Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00789/09.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/20/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:PROGRESSÃO NAS CATEGORIAS; LEI DO ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2008;
ARTIGOS 19º E 20º DO DEC.-LEI Nº 353-A/89, DE 16-10; ARTIGOS 46º A 48º E 113º Nº 1 DA LEI Nº 12-A/2008.
Sumário:1. A Lei do Orçamento do Estado para 2008 (Lei nº 67-A/2007, de 31-12), ao prever que a partir de 1 de Janeiro de 2008, a progressão nas categorias ficaria na alçada da Lei que viesse a definir e a regular novos regimes de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, revogou tacitamente, por incompatibilidade de normas, a progressão automática nas carreiras conforme resultava até então do art. 19º do Dec.-Lei nº 353-A/89, de 16-10, mas mantendo-se este, em todo o demais, em vigor até à entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008, de 27-2.

2. A alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores da função pública faz-se, no período de 1/1 a 1/3/2008, de acordo com o estabelecido nos artigos 46º a 48º e 113º nº 1 da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, em virtude do artigo 119º nº 1 da Lei nº 67-A/2007, de 31 de Dezembro, ter revogado os artigos 19º e 20º do DL nº 353-A/89, de 26 de Outubro, e de ter determinado a aplicação do regime estabelecido naquela lei (12-A/2008), à qual se referiu como lei futura e que lhe veio conferir exequibilidade, no período em causa.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local
Recorrido 1:Município do Porto
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Condenação à Prática Acto Devido (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
O Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local, em representação de [S.T.A.L.], em representação de JMP, JBR e FPC, veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pelo qual foi julgada procedente a acção administrativa especial conexa com actos administrativos, intentada pelo recorrente contra o recorrido, para pedir a condenação Município do Porto “(…) a emitir decisão pela qual reconheça o direito dos trabalhadores objecto dos seus requerimentos”, a progressão de escalão, e, bem assim, a proceder “(…) ao pagamento de diferença salariais correspondentes àquela mudança de escalão (…), acrescido de juros de mora até efetivo pagamento”.

Invocou a errónea aplicação ao caso concreto das normas jurídicas do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro.

O recorrido não contra-alegou.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

A) Vem o presente recurso interposto do douto acórdão que julgou procedente a acção administrativa especial, e que condenou o ora Recorrente “a emitir decisão pela qual reconheça o direito dos trabalhadores objecto dos seus requerimentos” (progressão de escalão) e “ao pagamento de diferenças salariais correspondentes àquela mudança de escalão”, acrescido de juros de mora até efectivo pagamento.

B) O acórdão do tribunal a quo enferma de vício de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, máxime no que respeita à aplicação do artigo 19º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro.

C) A sentença que se ataca no presente recurso propugna que, tendo-se esgotado o prazo máximo de aplicação da Lei nº 43/2005, de 29 de Agosto, alterada pela Lei 53-C/2006, de 29 de Dezembro, que veio prorrogar esse prazo de não contagem do tempo de serviço até 31 de Dezembro de 2007, deveria aplicar-se novamente o artigo 19º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, desde o dia 1 de Janeiro de 2008 até à entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas.

D) Tal interpretação não poderá proceder, pois o nº 1 do artigo 1º da Lei nº 43/2005, de 29 de Agosto determina que “o tempo de serviço prestado pelos funcionários, agentes e outros trabalhadores da administração pública central, regional e local e pelos demais servidores do Estado entre a data de entrada em vigor da presente lei e 31 de Dezembro de 2006 não é contado, para efeitos de progressão, em todas as carreiras, cargos e categorias, incluindo as integradas em corpos especiais”, sendo que a Lei 53-C/2006, de 29 de Dezembro, no seu artigo 4º, prorroga a vigência desta medida até 31 de Dezembro de 2007, “salvo se diploma concretizador da revisão dos sistemas de vínculos, carreiras e remunerações expressamente o determinar”.

E) É um facto que no dia 1 de Janeiro de 2008, o diploma legal relativo ao “regime de vínculos, carreiras e remunerações” não estava publicado, mas tal não significa que entrou novamente em vigor o Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro.

F) Pelo contrário, o legislador, prevendo que iria existir um vazio a partir de 1 de Janeiro de 2008 até à entrada em vigor do novo diploma, criou um regime transitório de progressão nas carreiras, que se materializou no nº 1 do artigo 119º da Lei do Orçamento de Estado de 2008.

G) Foi por este caminho que o recorrente seguiu, por duas ordens de razão.

H) Em primeiro lugar, porque não se vislumbra nenhuma diferença entre os efeitos produzidos pela Lei nº 43/2005, de 29 de Agosto, pela Lei 53-C/2006, de 29 de Dezembro e pela Lei do Orçamento de Estado de 2008 (LOE), no que concerne à não aplicação do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, porquanto o nº 1 do artigo 119º da LOE, reproduzido no artigo 6º, é claro e não suscita, a nosso ver, quaisquer questões de inconstitucionalidade formal ou material.

I) Depois, tal como já foi referido na contestação, o recorrente não está sozinho na interpretação que faz da lei.

J) No ofício circular nº 16/GDG/07 da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (Ministério das Finanças e da Administração Pública), com a data de 26 de Dezembro de 2007, que se encontra no processo administrativo, determina-se que “deverão os órgão e serviços da Administração Pública aguardar pela publicação da Lei que definirá e regulará os novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exerçam funções, para em cumprimento das regras nela previstas, proceder às progressões nas categorias que – repete-se – produzirão sempre os seus efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2008”.

K) A posição do recorrente foi informada a todos os seus funcionários, como se retira do processo administrativo, nomeadamente no comunicado de 4 de Fevereiro de 2008, cuja cópia se encontra na última página de cada um dos processos dos três funcionários.

L) Assim, à luz da leitura dos diversos diplomas supra mencionados, a pretensão do recorrido não poderá ser atendida, na medida em que a contagem do tempo de serviço realizada pelos três funcionários aqui representados por aquele é feita com base em preceitos legais que não vigoravam em Janeiro de 2008 e que não poderão por isso ser aplicados.

M) Numa palavra, a decisão judicial a quo aplicou o articulado do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, pelo que enferma assim do vício de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, devendo por isso ser revogada.


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II – Matéria de facto.

1. Os representados do autor são funcionários dos quadros de pessoal da Câmara Municipal do Porto, com as categorias de encarregado de serviços de higiene e limpeza, auxiliar administrativo e fiscal de obras, respectivamente, facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respectivos articulados.

2. Em 04.03, 01.02 e 14.02, de 2008, dirigiram ao Presidente da Câmara Municipal do Porto um requerimento peticionando a mudança para os escalões 4º, 5º e 8º das respectivas carreiras, conforme emerge de análise de fls. 7 a 9 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

3. Até à presente data não houve pronúncia expressa por parte da entidade demandada no tocante às pretensões formuladas pelos representados do autor, acabadas de referir, conforme emerge da análise global dos autos.

4. O representado do autor JMP encontrava-se posicionado no quarto escalão, mas com vencimento de terceiro escalão desde Setembro de 2001, facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respectivos articulados.

5. O representado do autor JBR encontrava-se posicionado no quarto escalão desde 28 de Setembro de 2001, facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respectivos articulados.

6. O representado do autor FPC encontrava-se posicionado no sétimo escalão desde 28 de Setembro de 2001, facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respectivos articulados.

7. Dá-se por reproduzido todo o teor, quer dos documentos juntos aos autos, quer dos documentos que integram o processo administrativo apenso.


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III - Enquadramento jurídico.

A única questão que aqui importa apreciar é a de saber se é de aplicar ao caso concreto o artigo 119º, nº 1, da Lei nº 67-A/2007, de 31/12 (Lei do Orçamento do Estado para 2008) ou artigos 19º e 20º do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16/10.

O artigo 1º, nº 1, da Lei nº 43/2005 de 29/08 veio determinar:

“O tempo de serviço prestado pelos funcionários, agentes e outros trabalhadores da administração pública central, regional e local … entre a data de entrada em vigor da presente lei e 31 de Dezembro de 2006 não é contado, para efeitos de progressão, em todas as carreiras, cargos e categorias, incluindo as integradas em corpos especiais.”

Esta Lei entrou em vigor em 30.08.2005 – artigo 4º da mesma Lei.

Este efeito de congelamento da progressão na carreira foi prorrogado até 31.12.2007, pelo artigo 4º da Lei nº 53-C/2006, de 29/12, que dispôs:

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos até 31 de Dezembro de 2007, salvo se diploma concretizador da revisão dos sistemas de vínculos, carreiras e remunerações expressamente determinar data anterior”.

No caso dos autos o recorrido não questiona o posicionamento dos associados em matéria de escalões e que estes tenham completado em Janeiro de 2008 os módulos de tempo necessários para a mudança para os escalões 4º, 5º e 8º das suas respectivas carreiras, somente contestando que à situação dos autos seja aplicável o regime do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, considerando aplicável a norma do artigo 119º nº 1 da Lei nº 67-A/2007, de 31/12 [Orçamento do Estado para 2008].

No Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 11.03.2010, processo nº 05766/09, decidiu-se:

“A Lei do Orçamento do Estado para 2008 (Lei nº 67-A/2007, de 31-12), ao prever que a partir de 1 de Janeiro de 2008, a progressão nas categorias ficaria na alçada da Lei que viesse a definir e a regular novos regimes de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, revogou tacitamente, por incompatibilidade de normas, a progressão automática nas carreiras conforme resultava até então do art. 19º do Dec.-Lei nº 353-A/89, de 16-10, mas mantendo-se este, em todo o demais, em vigor até à entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008, de 27-2.

Em sentido contrário a esta jurisprudência pronunciou-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 26.05.2010, processo n.º 0958/09:

À progressão nas categorias por mudança de escalão por um módulo de tempo de 4 anos no escalão imediatamente anterior, que se vença entre 01-01-2008 e 01-03-2008, é aplicável o disposto nos artºs 19º e 20º do DL nº 353-A/89, de 16 de Outubro, diploma que só veio a ser revogado pela Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro (novo regime de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas), a qual fixou a sua entrada em vigor e a respectiva produção de efeitos em data posterior à da sua publicação”.

Contudo o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 16.11.2011, no processo nº 0220/11 (Pleno), uniformizou a jurisprudência nesta questão, decidindo:

A alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores da função pública faz-se, no período de 1/1 a 1/3/2008, de acordo com o estabelecido nos artigos 46º a 48º e 113º nº 1 da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, em virtude do artigo 119º nº 1 da Lei nº 67-A/2007, de 31 de dezembro, ter revogado os artigos 19º e 20º do DL nº 353-A/89, de 26 de Outubro, e de ter determinado a aplicação do regime estabelecido naquela lei (12-A/2008), à qual se referiu como lei futura e que lhe veio conferir exequibilidade, no período em causa”.

São os seguintes os fundamentos desta posição:

«…o DL n.º 353-A/89 não foi, de facto, expressamente revogado pela Lei n.º 67-A/2007, que também não regulou toda a matéria naquele diploma regulado, pelo que só implicitamente pode ter sido revogado (cfr. artigo 7.º do C. Civil).

Quanto a esta revogação implícita, não procede o argumento da dupla revogação, pois que o tratamento feito pela Lei n.º 67-A/2007 de matéria do DL n.º 353-A/89 passível de operar a sua revogação foi meramente parcial, tendo continuado em vigor muitos outros preceitos deste último diploma passíveis de serem revogados.

Essa revogação, ou não, há-de, assim, ser encontrada no âmbito da interpretação conjugada do quadro normativo potencialmente aplicável, que deverá procurar reconstituir o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada (artigo 9.º do C. Civil).

Vejamos, então.

O regime do estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública e a estrutura das remunerações base das suas carreiras e categorias era regulado, ao tempo em que a representada do Autor se posicionou no escalão em relação ao qual pretendia progredir, (23/10/2001), pelo DL n.º 353-A/89, de 16 de Outubro.

De acordo com o estabelecido no artigo 19.º deste diploma, “A progressão nas categorias faz-se por mudança de escalão” (nº 1), e “A mudança de escalão depende da permanência no escalão imediatamente anterior dos seguintes módulos de tempo: a) Nas carreiras horizontais, quatro anos...” (nº 2).

Por sua vez, o seu artigo 20º dispõe que “A progressão é automática e oficiosa” (nº 1), e que “O direito à remuneração pelo escalão superior vence-se no dia 1 do mês seguinte ao do preenchimento dos requisitos estabelecidos no artigo anterior...” (nº 3).

A Lei nº 43/2005, de 29 de Agosto veio determinar “a não contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e o congelamento do montante de todos os suplementos remuneratórios de todos os funcionários, agentes e demais servidores do Estado [desde a data da sua entrada em vigor, 30/08/2005] até 31 de Dezembro de 2006”.

A vigência destas medidas de congelamento foi, entretanto, prorrogada por mais um ano pela Lei nº 53-C/2006, de 29 de Dezembro, cujo artigo 4º prescreveu: “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos até 31 de Dezembro de 2007, salvo se diploma concretizador da revisão dos sistemas de vínculos, carreiras e remunerações expressamente determinar data anterior.”

Pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 109/2005, de 2/6/2005, publicada no DR. n.º 124, I Série B, de 30-6-2005, foi decidido “determinar a revisão do sistema de carreiras dos funcionários públicos e dos demais servidores do Estado”, designadamente no que concerne a “criar alternativas aos mecanismos automáticos de evolução profissional e remuneratória que permitam uma rigorosa planificação da evolução orçamental em matéria de despesas de pessoal” [n.º 1, alínea h)].

Na sequência desta resolução, foi desencadeado o respectivo processo legislativo, que culminou com a aprovação em Conselho de Ministros de 14/6/2007 da proposta de lei n.º 152/X, da qual constava a entrada em vigor da lei a que daria origem em 1/1/2008 (artigo 117.º, n.º 1) e a revogação do DL n.º 353-A/89 [artigo 116.º, alínea u)].

Esta proposta foi aprovada pela Assembleia da República, tendo sido remetida para promulgação do Senhor Presidente da República, que a recebeu em 29/11/2007 (Decreto n.º 173/X). O Senhor Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional que aferisse da conformidade constitucional de algumas normas desse diploma [artigo 2.º, n.º 3, artigo 10.º, n.º 2, artigo 68.º, n.º 2, artigo 80.º, n.º 1, alíneas a) e c), artigo 101.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2, e artigo 112.º, n.º 1, alíneas a), b) e c)], que, por acórdão de 20/12/2007, publicado no DR. n.º 9, 1.ª série, de 14/1/2008, julgou inconstitucionais as normas constantes dos artigos 2.º, n.º 3, 10.º, n.º 2 e 68.º, n.º 2 (que tratavam da aplicação da normação contida na lei, por remissão, aos juízes) e dos artigos 36.º, n.º 3 e 94.º, n.º 2 (que se reportavam à retenção cautelar automática de metade da remuneração base de funcionário indiciado responsável pela celebração de contratos de prestação de serviços inválidos) e não julgou inconstitucionais as restantes normas questionadas.

O diploma, que, na sua versão inicial, entraria em vigor em 1/1/2008, voltou, novamente, à Assembleia da República, que o expurgou das apontadas inconstitucionalidades e o aprovou em 18 de Janeiro, tendo sido publicado, após promulgação e referenda do dia 20 do mesmo mês, no dia 27/2/2008, dele constando que entraria em vigor no dia 1 do mês seguinte ao da sua publicação (artigo 118.º, n.º 1) e que produziria efeitos, no que à alteração do posicionamento remuneratório diz respeito, na mesma data (n.º7 do mesmo preceito).

Quanto a essa alteração, o legislador, após ter estabelecido a possibilidade do dirigente máximo do serviço decidir, em face da disponibilidade das verbas orçamentais, o universo das carreiras e categorias onde as alterações do posicionamento remuneratório podiam ocorrer (artigo 46.º), estabeleceu a regra geral dessas alterações, que assentava no mérito (artigo 47.º) e que, na falta de lei em contrário, se reportava a 1 de Janeiro do ano a que tivesse lugar (n.º 7 do mesmo preceito), estabelecendo situações excepcionais no seu artigo 48.º. Resultando ainda, da conjugação dos artigos 47.º, n.º 6 e 113.º, n.º 1, do diploma que podia haver alterações obrigatórias, independentemente dos universos estabelecidos de acordo com o artigo 46.º, a partir de 1/1/2008.

Em 31/12/07 foi publicada a Lei n.º 67-A/2007 (Orçamento de Estado para 2008), cujo artigo 119.º prescreveu, no seu n.º 1: “A partir de 1 de Janeiro de 2008, a progressão nas categorias opera-se segundo as regras para alteração do posicionamento remuneratório previstas em lei que, na sequência da Resolução do Conselho de Ministros nº 109/2005, de 30 de Junho, defina e regule os novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, produzindo efeitos a partir daquela data.”

O que se infere da conjugação do quadro normativo enunciado é, assim, quanto a nós, que o legislador, absolutamente conhecedor de todo esse quadro e do processo legislativo conducente à Lei n.º 12-A/2008, nomeadamente do provável atraso da entrada em vigor da nova lei, bem como de que em 31/12/2007 terminava o descongelamento da progressão na carreira pelo simples decurso do tempo (artigo 4.º da Lei n.º 53/2006), que não pretendia que continuasse a fazer-se dessa forma, e para que não restassem dúvidas de que assim não seria a partir de 1/1/2008, produziu esta norma (artigo 119.º, n.º 1, da Lei n.º 67-A/2007), que qualificou expressamente de “transitória” e através da qual definiu que, para o período decorrente entre 1/1/2008 e a entrada em vigor do diploma futuro, que referenciou, essa progressão se faria segundo as regras dessa futura lei, de cujo conteúdo, que a tornaria exequível, se apropriou.

Defende o recorrido que o artigo 119.º da Lei n.º 67-A/2007 não pode ser considerado como uma disposição transitória, pela simples razão de que as disposições transitórias contêm sempre um regime concreto, seja fazendo perdurar o da anterior lei ou criando um próprio, quando, no caso, este preceito limita-se a remeter para uma lei futura cujo regime se desconhece.
Mas não lhe assiste razão, porquanto, como resulta do expendido, o regime da lei futura era perfeitamente conhecido à data da aprovação dessa lei. O que não era conhecido era a data da sua entrada em vigor, por força das referenciadas vicissitudes. E, por isso, estando em causa despesas que deviam ser orçamentadas, o legislador acautelou essa matéria, definindo que o regime aplicável seria o da nova lei e, consequentemente, que não era aplicável o regime do DL n.º 353-A/89.


Essa nova lei viria conferir-lhe exequibilidade (cfr., sobre esta temática, o Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 000032001, de 20/12/2001, com abundante doutrina).

Donde resulta que o artigo 119.º, n.º 1, da Lei n.º 67-A/2007 revogou, implicitamente, contrariamente ao que considerou o acórdão recorrido, os artigos 19.º e 20.º do DL n.º 353-A/89, pois que, de acordo com a doutrina do referido parecer, que se sufraga, a Lei n.º 67-A/2007, “ainda que inexequível, logo que entre em vigor, tem o condão de revogar, como qualquer outra, todas as normas anteriores com ela incompatíveis, nos termos do n.º 2 do artigo 7.º do Código Civil”.

O acórdão fundamento chegou à mesma conclusão, seguindo um percurso interpretativo idêntico, mas com uma pequena diferença no quadro que elaborou e que consistiu em considerar integrada aquela norma transitória do Orçamento de Estado para 2008 na Lei n.º 12-A/2008, como norma transitória desta. O resultado é o mesmo, a revogação dos artigos 19.º e 20.º do DL n.º 353-A/89, que se considera ter ocorrido.

O preceito em causa teve, assim, como considerou o acórdão fundamento, o duplo efeito de derrogar a aplicação do regime estabelecido nos artigos 19.º e 20.º do DL n.º 353-A/89 e de determinar a aplicação da normação da lei nova – a Lei n.º 12-A/2008 – a partir de 1/1/2008.»

Tendo em conta a necessidade de segurança e certezas jurídicas e não vendo razões imperiosas que nos levem a desviar da corrente jurisprudencial iniciada pelo Tribunal Central Administrativo Sul e confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, em Pleno, impõe-se aqui a decisão de improcedência da acção, e, logo, de procedência do recurso jurisdicional.

Isto porque o autor não invocou - e por isso não provou – que os seus representados preenchiam os requisitos para ascender na escala salarial, de acordo com as regras impostas pelos artigos 45º a 48º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.

Assim, com estes fundamentos, o recurso merece provimento, devendo revogar-se a decisão recorrida.


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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que:

A) Revogam a decisão recorrida.

B) Julgando a acção totalmente improcedente.

Sem custas, por delas estar isento o recorrente – artigo 4º nº 2 alª d) do Regulamento das Custas Processuais.


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Porto, 20 de Maio de 2016
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Garcia
Ass.: Esperança Mealha