Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário | |
Contencioso: | TRIBUTÁRIO |
Data: | 12/11/2006 |
Processo: | 01468/06 |
Nº Processo/TAF: | 132/01 TAF LISBOA |
Magistrado: | CARLOS BATISTA |
Descritores: | INDÍCIOS DE FRAUDE CUSTOS FISCAIS FALTA DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS |
Texto Integral: | 7 Excelentíssimos Senhor Juízes Desembargadores O Ministério Público vem emitir parecer nos termos seguintes: 1 – D .................. , S.A, veio interpor o presente recurso jurisdicional da douta sentença de fls. 146 a 152, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, relativa ao exercício do ano de 1995. Alega, em síntese: 1 – Que a sentença acatou, erradamente, a decisão tomada pela administração tributária de efectuar correcções ao lucro tributável com base na natureza fictícia dos pagamentos feitos a dois fornecedores, decidindo que competia à recorrente a prova de que as operações subjacentes às referidas facturas se haviam realizado, por força do disposto no artigo 74º da LGT, norma que não pode ser aplicada ao caso dos autos; 2 – Que devem ser aceites como custos fiscais as importâncias suportadas pela recorrente com essas facturas, bem como com os custos do material retomado aos CTT e com as rendas de locação de um imóvel à AGII; 3 – Que houve falta de diligências probatórias: a inquirição de testemunhas que havia indicado. 2 – É inequívoco que, à data dos factos, AT tinha o dever de fundamentar de facto e de direito as decisões em matéria tributária que afectassem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes, decorrendo esse dever de uma forma genérica dos artigos 268º, nº 3, da Constituição da República, 125º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 21º do Código de Processo Tributário (CPT). Por outro lado, o nº 1 do artigo 76º do CPT estabelecia que o processo de liquidação se instaura com as declarações dos contribuintes. Essas declarações apresentadas pelos contribuintes à Administração Tributária gozam da presunção de veracidade, de acordo com o estatuído no nº 1 do artigo 32º da Lei 106/88, de 17 de Setembro (autorização legislativa do CIRS e CIRC): “a administração fiscal só poderá proceder à fixação dos rendimentos colectáveis quando o contribuinte não apresentar declaração ou quando os rendimentos declarados não corresponderem aos efectivos ou se afastarem dos presumidos na lei”; de igual modo, o artigo 78º do CPT apontava no mesmo sentido quanto ao valor probatório da escrita. Hoje em dia, essas presunções legais de veracidade das declarações apresentadas pelos contribuintes à AF e dos dados que constarem da sua contabilidade e escrita, se estiverem de acordo com a legislação comercial e fiscal, constam do nº 1 do artigo 75º da LGT. Conforme referem Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária, comentada e anotada, 2ª edição, 2000, a pág. 309, “Assim, nestes casos, se a administração tributária não demonstrar a falta de correspondência entre o teor de tais declarações, contabilidade ou escrita e a realidade, o seu conteúdo terá de considerar-se verdadeiro”. A jurisprudência aponta no mesmo sentido: “Cabe à Fazenda Pública, tanto no recurso administrativo como na impugnação junto dos Tribunais, o ónus da prova da existência dos pressupostos de facto e de direito do acto de liquidação oficiosa, seja por correcções técnicas ou métodos indiciários e presuntivos, constantes do relatório dos serviços de fiscalização” (cfr. Ac do TCA, de 22/05/2001, processo 3216/00). No caso dos autos, pese embora a douta sentença e o bem elaborado parecer do Mº Pº da 1ª Instância, afigura-se-nos que não há indícios seguros de que não se tivessem realizado as operações que estiveram na base dos pagamentos efectuados aos dois fornecedores. Na verdade, está demonstrado que a recorrente passou vários cheques, alguns dos quais foram directamente levantados pelos fornecedores em causa. Havia, de facto, um elemento susceptível de levantar sérias dúvidas quanto à credibilidade das operações em causa: existiam cheques contabilizados como pagamento aos dois fornecedores que foram depositados na mesma conta do B.... , nº 022/30/582.8. Todavia, não tendo sido possível apurar a identidade dos titulares da referida conta não pode valorar-se tal facto como indício forte de que as prestações de serviços não ocorreram. De acordo com a jurisprudência, cabe à Fazenda Pública o ónus da prova da existência dos pressupostos de facto e de direito do acto de liquidação oficiosa, seja por correcções técnicas ou métodos indiciários e presuntivos, constantes do relatório dos serviços de fiscalização, mas incumbe ao contribuinte o ónus da prova de que deu cumprimento às obrigações de natureza contabilística, impostas pela lei comercial e fiscal, v.g. o DL 410/89, de 21/12 (Plano Oficial de Contabilidade (cfr. Ac. do TCA de 08.05.2001, Processo nº 1270/98). Ora, a Administração tributária não logrou fazer prova da existência dos pressupostos de facto do acto de liquidação, devendo, em consequência, anular-se, nesta parte, a liquidação. 3 – Relativamente à correcção de custos não aceites fiscalmente (material retomado aos CTT e rendas de locação de imóvel) cumpre dizer o seguinte: De facto, na petição de impugnação a recorrente indicou como testemunhas, para além de outras, os “Gerentes de M .............Lda e de A ........., Lda a identificar em 8 dias; Em 12/12/2002 veio a impugnante pedir prorrogação de prazo (cfr. fls. 113); Em 14/01/2003 pediu mais 5 dias (cfr. fls. 116); Em 29/01/2003 solicitou o “derradeiro prazo de 5 dias” (cfr. fls. 119), o que foi deferido, como, aliás, todos os anteriores); E foi de facto o derradeiro, porque a partir daí nada mais disse; Por despacho de 10/10/2003, o Mº Juiz considerou não arroladas as testemunhas não identificadas (cfr. fls. 122), despacho notificado à impugnante que nada disse; Por despacho de 09/07/2005, foi entendido que os autos continham os elementos necessários para a decisão, sendo dispensáveis outras diligências (cfr. fls. 127); Notificado às partes, nenhuma delas reagiu, tendo, por isso tal despacho transitado. Ora, ainda que no final do requerimento de impugnação judicial a ora recorrente tenha arrolado testemunhas (algumas das quais não identificou, nem nunca veio a identificar), o certo é que não se opôs a que os autos fossem decididos sem a sua inquirição. Ao proceder desta forma fê-lo, certamente, após ter ponderado que a inquirição das testemunhas nenhum elemento relevante acrescentaria aos elementos já constantes dos autos. 5 – Em face do exposto, emito parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional, excepto no que respeita à correcção nº 1, referente a pagamentos aos dois fornecedores. |