Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02253/17.6BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/11/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:PROCESSO CAUTELAR
Sumário:I. A alínea d) e e) do n.º 2 do art.º 116.º do CPTA, aplicável por força do n.º 6 do art.º 147.º do CPPT, prevê a possibilidade de o juiz indeferir liminarmente a providência cautelar por manifesta falta de fundamento da pretensão formulada e manifesta desnecessidade da tutela cautelar.
II. Nos termos do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no que concerne ao critério de decisão de periculum in mora, o Requerente em sede cautelar deve alegar em concreto e demonstrar de modo razoavelmente plausível, quer em termos de facto quer de direito, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.
III. Não tendo o Recorrente, nos termos do n. 1 do art. 120.º do CPTA demonstrado com factos concretos os fundamentos da pretensão formulada e ainda a necessidade de tutela cautelar, autoriza o Tribunal a rejeitar liminarmente a providência, nos termos das alíneas d) e e) do art.º 116.º do CPTA, sem que dai ocorra qualquer limitação ou esvaziamento direito à tutela jurisdicional efetiva do Requerente, com violação dos princípios constitucionais, previsto no artigo 268°, n.° 4 da CRP.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:F...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente, F..., melhor identificado nos autos, veio interpor recurso do despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datado de 13.10.2017, que indeferiu liminarmente a providência cautelar, proposta ao abrigo do n.º 6 do art.º 147.º do CPPT.

Com a interposição do recurso, apresentou alegações e formulou as conclusões que se reproduzem:

“(…)A) A presente providência cautelar destina-se, tão só, a impedir a iminente coexistência de duas reversões fiscais contra o Recorrente, com o mesmo objecto e com a mesma natureza.
B) Para o preenchimento do requisito do periculum in mora não é necessário que lesão irreparável seja actual e já se verifique, mas tão só que exista um risco sério ou um fundado receio de que a mesma venha a ocorrer - desde que assente em factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação.

C) Nos autos o Requerente demonstrou que existe desde já uma actuação concreta por parte da ATA e que tal actuação é precisamente a causadora desse justo receio, na medida em que juntou aos autos o despacho da ATA (Serviço de Finanças de Matosinhos-1), datado de 11-09-2017 (Doc. 4 junto com a petição inicial da providência cautelar), onde é determinada a preparação para a (nova) reversão contra o requerido.

D) E tal actuação foi materializada através da notificação daquele despacho ao Recorrente em 18/09/2017 e ainda através das notificações ao Recorrente do projecto da nova reversão e do convite para o exercício do direito de audição prévia, tudo na mesma data 18/09/2017.

E) Caso seja decidida a nova reversão contra o Recorrente, ainda na pendência da primeira, sem que a tal obste a presente providência cautelar, a lesão irreparável será consumada e qualquer providência cautelar a interpor, nessa altura, será já inútil.

F) Após a citação do Recorrente da segunda reversão, a interposição de uma providência cautelar não seria só inútil mas também ilegal, uma vez que a providência prevista no artigo 147°, n° 6 do CPPT não pode ser utilizada com a finalidade de suspender a cobrança de dívida tributária objecto de uma execução fiscal, visto que, em face ao disposto no artigo 52° da LGT e no artigo 169° do CPPT, tal suspensão só opera mediante prestação de garantia idónea no processo de execução fiscal ou a dispensa da sua prestação, verificando-se os requisitos para tal (cfr. Acórdão do TCAS, processo n° 0441/10 de 11/01/2011).

G) Se, por um lado, antes da decisão da concretização da segunda reversão contra o Recorrente o risco da lesão irreparável é meramente conjectural impossibilitando o decretamento da providência cautelar - conforme se interpreta e se estatui na Sentença recorrida - e se, por outro lado, é inútil e ilegal a providência cautelar quando requerida após a citação da reversão fiscal contra o Recorrente, tal significa que, na prática, o Recorrente deixará de ter a necessária tutela cautelar ao seu dispor.

H) A interpretação do artigo 147°, n° 6 do CPPT, nos termos em que é feita e aplicada nos autos pelo Tribunal a quo, esvaziando na prática o seu conteúdo, é assim inconstitucional por violação do direito à tutela jurisdicional efectiva, previsto no artigo 268°, n°4 da CRP.

I) O indeferimento liminar só deve ser decretado quando a improcedência da pretensão for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

J) E, nos presentes autos, mesmo que se colocasse a hipótese de ser dúbia a verificação do requisito legal do periculum in mora, tal não é, pelo menos, inequívoco e incontrovertível nesta fase preliminar do processo, nem é possível desde já, face ao exposto, uma pronúncia valorativa antecipatória sobre o mérito da providência requerida, no sentido de que a mesma não contem uma razoável probabilidade de procedência.

K) A presente providência cautelar cumpre os requisitos legais previstos no artigo 147°, n° 6 do CPPT, máxime o do periculum in mora, e é oportuna e adequada ao fim a que se destina.

L) A douta Sentença recorrida viola, entre outros, o artigo 147°, n° 6 do CPPT, e o artigo 268°, n°4 da CRP.

Termos em que V. Exas. julgando o presente recurso procedente e revogando a Douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, com todas as consequências legais, designadamente, decretando a providência requerida, farão, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA. (…)”

O Exmo. Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento por violação do artigo 147°, n.º 6 do CPPT, e o artigo 268°, n.º 4 da CRP.

3. JULGAMENTO DE FACTO
Com efeito o despacho recorrido, não autonomizou a matéria de facto, com vista à ao indeferimento liminar, no entanto e por que a mesma resulta dos atos importa agora proceder à sua autonomização, o que permitirá uma correta apreciação da situação factual:
1. Em junho de 2016, o Recorrente foi citado na execução fiscal n° 1821201401170759, na qualidade de revertido, por dívida de IRC de 2009 da devedora originária Lin Lines lnc, no valor de 4 820 219,64 €. (fls. 9 dos autos);
2. Por despacho de 31.05. 2016, constante de fls. 12 e 13, foi revertida a referida dívida, contra o responsável subsidiário, F…;
3. Em 22 de julho de 2016, o Recorrente apresentou no Serviço de Finanças de Matosinhos 1., oposição ao processo de execução fiscal, tendo por fundamentos a sua ilegitimidade nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, falta de notificação do tributo no prazo de caducidade, duplicação à coleta e por preterição de formalidades essenciais (fls. 14 a 24 dos autos);
4. Por ofício datado de 18.09.2017, foi notificado o mandatário do Recorrente do qual consta” Na qualidade de mandatário do executado….. fica notificado da revogação do despacho de reversão de 31-05-2006.
Foi apresentada oposição à execução, registada internamente com o n.º 182120160900178, ficando, face ao despacho de revogação, sem objeto.
Assim, fica notificado, para no prazo de 10 dias informar este Serviço de Finanças de mantêm interesse na oposição apresentada ou pretende desistir do pedido, concordando com o arquivamento dos autos.(….) fls. 25 dos autos;
5. Em 11.09.2017, sustentado em informação prestada pela Chefe de Finanças Adjunta, com a mesma data, foi proferido o seguinte despacho. “Na sequência da informação que antecede e, face aos elementos novos trazidos aos autos, e por considerar não se encontrar suficientemente fundamentado, revogo o despacho de 31-05-2016 que determinou a reversão da execução contra F…, NIF 2…, nos termos do n.º2 do art.º 208.º do CPPT.
(…)
Nestes termos, em face do disposto no art.º 23.º da LGT determino a preparação para a reversão dos autos contra o responsável subsidiário F..., NIF 2….
Notifique o mandatário do presente despacho bem como para, no prazo de 15 dias, exercer, querendo por escrito, o direito de audição…(…)” fls. 26 a 29 dos autos.
6. Em 28.09.2017, o Recorrente junto do Serviço de Finanças veio refutar o arquivamento do processo e manifestar interesse no prosseguimento da oposição (fls. 40);
7. Em 28.09.2017, o Recorrente em requerimento dirigido ao Sr. Juiz de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no processo de oposição Serviço veio requerer que não seja considerada a inutilidade superveniente da lide, ordenando o prosseguimento da oposição nos trâmites normais e julgada procedente a oposição
(fls. 41 a 42 dos autos).

4. JULGAMENTO DE DIREITO
A questão principal a resolver é a de saber se o despacho recorrido incorreu em erro de julgamento ao indeferir liminarmente a providência cautelar interposta ao abrigo do n.º 6 do art.º 147.º do CPPT, cujo pedido é … intimando-se a Autoridade Tributária e Aduaneira…. para abster-se de promover segunda reversão de dívidas fiscais de IRC de 2009 da LIn Lines Inc. (devedor principal) contra ora Requerente, enquanto a Oposição Judicial (relativa à mesma dívida e devedor principal) não transitar em julgado…
O depacho recorrido sutentou o indeferimento da providêcia cautelar com base em manifesta falta de fundamentos da pretensão cautelar formulada e manifesta desnecessidade da tutela cautelar, nos termos do n.º 1 e alíneas d) e e) do n.º 2 do art.º 116.º do CPTA.
Alega a Recorrente que o indeferimento liminar só deve ser decretado quando a improcedência da pretensão for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

E, nos presentes autos, mesmo que se colocasse a hipótese de ser dúbia a verificação do requisito legal do periculum in mora, tal não é, pelo menos, inequívoco e incontroverso nesta fase preliminar do processo, nem é possível desde já, face ao exposto, uma pronúncia valorativa antecipatória sobre o mérito da providência requerida, no sentido de que a mesma não contém uma razoável probabilidade de procedência.

Vejamos.

A alínea d) e e) do n.º 2 do art.º 116.º do CPTA, aplicável por força do n.º 6 do art.º 147.º do CPPT, prevê a possibilidade de o juiz indeferir liminarmente a providência cautelar por manifesta falta de fundamento da pretensão formulada e manifesta desnecessidade da tutela cautelar.

Como é evidente, e ao contrário de outros meios processuais nomeadamente nas ações administrativas de contencioso tributário, as providências cautelares permitem a existência de despacho liminar, para a eliminação ab initio de processos que não reúnam as condições mínimas de viabilidade, evitando o prosseguimento de processos votados ao insucesso e o congestionamento do fluxo processual nos tribunais.

No entanto o despacho liminar só deve ser de indeferimento quando o tribunal considere que é evidente ou manifesto que a pretensão deduzida é infundada que impede a emissão de uma prónuncia de mérito sobre a pretensão.

E não se diga que nesta fase não é possível uma pronúncia valorativa antecipatória sobre o mérito da providência requerida, no sentido de que a mesma não contém uma razoável probabilidade de procedência, pois o indeferimento liminar pauta-se por verificar se foram alegados factos que indiciam ou não os pressupostos da providência, nomeadamente, se perspetivam periculum in mora e o fumus boni iuris.

Vejamos então se o despacho recorrido ao indefeir a pretensão do Recorrente fez um correto julgamento dos pressupostos de facto, relativos à manifesta falta de fundamentos da pretensão cautelar formulada e à manifesta desnecessidade da tutela cautelar.

Como se refere in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de Mario Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, 4.ª edição 2017, pag 951 “A falta de fundamento da pretensão (alínea d)) prende-se com aplicação dos critérios de que depende adoção das providencias cautelares e há de fundar-se num juízo negativo sobre o preenchimento de alguns pressupostos de que depende aplicação desses critérios: por via de regra, de acordo com o regime dos n.ºs 1 e 2 do artigo 120.º do CPTA, o periculum in mora , o fumus boni iuris e a ponderação de danos. A desnecessidade de tutela cautelar (alínea e)) prende-se com o pressuposto do interesse processual ou interesse em agir e há de fundar-se num juízo negativo sobre a necessidade da tutela judiciária no plano cautelar em que a questão se coloca. (…)” (destacado nosso).
O despacho recorrido relativamente à falta de fundamentos da pretensão cautelar refere que “Assim, o Requerente deve alegar os seguintes requisitos de cujo preenchimento depende a concessão da providência:
(i) Uma actuação da administração tributária;
(ii) O fundado receio de uma lesão irreparável do requerente causado por aquela actuação.
Sucede que o Requerente não alega existir uma actuação da administração susceptível de causar uma lesão irreparável, pois, neste momento, a AT ainda não praticou o acto de reversão que o Requerente aponta como sendo aquele que irá causar aquela lesão. Segundo a alegação do Requerente, neste momento, a AT preparou o processo de reversão notificando-o para se pronunciar em sede de audição prévia, direito que o Requerente exerceu, pelo que é conjectural a prática do acto de reversão, o que não é suficiente para fundar o receio de uma lesão irreparável. A existir lesão ela será provocada pelo despacho de reversão e respectiva citação que ainda não ocorreram. (…)”
Da leitura da petição inicial resulta que o Recorrente pretende que seja decretada a providência de modo que a Administração Tributária se abstenha de promover a nova reversão de dívidas fiscais de IRC de 2009, da executada originária Lim Lines, Inc., contra si, enquanto a oposição judicial relativamente à mesma dívida não transitar em julgado.
Importa ponderar se estão verificados os pressupostos de que depende adoção da providência cautelar, previstos no artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que entrou em vigor em 1 de dezembro de 2015, nos termos do n.º 1 do artigo 15º deste diploma.
Dispõe o n.º 1 deste artigo: “1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente. (destacado nosso).
“(…) O primeiro destes [critérios de decisão] é o periculum in mora, isto é, o fundado receio de quando o processo principal chegue ao fim e sobre ele venha a ser proferida uma decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada às situações jurídicas envolvidas nos litígios, seja porque (a) a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil; seja, pelo menos, porque (b) essa evolução conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
(…)
Se não falharem os demais pressupostos de que depende a concessão das providências, elas devem ser concedidas quando o fundado receio se reporte à ocorrência de um dos tipos de situações enunciadas no n.º 1 do presente artigo.
Em primeiro lugar, quando os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se constituirá uma situação de facto consumado, o que significa que se tornará impossível, no caso do processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à restauração natural, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade.
(…)
Pelo contrário, deve considerar-se que o requisito do periculum in mora se encontra preenchido sempre que os factos concretos alegados pelo requerente permitam perspetivar a criação de uma situação de impossibilidade da restauração natural da esfera jurídica, no caso do processo principal vir a ser julgado procedente.
(…)
…as providências cautelares também devem ser concedidas quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela mora do processo, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de “ prejuízos de difícil reparação” no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspetiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente” . In Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administraticvos, de Mario Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, 4.ª edição 2017, pag 970 a 972, anotação n.º 2.
Nos termos do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no que concerne ao critério de decisão de periculum in mora, o Requerente em sede cautelar deve alegar em concreto e demonstrar de modo razoavelmente plausível, quer em termos de facto quer de direito, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.
Recai pois sobre o Requerente o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente e do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da existência do direito invocado.
Quanto ao pressuposto do periculum in mora, o Recorrente na petição inicial enunciou um conjunto de argumentos, sendo:
Receio de ser efetuada nova reversão, sem aguardar a decisão da oposição à execução fiscal, uma vez que já foi ordenada a preparação do processo de reversão e notificado do respetivo projeto;
A nova reversão provoca a coexistência de duas dívidas do contribuinte, com a constituição de uma nova dívida fiscal a rondar os 5 milhões de euros sem a extinção jurídica da anterior.
No que concerne ao prejuízo irreparável, alega o Recorrente que a lesão é irreparável, por que a Administração fica com um título executivo de 5 milhões a acrescer aos 5 milhões da primeira reversão.
E que o Requerente tem manifesta e óbvia insuficiência de meios de rendimentos e de bens penhoráveis, ou para o pagamento das quantias em causa, em confronto com os rendimentos, património registado e encargos familiares, nomeadamente, com filhos menores.
O prosseguimento da nova reversão fiscal e respetiva execução determina que venha a ser decretada a sua insolvência.
O prosseguimento da nova reversão fiscal e respetiva execução fiscal e penhoras impedi-lo-á de fazer face não só às suas despesas pessoais como também às despesas familiares e pagar empréstimo bancário concedido para o pagamento da sua habitação.
O que levaria ao Recorrente e sua família a encontrar-se não numa situação de insolvência, mas de uma insuportável e totalmente desproporcionada miséria e indulgência resultando em manifesto prejuízo irreparável.
Com efeito, existem factos que indiciam, a atividade da Administração no sentido de proceder à emissão de novo despacho de reversão, nomeadamente, os indicados nos factos 4 e 5 dos factos provados, ou seja, a revogação do despacho de reversão, ordenação da preparação do processo e a audição do requerente.
Numa tramitação processual normal seguir-se-á a emissão do despacho de reversão, o que in extremis poderia configurar um justificado receio da constituição de uma situação de facto consumado.
No entanto, tal não se verifica, uma vez que a Administração revogou o primeiro despacho de reversão, logo não há perigo de formação de segunda dívida e das mesmas coexistirem na ordem jurídica em simultâneo, pese embora se possa vir a discutir, em sede administrativa, se o ato de revogação foi tempestivo e legalmente efetuado.
Quanto à verificação de lesão irreparável, como refere o despacho recorrido é meramente conjetural, uma vez que alega a insuficiência de meios de rendimentos e de bens penhoráveis, ou para o pagamento das quantias em causa, em confronto com os rendimentos, património registado e encargos familiares, nomeadamente, com filhos menores, a hipotética insolvência, e que as eventuais penhoras a realizar impedirão de fazer face às suas despesas pessoais, às despesas familiares e pagar empréstimo concedido para o pagamento da sua habitação o que no seu entender
levaria o Recorrente e sua família a encontrarem-se numa insuportável e desproporcionada miséria e indulgência.
Os argumentos aventados pelo Recorrente colocam-se não são concretos e mensuráveis, somente hipotéticos prejuízos, pelo que não configuram a situação de prejuízo de difícil reparação.
E nesta conformidade, a providência cautelar apresenta manifesta falta de fundamentos, pois não são alegados em concreto pressupostos do periculum in mora.

No que concerne à manifesta desnecessidade da tutela cautelar, e como supra se disse esta prende-se com o pressuposto do interesse processual ou interesse em agir e há de fundar-se num juízo negativo sobre a necessidade da tutela judiciária no plano cautelar em que a questão se coloca.
O despacho fundamentou juízo negativo nos seguintes termosO Prof. Mário Aroso de Almeida afirma que “só parece existir interesse em agir em sede cautelar quando haja fundado receio de que se perca, no todo ou em parte, a utilidade prática da sentença pretendida no processo principal. Quando seja claro que falta esse interesse, não há, pois, necessidade de tutela cautelar e, portanto, o decretamento de uma providência, a ter lugar, já não desempenhará uma função verdadeiramente cautelar, mas de pura antecipação da tutela de fundo”. No caso em apreço, não há necessidade da tutela cautelar nos moldes requeridos pelo Requerente, pois neste momento não existe actuação da AT passível de provocar lesão irreparável, pelo que o deferimento da providência seria a antecipação da tutela de fundo.
Se a providência prevista no art.º 147.º, n.º 6 é uma concretização do princípio da tutela judicial efectiva prevista no art.º 26.º, n.º 4 da CRP que abrange a adopção das medidas cautelares adequadas, a providência deve ser adequada, o que não se verifica no caso dos autos, pois o Requerente tem tutela cautelar diversa da requerida e adequada aos interesses que pretende acautelar.
Com efeito, após a prolação do despacho de reversão e consequente citação (neste momento, hipotética, pois a AT poderá, ainda, pronunciar-se sobre as razões invocadas pelo Requerente sendo, em abstracto, possível a não prolação do despacho de reversão), o Requerente terá ao seu dispor tutela cautelar e executiva para obviar os efeitos lesivos da actuação da AT, através da qual poderá assegurar os interesses que pretende acautelar nos presentes autos, pelo que entende-se inadmissível intimar a AT a não praticar um acto, sob pena de intromissão ilegal na função administrativa por parte dos Tribunais e violação do princípio da separação de poderes. Além disso, tem ao seu dispor meios legais de reacção contra o despacho de revogação do despacho de reversão e não envio da oposição judicial por parte do OEF. (…)”

O que não nos merece qualquer reparo, pois após a emissão do despacho de reversão e citação, o Recorrente terá ao seu dispor tutela executiva e cautelar para o defender dos efeitos lesivos da atuação ilegal da Administração Fiscal.

Salienta-se ainda que, o Recorrente indica na petição inicial (ponto 72) que irá instaurar ação principal para reconhecimento de direito ou interesse legítimo em máteria tributária, ação cujo aplicação é residual, pois está condicionada à inexistência de outros meios contenciosos, que permitam assegurar tutela plena, eficaz e efectiva dos direitos ou interesses em causa, conforme estabelece o n.º 2 do art.º 147.º do CPPT.

Por fim o Recorrente alega que a interpretação do artigo 147.°, n.° 6 do CPPT, nos termos em que é feita e aplicada nos autos pelo Tribunal a quo, esvaziando na prática o seu conteúdo, é assim inconstitucional por violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto no artigo 268°, n.° 4 da CRP.

Com efeito o n.º 6 do art.º 147.º do CPPT, prevê a aplicação medidas cautelares a favor dos obrigados tributários.

Por sua vez, o n.º 4 do art.º 268.º da CRP estabelece explicitamente que a tutela jurisdicional efetiva se garante pela adoção de medidas cautelares adequadas.

No entanto, tais normativos não são de aplicação genérica e ilimitada, o uso das referidas medidas cautelares dependem da verificação dos pressupostos para as quais foram criadas e objetivadas.

Não tendo o Recorrente, nos termos do n.º 1 do art. 120.º do CPTA demonstrado com factos concretos os fundamentos da pretensão formulada e ainda a necessidade de tutela cautelar, autoriza o Tribunal a rejeitar liminarmente a providência, nos termos das alíneas d) e e) do art.º 116.º do CPTA, sem que daí ocorra qualquer limitação ou esvaziamento direito à tutela jurisdicional efetiva do Requerente, com violação dos princípios constitucionais, previsto no artigo 268°, n.° 4 da CRP.

E assim formulamos a seguinte conclusão:

I. A alínea d) e e) do n.º 2 do art.º 116.º do CPTA, aplicável por força do n.º 6 do art.º 147.º do CPPT, prevê a possibilidade de o juiz indeferir liminarmente a providência cautelar por manifesta falta de fundamento da pretensão formulada e manifesta desnecessidade da tutela cautelar.
II. Nos termos do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no que concerne ao critério de decisão de periculum in mora, o Requerente em sede cautelar deve alegar em concreto e demonstrar de modo razoavelmente plausível, quer em termos de facto quer de direito, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.
III. Não tendo o Recorrente, nos termos do n. 1 do art. 120.º do CPTA demonstrado com factos concretos os fundamentos da pretensão formulada e ainda a necessidade de tutela cautelar, autoriza o Tribunal a rejeitar liminarmente a providência, nos termos das alíneas d) e e) do art.º 116.º do CPTA, sem que dai ocorra qualquer limitação ou esvaziamento direito à tutela jurisdicional efetiva do Requerente, com violação dos princípios constitucionais, previsto no artigo 268°, n.° 4 da CRP.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se o despacho recorrido.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 11 de janeiro de 2017
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento