Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário
Contencioso:TRIBUTÁRIO
Data:01/30/2007
Processo:01552/06
Nº Processo/TAF:179/04.2BELRS
Magistrado:CARLOS BATISTA
Descritores:IRC
BENEFÍCIO FISCAL
CRIAÇÃO LÍQUIDA DE POSTOS DE TRABALHO
Texto Integral:Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores


O Ministério Público vem emitir parecer nos termos seguintes:


1 – E ..... , S.A veio interpor o presente recurso jurisdicional do douta sentença de fls. 85 a 92, proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures (Lisboa 2), que julgou improcedente a impugnação judicial de autoliquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) relativo ao exercício de 1999, alegando, em síntese, que admitiu por contrato sem termo, durante o ano de 2000, 105 trabalhadores de idade não superior a 30 anos e durante esse mesmo ano cessaram o seu contrato de trabalho com a recorrente 45 trabalhadores de idade não superior a 30 anos, pelo que, no seu entender, se verificou uma efectiva criação líquida de 60 postos de trabalho (105 – 45 = 60) pelo que terá direito ao benefício fiscal previsto no artigo 48º-A do EBF correspondente àquele número de trabalhadores.

Salvo o devido respeito, os números invocados pela recorrente só podem dever-se a lapso, porquanto se reportam ao ano de 2000 quando, o que está em causa nos autos é o exercício de 1999. E relativamente a este exercício, o que estava em causa era a questão de saber se teria havido uma efectiva criação líquida de 96 postos de trabalho correspondente à diferença entre os trabalhadores admitidos por contrato de trabalho sem termo durante o ano de 1999, ou seja, 109 (cento e nove) e os que, durante o mesmo ano, cessaram o seu contrato de trabalho com a recorrente, 13 (treze).

2 – A sentença recorrida não merece, a nosso ver, qualquer censura, dado ter feito uma correcta interpretação e aplicação da lei à factualidade que, com pertinência, vem fixada.

O que está em causa no presente recurso jurisdicional é a interpretação da expressão “criação líquida e postos de trabalho”.
No entender da recorrente esta expressão abrange os trabalhadores que, embora admitidos em anos anteriores mediante contratos de trabalho a termo, tivessem passado, no decurso do ano de 1999, a trabalhar mediante contrato sem termo.
Não foi esta a tese acolhida na douta sentença recorrida e cremos que com toda a razão.

A Lei n.º 72/98, de 3 de Novembro, introduziu no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) um artigo 48.º-A, com a seguinte redacção:
Artigo 48.º-A

Criação de empregos para jovens
“1 - Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o ordenado mínimo nacional.

3 - A majoração referida no n.º 1 terá lugar durante um período de cinco anos a contar da vigência do contrato de trabalho.


Como se diz na sentença sob recurso, “a norma em análise, ao consagrar o benefício fiscal relativo à criação de emprego para jovens, não contém, ela própria, os critérios a que deve obedecer a determinação ou aferição da “criação líquida de emprego”, como situação jurídica pressuposta para a aquisição de tal benefício”.

Assim, entendeu-se na sentença recorrida que na ausência de definição de tal conceito se deveria fazer-se uso do conceito equivalente que consta do artigo 7º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 34/96, de 18 de Abril, em que se estabelece que “considera-se criação líquida de postos de trabalho o aumento efectivo do número de trabalhadores vinculados à entidade empregadora mediante contrato sem termo, resultante, designadamente, de um novo projecto de investimento”.

E acrescentou-se:
“ (…) a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo de trabalhadores já vinculados à impugnante não consubstancia aumento efectivo do número de trabalhadores, nem tão pouco de postos de trabalho”.

Como se diz no Ac. do STA, de 11/10/2006, Processo nº 0723/06, que nesta fase seguiremos de perto, “O conceito de «criação líquida de postos de trabalho» não é próprio de qualquer ramo do direito e, por isso, não se pode aplicar-se em matéria fiscal, ao abrigo do n.º 2 daquele art. 11.º, a definição de tal conceito dada noutro diploma, para efeitos não fiscais, pelo mero facto de aí ser fornecida.

Assim, a expressão «criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos» tem de ser interpretada, por força do disposto no n.º 1 daquele art. 11.º, à luz dos critérios gerais de interpretação das leis, enunciados no art. 9.º do Código Civil.

(…)

O referido art. 48.º-A criou incentivo à criação de emprego para jovens, pelo que deverá ter-se em conta a política legislativa de incentivos com esse fim, que vinha sendo seguida.

O Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 34/96, de 18 de Abril, referido na sentença recorrida, elucida a evolução legislativa que foi seguida em matéria de incentivos à “criação de emprego para jovens» (expressão utilizada na epígrafe do referido art. 48.º-A.

Refere-se nesse Preâmbulo o seguinte:

O Decreto-Lei n.º 445/80, de 4 de Outubro (lei quadro da política de emprego), estabelece, como uma das orientações fundamentais das medidas activas de emprego, que os apoios financeiros contemplem apenas a criação líquida de postos de trabalho, resultante da realização de um projecto de investimento gerador de novos empregos.

O Decreto-Lei n.º 89/95, de 6 de Maio, que instituiu um regime específico de incentivos à contratação de jovens à procura de primeiro emprego e de desempregados de longa duração, veio alterar, em desconformidade com aquele princípio fundamental, toda a prática seguida no que concerne à concessão de incentivos à contratação, assente no requisito essencial da criação líquida de emprego.
Essa alteração traduziu-se num desvirtuamento dos objectivos da política de emprego. Com efeito, o Decreto-Lei n.º 89/95, ao desligar a criação líquida de postos de trabalho da existência de um projecto de investimento e ao não exigir a criação de novos postos de trabalho, mas apenas a admissão de trabalhadores, conduziu, em muitas situações concretas, não à redução efectiva do desemprego, mas apenas à substituição, porventura até fictícia, de trabalhadores afastados antes da apresentação das candidaturas ao apoio financeiro oferecido pela lei. Daí a ineficiência do sistema, envolvendo desperdícios financeiros avultados e consequências significativas na promoção da precariedade do emprego.

Mostra-se assim indispensável fazer cessar a vigência do regime desses apoios financeiros, constante do Decreto-Lei n.º 89/95.

Tendo, no entanto, em conta que os jovens candidatos ao primeiro emprego e os desempregados de longa duração são grupos específicos da sociedade particularmente afectados pelo desemprego e com maiores dificuldades de inserção ou reinserção na vida activa, por razões de idade, inexperiência ou falta de qualificação, impõe-se a instituição, em moldes eficientes, de uma medida activa de emprego a favor desses grupos, desde que a contratação pelas empresas se insira num projecto de investimento gerador de novos postos de trabalho.
O presente diploma tem o objectivo de regular os apoios financeiros à contratação de candidatos ao emprego pertencentes aos referidos grupos, sob a condição de que, com ela, se esteja realmente a criar novos postos de trabalho.

Concretizando o desígnio legislativo anunciado neste Preâmbulo, o art. 7.º deste Decreto-Lei n.º 34/96 veio esclarecer
Artigo 7º
Criação líquida de postos de trabalho

1 - Considera-se criação líquida de postos de trabalho o aumento efectivo do número de trabalhadores vinculados à entidade empregadora mediante contrato sem termo, resultante, designadamente, de um novo projecto de investimento.
2 - A aferição da criação de postos de trabalho faz-se tendo em conta o número global de trabalhadores ao serviço da entidade empregadora, independentemente da natureza do vínculo contratual, no mês de Janeiro do ano civil anterior e no mês precedente ao da apresentação da candidatura.

Ora,apontando o teor literal do art. 48.º-A no sentido de se ter pretendido adoptar um regime idêntico ao previsto no Decreto-Lei n.º 34/96, quanto ao conceito de “criação líquida de postos de trabalho» e sendo a adopção de um regime semelhante, no que concerne aos pressupostos da concessão de incentivos, o único regime que assegura a coerência valorativa do sistema jurídico, postulada pelo princípio da unidade do sistema jurídico, tem de se concluir, como se concluiu na sentença recorrida, que apenas quando houver aumento do número global de trabalhadores da empresa num exercício fiscal há lugar à aplicação do benefício fiscal nele previsto”.

3 – Assim sendo, sido dado como provado que durante o ano de 1999 a impugnante admitiu 19 trabalhadores com idade não superior a trinta anos e mediante a celebração de contrato de trabalho sem termo e que, durante o mesmo ano, cessaram a sua actividade ao serviço da impugnante 13 trabalhadores com idade não superior a trinta anos, é óbvio que o aumento do número efectivo de postos de trabalho se ficou pelos 6, conforme a AT já havia decidido na reclamação graciosa deduzida pela ora recorrente.

4 - Em conclusão, entendendo que sentença recorrida não merece qualquer censura, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.