Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário
Contencioso:TRIBUTÁRIO
Data:01/08/2008
Processo:02157/08
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Carlos Monteiro
Descritores:ERRO DE ESCRITA
OPOSIÇÃO EXECUÇÃO
Data do Acordão:01/22/2008
Texto Integral:VENERANDOS JUIZES DESEMBARGADORES DO
TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL



Nos autos de recurso jurisdicional em referência, veio a recorrente impugnar a sentença de fls. 41 a 47 do TAF de Almada que julgou improcedente a oposição à execução fiscal e pede a revogação do decidido, para o que conclui que violou os artºs 204º e 263º do CPPT e 268º, 659º e 138º, nºs 3 e 4 do CPC, porque afinal do documento de liquidação consta o ano de 2003, quando efectivamente se reporta ao ano de 2000 e a sentença não teria respeitado os princípios da legalidade e da estabilidade da instância, ao fixar como provado o facto de a contribuição se reportar a 2000 e não ao ano de 2003 que da mesmo consta.
A Fazenda Pública não contra-alegou.
A meu ver, a sentença recorrida não sofre de qualquer censura razoável e o recurso improcederá.
Com efeito, sempre a ora recorrente entendeu existir um erro manifesto na indicação do ano de 2003, como resulta da petição e da alegação; a Fazenda Pública afirma no artº 1º da contestação à oposição, cfr. fls. 31, que se trata de erro, “por lapso do título executivo menciona 2003”; o parecer do Ministério Público de fls. 40 refere-se-lhe como sendo “manifestamente um lapso de inscrição” e a sentença afirma “que é manifesto que a referência ao ano de 2003 constitui um lapso” e portanto rejeitou a invocada falsidade do título.
É óbvio que nos deparamos com um erro de escrita, erro material, manifesto, ostensivo, patente e evidente, imediatamente apreensível por qualquer destinatário médio e que não suscitou qualquer dúvida aos intervenientes processuais.
Como resulta do disposto nos artºs 249º do CC e 148º do CPA, o erro de escrita confere o direito à sua rectificação pelo órgão competente para a revogação do acto, a todo o tempo e com efeitos retroactivos, oficiosamente ou a pedido dos interessados e respeitando-se a forma e a publicidade do acto rectificado e tanto basta aos princípios da boa fé, da proporcionalidade e da justiça na relação entre o impugnante e a Administração Tributária, nunca sendo caso de anulação da liquidação.
Sendo o lapso de escrita sempre rectificável nada mais é exigível, pois não se contestam os factos declarados e se admite o lapso com o sentido considerado na sentença, devendo conclui-se que está comprovado o facto que se quis declarar e foi erroneamente declarado, porque contido na declaração, como pressuposto da aplicação do artigo 249º do CC, que o erro de escrita se revele no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.
Daqui não poder concluir-se como o recorrente, pois mesmo até em julgamento, “Formulado, por erro de escrita, quesito que mereceu resposta negativa do tribunal, nada impede que face à demais prova produzida se conclua em sentido contrário à resposta negativa dada a um quesito que se fundou em erro de escrita." - Ac. do STA de 11.11.97, R. 42020.
Aliás, entendimento semelhante se seguiu no Ac. do TRL de 24.5.94, CJ 3,99: “O regime estabelecido no artigo 249º do Código Civil para o erro de cálculo ou de escrita dos negócios jurídicos é aplicável a actos jurídicos, nomeadamente a declarações de vontade não negociais produzidas no decurso de um processo judicial, atento o disposto no artigo 295º do Código Civil.”
No mesmo sentido vai o Ac. do STA de 18.10.84, BMJ 344, 443:
“I – É rectificável oficiosamente ou a requerimento do interessado o erro de escrita revelado no próprio contexto do acto. II – O despacho de rectificação integra-se no acto rectificado, do qual passa a fazer parte. III – Carecendo de autonomia, esse despacho não está sujeito a fundamentação própria e só o despacho rectificado a exige, caso seja subsumível ao disposto no artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 256-A/77. IV – Estando este devidamente fundamentado, improcede a arguição de vício de forma.”
De resto, não sendo necessário rectificar qualquer declaração e jamais estando em causa a sua autenticidade, deve condenar-se a recorrente como litigante de má fé, por ter deduzido dolosamente oposição cuja ilegalidade não ignorava e em especial por fazer uso manifestamente reprovável do processo, no recurso jurisdicional, constituindo-se em litigância de má fé, visto o disposto no artº 456º, nºs. 1 e 2, alíneas a) b) e d) do CPC e neste sentido ser uniforme a Doutrina e a Jurisprudência, como pode observar-se em Litigância de má fé, Rui Correia de Sousa e respectiva colectânea de arestos.
Esta é também a orientação constante do Tribunal Constitucional, como por exemplo no Ac. nº 660/99/T. Const., DR 2ª Série de 23.3.00:
“Tendo presente o conceito de má fé, plasmado no artigo 456º, nº 2 do Código de Processo Civil, e a «utilização maliciosa e abusiva» do processo que o mesmo pressupõe – e tal acontece quando se recorre a juízo em casos que se sabe não assistir o direito que se invoca, quando se usam os meios processuais para fim diverso daquele para que a lei os prevê e, de um modo geral, quando se atenta conscientemente contra a verdade por acção ou omissão ( cf. Acórdão nº 103/95, inter alia, publicado no Diário da República, 2ª série, de 17 de Junho de 1995).”
Em conclusão, não se confirmando qualquer censura à douta sentença recorrida, deverá ser confirmada e improceder o recurso, condenando-se a recorrente como litigante de má fé, em multa e indemnização à recorrida, se esta a pedir, nos termos dos artºs 456, nº 1 e 2, al. a) b) c) e d) do CPC, segundo o meu parecer.

O Magistrado do Ministério Público