Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário
Contencioso:TRIBUTÁRIO
Data:11/10/2006
Processo:01454/06
Nº Processo/TAF:287/06.5BELRS
Magistrado:CARLOS BATISTA
Descritores:CUSTAS DA PARTE VENCIDA
FAZENDA PÚBLICA
Data do Acordão:11/21/2006
Disponível na JTCA:NÃO
Texto Integral:Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores


O Ministério Público vem emitir parecer nos termos seguintes:


1 – O EXCELENTÍSSIMO DIRECTOR-GERAL DOS IMPOSTOS veio interpor o presente recurso jurisdicional da douta sentença de fls. 70 a 76, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures (Lisboa 2) na parte em que o condenou nas custas do processo e da decisão que não atendeu o pedido de reforma da sentença quanto a custas por o Mº Juiz “a quo” ter entendido que “a circunstância de a sentença ter condenado a Fazenda Pública nas custas do processo constituirá, eventualmente, um erro de julgamento, que não se enquadra, salvo melhor opinião, na previsão do preceito, não constituindo, assim, fundamento de reforma da sentença, antes de recurso da mesma”.

Após alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões:

“a) A douta sentença recorrida (a fls. 70 dos autos), proferida pelo TAF de Loures em 7-8­-2006, condenou o ora recorrente em custas.
b) No decurso do procedimento administrativo aí apreciado a Administração solicitou ao contribuinte que viesse esclarecer a situação em causa
c) Não tendo o contribuinte esclarecido ou junto o que quer que fosse, a Administração teve que decidir com os elementos em seu poder
d) E face a esses elementos a decisão da Administração não poderia ser outra que não a fixação da matéria tributável por métodos indirectos nos termos dos números 1 e 4 do artigo 89°-A da LGT.
e) Só em sede de recurso judicial o contribuinte clarificou e comprovou a situação.
f) Se o tivesse feito oportunamente, nem o despacho do Director-Geral dos Impostos objecto de recurso judicial, nem, obviamente, esse recurso judicial, teriam tido lugar.
g) Assim quem deu causa ao processo foi o A., ora recorrido.
h) Pelo que, nos,termos do disposto n°1 do artigo 446° do CPC, deveria ter sido o ora recorrido - e não o Director-Geral dos Impostos - condenado nas custas do processo.
i) Ao não entender dessa forma a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento e viola a citada disposição legal.
j) Contra o erro de julgamento quanto a custas tanto se pode reagir por meio de requerimento da sua reforma dirigido ao tribunal que o cometeu, como por meio de recurso para o tribunal superior.
k) Ao entender de outra forma o Tribunal recorrido fez uma incorrecta interpretação da alínea b) do n°1 do artigo 669° do CPC”.


2 – Na minha perspectiva, a sentença recorrida não merece censura, dado haver feito correcta interpretação e aplicação da lei à factualidade apurada.

Controvertida é a questão de saber se, julgado procedente o recurso interposto da decisão do substituto legal do Director-Geral dos Impostos e anulado o acto recorrido deve ou não a Fazenda Pública ser condenada em custas.

O regime de responsabilidade pelo pagamento das custas está, em geral, fixado no artigo 446º do CPC, nos seguintes termos:
“1. A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
2. Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for
3. (…)”.

A primeira parte do nº 1 consagra o princípio fundamental nesta matéria: paga as custas a parte vencida. O facto objectivo da sucumbência é o fundamento da responsabilidade pelas custas.
Diz o Professor Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, volume II, 3ª edição, Reimpressão, pág. 205):
“Como se avalia a sucumbência? (…). Não descortinamos outro critério que não seja este: a equação entre o pedido que a parte formulou ou entre a pretensão que deduziu em juízo e a rejeição que encontrou por parte do tribunal. Sucumbência quer dizer insucesso; ora o insucesso mede-se e gradua-se pelos termos em que a decisão jurisdicional tenha deixado de acolher a pretensão da parte. Sucumbe em juízo o litigante que não conseguiu obter decisão favorável à sua pretensão, e sucumbe na medida em que a decisão lhe for desfavorável”.
O Código de Processo Civil manteve, em matéria de custas, o princípio da causalidade: paga as custas a parte que lhes deu causa, isto é, que pleiteia sem fundamento, que carece de razão no pedido formulado, que, em suma, exerce no processo uma actividade injustificada (cfr. Ac. STJ, de 18.11.1976, in BMJ, 261º-153).
A parte vencida suporta as custas precisamente porque deu causa a elas, porque a lide lhe é imputável.
Como ensina o Professor Manuel de Andrade (in “Noções Elementares de Processo Civil”, pp. 342/343) “a parte vencida é aquela que decaiu no pleito – aquela a quem a sentença seja desfavorável, por não ter acolhido a sua pretensão, já negando-lhe o direito que deduziu em juízo, ou não chegando a apreciar a sua pretensão (cf. art. 288º), já reconhecendo o direito deduzido pela outra parte”.

A segunda parte do nº 1 do artigo 446º do CPC prevê o caso de não haver vencido: paga as custas quem do processo tirou proveito.

No caso dos autos, o contribuinte E ... deduziu recurso da decisão do Senhor Director-Geral dos Impostos, datada de 17 de Março de 2006, de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 87º e nº 7 do artigo 89º-A, ambos da Lei Geral Tributária (LGT).
Este recurso foi julgado totalmente procedente, tendo a Fazenda Pública sido condenada em custas.

Ora, tendo ficado vencida e, independentemente da sua culpa, foi a Fazenda Pública que deu causa objectiva às custas do processo. Por consequência, é por elas responsável, nos termos previstos na 1ª parte do nº 1 e nº 2 do artigo 446º, do CPC.

Aliás, a jurisprudência é unânime no sentido de que “I - Em matéria de custas, a norma do art. 446° do CPC consagra o princípio da causalidade.
II - A responsabilidade pelas custas é independente da culpa e radica num factor objectivo: a sucumbência. (cfr. Ac. do STA, de 21/01/2003, Processo 0286/02; no mesmo sentido, cfr. Ac. do STA, de 09-02-2005, Processo 0680/03).

Entende, porém, a AT que o recorrente é que deu causa às custas porque no decurso do procedimento administrativo foi-lhe solicitado que viesse esclarecer a situação, o que não fez, tendo, por isso, levado a Administração a decidir com os elementos em seu poder; se o contribuinte, no decurso do procedimento administrativo, tivesse clarificado a situação, como fez em sede de recurso judicial, nem o despacho do Director-Geral dos Impostos seria o que foi nem o recurso judicial teria existido.
Ora, isto é, nem mais nem menos, do que a confissão expressa de que não se mostravam reunidos os pressupostos para a Administração Tributária recorrer à avaliação da matéria colectável pelo método indirecto.
Nos termos do nº 1 do artigo 89º-A da LGT, aditado pela Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro, “Há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no nº 4 ou quando declare rendimentos que mostrem uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela”.
Este normativo foi aditado à LGT no âmbito de uma reforma cujo objectivo era a luta contra a fraude e a evasão fiscais.

Ora, no caso dos autos, a Administração Tributária não averiguou, sequer, (o que não seria difícil, face ao carácter público do registo automóvel) se o contribuinte adquiriu e manteve, simultaneamente, no ano de 2002, os dois veículos em causa.

Em conclusão


1 - Em matéria de custas processuais vigora o princípio de que as mesmas são devidas pela parte que no processo a elas houver dado causa, entendendo-se como tal a parte que tiver ficado vencida, na proporção em que o for – artigo 446º, nº 2, do CPC.

2 - Não havendo vencido, paga custas quem retirou proveito do processo.

3 – No caso dos autos a recorrida viu a sua pretensão de avaliar a matéria colectável do recorrente E ... pelo método indirecto ser julgada totalmente improcedente.

4 – Nessa medida, é a mesma parte vencida, tendo sucumbido a 100%.

5 – Em consequência, deu causa objectiva às custas do processo, devendo, por isso, ser condenada a pagá-las.

6- Assim procedendo, bem andou a sentença recorrida.

Pelo exposto, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.