Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:06/23/2015
Processo:11452/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Fernanda Carneiro
Descritores:FALTA DE PROVA DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO. INSTAURAÇÃO TARDIA DA ACÇÃO DE INSOLVÊNCIA. PAGAMENTO DE CRÉDITOS SALARIAIS PELO FUNDO DE GARANTIA SALARIAL.
Texto Integral:Recurso Jurisdicional de Ação Administrativa Comum Ordinária
Nº 11452/14

1º Juízo; 1ª Sec.




CONTRA-ALEGAÇÕES DO ESTADO


Excelentíssimos Senhores Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo

A Magistrada do Ministério Público junto do TCAS vem nos autos supra referenciados apresentar as suas Contra - Alegações referentes ao recurso extraordinário de revista que o autor, J..., interpôs do douto Acórdão do TCA SUL proferido, em 12 – 2 - 2015, nos autos supra identificados que concedeu provimento ao recurso interposto pelo Réu Estado Português, tendo julgado improcedente a acção e absolvendo o R. Estado Português, tendo revogado a sentença da 1ª Instância proferida em 24 de Março de 2014 que declarara a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência, condenara o Estado Português a pagar ao Autor a quantia de 4498,20 Euros, acrescidos de juros de mora, devidos desde a citação até ao integral pagamento.

Entendeu o douto Acórdão, ora Recorrido, revogar a sentença da 1ª instância e julgar improceder a acção porquanto e, em síntese:

- A sentença da 1ªinstância deu como verificado o pressuposto da ilicitude subjectiva por considerar que, a interposição da ação de insolvência em 3.10.2008, impossibilitou o recorrido de obter junto do Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos seus créditos salariais laborais, até à quantia ilíquida de 5 387, 04 Euros, conclusão que se mostra errada;

- A indemnização devida ao Recorrido , nos termos do artigo 443º do Código de Trabalho de 2003, não se encontrava vencida na data em que foi proferida a sentença que declarou a insolvência da entidade empregadora daquele – 9.5.2009 - , só se tendo vencido e tornado liquida nesta data, com o seu reconhecimento no âmbito do processo de insolvência, nos termos dos artigos 443º do Cód de Trabalho de 2003, e 91º, nº1 do CIRE ;

- Inexistindo créditos salariais do recorrido que se tenham vencido no período de 2.4.2008 a 2.10.2008, o Fundo de Garantia Salarial, de acordo com o nº2 do artº 319ºº da Lei 35/2004, assegura o pagamento dos créditos salariais do recorrido vencidos a partir de 3.10.2008, até ao montante de 5 387 , 04 Euros, situação na qual se subsume a indemnização que lhe é devida nos termos do artigo 443º do Código de Trabalho de 2003, a qual foi reclamada e reconhecida pelo valor de 26 150 Euros;

- A interposição pelo Ministério Público da ação de insolvência em 3.10.2008 não se consubstancia num facto ( subjectivamente) ilícito, já que a instauração da ação nessa data não inviabilizava o direito do recorrido de beneficiar do pagamento de créditos laborais pelo Fundo de Garantia Salarial ( até ao montante de 5 387,04 Euros), atento, por um lado, ao estatuído no artigo 319º, nº2 da Lei 3572004 de 29/07, e, por outro lado, ao facto do vencimento do direito à indemnização previsto no artigo 443º do Código do Trabalho de 2003, só ter ocorrido após a instauração da ação de insolvência;

- O indeferimento da pretensão do recorrido pelo Fundo de Garantia Salarial traduz-se na prática de um facto ilícito, o qual, no entanto, não constitui a causa de pedir da presente ação ( nesta ação o facto – objectivamente – ilícito reconduz-se ao alegado atraso na instauração da ação de insolvência ) e foi praticado por entidade -( Fundo de Garantia Salarial - distinta do ora recorrente ( Estado Português), razão pela qual não se pode conhecer desse facto ilícito nestes autos;

- Ora, recaindo sobre o recorrido o ónus de provar os pressupostos da responsabilidade civil, concretamente, o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo causal, os quais são de verificação cumulativa, a falta de prova de qualquer deles – in casu do requisito relativo à ilicitude – resolve-se contra o mesmo, nos termos do artigo 342º, nº1 do Código Civil;

- Assim, deverá ser revogada a decisão recorrida, por a mesma enfermar de erro de julgamento, e, em consequência, julgada improcedente a presente ação, absolvendo-se o réu, ora recorrente, do pedido.



Defende o Autor, ora Recorrente, nas Conclusões que apresentou, em síntese, que:

- não pode concordar com o entendimento do Acórdão recorrido, no sentido de que não se tendo vencido créditos salariais no período de referência ( 6 meses) o Fundo de Garantia Salarial asseguraria os vencidos após 3.8.2010, como era o caso da indemnização porquanto a indemnização se vence com os restantes créditos laborais, ou seja, na data da rescisão do contrato de trabalho com justa causa que ocorreu em 7.3.2008, não se aplicando o artigo 319º, nº2 da Lei 35/2004 de 29/07, pelo que só por actuação do MºPº, conforme decisão da 1ª instância, viu inviabilizado o seu direito;

- Deve ser considerado improcedente o fundamento apresentado no douto Acórdão ora recorrido para excluir a responsabilidade civil extracontratual decorrente da atuação do MºPº.


A – Questão Previa

1. Admissibilidade do Recurso

QUANTO AOS FUNDAMENTOS DO RECURSO DE REVISTA

Dispõe o art.º 150º do CPTA:
1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

Ora, o recorrente não invoca, nem fundamenta, verificar - se qualquer daqueles requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA.

Como se e escreve no douto Acórdão do STA de 16-01-2013, 01060/13 “…E seguro é que é sobre o requerente que recai o ónus de alegar e intentar demonstrar a verificação dos requisitos legais de admissibilidade deste extraordinário meio processual de sindicância jurisdicional, alegações e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. art.ºs 676º n.º 2, 684º n.º 1 (in fine) e 2, e 685º-A n.º 1 e 2 do CPC, subsidiariamente aplicável -. …”

Por outro lado, não invoca o Recorrente nas suas alegações de recurso porque razão as questões que suscita se assumem de relevância jurídica ou social, pelo menos fora deste processo, nem por ele foi invocado que exista qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCAS.

É vasta a jurisprudência desse Venerando Tribunal que se tem pronunciado sobre os referidos pressupostos necessários à admissibilidade deste tipo de recurso jurisdicional, citando - se, a título de exemplo, o Ac. proferido em 07 - 12 - 11, no Proc. nº 01033/11:
“O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA.
Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA)”.

Também como se expende no Acórdão desse Venerando Tribunal de 22/03/07, Rec. 0217/07, « (…) a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância, sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins tidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA).”

Acontece que, no caso em apreço, não foram invocados pelo recorrente nem se mostram preenchidos os pressupostos que condicionam a admissão do recurso de revista.

Em primeiro lugar, a situação em análise – pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado - não é passível de se reconduzir ao quadro de uma eventual necessidade de admissão do recurso com o fim de obter uma melhor aplicação do direito.

Com efeito, nem sequer o recorrente invoca que a doutrina e/ou jurisprudência se tenham vindo a pronunciar em sentido contrário sobre a questão, desse modo se tornando necessária a sua clarificação para se obter uma melhor aplicação.

Nem se evidencia que a posição assumida no Acórdão recorrido esteja desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis, não se detectando qualquer erro clamoroso ou ostensivo no aresto em causa, sendo que o decidido no Acórdão recorrido radicou num quadro factual determinado.

Em segundo lugar, nem o Recorrente alega, nem o sindicado aresto evidencia, sobre os controvertidos pontos, decisão ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, em termos de poder qualificar-se como susceptível de integrar “erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ”.

Por último, será de realçar que não se vislumbra que a matéria subjacente se tenha revelado e seja “de elevada relevância e complexidade” jurídicas susceptíveis de “suscitar dúvidas sérias na jurisprudência e doutrina”, nem que a questão apreciada e decidida, “seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis”.

Entendemos, em consequência, que o presente recurso extraordinário de revista não deverá ser admitido, por não preencher os requisitos do art.º 150º nº 1 do CPTA, mas V. Exªs melhor decidirão.


B - QUANTO AO MÉRITO DO RECURSO DE REVISTA

Para o caso de assim não se considerar e o recurso ser admitido, entendemos então que esse Venerando Tribunal deverá decidir pela manutenção do julgado pelas razões que passamos a expôr.

O objeto do Recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º, nº2 e 146º, nº4 do CPTA e dos artigos 635, nºs 4 e e 639º do CPC aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26/06, “ ex vi” artigos 1º e 140º do CPTA.

Ora, o recorrente não menciona nas suas conclusões qual a norma jurídica violada pelo Tribunal Recorrido no seu douto Acórdão.

Limita-se a referir factos que, no entanto, são insuscetíveis de permitir o preenchimento dos pressupostos necessários à verificação da responsabilidade civil excontratual por parte do Estado Português, isto é, a existência cumulativa do facto ilícito, da culpa, do dano e do nexo causal.

De acordo com o alegado pelo Recorrente, este ficou impedido de obter junto do Fundo de Garantia salarial o pagamento dos créditos salariais a que tinha direito nos termos da Lei 35/2004 de 29/07, devido à atuação tardia do Ministério Público que só em 3.10.2008, deu entrada da petição inicial requerendo a insolvência da entidade empregadora, como decidido na sentença da 1ª instância.

Todavia, como decidido na 1ª instância e não impugnado, o montante dos créditos laborais de cujo pagamento o Recorrido beneficiaria por parte do Fundo de Garantia Salarial e, de que ficou privado, mercê da atuação tardia do Ministério Público, ascende a 5 387,04 Euros.

Ora, como bem se explicita, no douto Acórdão, ora recorrido, o Fundo de Garantia Salarial deveria ter deferido o pagamento dos créditos salariais a que o recorrido, ora recorrente, tinha direito, até ao montante de 5 387,04 Euros ( situação na qual se subsume a indemnização que era devida ao recorrente nos termos do artigo 443º do Cód. De Trabalho de 2003) porque sobre ele impendia a obrigação de assegurar tal pagamento, nos termos dos artigos 380º e 443º do Código de Trabalho de 2003, 316º 317º, 318º, 319º, nº2 e 320º da Lei 35/2004, .

Assim, a instauração da ação em 3.10.2008, não inviabilizou o direito do recorrido beneficiar do pagamento dos créditos laborais a que tinha direito pelo Fundo de Garantia Salarial até ao montante liquido de 5 387,04 Euros pelo que não se consubstancia qualquer facto ilícito, não se encontrando preenchidos os pressupostos de que depende a verificação da responsabilidade extracontratual do Estado.

Defende o Recorrente ser inaplicável, no caso em apreço, o disposto no artigo 319º, nº2 da Lei 35/2004 citada porque quer a indemnização quer os restantes créditos laborais se venceram em 7.3.2008, todavia, quanto a nós, sem razão porquanto:

Dispõe o artigo 317º da citada Lei 35/2004

“O Fundo de Garantia Salarial assegura, em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação nos termos dos artigos seguintes.”

O artigo 318º do mesmo diploma, quanto às situações abrangidas estabelece que:

“ 1 — O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo anterior, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente.”

E, quanto aos créditos abrangidos, dispõe o artigo 319º do mesmo diploma:

“1 — O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior.

2 — Caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no nº 1 do artigo seguinte, o Fundo de Garantia Salarial assegura até este limite o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência.”

No que respeita aos limites das importâncias pagas, dispõe o artigo 320º do diploma citado:

“1 — Os créditos são pagos até ao montante equivalente a seis meses de retribuição, não podendo o montante desta exceder o triplo da retribuição mínima mensal garantida.

2 — Se o trabalhador for titular de créditos correspondentes a prestações diversas, o pagamento é prioritariamente imputado à retribuição.”

A cresce que nos termos do artº 91º nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente.

Mas, se nos termos do nº1 do artº 128º, do mesmo Código, os credores devem reclamar a verificação dos créditos vencidos, só após o respectivo reconhecimento é que os podem solicitar ao Fundo de Garantia Salarial.

Nos termos da segunda parte do nº2 do artº 319º do da Lei 35/2004, o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos vencidos após os seis meses que antecedem a data da propositura da acção, caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no nº1.

Ora, tendo em vista que não existem créditos vencidos nos seis meses que antecedem a propositura da ação de declaração de insolvência, a qual ocorreu em 09-01-2009, só após o vencimento e reconhecimento dos créditos da Recorrente na ação de insolvência, em 09-01-2009, é que se podem os mesmos considerar vencidos – neles se subsumindo o crédito por despedimento ilícito uma vez que o mesmo precisa de ser demonstrado e declarado pelo Tribunal - para efeito de ser atribuído pelo FGS , a competente indemnização.

A ser como o Recorrente pretende, ou seja, que os créditos se venceram à data da cessação do contrato de trabalho em 07-08-2008 e que, portanto, a ação de declaração de insolvência teria que ser proposta nos seis meses posteriores, para o trabalhador ter direito à indemnização do FGS, ficaria sem qualquer efeito prático o nº2 do artº 319º, bem como o vencimento de todas as obrigações do insolvente determinado pela declaração de insolvência, a que se refere o artº 91º nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), e ainda o reconhecimento dos créditos a que se refere o nº 1 do artº 128º do CIRE.

Ou seja, a finalidade para que foi criado o FGS de, em caso de falência ou insolvência do empregador, assegurar ao trabalhador uma indemnização pelo Estado, ficaria na maioria dos casos sem qualquer efeito prático.

E isto porque, quando a insolvência fosse decretada e os créditos vencidos e reconhecidos, já o trabalhador não teria direito ao respetivo pagamento nem pela empregadora nem pelo FGS, o que redundaria num contra-senso dada a manifesta inutilidade que teriam esse vencimento e reconhecimento.

Acresce, que nunca se verificaria, no caso em apreço, a ilicitude porquanto inexiste norma legal que imponha que o Ministério Publico tenha que instaurar ação de insolvência por incumprimento do pagamento de créditos laborais no prazo de seis meses posteriores à cessação do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador.

Assim, nunca existiria ofensa de direito ou interesse legalmente protegido do recorrente.

Em face do exposto, o douto Acórdão, ora em recurso, pelos fundamentos nele aduzidos, para os quais remetemos, não merece qualquer censura, devendo ser mantido.


CONCLUSÕES

1º No presente recurso está em causa a decisão contida no douto Acórdão recorrido que revogou a sentença proferida 1ª instância, declarando a ação improcedente, por entender que a sentença enfermava de erro de julgamento ao ter concluído pela verificação do pressuposto da ilicitude subjectiva ao ter considerado que a interposição da ação de insolvência em 3.10.2008, impossibilitou o recorrido de obter junto do Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos seus créditos salariais laborais, até à quantia ilíquida de 5 387, 04 Euros;

2º Entendeu o douto acórdão, ora recorrido, que a interposição pelo Ministério Público da ação de insolvência em 3.10.2008 não se consubstancia num facto ( subjectivamente) ilícito, já que a instauração da ação nessa data não inviabilizava o direito do recorrido de beneficiar do pagamento de créditos laborais pelo Fundo de Garantia Salarial até ao montante de 5 387,04 Euros, atento, por um lado, ao estatuído nos artigos, 316º, 317, 318, 320 e 319º, nº2 da Lei 35/2004 de 29/07 e, por outro lado, ao facto do vencimento do direito à indemnização previsto no artigo 443º do Código do Trabalho de 2003, só ter ocorrido após a instauração da ação de insolvência, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 439º, 441º, nº2 e 443º, nº1 do Código do Trabalho, 805º do CC e 91º do CIRE ;

3º Tendo concluído o douto acórdão recorrido que o Autor não provou os pressupostos da responsabilidade extracontratual do Estado, designadamente a ilicitude bem como que a decisão de indeferimento da pretensão do Autor, ora recorrente, pelo Fundo de Garantia Salarial se traduziu na prática de um facto ilícito, o qual, no entanto, não constitui a causa de pedir da presente ação ( nesta ação o facto – objectivamente – ilícito reconduz-se ao alegado atraso na instauração da ação de insolvência ) e foi praticado por entidade -( Fundo de Garantia Salarial - distinta do ora recorrente ( Estado Português), razão pela qual não se pode conhecer desse facto ilícito nestes autos;

4º O recurso de revista, a que alude o nº 1, do artigo 150º do CPTA, tem por objectivo possibilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, sendo que os pressupostos da sua admissibilidade caracterizam a natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso;

5ºOra, no caso em apreço, o recorrente não invoca, nem fundamenta, verificarem-se qualquer daqueles requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA, não tendo cumprido o ónus que sobre si impendia ( cfr. douto Acórdão do STA de 16-01-2013, 01060/13) ;

6º Com efeito, não invoca o Recorrente nas suas alegações de recurso porque razão as questões que suscita se assumem de relevância jurídica ou social, pelo menos fora deste processo, nem por ele foi invocado que exista qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCAS.


7º Por outro lado, não se evidencia que a posição assumida no Acórdão recorrido esteja desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis, não se detectando qualquer erro clamoroso ou ostensivo no aresto em causa, em termos de poder qualificar-se como susceptível de integrar “erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ”;

8º Para além de que, a situação em análise não é passível de se reconduzir ao quadro de uma eventual necessidade de admissão do recurso com o fim de obter uma melhor aplicação do direito porquanto, salvo o devido respeito por opinião contrária, não se verifica que a matéria subjacente se tenha revelado e seja “de elevada relevância e complexidade” jurídicas susceptíveis de “suscitar dúvidas sérias na jurisprudência e doutrina”, nem que a questão apreciada e decidida, “seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis”.

9º Em consequência, o presente recurso extraordinário de revista não deverá ser conhecido, por não preencher os requisitos do art. 150º nº 1 do CPTA;

Caso assim se não entenda,

10º Sendo o objeto do Recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º, nº2 e 146º, nº4 do CPTA e dos artigos 635, nºs 4 e e 639º do CPC aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26/06, “ ex vi” artigos 1º e 140º do CPTA, verifica-se que o recorrente não menciona nas suas conclusões qual a norma jurídica violada pelo Tribunal Recorrido no seu douto Acórdão, limitando-se a referir factos que são insuscetíveis de permitir o preenchimento dos pressupostos necessários à verificação da responsabilidade civil excontratual por parte do Estado Português, isto é, a existência cumulativa do facto ilícito, da culpa, do dano e do nexo causal;

11ºO recorrente, defende que os créditos laborais emergentes da rescisão do contrato de trabalho com justa causa, onde se inclui a compensação, se venceram na data da rescisão do contrato que ocorreu em 7.3.2008, não se aplicando o artigo 319º, nº2 da Lei 35/2004 de 29/07, todavia, como bem se explicita no douto Acórdão recorrido, carece de razão;

12º Com efeito, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 441º, nº2, 443º, nº1 e 439º do Código de Trabalho de 2003, 805º do Código Civil resulta que a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais devida ao trabalhador em consequência da resolução do seu contrato com fundamento em justa causa, é fixada pelo tribunal atendendo ao valor da retribuição do trabalhador e ao grau de ilicitude da conduta do empregador, devendo corresponder a uma indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de trabalho;

13º Assim, o valor da indemnização pela resolução do contrato nos termos do artigo 443º do Código de Trabalho de 2003 só se verificou com o seu reconhecimento, no âmbito do processo de insolvência, o que significa ( aplicando também o que dispõe o artigo 91º do CIRE, aprovado pelo DL 5372004 de 18/03) que, no caso apreço, só se venceu em 9.1.2009, na data em que foi proferida a sentença de insolvência;

14º E, o Fundo de Garantia Salarial tinha a obrigação legal, decorrente do estabelecido nos artigos 380º do Código de Trabalho de 2003 e 316º, 317º, 318º, 319º e 320º da Lei 35/2004 de 29/07, de assegurar o pagamento dos créditos salariais do recorrido até ao limite de 5 387,04 Euros, montante dos créditos salariais a que o recorrido teria direito, podendo reclamá-los, conforme entendido na decisão da 1ª instância e não impugnado;

15º A ser como o Recorrente pretende, ou seja, que os créditos se venceram à data da cessação do contrato de trabalho, em 07-08-2008, e que, portanto, a ação de declaração de insolvência teria que ser proposta nos seis meses posteriores, para o trabalhador ter direito à indemnização do FGS, ficaria sem qualquer efeito prático o nº2 do artº 319º, bem como o vencimento de todas as obrigações do insolvente determinado pela declaração de insolvência, a que se refere o artº 91º nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), e ainda o reconhecimento dos créditos a que se refere o nº 1 do artº 128º do CIRE.

16º A finalidade para que foi criado o FGS de, em caso de falência ou insolvência do empregador, assegurar ao trabalhador uma indemnização pelo Estado, ficaria na maioria dos casos sem qualquer efeito prático porque, quando a insolvência fosse decretada e os créditos vencidos e reconhecidos, já o trabalhador não teria direito ao respetivo pagamento nem pela empregadora nem pelo FGS, o que redundaria num contra-senso dada a manifesta inutilidade que teriam esse vencimento e reconhecimento.

17º O Fundo de Garantia Salarial tinha a obrigação legal, decorrente do estabelecido nos artigos 380º do Código de Trabalho de 2003 e 316º, 317º, 318º, 319º e 320º da Lei 35/2004 de 29/07, de assegurar o pagamento dos créditos salariais do recorrido até ao limite de 5 387,04 Euros, montante dos créditos salariais que o recorrido poderia reclamar, conforme entendido na decisão da 1ª instância e não impugnado;

18º Assim, ao indeferir o pagamento dos créditos salariais ao recorrido, o Fundo de Garantia Salarial praticou um facto ilícito, que não foi impugnado pelo recorrente através da competente ação administrativa especial e que não constitui a causa de pedir da presente acção, razão pela qual não se pode conhecer desse facto ilícito nestes autos;

19º Em consequência, a interposição pelo Ministério Público da ação de insolvência em 3.10.2008 não consubstancia facto ilícito, já que a instauração da ação nessa data não inviabilizava o direito do recorrido de beneficiar do pagamento de créditos pelo Fundo de Garantia Salarial ;

20º Acresce, que nunca se verificaria, no caso em apreço, a ilicitude porquanto inexiste norma legal que imponha que o Ministério Publico tenha que instaurar ação de insolvência por incumprimento do pagamento de créditos laborais no prazo de seis meses posteriores à cessação do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador pelo que nunca existiria ofensa de direito ou interesse legalmente protegido do recorrente.

21º Pelo que, ao decidir como decidiu o douto Acórdão, julgando a ação improcedente, não merece qualquer censura, devendo ser mantido.

Nestes termos e nos mais de direito deverão V. Exªs Venerandos Conselheiros não conhecer do presente recurso extraordinário de revista ou, assim não o entendendo, negar provimento ao mesmo mantendo o douto Acórdão recorrido, com o que, V. Exªs farão a costumada
JUSTIÇA

A Procuradora - Geral Adjunta


( Fernanda Carneiro )