Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Tributário
Contencioso:TRIBUTÁRIO
Data:06/19/2007
Processo:01875/07
Nº Processo/TAF:10/02 TAF LISBOA
Magistrado:CARLOS BATISTA SILVA
Descritores:IMPOSTO AUTOMÓVEL (IA)
LIQUIDAÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA
AUTOLIQUIDAÇÃO
Texto Integral:Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores


O Ministério Público vem emitir parecer nos termos seguintes:


1 – M ….. , S.A, veio interpor o presente recurso jurisdicional da douta sentença de fls. 560 a 565, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa 2, que julgou provada a excepção dilatória atípica de inidoneidade do meio processual utilizado, que obsta a que o tribunal conhecesse do mérito da causa e, em consequência, absolveu da instância a Fazenda Pública.

Alega, em síntese:
      a) A liquidação de imposto automóvel (IA) é efectuada pelos serviços da Administração, apesar da intervenção dos contribuintes;

      b) Ainda que assim não fosse, o meio utilizado – a impugnação judicial - foi aquele que a Administração indicou expressamente à impugnante.

      c) Assim sendo, deverá reconhecer-se que “poderá o meio de reacção adequado ser ainda exercido, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão judicial”, ao abrigo do artigo 37º, nº 4 do CPPT.


2 – A impugnante deduziu impugnação parcial das liquidações de imposto automóvel efectuadas com base na Tabela I, anexa ao DL 40/93, de 18 de Fevereiro, (na redacção dada pelo artigo 43º da Lei 30-C/2000, de 29 de Dezembro), no montante global de € 466 918,80.

Entendendo que, in casu, estamos perante uma autoliquidação do imposto e que o fundamento da impugnação não é exclusivamente de direito, a douta sentença recorrida entendeu que a via contenciosa deveria ser obrigatoriamente precedida de reclamação prévia o que não sucedeu.

3 – De acordo com as disposições combinadas dos artigos 82º, nº 1 e 84º, nº 2, da Lei Geral tributária (LGT), quem faz a autoliquidação é o sujeito passivo.

Sujeito passivo é, nos termos do nº 3 do artigo 18º da LGT, a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.

Logo, a autoliquidação não é um acto exclusivo do contribuinte.

Como se diz no Ac. do STA, de 15/02/2006, processo 026622, “A doutrina fiscal vem sustentado que a autoliquidação é a que é feita por um particular, seja ele o contribuinte ou não. Um particular é aquele que não é autoridade pública. Neste sentido pode ver-se o estudo do Dr. LOURENÇO VILHENA DE FREITAS, a Autoliquidação: contributo para uma análise da sua Natureza Jurídica, in Ciência e Técnica Fiscal nº 405 (2002), páginas 15, 21 e 47.
A jurisprudência do Tribunal Supremo de Espanha também diz que a autoliquidação é a que é feita por um particular (sentenças de 9.12.1997 e de 15 de Dezembro de 1986)”.

Consta dos nos 2 e 3 do probatório que:
As liquidações de IA são efectuadas via informática através da “file transfer” do sistema informático da Direcção Geral das Alfândegas (…);

Aquando do envio informático das Declarações Aduaneiras de Veículos (DAV(s), o despachante preenche o mesmo com:
      As características do veículo;
      A matrícula do veículo.
      O valor de aquisição;
      A matéria colectável;
      O valor do IA (negrito nosso).

O papel da DGAIEC “limita-se a validar a declaração no sistema informático (…)”, conforme se diz na sentença recorrida.

Assim, conforme se constata dos DAV(s) juntos aos autos, quem fez a liquidação do imposto automóvel não foi uma autoridade pública, mas um “despachante ao serviço da impugnante” tratando-se, na verdade, de uma autoliquidação.

Como diz Sérgio Vasques in Fiscalidade, Revista de Direito e Gestão Fiscal, 10, de Abril de 2002, pág. 90, “o IA é sem dúvida um dos impostos melhor administrados do sistema fiscal português, encontrando-se já informatizado o respectivo procedimento de liquidação através de uma ligação dos operadores à Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo”.

“Ora, sendo caso de autoliquidação, a impugnante tinha que fazer uma reclamação graciosa necessária antes de deduzir a impugnação judicial, nos termos do artº 131º, nº 1, do CPPT. Não se conhece qualquer orientação genérica emitida pela administração tributária sobre o assunto, nem ela foi alegada pela impugnante.
A razão de ser da exigência legal da reclamação graciosa prévia à impugnação judicial prende-se com o facto de a autoliquidação não ser um acto tributário da Administração Tributária do qual se possa impugnar directamente. Daí que a lei exija que o sujeito passivo provoque esse acto da Administração Tributária a fim de dele deduzir impugnação judicial.
Não havendo acto tributário da Administração, tinha a impugnante que deduzir uma reclamação graciosa prévia à impugnação judicial. Não tendo feito essa reclamação, falta um pressuposto processual para a impugnação judicial, o que faz com que exista manifesta ilegalidade da sua interposição.
A impugnante, como contribuinte numa autoliquidação feita por terceiro, teria de fazer essa reclamação, pois “só então” podia impugnar (cfr. Prof. RUI DUARTE MORAIS, A Execução Fiscal, Almedina 2005, pág. 21)” (cfr. Acórdão do STA já citado).

4 – Por outro lado, não merece acolhimento a tese da recorrente de que o meio utilizado – a impugnação judicial - foi aquele que expressamente lhe foi indicado pela Administração, porquanto a “indicação” a que se refere nenhuma relevância teve na sua decisão de reclamar graciosamente ou impugnar pela simples razão de que quando chegou ao seu conhecimento já a impugnação judicial tinha sido apresentada, como esta confessa nas alegações (cfr. ponto II.II, alínea c), a fls. 582).

Assim sendo, improcedem todas as conclusões do recurso.

5 - Em conclusão, entendendo que sentença recorrida não merece qualquer censura, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida nos seus precisos termos.