Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00168/07.7BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/20/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE INTIMAÇÃO PARA ADOPÇÃO OU ABSTENÇÃO DE UMA CONDUTA; MOTORISTA.
Sumário:I- Não obstante a Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro e a actual LGTFP deixarem de definir a função de motorista como uma carreira, decorre do artigo 120º/3/alínea a) da LGTFP, assim como do Quadro de Pessoal da União de Freguesias, que existe o posto de trabalho de motorista.
II- A aqui Recorrente põe em causa os critérios de decisão, questionando a existência, ou não, do periculum in mora, a constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente/Recorrido visa assegurar no processo principal.
III- Ora, independentemente de manter o mesmo vencimento, o aqui Recorrido foi prejudicado pois sempre utilizou uma das viaturas da Junta, que lhe era confiada, estacionando-a no estaleiro em Valadares, transportando-se a si e aos restantes colegas de trabalho, quer fosse em Gulpilhares, quer em Valadares, à hora do almoço e depois, cerca das 13 horas, para o início dos trabalhos da tarde e novamente ao fim do dia;
III.1- de acordo com a nova ordem de serviço, enquanto os restantes colegas trabalhadores continuaram a ser transportados em viaturas da Junta, gratuitamente, de casa para os locais de trabalho pré-indicados, à hora do almoço para suas casas, ao início da tarde de suas casas para os mesmos locais de trabalho e ao final da tarde de regresso às suas casas, o Requerente passou a ter de deslocar-se em viatura própria, suportando todos os custos daí inerentes;
III.2 -a isto acrescem os notórios danos não patrimoniais, como a pressão psicológica e o desgaste emocional, aventados nas contra-alegações.
IV- No Mapa de Pessoal da União da Junta de Freguesias de Valadares e Gulpilhares, nos anos de 2012 e 2013 e na folha de férias de 2012, consta o nome do Requerente seguido da indicação de motorista;
IV.1 -a partir de finais de março de 2016 foi ordenado ao aqui Recorrido que executasse diferentes tarefas rudimentares, sozinho, como lenhador, lavador de campas de cemitério de Gulpilhares, e de passeios, lixador de vários varões do campo de futebol; e foi-lhe determinado que permanecesse isolado e continuadamente a partir de outubro de 2016, no Complexo Desportivo de Gulpilhares;
IV.2- tal quadro de facto corresponde a uma autêntica “desqualificação profissional”, humilhante, degradante e lesiva dos seus direitos;
IV.3- acresce que a alteração da ordem interna em causa não resultou de qualquer reorganização do órgão, serviço ou sector dos transportes.
V- A carreira de assistente operacional implica o desempenho das seguintes funções: as de natureza executiva, de caráter manual ou mecânico, execução de tarefas de apoio elementares, a responsabilidade pelos equipamentos sob sua guarda e pela sua correcta utilização, procedendo, ainda, quando necessário à manutenção e à reparação dos veículos da Junta;
V.1- além de ser condutor, eram precisamente essas funções (entre outras) que o Requerente executava.
VI- A situação criada pela Junta de Freguesia é passível de lesão dos direitos de funcionário e de valores humanos, designadamente o do respeito e dignidade da pessoa e, consequentemente, o da estabilidade emocional, o do direito à defesa da pessoa, da personalidade, carácter e imagem;
VI.1- deste modo, e contrariamente ao alegado, estão verificados os requisitos da providência cautelar sub judice.
Recorrente:União das Freguesias de Gulpilhares e Valadares
Recorrido 1:MMFL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Intimação Judicial para Prática Acto Legalmente Devido (art. 112.º RJUE) - Rec. Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não foi emitido parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO

MMFL intentou providência cautelar de intimação para adopção ou abstenção de uma conduta contra a União das Freguesias de Gulpilhares e Valadares, ambos melhor identificados nos autos, pedindo que:
1. retome de imediato a plenitude e exclusividade do exercício das suas funções inerentes à categoria profissional de -motorista profissional de 1ª categoria-, situação em que se encontrava em 31 de Março de 2016, sendo-lhe comunicado previamente, pela aqui requerida, as ações e deslocações a realizar;
2. se proceda à intimação da aqui Requerida, no sentido de se abster de toda e qualquer conduta que impeça, ou mesmo dificulte, a reocupação, por parte do Requerente do seu posto de trabalho, como sejam:
a) que não use impedimentos nos acessos, ao local de trabalho, nem aos instrumentos e meios de trabalho, imprescindíveis à boa prestação laboral do requerente;
b) que ponha à sua inteira disposição a viatura FORD TRANSIT, ou outra viatura de transporte de passageiros e/ou mercadorias, propriedade da requerida, bem como as respetivas chaves, imprescindível ao bom desempenho laboral do requerente;
c) que se abstenha de comportamentos determinantes e causadores de situações de inatividade, marginalização e/ou isolamento do requerente em quaisquer locais, públicos ou particulares, de que a requerida seja, ou não, proprietária ou possuidora.
Requereu ainda a imposição de sanção pecuniária compulsória à Requerida, com valor diário de € 45,00, acrescidos de juros calculados à taxa legal, por cada dia de atraso que se possa vir a verificar na execução e cumprimento das providências cautelares decretadas, nomeadamente, a retoma pelo Requerente, da plenitude e exclusividade das funções inerentes à sua categoria profissional de “motorista profissional de 1.ª categoria”, bem como a disponibilização da viatura FORD TRANSIT, ou outra, propriedade da Requerida, e as respectivas chaves, imprescindível ao bom desempenho laboral daquele.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a providência e condenada a Requerida a:
1.recolocar o Requerente no seu posto de trabalho de motorista, podendo atribuir-lhe tarefas afins ou complementares.

2.abster-se de toda e qualquer conduta que impeça, ou mesmo dificulte, a reocupação pelo Requerente do seu posto de trabalho de motorista.

3.abster-se de comportamentos determinantes e causadores de situações de inatividade, marginalização e/ou isolamento do Requerente.

Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Requerida formulou as seguintes conclusões:

A) A sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que deferiu o pedido de decretamento da providencia cautelar requerida, de:

- Recolocar o Requerente no seu posto de trabalho de motorista, podendo atribuir-lhe tarefas afins ou complementares.

- Abster-se de toda e qualquer conduta que impeça ou mesmo dificulte, a reocupação pelo Requerente do seu posto de trabalho de motorista.

- Abster-se de comportamentos determinantes e causadores de situações de inatividade, marginalização e/ou isolamento do Requerente.

Padece de um erro de julgamento e de errada valoração da prova que importa suprir, substituindo-se a decisão a quo por outra que indeferia a providência cautelar.

B) Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo, condena a Recorrente em objeto do pedido já decidido (previamente), fazendo incorreta aplicação dos pressupostos das providências cautelares, violação de lei e incorreta apreciação dos factos.

C) O Tribunal a quo decidiu condenar a Recorrente: em Recolocar o Requerente no seu posto de trabalho de motorista.

D) Porém, por despacho de 27.01.2017 o Tribunal a quo decidiu o seguinte:

“ MMFL, intenta Providência Cautelar de Intimação para Adopção ou Abstenção de uma conduta, contra a União de Freguesias de Gulpilhares e Valadares, requerendo o decretamento provisório.

Cumpre apreciar.

O artigo 131, nº 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos refere que a providência pode ser decretada provisoriamente quando se reconheça uma situação de especial urgência ou uma situação de facto consumado.

Começando por este último requisito, compete dizer que não se vislumbra ocorrer facto consumado, uma vez que não será pelo não decretamento provisório que a situação do requerente se eterniza.

No que concerne à especial urgência, cumpre salientar que o Requerente pede que o decretamento provisório o faça retomar as funções inerentes à categoria profissional de motorista de 1ª categoria, situação que se encontrava em 31/03/2016. Ora, lida a ordem de Serviço Interna nº 2/2016, na mesma refere-se que o Requerente é assistente operacional, não sendo possível aferir com certeza e segurança necessárias, se tal correspondia ao desempenho da função de motorista. Para além disso, o desempenho imediato da função de motorista, não se pode considerar um ato de especial urgência, pois que o Requerente pode desempenhar outras funções com dignidade, sem que seja propriamente a de motorista.

Assim, não se vislumbra ocorrer lesão irreparável que careça de tutela judicial ao nível do decretamento provisório.

Face ao exposto, indefere-se o pedido de decretamento provisório da providência.

Custas do incidente pelo Requerente.

E) A Recorrente aquando da citação da providência cautelar teve conhecimento do despacho supra identificado (27.01.2017).

F) E, o Requerente não interpôs recurso de tal decisão de indeferimento cautelar do pedido mencionado no ponto 1 d o pedido inicial.

G) Nesse pressuposto, e salvo o devido respeito, tal pedido não deveria ser apreciado em sede de decisão da providência cautelar proferida, uma vez que tal situação já havia sido decidida.

H) O despacho, supra referido, pôs assim termo ao pedido de retoma das funções inerentes à categoria profissional de motorista (… retome de imediato a plenitude e exclusividade do exercício das suas funções inerentes à categoria profissional de “motorista profissional de 1ª categoria”, situação em que se encontrava até 31 de março de 2016, sendo-lhe comunicado previamente, pela requerida, as ações e deslocações a realizar.)

I) Tendo o identificado despacho transitado em julgado.

J) Aquando da prolação da sentença encontrava-se esgotado o poder jurisdicional do Senhor Juiz sobre a matéria aí versada. Ou seja, não era lícito ao julgador, no processo, dar o dito por não dito.

K) O princípio da imodificabilidade da decisão, ou da sua irrevogabilidade, consagrado no art.º 613.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil PC, implica o esgotamento do poder jurisdicional sobre a questão apreciada, obstando a que, fora das condições expressamente previstas na lei (n.º 2 do artº 613.º), o juiz a altere.

L) Havendo caso julgado, o seu cumprimento é obrigatório no processo onde foi proferido (art.º 620º, nº 1 do CPC), obstando a que o juiz possa no mesmo processo alterar a decisão proferida, mesmo que posteriormente venha a reconhecer que a questão possa ter sido mal julgada.

M) “ Bem” ou “mal” decidida, transitou em julgado a questão da retoma do exercício das funções de motorista, inerentes à categoria profissional de motorista,

N) Assim, o julgador a quo, ao decidir em sentido diferente daquele em que anteriormente já tinha decidido, infringiu a autoridade do caso julgado, por desrespeitados os seus efeitos processuais, ocorrendo a situação de julgados contraditórios, com a consequência de valer a decisão que primeiramente tenha sido proferida (artº 625º, nºs 1 e 2, do CPC).

O) Neste pressuposto, a sentença proferida é nula por ofensa ao caso julgado.

P) Devendo a decisão proferida em primeiro lugar prevalecer, como se requer.

Q) A decisão recorrida desde logo padece de um erro de julgamento ao considerar verificado os requisitos previstos no artigo 120º CPTA.

R) Prevê agora o nº 1 do artigo 120º CPTA que,

“1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”.

S) Deixou, portanto, de existir o critério da evidência que permitia decretar, só por si, a providência requerida.

T) Há que averiguar agora, desde logo, a existência do periculum in mora, a constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.

U) No que concerne ao periculum in mora, o requerente em sede cautelar deve alegar e demonstrar de modo razoavelmente plausível, quer em termos de facto quer de direito, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.

V) Recaindo pois sobre o requerente o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da existência do direito invocado.

W) Ao referido acresce ainda a eventual necessidade de ser feita uma ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).

X) Quanto à alegada situação do facto consumado, tal como e bem decidiu o tribunal a quo, por despacho de 27.01.2017, não se vislumbra ocorrer facto consumado, uma vez que não será pelo não decretamento provisório que a situação do Requerente se eterniza.

Y) O desemprenho imediato das funções de motorista não se pode considerar um ato de especial urgência.

Z) O Requerente continuou a auferir o seu vencimento.

AA) Não se vislumbrando, assim, que exista um prejuízo de “difícil reparação” ou que possa determinar a “constituição de facto consumado” de consequências irreparáveis (Artº 120º nº 1 CPTA), tanto mais que a situação é reversível, se for caso disso.

BB) Relativamente à questão da evidência do direito do Requerente, das funções e da categoria, não se alcança procedência dos factos dados como provados e argumentos esgrimidos na douta sentença.

CC) A Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro, consagrou a existência de carreiras gerais (entre elas as de Assistente Operacional) e especiais, integrando diversas categorias que as exigências funcionais vieram impor.

DD) Com a entrada em vigor do referido diploma legal foram extintas as carreiras previstas no DL 412-A/98, tendo-se procedido à transição dos trabalhadores (nomeados e contratados) para as novas carreiras.

EE) O artigo 100º do citado diploma determinou que transitariam para a categoria de assistente operacional da carreira geral de assistente operacional, os trabalhadores que se encontrassem integrados nas carreiras de pessoal auxiliar de regime geral, tal como a do caso do requerente.

FF) No âmbito da transição de carreiras, a categoria profissional anteriormente designada por motorista, transitada para a nova categoria de assistente operacional, a partir de 2009- cfr. doc 1 que se junta e se á por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.

GG) Passando, assim, o Requerente a estar enquadrado na categoria de assistente operacional, por transição para a carreira de Assistente Operacional.

HH) Ao assistente operacional compete exercer funções de natureza executiva, de caráter manual ou mecânico, enquadradas em diretivas gerais bem definidas e com graus de complexidade varáveis; Execução de tarefas de apoio elementares, indispensáveis ao funcionamento dos órgãos e serviços, podendo comportar esforço físico; Responsabilidade pelos equipamentos sob sua guarda e pela sua correta utilização, procedendo, quando necessário, à manutenção e reparação dos mesmos.

II) A referida lei, foi posteriormente revogada pela atual Lei 35/2014, de 20 de junho, que no âmbito do conteúdo funcional encontra previsão no artigo 80º da LGTFP.

JJ) O artigo 81º da referida LTFP estipula o exercício de funções afins.

KK) Resulta das referidas disposições legais que sendo o conteúdo funcional descrito de forma genérica não pode concluir-se que a caraterização constante da LTFP esgote o elenco de tarefas que incumbem ao trabalhador ali integrados.

LL) Acresce que o conteúdo funcional tal como nele vem descrito no mencionado anexo não obsta a que deva ser adaptado às diversas áreas funcionais que integram a carreira.

MM) Assim, o empregador público poderá vincular o trabalhador a efetuar as funções que estejam descritas no conteúdo funcional da carreira correspondente ao posto de trabalho, bem como todas aquelas que sejam afins ou funcionalmente ligadas à caraterização do mesmo, desde que não impliquem uma desvalorização profissional.

NN) Nesse pressuposto, atendendo à categoria profissional de Assistente Operacional, todas as tarefas incumbidas ao trabalhador encontrando-se devidamente enquadradas no conteúdo funcional.

OO) As tarefas que o Requerente invoca encontram-se devidamente enquadráveis na categoria profissional de um Assistente Operacional.

PP) A recorrente não violou qualquer preceito legal no âmbito de atribuição de funções ao Requerente.

QQ) Ao Requerente sempre foi solicitado a execução de tarefas com dignidade.

RR) Nunca a Recorrente pretendeu ofender qualquer direito fundamental do Requerente.

SS) Limitando-se a atribuir tarefas no âmbito da gestão de recursos humanos e logísticos necessários ao interesse publico na gestão do poder autárquico.

TT) Assim, e salvo melhor opinião, entende a Recorrente não se encontrarem reunidos os requisitos exigíveis para que este instrumento cautelar pudesse ser considerado procedente, designadamente, por não ser palmar a evidência da procedência da ação, ao invés, é por demais evidente a falta de fundamento da pretensão formulada.

UU) Pelo que o Recorrente impugna a decisão recorrida na parte em que decide ser manifesta a procedência da ação principal.

VV) Ora, para que esta providência fosse decretada, teria, além de demonstrar a urgência no seu decretamento em relação à causa principal, que demonstrar que a procedência desta era manifesta, o que é diferente de demonstrar que existe essa legalidade.

WW) E não há dúvida de que a procedência da questão suscitada pelo Requerente não é manifesta.

XX) Trata-se, pois, de uma questão complexa que tem de ser decidida numa ação principal e não numa providência cautelar, caracterizada pela celeridade do processo e precariedade e simplificação das decisões proferidas no mesmo.

YY) Quanto aos pressupostos do periculum in mora, o requerente não demonstra quer em termos de facto quer de direito a probabilidade de procedência da sua pretensão principal.

ZZ) Não demonstrando sequer os prejuízos de difícil reparação.

AAA) O pedido de desempenho imediato das funções de motorista não reveste carater de urgência, nem tão pouco as circunstâncias de facto consumado.

BBB) E a fundamentação constante da decisão recorrida tratam-se de meras ilações e juízos conclusivos do julgador a quo, sem base factual dada como provada.

CCC) Em momento algum, o Requerente provou que a demora judicial lhe causaria danos irreparáveis e que tal situação fosse considerada como um facto consumado.

DDD) Tanto mais que o Requerente apesar da propositura da presente providência cautelar (antecipatória) ainda nem sequer propôs a ação principal.

EEE) Ora, tal demonstra que o Requerente ou não pretende obter uma decisão definitiva a breve prazo ou não se preocupa em evitar que a situação se prolongue.

FFF) O Requerente detinha, aquando da prolação das ordens de serviço 1/2016 e 2/2016 pela Recorrente, a categoria de assistente operacional.

GGG) A Recorrente deu instruções ao Requerente que se enquadram na sua categoria profissional e/ou afins.

HHH) Com efeito, sempre se dirá que não resulta dos autos que a atividade exercida pelo trabalhador implique uma desvalorização profissional.

III) De realçar que tal como consta do facto J, o Requerente na carta enviada à Recorrente, em 29.12.2016, declarou inequivocamente e sem margem para dúvidas que ” a partir desta data declara não mais tolerar assumir funções não correspondentes às inerentes de motorista profissional e 1ª categoria.”

JJJ) Ora, como decorre da carta enviada pelo próprio Requerente à Recorrente o mesmo colocou-se numa situação de recusa de exercer funções profissionais que não fossem a de motorista (violação do dever de obediência).

KKK) Salvo o devido respeito, a Recorrente não colocou o Requerente numa situação de inatividade, foi o próprio que decidiu não exercer funções afins.

LLL) No que concerne à ponderação de interesses, importa sublinhar o que este respeito se refere no n.º 2 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015):

“Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.

MMM) Em concreto, estamos perante o comportamento de um funcionário que se recusa a executar tarefas ordenadas pelo empregador que não sejam exclusivamente a de motorista.

NNN) A consequência da procedência da presente providência cautelar seria legitimar recusa por parte do trabalhador a ordens legítimas e legais proferidas pelo empregador.

OOO) A decisão dos conteúdos funcionais não pode, em caso algum, constituir fundamento para o não cumprimento do dever de obediência e não prejudica a atribuição aos funcionários de tarefas de complexidade e responsabilidade equiparáveis, não expressamente mencionadas.

PPP) E, não prejudica a atribuição aos funcionários de tarefas de complexidade e responsabilidade equiparáveis, não expressamente mencionadas.

QQQ) A decisão recorrida padece de violação do caso julgado, erro na apreciação dos critérios legalmente consagrados no nº 1 do artigo 120º do CPTA para o deferimento de providências cautelares, violação de lei e errada apreciação dos factos dados como provados e subsunção jurídica.

TERMOS EM QUE, com o suprimento, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente:

- Ser revogada a decisão recorrida, e substituída por outra que julgue o procedimento cautelar totalmente

Como é de JUSTIÇA.

O Requerente contra-alegou, sem conclusões, terminando assim:
Nestes termos, deve o presente recurso ser desatendido ou julgado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A) O Requerente nasceu em 30 de junho de 1956, tendo sido admitido como trabalhador da Freguesia de Valadares, em 01/07/1985, como cantoneiro de 2.ª, reclassificado como motorista de pesados de 2.ª, passando posteriormente a designar-se como motorista de pesados. (fls. 85 e 122 autos)
B) No Mapa de Pessoal da Freguesia de Valadares do ano de 2012 constam dois postos de trabalho de «motorista»; e na informação relativa à avaliação de desempenho do ano de 2012, surge o nome do Requerente enquadrado nos Assistentes operacionais, seguido da menção de motorista, tendo mais um trabalhador também a indicação de motorista. (fls. 157 e 128 autos)
C) No Mapa de Pessoal da Freguesia de Valadares do ano de 2013 consta o nome do Requerente seguido da indicação de «motorista» (e funções de coordenação do pessoal exterior), tendo mais um trabalhador também a indicação de motorista. (fls. 119 e 121 autos)
D) Na folha de férias do ano de 2013, da Freguesia de Valadares, surge o nome do Requerente seguido da indicação de «motorista», tendo mais um trabalhador também a indicação de motorista. (fls. 126 autos)
E) No Quadro de Pessoal da União de Freguesias de Gulpilhares e Valadares do ano de 2016, encontram-se previstos como Cargos/Carreiras/Categorias, dois elementos no quadro referente a Valadares e definido como: «Transportes» / Assistente operacional. (fls. 53 e 54 autos)
F) O Requerente é detentor de carta de condução, habilitado para as categorias B1, B, C1, C, BE, C1E, CE, D1E e DE, desde 28/04/1983, válida até 29/06/2021 (fls. 87 autos)
G) Os recibos de vencimento do Requerente de: fevereiro de 2002 contém a indicação de «categoria motorista pes. I»; o de novembro de 2008 e o de janeiro de 2010, contêm a menção de «motorista»; e os de novembro de 2016, janeiro, fevereiro e março de 2017, contêm a designação de «assistente operacional/encarregado operacional». (fls. 92, 15, 98, 92, 88, 89, 90 autos, respetivamente)
H) O Requerente foi notificado em 10 de fevereiro de 2016, da Ordem de Serviço Interna n.º 1/2016, com o seguinte teor: (fls. 50 e 51 autos)
Gestão de Pessoal
Informa-se todos os funcionários, com funções operacionais (externos), que a partir do dia 11 de fevereiro de 2016, devem obedecer às seguintes determinações:
1. Período da manhã:
a) Inicio da atividade às 08h00, no estaleiro;
b) Os funcionários cessam a atividade para o período de almoço às 12h00.
2. Período da tarde:
a) Reinício da atividade às 13h30 no local onde estão a prestar serviço;
b) Os funcionários abandonam o local de serviço às 16h20 e terminam a atividade às 16h30, no estaleiro.
3. Utilização da Viatura
a) O responsável pela condução da viatura, efetua o transporte dos funcionários para os locais de serviço e a viatura permanece no local onde estiver o maior número de funcionários;
b) O responsável pela distribuição de funcionários, deverá comunicar diariamente, a distribuição das tarefas inerentes para o dia seguinte, informação via telemóvel para as seguintes responsáveis:
D. MFL (…) ou D. V... (…)
Nota:
A não observância destas determinações serão alvo de procedimento ao abrigo do estatuto disciplinar (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).
I)
O Requerente foi notificado em 29 de março de 2016, da Ordem de Serviço Interna n.º 2/2016, com o seguinte teor: (fls. 16 e 52 autos)
Gestão de Pessoal
Informa-se o assistente operacional, MFL, que a partir do dia 31 de março 2016 (inclusive), deve obedecer à seguinte determinação:
1. Período da manhã:
a) Início da atividade às 08h00, Garagem/Armazém (Gulpilhares - Rua das Coletividades);
b) O funcionário cessa a atividade para o período de almoço às 12h00.
2. Período da tarde:
c) Reinício da atividade às 13h30 no local Garagem/Armazém (Gulpilhares - Rua das Coletividades);
d) O funcionário cessa o serviço às 16h30 no local Garagem/Armazém (Gulpilhares - Rua das Coletividades).
3. O funcionário tem como superior hierárquico a Sr.ª D. MFL.
J)
O Requerente remeteu via correio postal registado no dia 29/12/2016, uma carta à União de Freguesias de Gulpilhares e Valadares, com o seguinte teor: (fls. 21 a 23 autos)
Exmo. Senhor Presidente,
MMFL (…), vem expor e requerer, COM EFEITOS, IMEDIATOS, o seguinte:
1. O requerente é funcionário da Junta de Freguesia de Valadares há mais de 30 (trinta) anos, exercendo, desde sempre as funções de motorista profissional de 1ª categoria, a qual foi por obtida e por outros reconhecida há dezenas de anos.
2. Acontece que, lamentável e inexplicavelmente, está atualmente a desempenhar funções que causam o esvaziamento do núcleo essencial da categoria por si detida, ao ponto de ser compelido, por ordem do senhor presidente da União das Juntas, a exercer funções como lavador de passeios e paredes; de madeireiro, serrador de árvores bem como de lixador dos gradeamentos metálicos delimitadores do recinto das bancadas e do piso sintético do Estádio de Gulpilhares.
3. Tal situação, ordenada e imposta ao requerente pelo sobredito presidente, é atentatória e violadora de todas as garantias do trabalhador consagradas nas alíneas a), b) e e) do nº 1 do art.º 72º da LGTFP.
4. Foi ainda retirada ao requerente, além do telemóvel de serviço, a viatura da Junta de Freguesia de Valadares, que sempre conduziu e na qual se fazia transportar de sua casa para a Junta de Valadares primeiro e, posteriormente, para a Junta de Freguesia de Gulpilhares, como é por todos aceite e reconhecido.
5. O requerente tem pago, a suas expensas, todos os custos de transporte de casa para o local de trabalho, e vice-versa.
6. Os factos e circunstancialismos supra expostos demonstram um elevado grau de ilicitude dos diversos atos praticados pera atual União das Juntas de Freguesia, sobretudo na pessoa do seu presidente, acrescido de um elevado grau de culpa o que resulta na violação chocante dos princípios do respeito, da urbanidade e da probidade do trabalhador, ferindo, assim, de modo irreversível, o suporte psico-lúcido de confiança reciproca que deve existir entre trabalhador e superior hierárquico, nomeadamente, ao "desclassificar" o requerente, de forma vexatória e humilhante, desde abril de 2016, impedindo-o de exercer as suas funções de motorista profissional e, eventualmente, atribuindo-lhe outras não qualificadas.
7. O requerente tem cumprido as ordens que lhe têm sido impostas, apesar de as mesmas não se enquadrarem nas suas funções e categoria profissional, e configurarem um comportamento abusivo por parte Executivo da União das Juntas.
8. Contudo, a partir desta data o requerente declara não mais tolerar assumir funções não correspondentes às inerentes de motorista profissional de 1ª categoria.
9. Não deixará ainda de reclamar, em Tribunal, a indemnização devida por danos patrimoniais e não patrimoniais, sofridos na sequência da prática de atos culposos, - ilícitos e danosos do conteúdo essencial de direitos fundamentais do requerente enquanto trabalhador e pessoa humana.
Requer-se, assim, que o requerente seja Integrado DE IMEDIATO nas suas funções profissionais bem como lhe sejam asseguradas as condições de desempenho das funções de motorista profissional de primeira categoria, sendo-lhe entregue a devida viatura da União das Juntas, ou outro veículo, de forma a retomar O exercício do seu posto de trabalho e correspondentes funções, de acordo com a orientação e coordenação de trabalho dimanado pelo Executivo da União de Juntas.
K) O Requerente encontrou-se de baixa médica no período compreendido entre 16 de fevereiro de 2016 e 28 de março de 2016 e entre 05 de abril e 06 de junho de 2016; tendo diagnosticada uma patologia crónica de hipertensão arterial. (fls. 99, 100, 17, 18 e 19)
L) O Requerente até março de 2016, tinha como função principal conduzir as viaturas da freguesia, ocasião em que passou a lavar passeios, muros, lixar grades, cortar árvores e sebes, tendo sido a maior parte do tempo destacado isoladamente para o estádio de futebol de Gulpilhares, por ordem do presidente da união das juntas de freguesia, para realizar trabalhos de manutenção naquele equipamento desportivo.

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Em sede de motivação da factualidade assente o Tribunal consignou: A matéria de facto das alíneas A) a K), resulta da documentação junta aos autos.
A matéria de facto dada por assente na alínea L), resulta dos depoimentos testemunhais prestados, tendo as testemunhas arroladas pelo Autor, referido que o Requerente até determinada ocasião (que a maior parte das testemunhas situa em março de 2016), só o viam a conduzir as carrinhas da Junta de Freguesia. Assim, a testemunha MA, referiu que o Requerente ia muitas vezes buscar um vizinho eu que é funcionário da Junta, com a viatura de serviço e que o viu por diversas vezes a conduzir as carrinhas da Junta. Por sua vez, a testemunha AJ, referiu que viu o Requerente a lavar o passeio junto ao cemitério por duas vezes. Por seu turno, a testemunha DO, disse era chefe de oficina onde o Requerente ia levar as viaturas da Junta para efetuarem reparações e lubrificações e que o via levar muitas vezes o pessoal da Junta nas carrinhas e que sempre o conheceu como responsável pelas carrinhas e condutor. Por seu turno, a testemunha MFL disse que chegou a ser transportada numa carrinha conduzida pelo Requerente para o Centro de Dia de Gulpilhares. Resulta, ainda do depoimento das testemunhas arroladas pela Entidade Requerida, que o Requerente tinha a função de conduzir viaturas, ainda que não exclusivamente. Assim, a testemunha, MFL, que é técnica administrativa da União de Freguesias e superior hierárquica do Requerente, referiu que ele «neste momento apresenta-se ao serviço no campo de futebol, foi lá que lhe foi distribuído o trabalho». Esta testemunha referiu, ainda, que o Requerente teve as chaves de uma viatura até março de 2016; que só deixou de andar com a viatura quando ficou doente. Disse, ainda, que o Requerente tem feito lavagem de muros com máquina de pressão, lixar grades no campo de futebol. Referiu, ainda, que o local de trabalho do Requerente passou a ser em Gulpilhares a fazer os serviços que lhe são indicados, situação que é uma exceção em relação aos demais funcionários oriundos de Valadares (os quais muito esporadicamente vem fazer trabalhos a Gulpilhares), que fazem o seu serviço em Valadares (fazem jardins, limpeza de bermas, cada dia vão para um sítio diferente e que em Gulpilhares não fazem limpeza de bermas). Disse esta testemunha, quando confrontada com o Quadro de Pessoal de fls. 53 e 54 dos autos, que “transportes” é motoristas. Referiu, igualmente, que os funcionários deslocam-se por meios próprios para o local de trabalho, no caso dos de Valadares dirigem-se à garagem em Valadares e depois são conduzidos para os locais de trabalho. Por seu turno, a testemunha AV (identificou-se como trolha da Freguesia de Gulpilhares) disse que viu o Requerente a andar com a carrinha que era da Junta de Valadares e que depois deixou de o ver a conduzir. Referiu, ainda, que quando iam montar palcos era o Requerente que ia buscar o pessoal na carrinha. Disse, também, que «trabalhávamos uns com os outros, quando o Senhor MMFL nos ajudava». Referiu que o Requerente fez a limpeza dos muros do estádio com máquina de pressão e noutros locais como no cemitério e no rancho folclórico. E que agora está sozinho no campo de futebol. Por seu turno, a testemunha, JES (vogal do executivo da Junta de Freguesia), disse que com a União de Freguesias, o Requerente desempenhava as funções que antes, andava com a carrinha, distribuía pessoal, montava palcos e que antes da baixa médica andava com uma carrinha, e que a alteração ocorrida foi a de o Requerente deixar de andar com a carrinha. Referiu, ainda, que agora o Requerente faz a limpeza de passeios e muros com uma máquina de pressão, corte de árvores no estádio, assim como lixar gradeamento. Disse que o Presidente ordenou que o Requerente fosse para o estádio. Referiu, ainda, que a União de Freguesias não alterou o quadro de pessoal.
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DE DIREITO
Está posta em causa a decisão que julgou procedente a providência cautelar.
Na óptica da Recorrente esta padece de violação do caso julgado, erro na apreciação dos critérios legalmente consagrados no nº 1 do artigo 120º do CPTA para o deferimento de providências cautelares, violação de lei e errada apreciação dos factos dados como provados e subsunção jurídica.
Cremos que não lhe assiste razão.
Antes, atente-se no discurso jurídico fundamentador da sentença:
“Cumpre analisar os pressupostos legais estabelecidos para adoção da providência cautelar, conforme decorre do regime estabelecido no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA – Código de Processo nos Tribunais Administrativos (na redação dada pelo Decreto-lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro), segundo o qual as providências são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
Cumpre começar por saber se existe uma situação de facto consumado.
Relativamente ao facto consumado, deve entender-se o mesmo como uma situação em que a delonga da ação principal, com sua procedência, já não pode fazer retornar a situação ao anteriormente existente.
Ora, na situação dos autos entende-se ocorrer uma situação de facto consumado, pois que a não se conhecer a providência cautelar, o Requerente fica numa situação de facto diferente daquela que entende ser-lhe devida. E tal situação prolongar-se-á até ao trânsito em julgado da ação principal. Aliás, atenta a idade do Requerente e a antiguidade, pode até acontecer que a ação principal quando for decida com trânsito em julgado, até o Requerente já esteja aposentado. Significa isto que ocorre uma situação de facto consumado, pois a haver procedência da ação principal, já não pode a situação de facto reverter, pois que a atividade desempenhada ou as tarefas ordenadas ao Requerente já se mostram executadas, quando, na sua versão, as não deveria executar, em função da eventual procedência da ação principal. Assim, os interesses de facto que o Requerente visa assegurar no processo principal estarão ultrapassados quando a ação de que esta providência depende estiver decidida com trânsito em julgado.
Face ao exposto, considera-se ocorrer uma situação de facto consumado.
Atendendo a que os requisitos de facto consumado e periculum in mora são alternativos basta a verificação de um deles para se poder passar à análise do requisito cumulativo que é o da aparência do direito pelo lado do Requerente.
No que concerne à aparência do direito, para melhor compreensão da temática em apreço nos autos, compete fazer um enquadramento jurídico do regime das carreiras dos trabalhadores que exercem funções públicas.
O regime das carreiras do pessoal das Autarquias Locais encontrava-se estabelecido no Decreto-Lei n.º 247/87, de 17 de junho, no âmbito do qual estava prevista a carreira de motorista nos termos do disposto no artigo 26.º; que se integrava no regime das carreiras mistas (artigo 37.º do mesmo diploma). Nos termos do Anexo I ao Decreto-Lei 247/87, os motoristas integravam a carreira de auxiliar, conforme remissão da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do mesmo diploma.
Nos termos da alínea c) do artigo 5.º do Decreto-Lei 248/85, de 15 de julho, a carreira mista era aquela que combinava características das carreiras verticais e horizontais. Segundo o mesmo preceito, desde último diploma, as carreiras (a) Verticais integravam categorias com o mesmo conteúdo funcional, diferenciadas em exigências, complexidade e responsabilidade; e as carreiras (b) Horizontais, quando integram categorias com o mesmo conteúdo funcional cuja mudança de categoria corresponde apenas à maior eficiência na execução das respetivas tarefas.
Os referidos diplomas foram revogados pelo artigo 116.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro. Esta Lei acabou com a definição de carreiras Verticais, Horizontais e Mistas e introduziu o conceito de carreiras gerais e especiais e unicategoriais ou pluricategoriais (artigos 41.º e 42.º). Este diploma efetuou uma transição de carreiras, para o efeito interessando-nos a previsão do artigo 100.º, n.º 1, alínea b), nos termos da qual os trabalhadores integrados nas carreiras de pessoal auxiliar, passava a integrar a categoria de assistente operacional. No seguimento do que acima se referiu, a carreira de motorista integrava-se na carreira de pessoal auxiliar, pelo que passou a integrar a categoria de assistente operacional.
Nos termos do artigo 49.º, n.º 1 – c) da Lei n.º 12-A/2008, a categoria de assistente operacional, integrava a carreira geral. Resulta, ainda, que o assistente operacional integra a carreira pluricategorial. A carreira pluricategorial significa que integra várias categorias. Veja-se sobre o assunto, a anotação aos artigos 42.º e 49.º efetuada pelos autores Paulo Veiga e Moura e Cátia Arrimar, no livro «Os novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores da Administração Pública» (edição Coimbra Editora, junho de 2010), págs. 120, 121 e 144 respetivamente. Por sua vez, o artigo 43.º da Lei n.º 12-A/2008, dispunha sobre o conteúdo funcional de cada carreira, nos seguintes termos:
Artigo 43.º
(Conteúdo funcional)
1 — A cada carreira, ou a cada categoria em que se desdobre, corresponde um conteúdo funcional legalmente descrito.
2 — O conteúdo funcional de cada carreira ou categoria deve ser descrito de forma abrangente, dispensando pormenorizações relativas às tarefas nele abrangidas.
3 — A descrição do conteúdo funcional não pode, em caso algum, e sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 271.º da Constituição, constituir fundamento para o não cumprimento do dever de obediência e não prejudica a atribuição ao trabalhador de funções, não expressamente mencionadas, que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador detenha a qualificação profissional adequada e que não impliquem desvalorização profissional.
A Lei n.º 12-A/2008, foi revogada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a LGTFP - Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (que foi objeto de Declaração de Retificação n.º 37-A/2014, de 19/08 e de alterações operadas pelas Leis n.ºs 82-B/2014, de 31/12; 84/2015, de 07/08; 18/2016, de 20/06; 42/2016, de 28/12; e 25/2017, de 30/05), que no essencial, manteve o regime jurídico respeitante aos trabalhadores em funções públicas. Transcrevem-se os pertinentes preceitos desta Lei, para sua melhor análise a apreensão. (Sendo as futuras indicações de preceitos respeitantes a esta LGTFP).
«Artigo 29.º
(Mapas de pessoal)
1 — Os órgãos e serviços preveem anualmente o respetivo mapa de pessoal, tendo em conta as atividades, de natureza permanente ou temporária, a desenvolver durante a sua execução.
2 — O mapa de pessoal contém a indicação do número de postos de trabalho de que o órgão ou serviço carece para o desenvolvimento das respetivas atividades, caracterizados em função:
a) Da atribuição, competência ou atividade que o seu ocupante se destina a cumprir ou a executar;
b) Do cargo ou da carreira e categoria que lhes correspondam;
c) Dentro de cada carreira e, ou, categoria, quando imprescindível, da área de formação académica ou profissional de que o seu ocupante deva ser titular;
d) Do perfil de competências transversais da respetiva carreira ou categoria, regulamentado por portaria do membro do Governo responsável pela área da Administração Pública e complementado com as competências associadas à especificidade do posto de trabalho.
(…)
7 — A alteração dos mapas de pessoal que implique redução de postos de trabalho fundamenta-se em reorganização do órgão ou serviço nos termos legalmente previstos, devendo cessar, em primeiro lugar, os vínculos de emprego público a termo.
Artigo 30.º
(Preenchimento dos postos de trabalho)
1 — O órgão ou serviço pode promover o recrutamento dos trabalhadores necessários ao preenchimento dos postos de trabalho previstos no mapa de pessoal, nos termos do presente artigo.
2 — O recrutamento deve ser feito por tempo indeterminado ou a termo, consoante a natureza permanente ou transitória da atividade, tal como consta do mapa de pessoal.
TÍTULO II - Formação do vínculo
CAPÍTULO I - Recrutamento
Artigo 33.º
(Procedimento concursal)
1 — O recrutamento é decidido pelo dirigente máximo do órgão ou serviço.
2 — O recrutamento é feito por procedimento concursal publicitado, designadamente através de publicação na 2.ª série do Diário da República.
3 — Da publicitação do procedimento concursal consta a referência ao número de postos de trabalho a ocupar e respetiva caracterização, de acordo com atribuição, competência ou atividade, carreira, categoria e, quando imprescindível, área de formação académica ou profissional que lhes correspondam.
SECÇÃO II - Período experimental
Artigo 45.
(Regras gerais)
1 — O período experimental corresponde ao tempo inicial de execução das funções do trabalhador, nas modalidades de contrato de trabalho em funções públicas e de nomeação, e destina-se a comprovar se o trabalhador possui as competências exigidas pelo posto de trabalho que vai ocupar.
2 — O período experimental tem duas modalidades:
a) Período experimental do vínculo, que corresponde ao tempo inicial de execução do vínculo de emprego público;
b) Período experimental de função, que corresponde ao tempo inicial de desempenho de nova função em diferente posto de trabalho, por trabalhador que já seja titular de um vínculo de emprego público por tempo indeterminado.
(…)
5 — Por ato fundamentado da entidade competente, o período experimental pode ser feito cessar antes do respetivo termo, quando o trabalhador manifestamente revele não possuir as competências exigidas pelo posto de trabalho que ocupa.
Artigo 80.º
(Conteúdo funcional)
1 — A cada carreira, ou a cada categoria em que se desdobre uma carreira, corresponde um conteúdo funcional legalmente descrito.
2 — O conteúdo funcional de cada carreira ou categoria deve ser descrito de forma abrangente, dispensando pormenorizações relativas às tarefas nele abrangidas.
Artigo 81.º
(Exercício de funções afins)
1 — A descrição do conteúdo funcional nos termos do artigo anterior não prejudica a atribuição ao trabalhador de funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador detenha a qualificação profissional adequada e que não impliquem desvalorização profissional.
2 — Sempre que as funções afins ou funcionalmente ligadas à atividade principal, referidas no número anterior, exijam especiais qualificações, o exercício de tais funções confere ao trabalhador o direito a formação profissional não inferior a 10 horas anuais.
Artigo 82.º
(Atribuição de funções e desenvolvimento da carreira)
1 — O empregador público deve procurar colocar o trabalhador no posto de trabalho mais adequado às suas aptidões e qualificação profissional, dentro da carreira e categoria a que pertence ou que serve de referencial para o exercício das suas funções.
2 — As condições de prestação de trabalho devem favorecer a compatibilização da vida profissional com a vida familiar do trabalhador, bem como assegurar o respeito das normas aplicáveis em matéria de segurança e saúde no trabalho.
3 — O início de funções do trabalhador tem lugar com um período de formação em sala e em exercício, com duração e conteúdo dependentes da prévia situação jurídico-funcional do trabalhador, salvo tratando -se de trabalhador integrado em carreira especial cujo ingresso exigiu a aprovação em curso de formação específico.
4 — Todos os trabalhadores têm direito ao pleno desenvolvimento da respetiva carreira profissional, que pode ser feito por alteração de posicionamento remuneratório ou por promoção.
Artigo 83.º
(Local de trabalho)
1 — O trabalhador deve, em princípio, realizar a sua prestação no local de trabalho correspondente ao posto de trabalho atribuído, sem prejuízo das situações de mobilidade previstas na presente lei.
2 — O trabalhador encontra -se adstrito às deslocações inerentes às suas funções ou indispensáveis à sua formação profissional.
SECÇÃO II - Carreiras
Artigo 84.º
(Carreiras gerais e especiais)
1 — As carreiras dos trabalhadores em funções públicas são gerais ou especiais.
2 — São gerais as carreiras cujos conteúdos funcionais caracterizam postos de trabalho de que a generalidade dos órgãos ou serviços carece para o desenvolvimento das respetivas atividades.
3 — São especiais as carreiras cujos conteúdos funcionais caracterizam postos de trabalho de que apenas um ou alguns órgãos ou serviços carecem para o desenvolvimento das respetivas atividades.
Artigo 88.º
(Enumeração e caracterização das carreiras gerais)
1 — São gerais as carreiras de:
a) Técnico superior;
b) Assistente técnico;
c) Assistente operacional.
2 — A caracterização das carreiras gerais, em função do número e designação das categorias em que se desdobram, dos conteúdos funcionais, dos graus de complexidade funcional e do número de posições remuneratórias de cada categoria, consta do anexo à presente lei, da qual faz parte integrante.
3 — A previsão, nos mapas de pessoal, de postos de trabalho que devam ser ocupados por coordenadores técnicos da carreira de assistente técnico depende da existência de unidades orgânicas flexíveis com o nível de secção ou da necessidade de coordenar, pelo menos, 10 assistentes técnicos do respetivo setor de atividade.
4 — A previsão, nos mapas de pessoal, de postos de trabalho que devam ser ocupados por encarregados gerais operacionais da carreira de assistente operacional depende da necessidade de coordenar, pelo menos, três encarregados operacionais do respetivo setor de atividade.
5 — A previsão, nos mapas de pessoal, de postos de trabalho que devam ser ocupados por encarregados operacionais da carreira de assistente operacional depende da necessidade de coordenar, pelo menos, 10 assistentes operacionais do respetivo setor de atividade.
Artigo 120.º
(Limites da duração do trabalho suplementar)
1 — É aplicável aos trabalhadores com vínculo de emprego público, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do disposto no presente artigo e nos artigos seguintes, o regime do Código do Trabalho em matéria de trabalho suplementar.
— O trabalho suplementar fica sujeito, por trabalhador, aos seguintes limites:
a) 150 horas de trabalho por ano;
b) Duas horas por dia normal de trabalho;
c) Um número de horas igual ao período normal de trabalho diário, nos dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e nos feriados;
d) Um número de horas igual a meio período normal de trabalho diário em meio dia de descanso complementar.
3 — Os limites fixados no número anterior podem ser ultrapassados, desde que não impliquem uma remuneração por trabalho suplementar superior a 60 % da remuneração base do trabalhador:
a) Quando se trate de trabalhadores que ocupem postos de trabalho de motoristas ou telefonistas e de outros trabalhadores integrados nas carreiras de assistente operacional e de assistente técnico, cuja manutenção ao serviço para além do horário de trabalho seja fundamentadamente reconhecida como indispensável;».
Nos termos do Anexo a que se refere o n.º 2 deste artigo 88.º, a carreira de assistente operacional, implica o desempenho das seguintes funções:
Funções de natureza executiva, de caráter manual ou mecânico, enquadradas em diretivas gerais bem definidas e com graus de complexidade variáveis.
Execução de tarefas de apoio elementares, indispensáveis ao funcionamento dos órgãos e serviços, podendo comportar esforço físico.
Responsabilidade pelos equipamentos sob sua guarda e pela sua correta utilização, procedendo, quando necessário, à manutenção e reparação dos mesmos.
Em função da transcrição efetuada, verifica-se que os trabalhadores, não obstante estarem integrados numa determinada carreira e numa concreta categoria, exercem as suas funções afetos a um posto de trabalho. Assim, o artigo 29.º, n.º 2 refere que o Mapa de Pessoal (para as autarquias vigora ainda o Decreto-Lei n.º 209/2009, de 3 de setembro, cujo artigo 3.º determina que os municípios e as freguesias dispõe de mapas de pessoal; diploma alterado pelas Leis n.º 3-B/2012, de 28/04; n.º 66/2012, de 31/12, e n.º 80/2013, de 28/11) contém a indicação do número de postos de trabalho necessários para o exercício da atividade, determinados em função da atribuição, competência ou atividade que o seu ocupante (trabalhador) se destina a cumprir ou executar – alínea a). Concorre para esta ideia o facto de o recrutamento de pessoal ser efetuado para o preenchimento de postos de trabalho previstos no mapa de pessoal, conforme decorre do disposto nos artigos 30.º, n.º 1 e 33.º, n.º 3. Decorre deste último preceito que o recrutamento é efetuado para ocupação de postos de trabalho, de acordo com as atribuições, competência ou atividade, carreira, categoria e categoria. Concorre, ainda, para esta interpretação, o facto de no período experimental o trabalhador ter de comprovar as competências exigidas para o posto de trabalho, não para a carreira ou categoria – artigo 45.º acima transcrito. Por sua vez, nos termos do artigo 82.º, o empregador deve colocar o trabalhador no posto de trabalho mais adequado às suas aptidões e qualificações profissionais (n.º 1), tendo o trabalhador direito ao pleno desenvolvimento da respetiva carreira profissional (n.º 4). Contudo, pode o empregador atribuir ao trabalhador outras funções afins ou funcionalmente ligadas ao conteúdo funcional, desde que não impliquem desvalorização profissional (artigo 81.º, n.º 1). Resulta, ainda, que nas carreiras gerais, os seus conteúdos funcionais caracterizam postos de trabalho (artigo 84.º, n.º 2). Comprova esta ideia de que os trabalhadores e encontram, adstritos ou ligados a um posto de trabalho, a nova redação dada a alguns preceitos da LGTFP pela Lei n.º 25/2017, de 30 de maio (diploma que aprova o regime da valorização profissional dos trabalhadores com vínculo de emprego público). Assim, as novas redações dadas aos artigos 28.º, n.º 3 e 30.º, n.º 6 confirmam que o recrutamento na função pública é efetuado para preenchimento de postos de trabalho. Para além disso, não obstante o legislador nunca esclarecer muito bem o que tantas vezes designa como «posto de trabalho», retira-se da redação do n.º 1 do artigo 33.º do Regime de Valorização Profissional (RVP) que o trabalhador deve ser colocado em posto de trabalho para o qual reúna os requisitos habilitacionais e profissionais legalmente exigidos e o perfil profissional adequado ao mesmo. Significa isto que, não obstante a inserção do trabalhador numa carreira e na categoria que esteja em causa, desempenha a sua função num posto de trabalho, para o qual é contratado ou ao qual acedeu, onde se deve manter, sem prejuízo da sua valorização profissional.
Não invalida este raciocínio a particularidade das situações que o RVP pretende abranger, pois que então violar-se-ia o princípio da igualdade, pelo que cremos poder retirar-se desse regime o princípio de que os trabalhadores devem desempenhar as suas funções num posto de trabalho para o qual estejam mais habilitados, não podendo ser - despromovidos‖ do seu posto de trabalho.
Em face do exposto, conclui-se que, não obstante a Lei n.º 12-A/2008 e a atual LGTFP deixarem de definir a função de motorista como uma carreira, resulta do exposto, bem como decorre do artigo 120.º, n.º 3, alínea a) da LGTFP, assim como do Quadro de Pessoal da União de Freguesias, que existe o posto de trabalho de motorista (e que adiante melhor explicitaremos).
Ou seja, não obstante a integração genérica do pessoal numa carreira e numa concreta categoria, o trabalhador exerce a sua atividade num posto de trabalho. Isto, sem prejuízo da definição geral e resumida do conteúdo funcional, pois que esta definição é apenas um elemento padrão das funções de cada categoria (artigo 80.º), que não dispensa a existência de mapa de pessoal, onde devem estar definidos os postos de trabalho (artigo 29.º, n.º 1, já citado). O mapa de pessoal dever ser aprovado anualmente, contudo a redução de postos de trabalho, deve-se fundamentar na reorganização do serviço nos termos legais (artigo 29.º, n.º 1).
Resulta do exposto, que, atualmente, não existe a carreira de motorista, nem existe a categoria de motorista, mas existe o posto de trabalho de motorista. E a menção na Lei n.º 35/2014, a postos de trabalho ou a posto de trabalho, tem de ter algum conteúdo, pois que de outro modo o legislador estaria a referir-se a uma realidade inexistente; sendo que aquele diploma menciona 43 vezes, - postos de trabalho e 34 vezes - posto de trabalho‖. Seria um total de 77 referências inócuas, se o posto de trabalho não tivesse nenhum significado jurídico; o que não cremos tenha o legislador efetuado referências inócuas desse conceito jurídico: posto de trabalho.
Não obstante o trabalhador poder ser colocado a exercer funções afins ou funcionalmente ligadas ao conteúdo funcional, tal apenas pode ocorrer desde que não impliquem desvalorização profissional (artigo 81.º, n.º 1).
Ora, por um lado, não se vislumbra que as atividades mandadas desempenhar ao Requerente sejam afins da de motorista, e, por outro lado, essas atividades implicam uma desvalorização profissional, pois que para as executar não é necessária nenhuma formação específica (aliás, tal como referido pela testemunha membro do órgão da Junta de Freguesia que depôs em Tribunal), enquanto a de motorista profissional, implica a realização de exames de teóricos e práticos para obtenção da uma licença de condução com características especiais. Para além disso, o Requerente encontra-se a realizar tarefas típicas de um servente indiferenciado ou de um operário desqualificado, pois que as mesmas não carecem de especiais conhecimentos, sendo caracteristicamente desempenhadas pelos operários com mais baixas qualificações. Desta forma, ao ser ordenado o desempenho de tais tarefas de modo exclusivo e predominante, o empregador acaba por desqualificar o trabalhador. E as tarefas mandadas desempenhar, nem sequer são afins das de motorista, pelo que não encontra abrigo legal a sua ordenação.
Resulta, ainda, do que acima se deu por assente na alínea E) da matéria de facto, que o Mapa de Pessoal (designado pela Autarquia como Quadro de Pessoal), prevê dois postos de trabalho (ali mencionados como cargos/carreiras/categorias) designados como de «transportes» e relativos ao quadro de Valadares (sendo que o quadro de Gulpilhares é que está por preencher). Ora, quem desempenha a função de «transportes» é um motorista. Aliás, conforme referido pela técnica administrativa MFL, em depoimento neste Tribunal, conforme acima referenciado. Estando previsto no Mapa de Pessoal o posto de trabalho ou a função de transportes, deve o mesmo ser preenchido por quem tenha as qualificações para o efeito. Mas não só, deve o posto de trabalho ser desempenhado por quem esteja designado para o mesmo. Ora, constado no mapa de pessoal do ano de 2012 de Valadares dois postos de trabalho de motorista, estando nominalmente indicado como tal o Requerente (portanto já depois da reformulação de carreiras operada pela Lei n.º 12-A/2008); assim como no mapa de férias do pessoal de Valadares de 2012 e 2013, surgem dois motoristas (nominalmente assim identifica o Requerente) – vide alíneas B), C) e D) da matéria de facto supra. Por sua vez, no Mapa de Pessoal de 2016, surge a função de «transportes» na coluna referente a Valadares, com a indicação de dois lugares. Ora, em função da indicação nominal do requerente como motorista no Mapa de Pessoal de Valadares do ano de 2012, da identificação do mesmo como motorista no mapa de férias e Valadares dos anos de 2012 e 2013, e que constando do Mapa de Pessoal da união de Freguesias de 2016, dois postos de trabalho de «transportes», conclui-se que um destes postos de trabalho está afeto ao Requerente.
Assim, havendo aquela previsão no Mapa de Pessoal, a mesma deve ser cumprida por quem a aprovou, ou seja, deve ser preenchido o posto de trabalho de «transportes» (motorista) por quem detém habilitações para o efeito. Considerando que o Requerente detinha a categoria de motorista (antes da Lei n.º 12-A/2008), que efetivamente desempenhava essa função; assim como é detentor de carta de condução de profissional (vide anotações à mesma, e sua integração por leitura do Código da Estrada – artigo 3.º, entre outros), deve ser colocado a desempenhar a atividade para a qual se encontra habilitado e que consta do Mapa de Pessoal como de «transportes». Isto sem prejuízo de poder realizar as tarefas afins ou complementares, mas devendo ser a sua função principal a de motorista.
Cumpre ainda referir, que não obstante o Requerente se encontrar colocado numa carreira pluricategorial, tal só por si não permite que possa ser afastado do seu posto de trabalho.
Para além do que fica exposto, verifica-se, ainda, que o empregador obstou, sem justificação, que o Requerente realizasse a prestação efetiva do trabalho que correspondia ao seu posto de trabalho, violando o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 72.º da LGTFP. Resulta, igualmente, que com a atribuição ao Requerente de tarefas que não correspondem ao do seu posto de trabalho, assim como ao coloca-lo a trabalhar isoladamente, o empregador público, falta ao respeito ao trabalhador, pois não age com probidade, uma vez que tem um tratamento desigual e não proporciona boas condições morais para o trabalhador. A Entidade Requerida ao não dar nenhuma explicação para a alteração das funções do Requerente também não atua com urbanidade. Desta forma, afigura-se que a Entidade Requerida terá violado o disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 71.º da LGTFP.

Em face do que se acaba de analisar, conclui-se que o Requerente tem a aparência do direito na máxima intensidade pelo seu lado, ou seja, é deveras provável que possa vir a ter vencimento na ação principal.
Compete, por fim, analisar o requisito negativo estabelecido no n.º 2 do artigo 120.º do CPTA, ou seja, saber se, mesmo com a aparência do direito pelo lado do Requerente, ocorre algum motivo ponderoso para que a providência possa ser recusada. Ora, analisada a factualidade não se deteta que a recolocação do Requerente na função que deve desempenhar causa dano irreparável à entidade pública, tanto mais que no mapa de pessoal consta a função de «transportes», que é como quem diz, o posto de trabalho de motorista.
Face ao exposto, deve a Entidade Requerida recolocar o Requerente nas funções que vinha desempenhando até março de 2016, sendo estas maioritariamente as de desempenho da função de motorista.
Atendendo à forma como se encontram realizados os pedidos, e que já não existe a categoria de motorista, mas a de posto de trabalho de motorista; bem assim, como o Tribunal não pode (não deve sequer) mencionar qual seja o veículo a afetar ao Requerente, pois que tal seria já entrar num domínio tão exímio que contenderia com a autonomia de gestão de recursos materiais, não podem os pedidos serem providos exatamente como peticionados. Para além disso, uma vez decididos os termos e modos do exercício da função laboral, não se mostra necessário que a cominação seja tão concretamente particularizada, tal como peticionada.
Considerando, igualmente, o peticionado (ou melhor, por não estar peticionado), não se pode condenar a Entidade Requerida a colocar o Requerente como encarregado operacional, uma vez que não se encontra expressamente assim pedido (colocação como encarregado operacional). Mas ainda que estivesse assim peticionado, era necessário que estivessem demonstrados os respetivos pressupostos legais, que no caso se encontram estabelecidos no artigo 88.º, n.º 5 da LGTFP; sendo que no caso concreto, tais pressupostos não resultam demonstrados, porquanto não existem trabalhadores em número suficiente (10 trabalhadores) para serem chefiados por um encarregado operacional.
Compete, ainda, referir que não obstante alegado, não é possível condenar no modo de recolha e transporte do Requerente de e para o local de trabalho, por não estar assim peticionado. Contudo afigura-se que ao Requerente será de aplicar o regime estabelecido para os demais trabalhadores oriundos de Valadares, aliás, conforme previsto nas Ordens de Serviço n.º 1 e n.º 2 de 2016.
*
Do pedido de sanção pecuniária compulsória.
Relativamente a este aspeto compete referir que o artigo 169.º, n.º 1 do CPTA que para efeitos de aplicação sanção pecuniária compulsória devem estar individualmente identificados os titulares do órgão incumbido de executar a sentença. Ora, o Autor não logra identificar nominalmente o Presidente da Junta de Freguesia, nem a sua identificação se encontra nos autos. Assim, não é possível fixar uma sanção a quem não se encontra devida e cabalmente identificado.
Para além disso, o artigo 27.º, n.º 2, alínea b) da LGTFP, refere que nas freguesias, as competências inerentes à qualidade de empregador público são exercidas pela junta de freguesia. Ou seja, pelo órgão colegial executivo. Também por esta razão não é possível determinar uma sanção apenas a um titular daquele órgão colegial.
Face ao exposto, indefere-se o pedido em apreço.” (sublinhados nossos).
X

Vejamos:
Dispõe o artigo 112º/1 do CPTA, que “Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.
A redacção deste artigo, na sua parte final, expressa o propósito essencial da tutela cautelar, que se reconduz a assegurar a utilidade da lide principal, ou seja, salvaguardar o efeito útil de uma sentença a proferir em sede de acção principal, que pela sua cognição plena poderá comportar um período mais longo até ser definitivamente decidida.
Tal equivale a dizer que a providência cautelar está intimamente ligada aos autos principais, sendo nestes que a pretensão do requerente irá ser analisada e decidida com a profundidade necessária, tratando-se, em sede cautelar, apenas de assegurar a utilidade da sentença que aí venha a ser proferida mediante a adopção de medidas urgentes baseadas necessariamente numa apreciação sumária e perfunctória do caso.
Daí que ao julgador de um processo cautelar se imponha que proceda a uma apreciação sucinta e sumária das ilegalidades apontadas pelo requerente cautelar ao acto impugnado ou a impugnar com o objectivo de constatar se ocorre a sua manifesta ilegalidade, não lhe competindo analisar e apurar com exaustão se as ilegalidades imputadas ao acto ocorrem ou não.

Deste modo, o julgador, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de procedência da acção principal, terá de indagar e ajuizar se existem ou não razões para temer que tal decisão venha a tornar-se inútil, sem qualquer alcance prático, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos dificilmente reparáveis para quem dela pretende beneficiar, que obstem à reconstituição natural ou à reintegração da esfera jurídica do beneficiado com a sentença.
Na redacção actual, dada pelo DL 214-G/2015, de 2 de outubro, o fumus boni iuris apresenta-se sempre sob a formulação positiva (condizente com a formulação que na redacção anterior se encontrava plasmada na al. c) do n° 1 do artº 120° do CPTA)
Ponderada a tutela cautelar em função dos critérios agora estatuídos no artigo 120°/1 do CPTA, a análise da verificação da aparência do bom direito assume particular relevância nos presentes autos, na medida em que é necessário que se verifique uma forte probabilidade de procedência da pretensão principal.
A formulação positiva do fumus boni iuris é-nos dada pela introdução na redacção do n ° 1 do artigo 120 ° do CPTA do substantivo "provável", que imprime uma maior rigidez ao conceito. Assim, do direito convocável para subsumir os factos descritos, tem de ser possível chegar-se à probabilidade do êxito da acção; tem de se verificar uma aparência de que o requerente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela actuação administrativa.
Como refere a Prof. Isabel Celeste Fonseca, o requisito do fumus boni iuris na formulação positiva, obriga a um juízo positivo de probabilidade através da “intensificação da cognição cautelar”, ou seja, duma “apreciação mais profunda e intensa da causa” - (em Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (função e estrutura), págs. 66/68).
A apreciação judicial sobre a probabilidade da procedência da pretensão formulada no processo principal deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, que permita ao tribunal acreditar na probabilidade do êxito da pretensão principal. Designadamente, verificar-se-á o critério referenciado quando a ilegalidade do acto a suspender resulte de forma clara dos autos, sem necessidade de mais provas, ou, por outras palavras, quando se esteja perante uma ilegalidade evidente.
Este receio não é um mero elemento subjectivo e tem que ter suporte em dados de facto que, sob um crivo objectivo, apontem no sentido de verosimilhança quanto aos alegados efeitos perniciosos das normas suspendendas.
Na verdade, face ao CPTA de 2015, as providências cautelares serão deferidas, desde que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos: i) fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); ii) que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (fumus boni juris); iii) que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença resulte que os danos decorrentes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência).
Acresce que, tal como já ocorria no regime anterior, a verificação destes requisitos tem que ser cumulativa e, ademais, a concessão da providência cautelar depende da invocação e demonstração de factos donde se conclua pela verificação dos supra aludidos requisitos, sendo que incumbe ao requerente da providência o ónus do oferecimento de prova sumária dos requisitos de que depende a suspensão e cabe ao requerido fazer a prova, também sumária, dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do requerente bem como a matéria de impugnação - artºs 342º/2 do CC e 487º e 516º, estes do CPC.
O tribunal não pode substituir-se às partes no seu ónus de alegar e provar os factos que interessam a cada uma, porquanto o dever de investigação que a lei processual comete ao juiz apenas abarca a matéria de facto trazida ao processo, os factos notórios ou de conhecimento geral - artºs 264º, 514º e 664º/2ª parte, do CPC.
Estas asserções não foram postas em causa pelo CPC de 2015 que, no seu nº 1, consagra o princípio do dispositivo, em relação aos factos essenciais que constituem a causa de pedir, e, no seu nº 2, à sombra do princípio da aquisição, permite ao julgador que tome em consideração os factos instrumentais e, outrossim, os que constituam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado, desde que tais factos resultem da instrução da causa. Mas essa possibilidade está sempre condicionada pela prévia alegação desses factos essenciais e, obviamente, pela necessidade da sua atendibilidade e ponderação pelo julgador, o que equivale a dizer, pela sua relevância para a decisão a proferir.
Voltando ao caso em concreto, temos que a Entidade Requerida/ Recorrente invoca, além do mais, a ofensa do caso julgado.
Ora, decorre do artº 497º/1 do CPC que a excepção do caso julgado pressupõe “… a repetição de uma causa ...”. E estipula o seu artº 498º, sob a epígrafe de “requisitos … do caso julgado”, que se repete “… a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir …” (nº 1), que há “… identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica…” (nº 2), que existe “… identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico …” (nº 3) e que há “… identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. (…) nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido …”.
O caso julgado é a insusceptibilidade de impugnação de uma decisão judicial decorrente do seu trânsito em julgado (cfr. artº 677º do CPC), sendo que, como afirma Miguel Teixeira de Sousa o “... caso julgado traduz-se na inadmissibilidade da substituição ou modificação da decisão por qualquer tribunal (incluindo aquele que a proferiu) em consequência da insusceptibilidade da sua impugnação por reclamação ou recurso ordinário …”, já que “... após o proferimento de uma decisão judicial verifica-se a extinção do poder jurisdicional do juiz (artº 666º/1 e 3 do CPC), o que significa que o tribunal não pode, motu proprio, voltar a pronunciar-se sobre a matéria apreciada …” (em Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., Lx 1997, págs. 567 e 572).
Temos, assim, que esta excepção consiste em ser proposta uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir que tenha sido decidida por decisão judicial de que já não admita recurso ordinário, isto é, por decisão judicial passada ou transitada em julgado
( artºs 494º/i), 497º, 498º, 677º e 678º todos do CPC).
Esta excepção não se estende a todos os fundamentos da decisão e preclude a invocação de questões relacionadas com o «thema decidendum» e só vale enquanto se mantiver inalterada a situação apreciada na decisão, sendo que, em princípio, só vincula as partes da acção.
Isso significa que o caso julgado possui aquilo que se denomina de limites objectivos, temporais e subjectivos (identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica
- artº 498º/2 do CPC).
A acção identifica-se e individualiza-se não pela norma abstracta da lei mas pelos elementos de facto que converteram em concreta a vontade legal.
Como ensinava Manuel de Andrade é pelo próprio teor da decisão que se mede a extensão objectiva do caso julgado a ponto de se “… ela não estatuir de modo exaustivo sobre a pretensão do A. (o 'thema decidendum'), não excluindo portanto toda a possibilidade de outra decisão útil, essa pretensão poderá ser novamente deduzida em juízo …” (em Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 325
e Alberto dos Reis em Código de Processo Civil Anotado, vol. III, pág. 174).
É a resposta dada na decisão judicial à pretensão do A., delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado, assim se evitando que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior, com todos os prejuízos que isso implicaria não só para os particulares (insegurança acerca dos direitos definidos por decisão judicial), como também para os próprios tribunais («… a sua função de órgãos de pacificação jurídica, de instrumentos de paz social falharia redondamente …» - cfr. Antunes Varela
, em Manual de Processo Civil, 2.ª ed. revista e actualizada, pág. 686).
Temos, assim, que o problema do âmbito objectivo do caso julgado se prende
com a determinação do quantum de matéria que foi apreciada pelo tribunal e que recebe o valor de indiscutibilidade do caso julgado, sendo que este abrange a parte decisória do despacho, sentença ou acórdão, isto é, a conclusão extraída dos seus fundamentos (artºs 659º/2 e 713º/2, ambos do CPC), que pode ser, por exemplo, a condenação ou absolvição do réu ou o deferimento da providência solicitada.
No caso posto a decisão recorrida não enferma deste mal, uma vez que a decisão de não decretamento provisório não contende com a decisão definitiva da providência cautelar. O decretamento provisório limita-se a verificar se a situação do Requerente fica irremediavelmente prejudicada na pendência da providencia cautelar sem o decretamento, como que numa situação sem retorno. Numa primeira e perfunctória análise o Tribunal limitou-se a apreciar se a situação do Requerente ficava irremediável sem esse decretamento provisório, tendo concluído não ficar. O decretamento provisório (ou não decretamento) é para valer apenas até à decisão da providência cautelar, nada impedindo que a providência possa ter decisão de sentido diferente, em função dos elementos carreados pelas partes.

Dito de outro modo, o Requerente/Recorrido requereu que no despacho liminar previsto no nº 5 do artigo 116º do CPTA fosse decretada previamente a providência cautelar sem audição prévia da Requerida.
O Tribunal a quo entendeu indeferir aquela pretensão, apesar do nº 1 do artigo 131º do CPTA prever e admitir que a providência cautelar possa ser decretada oficiosamente ou a pedido do requerente; nesse despacho o Senhor Juiz limitou-se a considerar que, à primeira vista, não vislumbrava que ocorresse facto consumado e que apesar de o autor ter alegado que exercia funções inerentes à categoria profissional de motorista de 1ª categoria, à data de 31/3/2010, para já não era possível aferir com certeza e segurança necessárias se tal correspondia ao desempenho daquelas funções de motorista, independentemente até do mesmo poder desempenhar outras funções afins como assistente operacional.
Tal equivale a dizer que só após a apresentação da contestação da parte contrária, produzida e apurada a prova, poderiam estar reunidos e preenchidos os pressupostos para se apreciar de mérito o pedido final, decretando, ou não, as medidas requeridas.
Não ocorre, pois, ofensa de caso julgado.
E o que dizer do fundo da causa?
A aqui Recorrente também põe em causa os critérios de decisão, questionando a existência, ou não, do periculum in mora, a constituição de uma situação de facto consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal.
Sucede que a este respeito a sentença foi clara e objectiva ao assentar que as funções principais desempenhadas pelo Requerente eram essencialmente as de motorista, ao longo de mais de 30 anos, (além de outras afins).
Como é, então, possível concluir que não se trata de um acto de especial urgência para que o Requerente retomasse de imediato as suas funções específicas de motorista, quando este é o mais antigo e habilitado motorista para conduzir uma das quatro viaturas da União da Junta de Freguesia/Recorrente? Interroga-se o Recorrido.
Independentemente de manter o mesmo vencimento, o aqui Recorrido foi prejudicado pois sempre utilizou uma das viaturas da Junta, que lhe era confiada, estacionando-a no estaleiro em Valadares, transportando-se a si e aos restantes colegas de trabalho, quer fosse em Gulpilhares, quer em Valadares, à hora do almoço e depois, cerca das 13 horas, para o início dos trabalhos da tarde e novamente ao fim do dia.
De acordo com a nova ordem de serviço, enquanto os restantes colegas trabalhadores continuaram a ser transportados em viaturas da Junta, gratuitamente, de casa para os locais de trabalho pré-indicados, à hora do almoço para suas casas, ao início da tarde de suas casas para os mesmos locais de trabalho e ao final da tarde de regresso às suas casas, o Requerente passou a deslocar-se em viatura própria, suportando todos os custos daí inerentes.
A isto acrescem os notórios danos não patrimoniais, como a pressão psicológica e o desgaste emocional, aventados nas contra-alegações.
O Recorrido tem sessenta anos de idade, sofre de hipertensão, esteve de baixa médica durante cerca de 4 meses, pelo que a notificação de uma ordem de serviço, datada de 30/3/2016, ordenando que a partir de então, passasse a deslocar-se e a apresentar-se, quer de manhã quer ao meio dia, em viatura própria, nos estaleiros da Junta de Gulpilhares e, posteriormente, em finais do ano, sempre no complexo desportivo de Gulpilhares, não pode deixar de o afectar em termos de o desenrolar (e a demora da acção) o acentuar.
No Mapa de Pessoal da União da Junta de Freguesias de Valadares e Gulpilhares, nos anos de 2012 e 2013, na folha de férias de 2012, consta o nome do Requerente seguido da indicação de motorista (factos assentes nas alíneas B), C), D) do probatório.
Nessa folha de férias e no Quadro da União da Junta de Freguesias de Valadares e Gulpilhares, relativo ao ano de 2016, são mencionadas as funções de um primeiro e segundo motorista efectivos, registando e especificando o sobredito Quadro, que no sector dos transportes se encontram preenchidos dois lugares efectivos e se encontram duas vagas por preencher, além da descrição de outros cargos/carreiras/categorias (fls. 53 e 54 dos autos).
O Requerente é detentor de carta de condução, habilitado com diferentes categorias desde 28/4/1998, válida até 29/6/2021 (fls. 87), encontrando-se reflectida tal categoria efectiva, nos seus recibos de vencimento de fevereiro 2002, novembro 2008, janeiro 2010, novembro 2016, janeiro, fevereiro e março de 2017.
A ordem de serviço nº 1/2016, de 10/2/2016, entregue aos funcionários externos, previa que o responsável pela condução da viatura efectuaria o transporte dos funcionários para os locais de trabalho, permanecendo aquele responsável no local onde estiver o maior número de funcionários, incumbindo-lhe também comunicar diariamente as tarefas a executar pelos colegas, recebidas da responsável superior, D. MFL ou D. Luciana.
O Requerente fez aquelas funções de recolher e transportar os colegas, comunicando-lhes as tarefas a executar e os seus locais de trabalho ao longo de dezenas de anos, até finais de março de 2016.
Porém, a partir dessa altura, foi-lhe ordenado que executasse diferentes tarefas rudimentares, sozinho, como lenhador, lavador de campas de cemitério de Gulpilhares, e de passeios, lixador de vários varões do campo de futebol; e foi-lhe determinado que permanecesse isolado e continuadamente a partir de outubro de 2016, no Complexo Desportivo de Gulpilhares.
Tal como invocado pelo Recorrido, tal quadro de facto corresponde a uma autêntica “desqualificação profissional”, humilhante, degradante e lesiva dos seus direitos. Acresce que a alteração da ordem interna 2/2016, de 31/3/2016, não resultou de qualquer reorganização do órgão, serviço ou sector dos transportes.
Conforme bem explanado na sentença, a carreira de assistente operacional implica o desempenho das seguintes funções: as de natureza executiva, de caráter manual ou mecânico, execução de tarefas de apoio elementares, a responsabilidade pelos equipamentos sob sua guarda e pela sua correcta utilização, procedendo, ainda, quando necessário à manutenção e à reparação dos veículos da Junta.
Além de ser condutor, eram precisamente essas funções, entre outras, que o Requerente executava.
Como entendeu, e bem, a decisão, não obstante a Lei nº 12-A/2008 e a atual LGTFP, deixaram de definir a função de motorista como uma carreira, resulta do exposto, bem como decorre do artigo 120º, nº 3, alínea A) da LGTFP, assim como do Quadro de Pessoal da União de Freguesias, que existe o posto de trabalho de motorista.
Para além dos invocados danos patrimoniais - que se agravam mensalmente, por ter de pagar do seu bolso o combustível, contrariamente aos demais colegas que são transportados gratuitamente por viaturas da Junta de Freguesia - a situação criada é passível de lesão dos direitos de funcionário e de valores humanos, designadamente o do respeito e dignidade da pessoa e, consequentemente, o da estabilidade emocional, o do direito à defesa da pessoa, da personalidade, carácter e imagem, aqui lembrados na peça processual - contra-alegações.
Deste modo, e contrariamente ao alegado, estão verificados os requisitos da providência cautelar sub judice.
Corrobora-se, pois, a leitura da sentença sob escrutínio; verificam-se todos os pressupostos da figura jurídica em análise.
Em suma:
-os requisitos para o decretamento de uma providência cautelar são, em termos muito simplistas, os seguintes: que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente (fumus boni juris); que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença decorra que os danos resultantes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência);
-a verificação destes requisitos tem que ser cumulativa;
-a apreciação judicial dos requisitos em presença deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, sob pena de se estar a entrar no domínio da apreciação de mérito;
-o Tribunal a quo deferiu a providência por reputar demonstrados os respectivos pressupostos;
-e, vistos os autos, nomeadamente o quadro factual exposto e o juízo a adoptar nesta sede, ele mostra-se assertivo;
-a decisão recorrida fez correcta leitura do instituto jurídico invocado e dos critérios legalmente consagrados no artigo 120º do CPTA, subsumindo com acerto os factos aos preceitos em que se fundou;
-manter-se-á, assim, na ordem jurídica, o que significa a não atendibilidade das conclusões da Recorrente.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 20/10/2017
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico Branco
Ass.: Rogério Martins