, bem como dos recibos nº 017 de 06/10/99 e nº 051 de 17/11/99, respectivamente nos valores de 3.744.000$00 e 4.000.000$00, supostamente por si emitidas a favor das Construções ... Lda., por trabalhos de construção civil que lhe terão sido prestados e tendo sido solicitado a pronunciar-se sobre o conteúdo das mesmas, disse que as facturas e recibos exibidos não foram por si emitidos, tanto mais que nunca prestou quaisquer serviços para a mencionada empresa Construções ... Lda.

- questionado sobre a letra que surge manuscrita nos referidos documentos, declarou não ser sua, embora tenha admitido ser sua a assinatura que consta dos mesmos;

- declarou ainda que dada a sua situação de toxicodependente, cedia factura, as quais assinava, a troco de uma quantia que rondava os 1.000$00 por factura e respectivo recibo, dada a necessidade de arranjar dinheiro para comprar a droga.

- por fim, o depoente fez questão de referir que desde 1999, dada a sua situação de toxicodependente de drogas, não mais trabalhou fazendo apenas alguns pequenos “biscatos”.

Por outro lado, no âmbito da acção inspectiva, foram apurados os seguintes factos:

(…)

- trata-se de um não declarante, em sede de IVA e IRS, pelo que, com referencia ao ano de 1999 não cumpriu as suas obrigações declarativas, efectivamente não remeteu ao SAIVA as declarações periódicas do IVA, nos termos do art. 40º do CIVA bem como não apresentou a declaração de rendimentos modelo 3 de IRS.

- não possui escrita, (…), alegando que todos os elementos da sua escrita foram extraviados aquando da mudança de casa, à cerca de um ano e meio;

- não possui arquivados quaisquer duplicados e até mesmo originais não utilizados das facturas que normalmente processava.

- a numeração sequencial das facturas emitidas, não é acompanhada pela cronologia das datas, por exemplo, a factura n.º 017 é datada de 06/10/99, quando a nº 039 é de 03/05/99, esta última interceptada na escrita de António..., NIF 198 191 480.

3.2.3. António…

(…)

Com referência ao ano de 1999~, cumpriu com as suas obrigações declarativas, efectivamente remeteu ao SAIVA as declarações periódicas, previstas no artigo 40º do CIVA, acompanhadas pelo respectivo meio de pagamento nos períodos com apuramento de imposto devido, bem como apresentou para efeitos do IRS a declaração de rendimentos modelo 3 acompanhada do anexo B1.

Visitado o contribuinte, (…), foi exibida a escrita, nomeadamente os livros do artigo 50º do CIVA, bem como dos documentos de suporte ao registo dos mesmos.

A factura nº 0007 de 21/05/1999 no valor de 3.800.000$00 mais IVA repercutido de 646.000$00, interceptada na contabilidade das Construções ..., Lda., representativa de serviços prestados de “aplicação de gessos projectados na obra de Ermesinde” encontra-se registada no livro de registo de serviços prestados, à data de 01/10/1999 e declarada na declaração de IVA do período 9912T. (…) Existem dúvidas quanto à autenticidade da mencionada factura, (…).

No entanto, como o contribuinte emitente prestou contas à Administração Fiscal, na dúvida, parece-nos não ser e rejeitar ou afastar completamente a sua veracidade e, nessa medida, deve ser tida como representativa da subcontratação efectuada pelas Construções ..., Lda..

3.2.4. D...

(…)

Trata-se de um contribuinte sobre quem recaem suspeitas de emissão de facturação falsa, e, portanto, conectado com a prática de crime de fraude fiscal em co-autoria com as empresas utilizadoras das facturas.

Com referência ao ano de 1999, cumpriu com as suas obrigações declarativas, (…). No entanto, não fez constar das mesmas as facturas n.ºs 155 de 10/02/99, 156 de 26/03/99 e 189 de 04/05/99 respectivamente no valor de 2.129.400$00, 4.504.500$00 e 3.978.000$00, todas supostamente emitidas às Construções ..., Lda..

Procurado o contribuinte, (…), ouvimo-lo em 2001/07/16, sendo as suas declarações reproduzidas em auto, do qual se passam a transcrever as seguintes:

- que presta serviços na área da construção civil, como seja serviços de trolha, pintura e até como pedreiro. No âmbito da actividade possui ao seu serviço cerca de dois, três trabalhadores. Quando o serviço é muito recorre à subcontratação;

- perguntado se conhecia a empresa Construções ..., Lda. declarou não conhecer a referida firma de nenhum lado;

- exibidas fotocópias das facturas nº 155 de 10/02/99, nº 156 de 26/03/99 e nº 189 de 04/05/99 bem como a fotocópia dos recibos nº 155 de 10/02/99, nº 156 de 26/03/99 e nº 189 de 04/05/99, todas supostamente emitidas a favor da mencionada empresa Construções ..., Lda., por trabalhos de construção civil que lhe terão sido prestados, e tendo sido solicitado a pronunciar-se sobre o conteúdo das mesmas disse que as facturas e recibos exibidos fazem parte de livros que lhe foram roubados, isto é, que desapareceram da sua posse, durante o ano de 1994.

- precisou que nesse ano trabalhava com outra pessoa, o Sr. J…, residente em Lavadores, Vila Nova de Gaia, tendo-se ambos deslocado, na viatura daquele, à empresa “I…”, em Gaia, afim de ser emitida facturação por serviços prestados, dado o adiantado da hora e porque o dito J... disse que as instalações já se encontrariam encerradas decidiram adiar essa deslocação para o dia seguinte. Por esse motivo, o livro de facturas e o livro de recibos ficaram no automóvel do J..., só que, a partir dessa data o depoente deixou de ver as facturas e os recibos assim como ao J.... Só mais tarde o voltou a encontrar, em casa do pai da pessoa que executa a sua escrita, cerca de dois anos depois do seu desaparecimento, tendo-lhe então sido dito pelo J... que o livro de facturas e de recibos tinham sido roubados da sua viatura;

- questionado se prestou os serviços, que constam das mencionadas facturas, à empresa Construções ..., Lda., respondeu que não, que nunca trabalhou para tal empresa e como já antes tinha afirmado nem sequer a conhece;

- Sobre a letra que aparece manuscrita nas facturas e nos recibos disse não a reconhecer como sendo sua, assim como considera não ser sua a assinatura que surge no recibo e na factura nºs 189;

- Perguntado se recebeu alguma verba das que constam nas facturas e nos recibos, ainda que parcial, respondeu que não;

- O depoente fez questão de referir que no ano de 1999 trabalhou, entre outras, para as empresas “T…” e “C…”, sendo que para esta ultima durante quase todo o ano. Como trabalhava conjuntamente com um amigo, umas vezes facturava um, outras vezes o outro, reafirmando que nunca trabalhou para a empresa Construções ..., Lda.”

3.2.5. M....

Trata-se de um contribuinte que esteve colectado no exercício da actividade de “comércio por grosso de tecido/malha/vestuário” até 30/09/1992, data da cessação, (…).

Visando obter esclarecimentos em torno da factura nº 043 de 09/08/1999 por si emitida, interceptada nas Construções ..., Lda., (…), bem como das características da actividade exercida por M..., foram desenvolvidas diligências junto do emitente.

Em auto de declarações, o contribuinte veio produzir, entre outras, as seguintes afirmações:

- que prestou serviços de construção civil durante todo o ano de 1997, nomeadamente na colocação de gessos projectados. No âmbito da actividade não possuía trabalhadores a seu cargo, recorrendo à subcontratação de equipas para efectuar o serviço.

- declarou que no ano de 1997 trabalhou essencialmente para as empresas “P…, Lda.”(…), “E…– Soc. de Construções, Lda.”(…) e “Construções…, Lda.”(…). Acrescentou ainda que, para todas elas, facturou os serviços prestados;

- nos anos de 1998 e seguintes não mais trabalhou por motivos de saúde, nomeadamente problemas de álcool;

- cedia facturas em branco, as quais assinava a troco de uma quantia que rondava os 5% do valor facturado, tendo adoptado este procedimento nos anos de 1998 e 1999;

- questionado se conhecia a empresa Construções ... Lda… declarou conhecer a empresa, uma vez que já trabalhou para a mesma por intermédio do seu cunhado, Sr. J..., talvez em 1994 ou 1995, não se recordando da data precisa;

- exibida fotocópia da factura nº 043 de 09/08/99 bem como do recibo nº 043 no valor de 3.276.000$00 interceptada nas Construções ... Lda., por trabalhos de construção civil que lhe terão sido prestados, e tendo sido solicitado a pronunciar-se sobre o conteúdo da referida factura, declarou que a mesma não foi por si emitida, no entanto, admitiu que a assinou e cedeu em branco a troco de uma determinada quantia, 5% do valor facturado.

Por outro lado, no âmbito da acção inspectiva, foram apurados os seguintes factos relacionados com a situação tributária do contribuinte:

- não possui escrita, (…);

- não deu conta à Administração Fiscal, através da entrega da declaração de rendimentos modelo 3 de IRS dos resultados alcançados no âmbito da hipotética actividade, não obstante ter declarado que prestou serviços em obras de construção civil, durante o ano de 1997 e ter exibido os duplicados das facturas emitidas;

- de igual modo, não prestou contas à Administração Fiscal do IVA liquidado nas facturas, (…)

- do livro de facturas exibido faz parte a nº 043 de 09/08/1999, interceptada na contabilidade das Construções ... Lda., sendo que, o duplicado da referida factura apenas está assinado pelo contribuinte.

3.2.6. R....

Contribuinte colectado na actividade de “Construção de Edifícios” desde 1998/10/01, enquadrado em IVA no regime normal/ trimestral. Trata-se de um não declarante em sede de IRS e IVA.

Com referência ao ano de 1999, não cumpriu com as suas obrigações declarativas, efectivamente não remeteu ao Serviço do IVA as declarações periódicas bem como não apresentou a declaração de rendimentos modelo 3 do IRS.

Em relação às facturas nº 155 de 10/02/99, 156 de 26/03/99 e 189 de 04/05/99, respectivamente nos valores de 2.129.400$00, 4.504.500$00 e 3.978.000$00, interceptadas nas Construções ..., Lda. (…), a falta do meio de pagamento credível que comprove sustentavelmente a referida operação, na óptica da empresa utilizadora, bem como as declarações proferidas por J..., onde diz que, entre outras facturas, estas foram por si processadas e entregues às Construções ..., Lda., na pessoa do Engº D…, não correspondendo às prestações de serviços que constam dos respectivos discriminativos, recebendo tão só um valor correspondente a 50% do IVA facturado, leva-nos a rejeitar completamente a sua autenticidade e, nessa medida, não deve ser tida como representativa da subcontratação, na óptica das Construções ..., Lda.

4. NA OPTICA DA EMPRESA UTILIZADORA DAS FACTURAS

4.1. Dos aspectos técnicos/contabilísticos

Apesar dos sócios da empresa pretenderem fazer acreditar que as facturas emitidas no ano de 1999 por A..., servindo-se para tanto do argumento de que o numero de metros quadrados de gesso facturados por aquele e pela Maria… (S… Gessos) é coincidente com o número de metros que consta do orçamento apresentado pelo “S... Gessos”, o certo é que esse aspecto não é confirmado pela realidade.

De facto, uma observação mais extensiva e atenta permitiu constatar que ao contrario do que é sugerido pelos sócios da empresa, os trabalhos de colocação de gesso na citada obra de Ermesinde (costa) iniciaram-se no ano de 1998, conforme consta das facturas emitidas nesse ano por Maria... (“S... Gessos”) e uma outra processada por A..., todas representativas de trabalhos de “aplicação de gessos projectados na obra de Ermesinde”, contabilizadas a débito da conta “621 – Subcontratos”, envolvendo os seguintes valores e número de metros debitados, estes calculados por extrapolação, ou seja, a partir do preço por metro quadrado indicado no orçamento:

(…)

Não se deixa de referir que, não obstante os trabalhos se terem iniciado em 1998, mantendo-se em curso as respectivas obras, a empresa não fez reflectir nas contas desse ano, ao nível do inventário final, qualquer valor a titulo de existências respeitante a obras em curso no dito prédio de Ermesinde (Costa), constituído por quatro blocos, como também não inventariou no final do ano de 1999, como estando concluído ou em curso, as fracções do prédio correspondentes ao Bloco 4, quando é certo que por essa altura estaria já concluído ou em adiantada fase de conclusão, visto que de acordo com o Processo de Avaliação instaurado pelos Serviços de Finanças de Valongo – 2, a avaliação de todo o prédio teve lugar no dia 11/05/2000, tendo nessa mesma data sido inscrito na matriz sob o artigo 8976 da freguesia de Ermesinde.

Tendo em vista a inscrição do prédio na matriz a empresa “Construções ..., Lda.” comunicou nos Serviços de Finanças de Valongo-2 a data de conclusão do citado prédio de Ermesinde (Costa), sito na Rua… em Ermesinde, como se tendo verificado em 01/03/99, conforme consta da declaração mod. 129 entregue em 19/04/99. Por outro lado, considerando que começou a vender as fracções desse prédio em Maio de 1999, como decorre das escrituras de compra e venda realizadas, entre outras a relativa à fracção H, de 07/05/1999, lavrada pelo 8º Cartório Notarial do Porto, torna-se evidente que os trabalhos de aplicação de gessos e molduras não se poderiam ter iniciado apenas no ano de 1999.

Daí que, tendo em conta que os trabalhos de colocação de gesso na referida Obra de Ermesinde (Costa) foram objecto de facturação em 1998, por parte do “S... Gessos”, e que o número de metros quadrados que resultam dessas facturas é de 28 688 ou seja, próximo do numero que consta do já citado orçamento, infere-se que as facturas nº 137, 139, 144 e 147, atribuídas a A..., contabilizadas nas Construções ..., Lda. como custo do exercício de 1999, não representam na verdade os trabalhos que os responsáveis da empresa alegam de colocação de gessos na obra em causa. A este propósito importa salientar-se que não tendo sido rejeitada a factura atribuível ao António... (…), apura-se o número de metros quadrados 32 256, ligeiramente superior ao que consta do orçamento. (…)

No que concerne aos registos contabilísticos e fluxos financeiros associados ao pagamento das facturas nºs 137, 139, 144 e 147 de A..., nºs 017 e 051 de Ab...; nº 0007 de António…, nºs 155, 156 e 189 de D...; nºs 0003 e 0004 de R..., evidenciam-se os seguintes factos:

- para todos os supostos emitentes existe conta corrente;

- todas as facturas foram lançadas no próprio mês da suposta emissão, como decorre dos movimentos efectuados a crédito da respectiva conta “22.1.1 Fornecedores Nacionais” por contrapartida do débito “621- Subcontratos”;

- a contabilização dos supostos pagamentos mostra-se efectuada na mesma data das respectivas facturas, conforme lançamentos reflectidos na citada conta do “Fornecedor” e por contrapartida da conta “111- Caixa”, como se os mesmos tivessem sido realizados em dinheiro, o que não deixa de ser estranho. (…)

4.2.Dos meios de pagamento.

Do ponto de vista do registo contabilístico dos fluxos financeiros, verificamos que a empresa mantinha implementado um sistema caracterizado pela utilização intensiva da conta “111- Caixa” por onde fazia passar todos os movimentos associados a pagamentos e recebimentos, não movimentava a conta “Bancos” e, consequentemente, não fazia reflectir na contabilidade quer os cheques emitidos, quer os depósitos bancários. No entanto, a empresa possuía pelo menos uma conta bancária na Caixa Geral de Depósitos, correspondente ao n.º 00022000130 da Agência de Valongo.

Por outro lado, em relação a alguns dos pagamentos a fornecedores, mesmo envolvendo pequenas importâncias, foram emitidos cheques bancários, apesar de não movimentados na contabilidade da empresa, conforme anotações contidas nos respectivos recibos. Referem-se, entre outros, os seguintes: (…)

De igual modo, foram facultadas fotocópias dos cheques emitidos pela empresa para pagamento das facturas de Maria... (“S... Gessos”), pelo fornecimento de gessos e sua aplicação de gessos e molduras, no âmbito das prestações de serviços, na obra sita na Rua …, em Ermesinde, (…).

Apesar do tratamento contabilístico indicar que o pagamento ao “S... Gessos” foi realizado por caixa, o certo é que o meio de pagamento utilizado pela empresa foi o cheque bancário, conforme anotações contidas em alguns dos recibos: (…)

Refira-se que todos os cheques emitidos para pagamento das facturas emitidas pela Maria... (S... Gessos), foram emitidos à ordem de J..., com excepção do cheque nº 4354570949 que foi emitido à ordem daquela.

Em relação às facturas atribuídas a A..., Ab..., D..., M... e R..., do ponto de vista contabilístico, os fluxos financeiros de saída associados aos supostos pagamentos dos serviços prestados deram-se de uma só vez, à data da factura, a dinheiro, como decorre da leitura da conta corrente de cada um dos operadores, bem como dos movimentos ocorridos na conta “111- Caixa”.

No que respeita aos restantes cheques emitidos à ordem de J..., facultados pelos responsáveis das Construções ..., Lda., identificados no ponto 2.1., como representativos do pagamento de parte das facturas emitidas por Maria... e A..., sendo que, o restante foi pago a dinheiro, constata-se que a maioria deles representam tão só o pagamento de 50% do IVA mencionado nas facturas atribuídas a A..., Ab..., D..., M... e a R..., o que faz supor tratar-se de eventual comissão auferida pelos agentes que intervieram na colocação das facturas na empresa.

Esse pormenor é observável pela leitura comparativa entre o valor dos 50% do IVA que consta do quadro seguinte com os correspectivos cheques: (…)

Tal situação, de todo estranha e não conforme com os procedimentos usuais das empresas, mostra-se também contrária à prática comumente seguida pelas Construções ..., Lda. no que se refere a pagamentos a outros fornecedores, bem como à própria “S... Gessos”, efectuados a mais das vezes por meio de cheque bancário, mesmo no caso de importâncias reduzidas, ainda que não reflectidos na contabilidade, e em circunstância alguma pagando apenas 50% do IVA das facturas.

Daí se concluir que os cheques disponibilizados pela empresa, não contabilizados, correspondentes à liquidação de 50% do IVA repercutido nas facturas, evidenciam claramente na óptica da utilizadora, não só pela estranheza da diversidade dos supostos meios de pagamento utilizados, 50% do IVA por cheque e restante valor substancial das facturas em dinheiro, que as facturas sobre as quais recaem suspeita da sua autenticidade não correspondem à realização de quaisquer serviços, por não se provar por meios credíveis o efectivo pagamento, antes relevando da natureza falsa das mesmas e de que os factos e operações que lhe estão subjacentes não existiram.

5.CORRECÇÕES À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

Em razão do que se deixa exposto, quer na óptica dos supostos emitentes, quer na perspectiva da empresa utilizadora das facturas, produziram-se todo um conjunto de fundamentos que claramente apontam para que as facturas de A..., n.º 137, 139, 144 e 147, de Ab..., nº 017 e 051, de D..., n.º 155, 156 e 189, de M..., n.º 043 e de R..., n.º 0003 e 0004, movimentadas como custos do exercício de 1999 sob a rúbrica de “Subcontratos”, encerram factos e operações que não se deram e que, portanto, são documentos falsos.

Facturas falsas contabilizadas: (…)

Total: 51.074.160$00

Nessa medida e porque se tratam de despesas fictícias, será de promover as seguintes correcções, em sede do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas:

No âmbito do IRC, considerando que as facturas falsas não são encargos, na medida em que se tratam de custos fictícios, e sendo certo que as Construções ..., Lda. contabilizou e declarou como custo do exercício de 1999 os valores delas constantes, conforme registos operados a débito na conta “62.1.1. – subcontratos” e como consta da declaração de rendimentos Mod.22 do IRC de 1999 apresentada em 31/07/2000 no 2º Serviço Fiscal de Valongo, decorre que, por falta de enquadramento no preceituado artigo 23º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, tais valores não podem ser considerados custos fiscais, tendo-se, portanto, procedido à respectiva correcção técnica, através de acréscimo efectuado ao lucro tributável declarado:

- Lucro Tributável declarado 9.491.149$00

- Correcção Proposta 51.074.160$00

- lucro tributável proposto 60.565.309$00

IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Não aplicável ao caso apreciação.

V. CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Não aplicável ao caso apreciação.

(…)

VII - DIREITO DE AUDIÇÃO.

Não foi exercido o direito de audição sobre o projecto de conclusões do relatório da acção inspectiva, não obstante a empresa ter sido notificada, para a sede, nos termos previstos no artigo 60º da Lei Geral Tributária e artigo 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária. (…)”; – cfr. fls. 182 a 214 do processo administrativo;

C). As conclusões a que o Serviço de Inspecção chegou, após a Impugnante ter sido notificada para exercer o direito de audição, vieram a ser ratificadas superiormente, como resulta do “parecer” e “despacho”, do qual consta, além do mais, o seguinte:

“Confirmo o presente relatório, nomeadamente as correcções de natureza meramente aritmética, resultante de imposição legal, à matéria tributável do IRC do exercício de 1999, no montante de Esc. 51.074.160$00, decorrente da desconsideração de custos titulados por facturas falsas. (…)”

“Concordo. (….)” – cfr. fls. 182 do processo administrativo;

D). No seguimento das rectificações efectuadas, a Administração Tributária emitiu a liquidação de IRC n.º 8310001072, referente ao exercício de 1999, no valor de € 105.767,56; - cfr. fls. 217 do processo administrativo;

E). A obra em causa localiza-se na Rua…, n.ºs 221, 237, 251, 261, 295 e 311, em Ermesinde; - cfr. fls. 24 dos autos;

F). A obra consistia na construção de um prédio habitacional, constituído por 4 blocos e 59 habitações; - cfr. depoimentos das testemunhas J… e V…;

G). A Impugnante tinha entre 2 a 3 trabalhadores na obra; - cfr. depoimentos das testemunhas D... e V…;

H). Para a realização da obra referida na alínea E) a Impugnante por adjudicou as diferentes artes a vários empreiteiros, designadamente, a obra de gesso a J..., que comercialmente utilizava a denominação de “S... Gessos” e a obra de “electricidade” a V...; - cfr. depoimentos das testemunhas J..., J..., V...;

I). A construção da referida obra foi faseada, tendo durado cerca de três anos; -cfr. depoimento das testemunhas D..., J... e V...)

J). O material utilizado na obra era fornecido pela Impugnante, com excepção do gesso e electricidade; - cfr depoimentos das testemunhas J... e V…)

L). A maior parte das vezes a Impugnante fazia os pagamentos através de numerário e algumas vezes por cheque; - cfr. depoimentos das testemunhas J..., António…, D..., J... e V...;

M). A petição inicial da presente impugnação deu entrada no Tribunal Tributário do Porto em 18.06.2002; - cfr. fls. 2 dos autos;

N). Em 11.11.2010, através do ofício n.º 9509, foi prestada ao Tribunal, a seguinte informação, da qual consta, além do mais o seguinte:

“ (…) 2º Liquidação n.º 20028310001072 efectuada em 2002-01-30 (objecto da impugnação em apreço) (…) Nesta liquidação o valor da matéria colectável declarada € 47.341,65, não coincide com o valor calculado, €302.098,14, encontrando-se anulado em 2008-03-27 o montante de € 10.488,52, e pago o valor restante de €95.279,04 em sede do processo executivo nº 3565200201500309 (tendo sido paga a quantia de € 94.441,33 em 2002-12-27 e a quantia de € 837,71 em 2004-09-03). (…)”; - cfr. fls. 688 dos autos;

III.A - Factos não provados

Com relevância para a decisão a proferir não resultam provados outros factos.


***

No que respeita à factualidade considerada provada e relevante à decisão da causa, o Tribunal fundou a sua convicção na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e constantes do processo administrativo que não foram objecto de impugnação, e ainda, nos depoimentos prestados pelas testemunhas apresentadas pela Impugnante.

As testemunhas inquiridas possuem, considerando a razão de ciência que invocam, um conhecimento directo dos factos sobre os quais depõem, com excepção da testemunha M..., que tem conhecimento dos factos através do que lhe era relatado pelo cunhado, a testemunha J....

Com efeito, atestam as várias testemunhas que para a realização da obra de construção do prédio na Rua…, em Ermesinde, a Impugnante teve de recorrer a mão-de-obra subcontratada, tendo ao seu serviço, directamente, 1 ou 2 trabalhadores (cfr. depoimento de D…). No entanto, não afirmam de forma clara e inequívoca, que entre as empresas subcontratadas figuravam os cinco emitentes – a saber, A..., Ab..., D..., M... e R… - emitentes das facturas que pretensamente titulam negócios simulados.

Vejamos, pois em concreto cada um dos depoimentos prestados.

A testemunha António… refere que trabalhou na obra em causa, por intermédio do J..., sendo este quem lhe pagava. Mais afirma que no local se encontravam outros “funcionários” a trabalhar, cada um por si. Declara ainda que trabalhava ao “m2”, não se recordando da dimensão da obra. Recebia no final do mês, sem prejuízo de poderem existir adiantamentos, sempre em dinheiro, em função da medição dos trabalhos efectuados.

O depoimento prestado por esta testemunha afigurou-se ao Tribunal como sendo isento, mas também inócuo, face à matéria em discussão nos autos. É que, na verdade, a testemunha não se pronuncia sequer sobre o conhecimento ou existência de qualquer um dos emitentes das supostas facturas falsas que vêm identificados no Relatório da Inspecção Tributária.

Adicionalmente, de salientar que a factura emitida por esta testemunha foi aceite como autêntica pela Administração Fiscal.

Por sua vez, o depoimento da testemunha M..., apontado pela Administração Tributária como suposto emitente de factura falsa, tem desde logo por base um conhecimento indirecto dos factos, uma vez que a testemunha afirma que, não obstante conhecer a Impugnante, ter feito apenas um trabalho para esta, numa obra em Carreiros, sem saber precisar exactamente em que data, mas indicando ser cerca dos anos 1993/1994. Afirma nunca ter trabalhado na obra em questão nos presentes autos, cuja fase de construção decorreu em período posterior. Por outro lado, o depoimento que a testemunha aqui prestou, em nada contrariou as declarações que a mesma produziu aquando da sua audição em sede de acção inspectiva e na qual referiu ter entregue “facturas em branco, as quais assinava a troco de uma quantia”[cfr. ponto B) do probatório].

Em face do descrito, o depoimento prestado pela testemunha em juízo, apesar de se apresentar como isento e sincero, não logrou, ou sequer tentou, afastar as declarações que proferiu em sede de acção inspectiva, pelo que, julga o Tribunal ser de manter a valoração das mesmas tal como o foi feito pelos Serviços de Inspecção Tributária.

No que concerne à testemunha D..., a mesma referiu trabalhar para a Impugnante e ter prestado serviços na obra de Ermesinde em causa.

Afirma que quem estava “à frente de tudo” era o Sr. S..., o qual, nesta fase, fazia o reboco. Desconhece os preços da obra e refere que recebia em numerário, declarando que tanto podia ser no final do mês, como no dia 15.

Diz ignorar quem fornecia as matérias-primas. E assevera, ainda, que a construção da obra foi faseada, uma vez que a firma tinha na obra um ou dois trabalhadores, motivo pelo qual, existiam diversos subempreiteiros.

Instado para tal pela Representante da Fazenda referiu conhecer o A..., o Ab... e o António.... Quanto a D..., M... e R..., afirmou não os conhecer, pois “não conhecia todos os subempreiteiros que andavam lá”.

A testemunha J... referiu trabalhar para a Impugnante, conhecer o prédio do Alto da Costa e ter lá trabalhado no final de 1997. Referiu que apenas faziam o trabalho de pedreiro. Concretamente, a testemunha disse trabalhar no ferro, ajudar a por os pilares e fazer a massa/ betão. O trabalho seguinte – assentar tijolo, fazer chão e colocar gesso e azulejo - era adjudicado a um subempreiteiro, que identificou como sendo o Sr. S....

Mais afirmou que o prédio em causa era composto por 4 blocos e 59 habitações, sendo que a construção do mesmo foi faseada.

Afirmou desconhecer quem fornecia a matéria-prima, mas que quem fazia a areia era um Sr. Gambelas.

Disse ainda, sempre ter recebido em dinheiro, ignorando como eram pagos os subempreiteiros ou quem emitia as facturas.

A testemunha V... referiu que há já muitos anos presta serviços à Impugnante, fazendo a instalação eléctrica das obras da Impugnante.

Refere conhecer o prédio em causa, ter trabalhado no mesmo, começando em 1997 e terminando em 2001.

Afirma que o Sr. L... só faz a parte estrutural da obra, entregando o restante a subempreiteiros, sendo que, no caso concreto, o reboco e azulejo estava entregue ao Sr. S....

Ignora o preço da obra do Sr. S... e mais declara que, em regra, as matérias-primas são fornecidas pelo dono da obra, com excepção da parte eléctrica e de serralharia.

Desconhece, igualmente, como eram facturados os outros serviços.

Declara ainda que geralmente recebe ao mês e a maior parte das vezes em cheque.

Por fim, a testemunha J... refere conhecer a Impugnante no âmbito de relações profissionais. Prestou serviços à mesma na obra de Ermesinde, tendo feito todo o tipo de trabalhos “desde o gesso ao reboco, aos blocos, assentamento de tijolo e de azulejo, só não tendo feito de electricista, carpinteiro e de pintor. Nem terraplanagem”. Afirma que os seus trabalhos decorreram durante três anos, entre 1997 e 1999. Mais declarou que a negociação de preços era sempre feita por especialidade, sendo que a primeira foi o gesso, depois o tijolo, seguido do reboco e azulejo.

Note-se que, de modo incoerente com a afirmação acima transcrita, vem mais adiante no seu depoimento especificar que a única coisa que fez foi o gesso, em que o material e mão-de-obra eram dele, tendo entregue as restantes artes a outros subempreiteiros. Esclarece, em complemento, que inicialmente concorreu apenas para fazer o gesso e, posteriormente, como já lá estava concorreu também para outras artes, mas que acabou por as entregar a outros subempreiteiros seus conhecidos.

A este título referenciou o D... (note-se, que este se identificou como trabalhador da Impugnante) que fazia o reboco exterior, o Castro fazia chão e reboco de cozinhas e casas de banho e o D... que fazia o tijolo. Reiterou ainda, que toda a matéria-prima era fornecida pelo Impugnante, com excepção do gesso. As restantes artes prestavam apenas o serviço de mão-de-obra.

Afirmou ainda que o valor global da obra deveria rondar os “noventa ou cem mil e tal contos”, englobando neste preço todas as artes. Disse ainda que o preço dos serviços prestados era pago na maior parte em dinheiro, mensalmente, tendo em conta os metros de trabalho que eram efectuados e mediante “as facturas que a gente submetia à ...”. Para o efeito eram realizados autos de medição todos os meses.

Exibidos à testemunha os documentos n.ºs 243 a 294 juntos com a petição inicial, referentes a autos de medição, esta afirmou reconhecer tais documentos, bem como, a letra e assinatura que afirma serem suas. No que a estes autos de medição concerne esclareceu que era ele quem se responsabilizava pela metragem que era feita, e que mediante aquela era emitida uma factura, que ele, por sua vez entregava à Impugnante, recebendo o dinheiro correspondente às mesmas, o qual era por si entregue aos subempreiteiros.

Mais refere que os pagamentos eram feitos a maior parte das vezes em dinheiro. Quanto à circunstância de existirem cheques emitidos cujo valor é correspondente a 50% do valor do IVA da respectiva factura, justifica afirmando que tal sistema era utilizado quando a factura não era emitida e entregue imediatamente, sendo que, no momento da apresentação da factura, então a Impugnante entregava os restantes 50% de IVA.

Afirmou também existirem pagamentos a meio do mês quando alguém disso demonstrasse necessidade, sendo que esse valor era descontado no pagamento da factura.

Perante o depoimento da testemunha J..., mesmo tendo este declarado que prestou serviços à Impugnante na obra de Ermesinde, em regime de subempreitada e que, para a referida obra subcontratou outros subempreiteiros para diferentes artes, referenciando alguns dos supostos emitentes de facturas falsas, conclui o Tribunal tratar-se de um depoimento vago, impreciso e inconsistente, na medida em que não indica, sequer, quantos trabalhadores teve a seu cargo durante a obra ou a data da realização desses serviços, não obstante reconhecer como seus os autos de medição constantes dos autos. É que, mesmo relativamente a estes documentos (autos de medição), não soube explicar a que apartamento, ou bloco, os mesmos se referiam, limitando-se a afirmar que aquilo era um “apontamento” que depois era passado a limpo

E ainda, no que respeita às subcontratações para outras artes que não a sua, limita-se a afirmar ter subcontratado diversas pessoas, declarando para efeito conhecer o Ab..., o A..., o António..., o D..., o D... e o M... – seu cunhado, que terá trabalhado para si durante cerca de 3 ou 4 meses. Mas, e uma vez mais, o certo é que não concretiza o tipo de serviços prestados pelos referidos emitentes, o número de trabalhadores colocados na obra ou a data da sua realização, ou seja, em concreto, não esclarece sequer a “arte/ obra” que a cada um dos supostos emitentes teria sido adjudicada. Quando inquirido se conhece o suposto emitente, R..., responde dizendo que tal nome não lhe diz nada.

Por fim, nesta valoração da prova ora produzida, não é dispiciendo considerar positivamente a resposta da testemunha quando instada pela Representante da Fazenda Pública acerca da veracidade do depoimento que prestou em sede de acção inspectiva, uma vez que a mesma reiterou a veracidade das afirmações ai produzidas (instado pela Representante da Fazenda Pública: “O que disse em auto de declarações a esta senhora é verdade? (…) respondeu: “Ora bem naquela altura… não sei… mas é verdade. (…) Sim senhora, é verdade (…)”).

Sendo assim, da conjugação das declarações prestadas junto da Administração Tributária e do depoimento prestado pela testemunha em juízo, julga o Tribunal não ser necessária a sua re-inquirição, por se afigurar que, considerando o que decorre dos autos e o envolvimento directo que a testemunha terá tido na situação em apreço, bem como o depoimento por esta prestado em juízo, quando analisado conjuntamente com as declarações proferidas em sede de Inspecção Tributária e cuja veracidade reiterou, este depoimento foi tão esclarecedor quanto o podia ser nas especificas circunstâncias em que se desenrola a participação da testemunha na situação em apreço.

Em referência à prova documental junta aos autos em sede de petição inicial pela Impugnante, deixa-se assente que, analisada a mesma, o Tribunal considera que aquela é inócua e insuficiente para afastar os indícios sérios de emissão de supostas facturas falsas que levaram a Administração Tributária a não aceitar a dedutibilidade dos custos que aquelas pretendem representar. Na verdade, da análise dos documentos juntos aos autos o Tribunal verificou reportarem-se a trabalhos de terraplanagem (Doc. n.º 4), fornecimento de matérias-primas (Doc.n.º 5 a 35 – areias e brita; Doc. n.º 36 a 79 e 234 a 239 – cimento, bloco betão, cal hidráulica e tijolo; Doc. n.º 80 a 92 - vigota e abobadilha; Doc. n.º 93 a 130 – vigas e tijolo, Doc. n.º 195 a 216 – tijolo e palete; Doc. n.º 221 a 233 – cerâmica e mosaico), pagamentos a funcionários e Segurança Social, ai se englobando pessoal de escritório e de limpeza (Doc. n.º 131 a 193), sendo os restantes documentos respeitantes à calendarização das diferentes artes da obra, e como já se referiu, a autos de medição (Doc. n.ºs 243 a 294).

Em conclusão, de toda a prova produzida em juízo e quando concatenada com as declarações que foram prestadas pelos supostos emitentes de facturas falsas em sede de inspecção, julga o Tribunal que a mesma não foi suficiente, para ilidir os indícios sérios que a Administração Tributária reuniu e apresentou para não aceitar a dedutibilidade dos custos titulados por aquelas facturas e, consequentemente, emitir a liquidação adicional de IRC ora impugnada. É que, em face dos depoimentos prestados ficou o Tribunal com a convicção de que, em regra, os mesmos são pouco consistentes e vagos quanto à matéria de que importava fazer prova nos autos.

Vejamos, as testemunhas apresentadas pela Impugnante – de salientar que apenas a testemunha M... integra o grupo dos supostos emitentes, não tendo sido apresentada como testemunha qualquer outro dos emitentes das facturas em causa – de forma convicta e consistente limitaram-se, em síntese, a referir a existência da obra, a sua construção faseada e, de alguma forma, a sustentar o modo de pagamento em dinheiro. Porém, dos referidos depoimentos ressalta, no que à matéria em litígio especificamente interessa, o seu carácter vago e impreciso e mesmo inconsistente, não resultando daqueles, de forma clara e inequívoca, que os cinco emitentes identificados pela Inspecção Tributária, hajam efectivamente prestado serviços à Impugnante na obra em causa.

Ora, para o Tribunal não estava em questão a existência do prédio, o tempo que durou a sua edificação ou mesmo o modo de pagamento aos trabalhadores/ prestadores de serviço na obra – factores que, sem dúvida, constituíram indícios sérios que determinaram a actuação da Inspecção Tributária - mas sim, e perante as declarações prestadas pelos supostos emitentes das facturas em causa e constantes do Relatório de Inspecção, impunha-se a demonstração, por parte da Impugnante, de que os serviços que as mesmas titulam foram, de facto, prestados.

Não obstante o que vem de se dizer, conclui ainda o Tribunal não se afigurar necessário ordenar a inquirição do emitente A..., já que, não resultou da prova produzida pela Impugnante em juízo qualquer indício que de forma séria, abalasse, ou contrariasse, as declarações por aquele produzidas perante a Administração Tributária. Ora, se é certo que ao Tribunal assiste o poder de direcção e inquisitoriedade do processo, realizando todas as diligências que considere necessárias ao apuramento da verdade (artigo 13º do CPPT), é também certo que, considerando as declarações que aquele A... prestou junto da Inspecção Tributária, o Tribunal encontra-se devidamente esclarecido quanto à sua “participação” na situação em litígio. Adicionalmente, não pode também o Tribunal olvidar as regras de distribuição do ónus probatório nesta matéria.

Em suma, da concatenação dos elementos probatórios recolhidos em sede de acção inspectiva pela Administração Tributária e que se deixaram devidamente explicitados supra no ponto B) da factualidade assente, bem como dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Impugnante em juízo, conclui o Tribunal que, a prova testemunhal produzida não foi suficiente para abalar a credibilidade dos indícios recolhidos pela Administração Tributária.

2.2. O direito

Está em causa no presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que resultou de correcções meramente aritméticas à matéria tributável declarada relativamente ao exercício de 1999, emitida na sequência de uma acção de inspecção realizada à contabilidade da Impugnante, em que a administração tributária concluiu que esta terá relevado indevidamente na contabilidade custos contidos em facturas emitidas por “A...”, “Ab…”, “D...”, “M...” e “R...”, por entender que estas facturas não correspondiam a uma efectiva prestação de serviços.

A Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel julgou improcedente a impugnação judicial apresentada, por considerar que o quadro indiciário referido no relatório de inspecção, analisado à luz das regras da experiência comum, permite suportar a conclusão da administração tributária no sentido de que as facturas em causa não se reportam a serviços efectivos e a Impugnante não fez a prova, que se lhe impunha, de que adquiriu os serviços titulados pelas facturas e que os mesmos lhe foram prestados pelos emitentes das mesmas, concluindo assim que os custos declarados pela Impugnante relativos às facturas em causa não podem ter-se por comprovadamente efectuados.

A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando, no essencial, que (i) o processo de impugnação de um acto tributário é de plena jurisdição e, em consequência, o valor da prova produzida em procedimento administrativo - tributário esgota-se com a decisão final produzida nesse procedimento e, assim, os factos dados como provados pela Fazenda Pública, em procedimento administrativo, com base em possível violação do disposto no artigo 19º, nº 3 do CIVA, e por força dos princípios decorrentes das normas dos artigos 1º, 2º, 13º, 18º/2, 32º/1 e 5, da CRP, 9º/1 d CC, 93º/2, 40º/3, 48º, 52º, 59º, 67º e 119º do Tratado de Roma, 2º/1, 4º e 5º/1 da 6ª Directiva sobre o IVA, têm que ser provados pela Fazenda Pública em processo judicial; (ii) em matéria dos nºs 3 e 4 do artigo 19º do CIVA, a Fazenda Pública não goza da presunção de legalidade dos seus actos, por tais matérias terem relevância jurídico - penal; (iii) o disposto no artigo 76º, nº 1 e 4 da LGT é matéria inconstitucional; (iv) os indícios que sustentam a decisão de liquidar o imposto não são suficientemente consistentes e credíveis para suportar tal decisão; (v) a Recorrente provou a falta dos factos constitutivos daquele direito, tendo demonstrado que adquiriu todos os serviços correspondentes aos valores das facturas.

2.2.1. Nas primeiras conclusões de recurso, a Recorrente insurge-se, sobretudo, contra a valoração dos elementos probatórios recolhidos em sede de procedimento administrativo tributário no âmbito do processo judicial.

Pretende a Recorrente, no essencial, que a prova feita no procedimento administrativo se esgota na decisão final e, portanto, não tem qualquer valor em sede judicial, pelo que, desde que o sujeito passivo impugne judicialmente esse acto, e por força nomeadamente das normas dos artigos 1º, 2º, 13º, 18º/2, 32º/1 e 5, da CRP, 9º/1 do CC, 93º/2, 40º/3, 48º, 52º, 59º, 67º e 119º do Tratado de Roma, 2º/1, 4º e 5º/1 da 6ª Directiva sobre o IVA, a Fazenda Pública está obrigada a fazer a prova no processo judicial dos factos dados como provados em sede de procedimento administrativo.

Vejamos.

Antes de mais, importa esclarecer que está aqui em causa não uma liquidação de IVA (como parece pressupor a Recorrente) mas de IRC e o fundamento legal de tal liquidação foi a norma do artigo 23º do CIRC e não dos nºs 3 e 4 do artigo 19º do CIVA (norma que nunca foi invocada, nem pela administração tributária nem pelo tribunal recorrido).

Isto posto, o que a Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel consignou no probatório foi o teor do relatório de inspecção. Com efeito, sabido que é no relatório de inspecção que reside toda a factualidade que consubstancia a declaração fundamentadora dos actos de liquidação impugnados, é essencial conhecer-se a motivação do acto impugnado, de modo a que o tribunal a possa sindicar, pelo que tal fundamentação pode (e deve) integrar o probatório.

E é à luz de tal fundamentação do acto impugnado (vertida no relatório de inspecção tributária) que o tribunal tem de sindicar se a administração tributária demonstrou os pressupostos que a legitimam a proceder às correcções à matéria tributável aqui em causa. Na verdade, as informações oficiais, em que se integra o relatório de inspecção e respectivos anexos, fazem fé, quando devidamente fundamentadas (artigos 76º, nº 1 da LGT e 115º, nº 2 do CPPT). O que significa, desde logo, que a Fazenda Pública não tem que repetir em juízo o esforço instrutório e probatório que desenvolveu em sede de procedimento administrativo. Ou seja, por força das normas do artigo 76º, nº 1 da LGT e do artigo 115º, nº 2 do CPPT, a Fazenda Pública pode valer-se em sede judicial da factualidade que apurou no procedimento administrativo, sem ter de reproduzir essa prova em tribunal.

No entanto, isto não significa que se os factos aí afirmados forem impugnados na petição inicial (nomeadamente por desconhecimento ou por oposição), o tribunal esteja dispensado de valorar a respectiva prova (é que uma coisa é dar como provado que a administração tributária realizou os actos de inspecção descritos no probatório e recolheu as informações aí referidas e outra, distinta, é dar como provado o que aquela concluiu). O facto de os fundamentos aduzidos no relatório de inspecção tributária constarem do probatório em nada colide com a eventual prova que a Impugnante possa fazer nos autos, em sentido contrário àqueles.

Em regra, o local apropriado para se efectuar tal juízo será na subsunção dos factos ao direito em que o juiz (depois de dar como assente, na resposta à matéria de facto, que a administração tributária concluiu o que concluiu) aprecia a qualidade do respectivo discurso fundamentador e confirma se houve ou não erro sobre a suficiência dos pressupostos de facto da tributação. Quando a impugnação do facto afirmado for feita por oposição, “o juízo sobre a ocorrência do facto afirmado pelos serviços de inspecção tributária depende da prova que for feita dos factos materiais que forem alegados pelo impugnante e da sua idoneidade para abalar os juízos de facto que o relatório ou as suas conclusões exprimam. Sendo tais factos alegados na petição e relevantes para a decisão, deve o juiz formular o juízo sobre a sua existência na resposta à matéria de facto e sobre a sua idoneidade na aplicação do direito aos factos” (cf. acórdão, ainda inédito, deste TCAN de 6/6/2012, Processo 79/04.6 BEPNF).

Por outro lado, o contraditório é sempre assegurado (i) pelo dever de notificar as conclusões ao sujeito passivo (na fase administrativa) e (ii) pelo dever de notificar o teor das informações oficiais logo que juntas ao processo judicial, como decorre do artigo 115º, nº 3 do CPPT. No caso de serem omitidas essas notificações e terem influência na decisão do procedimento e na decisão judicial, estas podem ser anuladas precisamente com fundamento nessa omissão (artigo 60º da LGT e artigos 115º do CPPT e 201º do CPC, respectivamente), salvo se esta for irrelevante para o teor da decisão proferida.

Constituindo o relatório da acção de inspecção um documento autêntico (artigo 371º, nº 1 do CC), uma vez que é exarado por funcionário da administração tributária, no âmbito e exercício das respectivas funções, o mesmo tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na percepção dos seus órgãos e que apenas pode ser ilidida nos termos da lei (artigos 363º e ss. do CC e 546º e ss do CPC).

Não se vislumbra, pois, que a Recorrente possa pretender que no probatório da sentença recorrida não seja consignada a factualidade vertida no relatório da acção de inspecção e que corresponde ao declarado como encontrado na contabilidade da Impugnante e emitentes das facturas em causa e saber se essa factualidade permite ou não as ilações retiradas pela administração tributária já é questão diferente e que adiante apreciaremos.

Pelo que vimos de dizer se conclui que, ao relevar a factualidade que consta do relatório de inspecção tributária (e em que se fundamenta a liquidação impugnada) nos termos que constam da sentença recorrida, não foi violado pelo tribunal qualquer dos princípios e direitos decorrentes das normas que, de uma assentada, a Recorrente enunciou e sem que, todavia, tenha feito qualquer concretização a esse respeito.

Improcede, pois, este fundamento do recurso.

Com o devido respeito, também não tem qualquer sentido o argumento vertido na conclusão 3ª das alegações de recurso, de que em matéria dos nºs 3 e 4 do artigo19º do CIVA a Fazenda Pública não goza de presunção de legalidade dos seus actos, pois tais matérias têm relevância jurídico - penal e a atribuição dessa presunção perverteria os princípios e direitos decorrentes das citadas normas.

Por um lado, como já supra dissemos, a fundamentação legal da correcção que está na origem da liquidação impugnada não é o artigo 19º, nº 3 e 4 do CIVA (o nº 4 nunca seria, aliás, aplicado, porquanto foi introduzido pelo artigo 47º, nº 2 da Lei 55 - B/2004, de 20 de Dezembro e a liquidação é referente ao ano de 1999) mas, sim, o artigo 23º do CIRC e, por outro lado, este processo não tem natureza criminal.

2.2.2. Na conclusão 4ª das alegações de recurso, invoca a Recorrente que o disposto nos artigos 74º, 75º e 76º da LGT têm que ser interpretados em função das normas invocadas, sendo certo que o disposto nos nºs 1 e 4 do artigo 76º da LGT é matéria inconstitucional.

Embora esta questão de constitucionalidade agora colocada não tenha sido suscitada perante o tribunal recorrido, tem-se entendido que os vícios de violação de lei que derivem da inconstitucionalidade de normas aplicadas pelo acto impugnado são do conhecimento oficioso do tribunal que seja chamado a apreciar a sua legalidade com base nessas normas – assim, Jorge Lopes de S..., in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, I volume, Áreas Editora 2006, pág. 885. Assim, o facto de a questão de inconstitucionalidade não ter sido objecto de pronúncia por parte da decisão recorrida não obsta a que integre o objecto do presente recurso.

Não concretiza minimamente a Recorrente, porém, a razão do disposto no nº 1 e 4 do artigo 76º da LGT ser matéria inconstitucional. Nem nós vislumbramos que o seja.

Estabelece o nº 1 que as informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei; e no nº 4 está previsto que são abrangidas pelo nº 1 as informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado.

Desde logo, o nº 4 do artigo 76º da LGT não tem aqui qualquer aplicação, já que não está em causa nos autos o valor probatório de qualquer informação prestada pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua.

Refere António Lima Guerreiro, in LGT anotada, p. 335, em anotação ao artigo 76º, e cujo entendimento sufragamos, não fazer qualquer sentido a arguição de inconstitucionalidade destas normas, sendo que o nº 1 “ (..) cinge-se, pois, à consagração do carácter “júris tantum” da presunção de verdade das declarações e elementos do contribuinte, que somente as informações oficiais fundamentadas de acordo com critérios objectivos, têm aptidão para contrariar, sem que tenha, pois, sido introduzido nada de substancialmente novo na disciplina da relação jurídico -tributária.”

Em todo o caso, o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre esta questão, tendo decidido não declarar a inconstitucionalidade das normas dos artigos 76º, nºs 1 e 4 da LGT (acórdão nº 84/2003, de 12/2/2003, no Processo nº 531/99) aduzindo, para o que aqui importa, a seguinte argumentação: “ (…) A questão de constitucionalidade respeitante às normas da alínea 23) – no segmento destacado - do artigo 2º, da Lei n.º 41/98 e dos n.ºs 1 e 4, do artigo 76º, da LGT, tem igualmente como pressuposto o entendimento de que a matéria que elas versam – a força probatória das informações da inspecção tributária – cai na reserva relativa da Assembleia da República, nos termos do artigo 165º, n.º 1, alínea i), combinado com o artigo 103º, n.º 2, da Constituição, como atinente às “garantias dos contribuintes”.

Mas não se aceita um tal pressuposto.

Com efeito, regras sobre as provas admissíveis e o valor delas e, nomeadamente, sobre o valor probatório de informações oficiais, com as que estão em causa, respeitam à “instrução” do procedimento ou do processo tributário (assim, justamente, as tratando, e bem, a LGT, ao inseri-las, como não podia deixa de ser, no seu correspondente título e capítulo (Capitulo III do Título III)). Sempre seria, pois, excessivo incluí-las naquela reserva (ainda que se queira, possa ou deva mesmo ver nessas regras um qualquer efeito ou dimensão garantística, designadamente por poderem implicar com a distribuição do ónus da prova).

De todo o modo, tendo em conta o que supra se disse sobre a “suficiência” das autorizações legislativas, não se deixará de dizer que a remissão que na alínea 23) se faz para o “Código de Procedimento Administrativo” não é despicienda para apontar e definir o “sentido” geral da autorização nela contida.

O que fica exposto é bastante para concluir que a alínea 23), do artigo 2º, da Lei n.º 41/98 e os n.ºs 1 e 4, do artigo 76º, da LGT, não violam o disposto no artigo 165º, n.º 1, alínea i), combinado com o artigo 103º, n.º 2, da CRP.

Não deixará, no entanto, de se acrescentar o seguinte:

Em primeiro lugar, não faz sentido a afirmação – que visa sublinhar o alcance, em certo aspecto, da norma da LGT agora em apreço – de que “ela estende a atribuição da força probatória”, que reconhece às informações da fiscalização, e que antes estava só prevista para os “processos judiciais” a “todo o procedimento tributário”, tal como definido no artigo 54º da LGT (art.º 26º do requerimento inicial).

Na verdade, muito embora, antes, se tratasse da força probatória das “informações oficiais” tão só a propósito da impugnação judicial (artigo 134º, n.º 2, do CPT), claro é que a Administração também delas se podia servir e se servia – naturalmente com a mesma força probatória, e, sendo o caso, com prejuízo das indicações fornecidas pelos contribuintes – nas fases não contenciosas do procedimento tributário, fosse a fase da liquidação ou da correcção desta, fosse a reclamação graciosa (quanto a esta última, cfr., de resto, artigo 98º, n.º 2, do CPT).

Em suma, pois, a norma em apreço apenas “formaliza” e “codifica”, quanto a esse aspecto, um princípio e uma situação anteriores.

Em segundo lugar, não é, no mínimo, fácil encontrar suporte para a afirmação do requerimento inicial (artigo 28º) de que, com a norma em análise, se “deixa de consagrar sem limites a regra da presunção de veracidade das declarações dos contribuintes (...) como era o caso do regime constante do Código de Processo Tributário”, com o que – e é também um pressuposto e um ponto central na argumentação do requerente, para acentuar o carácter inovatório do regime em questão – no âmbito de tal norma se “promove uma verdadeira inversão do ónus da prova, que passa assim [nas] circunstâncias precisas [nela previstas, de informações oficiais fundamentadas em critérios objectivos] a pertencer ao contribuinte”, ao contrário do que antes sucedia.

Na verdade, no quadro legal que imediatamente antecedeu a LGT, reconheciam-se as declarações dos contribuintes como base do apuramento da matéria tributável, desde que apresentadas nos termos da lei e fornecidos por aqueles os elementos necessários à verificação da sua situação tributária (artigo 76º, n.º 2, do CPT), e estabelecia-se uma presunção de veracidade dos dados da contabilidade ou escrita dos sujeitos passíveis do imposto, e dos apuramentos dela decorrentes, quando a mesma “se mostre organizada segundo a lei comercial e fiscal” e não se verifiquem “erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte” (artigo 78º do CPT). Por outro lado, e a um tempo, dispunha-se que “as informações oficiais só têm força probatória quando devidamente fundamentadas” (artigo 134º, nº 2 do CPT).

Àquela primeira vertente do regime do CPT corresponde agora o artigo 75º da LGT, o qual, nos seus n.ºs 1 e 2, estabelece uma presunção de veracidade das declarações e escrita do contribuinte, em termos, não só substantivamente, mas até literalmente, similares aos do CPT (abstraindo, neste momento, do disposto na alínea c), do n.º 2, que introduz uma hipótese ou situação nova não importando à comparação e que, aliás, há-de ainda ser analisada em separado). À segunda dessas vertentes corresponde, por sua vez, o artigo 76º, nº 1 da LGT, aqui em análise.

Ora não se vê que o confronto dos preceitos de um e de outro diploma ofereça dois regimes diversos, e inversos um do outro, quanto à distribuição do ónus da prova entre contribuinte e administração, emergente do funcionamento combinado dos dois pares de preceitos.

De resto, nem sequer as normas sobre o valor probatório das declarações dos contribuintes, por um lado, e das informações oficiais, por outro, têm de operar sempre e necessariamente em contraposição (e implicando, portanto, com a distribuição do ónus da prova) pois pode cada um desses elementos de prova ser útil ou relevante, num dado caso concreto, para factos diferentes ou para aspectos diferentes da situação fáctico - tributária geral. (…)”.

Na esteira deste entendimento, improcede, pois, a arguida inconstitucionalidade.

Quanto à aplicação das normas do artigo 74º e 75º da LGT (quanto ao artigo 76º da LGT já nos pronunciamos no ponto anterior) à situação dos autos, afigura-se-nos que nenhuma censura merece a sentença recorrida.

De acordo com o artigo 74º, nº 1 da LGT, ó ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem o invocar.

E do artigo 75º, nº 1 da LGT resulta que as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, se presumem verdadeiras.

Existe, portanto, uma presunção legal de que as declarações apresentadas pelos contribuintes à administração tributária são verdadeiras, sendo com estas declarações que, em regra, se instaura o procedimento de liquidação (artigo 59º do CPPT).

Essa presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respectivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75º, nº 2 da LGT).

Assim, a circunstância de as operações se encontrarem documentadas em factura e recibo e terem sido devidamente inscritas na contabilidade faz presumir a existência da operação; mas tal presunção deixa de se verificar, nomeadamente, quando a contabilidade ou escrita do contribuinte revelarem indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo Portanto, se a administração tributária recolher indícios fundados de que os documentos de suporte, apesar de formalmente correctos, não reflectem uma verdadeira transacção (seja relativamente aos sujeitos, objecto, datas, valores), cessa a presunção de veracidade das operações constantes de tais documentos.

É jurisprudência pacífica, reiterada e uniforme que, quando a liquidação adicional de IRC tem por fundamento o não reconhecimento dos custos declarados pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais legitimadores da sua actuação, ou seja, assentando o juízo da administração tributária na consideração de que as operações a que se referem as facturas em causa não correspondem à realidade, terá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas foram simuladas. Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus de provar que as operações económicas que estiveram subjacentes aos custos declarados e reflectidos na matéria tributável [cf. artigo 23º do CIRC] se realizaram efectivamente - neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STA, de 24/4/2002, Recurso nº 102/02; de 23/10/2002, Recurso nº 1152 /02; de 9/10/2002, Recurso nº 871/02; de 20/11/2002, Recurso nº 1483/02; de 30/4/2003, Recurso nº 241/03; de 14/1/2004, Recurso nº 1480/03 e do TCAN, por todos, acórdão de 24/1/2008, Processo 01834/04.

Importa, no entanto, referir que a administração tributária não tem de fazer a prova directa da simulação, i.e., a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil para que se verifique a simulação (cf. artigo 240º do Código Civil), sendo suficiente a prova indirecta a factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova ” (cf. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Coimbra, 1972, p. 154).

Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência - citado por José Luís Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2 edição, p. 311.

Ora, a Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, depois de ressalvar a presunção de verdade de que gozava a declaração da Recorrente e os dados da sua escrita e de analisar os fundamentos da liquidação impugnada, concluiu queos indícios recolhidos pela Administração Tributária para fundamentar a rectificação das declaração de IRC da Impugnante são sérios e consistentes, apontando no sentido de que as entidades emitentes não exerceram a actividade ali mencionada, e que, como tal, não foram prestados os serviços ali discriminados à Impugnante, motivo pelo qual, não pode efectivamente ser aceite a dedutibilidade de tais custos. Na verdade, se alguns desses indícios individualmente considerados poderiam ser julgados irrelevantes, é da conjugação de todo os factos indiciários apurados, apreciados segundo as máximas da experiência, que se pode concluir que as operações tituladas nas facturas em causa são simuladas. Assim, se julgando que a Administração Tributária reuniu os pressupostos legais necessários e suficientes para proceder à desconsideração dos custos titulados pelas identificadas facturas.”.

A Recorrente, para além de pretender, sem sucesso, que esses indicadores fossem desconsiderados pelo tribunal porque sobre os mesmos não foi produzida qualquer outra prova em juízo, invoca também que os indícios que sustentam a decisão de liquidar o imposto não são suficientemente consistentes e credíveis para suportar essa decisão (conclusão 7ª)

2.2.3. A questão que então se coloca é a de saber se o tribunal recorrido errou ao concluir que a administração tributária fez prova, como lhe competia, da existência de indícios sérios e consistentes, susceptíveis de permitir a conclusão de que as facturas contabilizadas pela Impugnante não correspondem a reais operações, para que possa corrigir a matéria tributável com a desconsideração desses custos.

No caso em apreço, a administração tributária considerou que as facturas contabilizadas pela Impugnante/Recorrente não correspondem a efectivas prestações de serviços, com base em diversos indícios recolhidos junto da Impugnante e dos emitentes das facturas e transcritos na decisão de facto [cf. alínea B) do probatório] e que vêm resumidos a fls. 10 do RIT, nos seguintes termos:

“ Incumprimento das obrigações fiscais por parte de quase todos os emitentes;

- Deficiente discriminação dos serviços prestados;

- Em todas as facturas, a letra que surge manuscrita é idêntica, parece mesmo corresponder à que consta das facturas nº 137, 139, 144 e 147, atribuídas a A...;

- A empresa não possui meios de pagamento que comprovem sustentavelmente as referidas operações;

- Foram facultados cheques emitidos pelas Construções ..., Lda. que representam tão só o pagamento de 50% do valor do IVA repercutido nas facturas, o que faz supor tratar-se da comissão auferida pelo agente que terá colocado as facturas na empresa;

- Os referidos cheques, supostamente representativos do pagamento, nomeadamente dos 50% do valor do IVA, surgem emitidos à ordem de J..., indivíduo que terá colocado as facturas na empresa utilizadora.”

Por outro lado, além destes factos indiciários, todos os emitentes afirmaram não terem prestado os serviços a que aludem as facturas nem terem as mesmas sido emitidas por eles.

Acresce ainda que foi admitido pelo J... que a maior parte das facturas foram por si processadas (salvo as facturas nº 156 de D... e nº 051 de Ab...) e colocadas na Impugnante, afirmando que “todas elas não correspondem às prestações de serviços que constam dos respectivos discriminativos” e adiantou que “a troco da entrega dessas facturas recebia tão só das Construções L... Marques, Lda. um valor correspondente a cerca de 50% do IVA facturado. Desse valor que recebia ficava com uma parte e o restante distribuía pelas pessoas em nome das quais passava as facturas, por serem do seu conhecimento pessoal com excepção do R..., que não conhece”.

Analisada esta factualidade indiciária à luz das regras da experiência comum e da lógica, consideramos que se impõe a conclusão de que as facturas não correspondem a serviços efectivamente prestados pelos respectivos emitentes à Impugnante. Na verdade, concatenando os elementos recolhidos ao nível dos emitentes das facturas com os apurados na esfera da Impugnante, e analisando-os à luz das regras da experiência comum, afigura-se-nos que os mesmos indiciam fortemente que as operações tituladas pelas facturas aqui em causa não são verdadeiras.

Ao que acresce, a indiciar no mesmo sentido, a completa ausência de documentos escritos (v. g. contrato de empreitada, orçamentos de obras, autos de medição, relações de eventuais pagamentos) que, ainda vagamente que seja, se refiram as serviços alegadamente prestados.

Deste modo, a sentença recorrida não merece qualquer censura ao concluir pela existência de indícios sérios e consistentes de que as facturas em causa não correspondem a reais operações.

2.2.4. E perante este quadro indiciário que suporta a conclusão da administração tributária de que as facturas em causa não se reportam a serviços efectivos (cumprindo, assim, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia) impunha-se à Impugnante, ora Recorrente, fazer a prova de que adquiriu os serviços e que os mesmos lhe foram prestados pelos emitentes das facturas e, assim, comprovar as operações que estiveram subjacentes à contabilização dos custos, não lhe bastando criar dúvida a esse propósito (o artigo 100º do CPPT não tem aqui aplicação, pois não está em causa a prova sobre a existência e quantificação do facto tributário que competiria à administração tributária mas antes a prova dos factos em que o contribuinte funda o seu direito de contabilizar os custos).

No entanto, da matéria de facto assente no probatório resulta que essa prova não foi feita pela Impugnante.

E, nesta parte, a Recorrente limitou-se a defender genericamente que da prova produzida resultou provada a materialidade das operações constantes nas facturas e que ficou provado que a Recorrente não dispunha de meios para efectuar uma obra de tal dimensão sem recurso ao trabalho de sub - empreiteiros e que a obra foi adjudicada ao J... que arranjava trabalhadores para nela trabalharem e que os pagamentos, em regra, eram feitos em dinheiro.

Ficou, de facto, provado nos autos que para a realização a obra em causa (sita em Ermesinde), a Impugnante adjudicou as diferentes artes a vários empreiteiros, designadamente a obra de gesso a J..., que comercialmente utilizava a denominação de “S... Gessos” e a obra de “electricidade” a V... [cf. alínea H) do probatório].

Mas não ficou, todavia, provado que os emitentes das facturas tivessem sido subcontratados pela Impugnante ou mesmo através do subempreiteiro J..., nem que os serviços constantes das facturas cuja autenticidade é questionada pela administração tributária foram efectivamente prestados.

É que, ao invés do que pretende a Recorrente, não está aqui em causa saber se ela realizou a obra em questão e se teve ou não de recorrer a mão - de - obra externa para a realização da mesma (o que nem vem questionado pela administração tributária), mas sim saber se as concretas operações a que aludem as facturas aqui em causa foram as que permitiram a realização de tal obra.

E se, por hipótese, subjacentes às facturas em causa estão reais transacções (designadamente negócios realizados com outrem, que não com os emitentes das facturas), isso teria a Recorrente que demonstrar, já que é sobre ela, face às regras que atrás deixámos enunciadas, que recai o ónus da prova de que suportou os custos titulados pelas facturas que contabilizou e que estas titulam e documentam efectivas aquisições de bens, o que, no caso, não fez.

Como foi entendido pela Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, a prova documental e testemunhal não permitem que se conclua pela realidade das operações a que se reportam as facturas em causa, tendo os depoimentos das testemunhas sido vagos e imprecisos e mesmo inconsistentes “não resultando daqueles, de forma clara e inequívoca, que os cinco emitentes identificados pela Inspecção Tributária, hajam efectivamente prestado serviços à Impugnante na obra em causa”.

E este julgamento efectuado em 1ª instância quanto à matéria de facto não foi posto em causa, pelo que o mesmo terá que se manter. Na verdade, estando em causa uma parte da decisão sobre a matéria de facto, impunha-se que a Recorrente, se dela discordasse e pretendendo impugná-la, além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, tivesse indicado os meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa daquela que consta da sentença, em observância do disposto no artigo 690º - A, nº 1 e 2 do CPC, na redacção aplicável.

No caso, tal ónus não foi minimamente cumprido pela Recorrente, que se limitou a dizer que os factos alegados na sua petição estão suficientemente provados, quer por força dos depoimentos das testemunhas inquiridas, coerentes, objectivos e isentos, quer pela experiência comum, pelo que a apreciação do mérito do recurso terá de ser efectuada com o probatório fixado pelo Tribunal recorrido.

Sintetizando: atendendo à matéria de facto provada e não provada, é de concluir que a Impugnante não logrou demonstrar que as facturas em causa titulam serviços realmente prestados, sendo, assim, legítima a actuação da administração tributária ao desconsiderar os custos declarados e que estavam suportados nessas facturas e, consequentemente, ao corrigir o lucro tributável declarado para os anos em causa, emitindo a consequente liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios.

Não tendo feito tal prova, a impugnação não poderia, pois, ter sido julgada procedente e, assim, bem andou a sentença recorrida ao, por via disso, decidir manter a liquidação impugnada.

Improcedem, pois, as conclusões 8ª a 12ª das alegações de recurso e, com elas, totalmente o presente recurso.

3.Decisão

Assim, pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.


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Ofício de fls.692: Após trânsito, remeta cópia certificada do presente acórdão.

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Porto, 26 de Fevereiro de 2015

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Ana Patrocínio

Ass. Ana Paula Santos