Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário
Contencioso:TRIBUTÁRIO
Data:01/29/2007
Processo:01551/06
Nº Processo/TAF:324/05.0BELLE
Magistrado:CARLOS BATISTA
Descritores:PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DE EXERCÍCIOS
EXCEPÇÕES
Data do Acordão:03/28/2007
Disponível na JTCA:SIM
Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores


O Ministério Público vem emitir parecer nos termos seguintes:


1 – A EXCELENTÍSSIMA REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença de fls. 184 a 197, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que julgou procedente a impugnação judicial e, em consequência, determinou a anulação das liquidações, alegando, em síntese, “erro de julgamento, porquanto é valorada e fixada matéria de facto que não se subsume nas regras de direito invocadas na doutrina e jurisprudência que serviu de suporte à douta decisão”.

2 – Os factos provados na sentença são os seguintes:

“A Administração Fiscal efectuou as seguintes correcções ao IRC da Impugnante:
Acréscimo de € 1.432.509,46 e de € 2.044.250,96 referente aos exercícios de 2000 e de 2001, respectivamente, correspondentes aos resultados positivos da venda de bens imóveis, que entendeu deveriam ter sido reconhecidos antecipadamente como proveitos tributáveis em sede de IRC; a Impugnante realizou os proveitos em causa em 2000 e 2001 mas só os considerou na declaração de IRC de 2002.
Dedução de proveitos de € 35.284.72 e acréscimos de custos no montante de € 378.089,62 relativamente aos exercícios de 2000 e de 2001, respectivamente, resultantes da desconsideração das diferenças cambiais positivas e negativas reconhecidas contabilisticamente, em consequência da correcção descrita no ponto anterior. As respectivas transacções haviam sido acordadas em moeda estrangeira.
Acréscimo de € 187.049,21 e de € 12.469,95 referente, respectivamente, aos exercícios de 1999 e de 2000, pelo facto daquela ter considerado que os proveitos associados à alienação de títulos de golfe deveriam ter sido reconhecidos antecipadamente”.

3 – Para decidir como decidiu, o Mº Juiz “a quo” limitou-se a transcrever alguns artigos do CIRC e da LGT, bem como doutrina e jurisprudência do STA e deste TCA Sul.
A lei, a doutrina e a jurisprudência transcritas referem, em resumo, que o princípio da especialização dos exercícios consagrado no artigo 18º do CIRC, que determina que a cada ano fiscal de actividade da empresa devem ser imputados os proveitos e custos que nele tenham sido gerados ou suportados, deve ceder:
1. Nos casos em que haja imprevisibilidade ou manifesto desconhecimento das componentes positivas ou negativas e das obras de carácter plurianual (artigo 18º, nos 2 e 5 e 19º do CIRC);
2. Naquelas situações em que a administração fiscal não teve qualquer prejuízo com o erro praticado pelo contribuinte;
3. Quando esse erro não resultar de omissões voluntárias ou intencionais, com vista a operar as transferências de resultados entre exercícios.

Embora não o diga expressamente, da decisão resulta claramente a conclusão de que, no caso concreto, se terão verificado os pressupostos indicados, o que não sucedeu.
Desde logo, no caso dos autos, não estamos perante proveitos imprevisíveis ou desconhecidos, mas sim perfeitamente concretizados. Aliás, competia à impugnante o ónus da prova de que se encontrava numa das situações excepcionais em que lhe era permitido contabilizar no exercício seguinte proveitos auferidos no exercício anterior (cfr. Ac. deste TCA Sul, de 11/06/2002, citado na sentença sob recurso – fls. 194).
Por outro lado, porque a transferência de resultados acarretou um prejuízo para a administração fiscal, como, aliás, a própria impugnante reconhece nas contra-alegações, ao admitir que procedeu ao pagamento do imposto ainda que a uma taxa inferior em 2% (Conclusão I).
De facto, a taxa de IRC aplicável nos exercícios em que deveriam ter sido imputados os proveitos auferidos, ou seja, em 2000 e 2001, era de 32%; no ano em que foram tributados, ou seja, em 2002, já a referida taxa era de 30%.
Houve, assim, de facto, só por isso, um prejuízo para a Fazenda Pública, não contando com o retardamento no pagamento do imposto.
Acresce que, não decorre da matéria de facto dada como provada que a não contabilização dos proveitos nos anos em que foram auferidos não resultou de omissão voluntária ou intencional do contribuinte.

Podemos, assim, concluir que a matéria de facto dada como provada não permitia dar primazia ao princípio da justiça, consagrado no artigo 55º da LGT, em detrimento do princípio da especialização de exercícios, devendo, assim, dar-se provimento ao recurso.

4 - Porém, na sentença recorrida, depois de ter sido dado resposta positiva à questão de saber se o princípio da especialização de exercícios devia ceder, no caso concreto, considerou-se “desnecessário analisar as demais questões”.

As questões a analisar são as seguintes:
· A de saber se os acréscimos de € 187.049,21 e de € 12.469,95, referentes, respectivamente, aos exercícios de 1999 e de 2000 e reportados a proveitos associados à alienação de títulos de golfe deveriam ter sido reconhecidos antecipadamente; e
· A de saber se são devidos juros compensatórios pela impugnante.

Na fixação da matéria de facto que consta da sentença não são dados como provados nem como não provados factos que permitam reportar a determinado exercício aqueles proveitos, nomeadamente, a que exercício devem ser considerados esses proveitos e quais os motivos.
Tem, assim, de concluir-se que os elementos que constam dos autos não são suficientes para apreciar, em substituição, a globalidade das questões cujo conhecimento foi considerado prejudicado na decisão recorrida.

5 - Em conclusão, emito o seguinte parecer:
· Deve ser concedido provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a decisão recorrida;
· Deve ser ordenada a baixa dos autos ao TAF de Loulé, a fim de serem apreciadas as questões cujo conhecimento foi considerado prejudicado na decisão recorrida.