Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:07/27/2011
Processo:07926/11
Nº Processo/TAF:00037/11.4BESNT
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL.
VALOR DA CAUSA.
REVISÃO DE PREÇOS.
Data do Acordão:11/17/2011
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator

A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos arts. 146º nº 1 e 147º do CPTA, vem emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto pela então Requerente, da decisão que fixou o valor da causa, proferida a fls. 260 a 262, e do despacho saneador/sentença proferido, a fls. 263 e segs., pelo TAF de Sintra, que julgou totalmente improcedente, por não provada, a presente acção de contencioso pré - contratual, absolvendo a Autoridade Demandada e a Contra - Interessada dos pedidos.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, a recorrente imputa à decisão que fixou o valor da causa violação dos arts. 31º e 32º a 34º do CPTA e à sentença em recurso violação dos arts. 57º nº 1 al. c), 70º nº 2 al. b) e 146º nº 2 al. o) do CCP e errada interpretação e aplicação do disposto no nº 2 da cláusula 10º do Caderno de Encargos.


Apenas a contra - interessada I… tinha apresentado contra - alegações, cujo desentranhamento foi ordenado por despacho de fls. 347.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados com interesse para a decisão e com base na prova documental e na posição das partes, os factos constantes das alíneas A. a N., do ponto III.1, de fls. 266 a 271, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Quanto ao recurso da decisão que fixou o valor da causa.

Desde já entendemos que a decisão que fixou o valor da causa em €1.450.851,12, em termos da “utilidade económica imediata do pedido”, correspondente ao efeito jurídico pretendido, ou seja, a adjudicação da proposta apresentada pela A., naquele valor, nos merece censura, devendo ser revogada.

Com efeito, de acordo com a petição inicial, o objecto da causa no tocante ao pedido deduzido em juízo é o seguinte: “A anulação da deliberação, datada de 10 de Dezembro de 2010, do Conselho de Administração da C… no âmbito do Concurso Público Internacional (…) de adjudicação à Contra - Interessada …”; “Ser determinada a anulação do eventual Contrato Público que venha a ser celebrado na sequência do predito acto de adjudicação e, bem assim, dos respectivos efeitos; “Ser a Entidade Demandada condenada a praticar os actos necessários à adjudicação à Autora do objecto do concurso público em apreço, com as devidas e legais consequências”.

De acordo com o art. 31º nº 1 do CPTA é a “utilidade económica imediata do pedido” que define o valor da causa, sendo que os critérios através dos quais se deve atender para a fixação daquele valor contam dos arts. 32º a 34º do CPTA.

Defende o recorrente a aplicação do art. 34º do CPTA por entender que o benefício que pretende obter é o valor do lucro o qual constitui uma mera estimativa e que pode variar ao longo da execução do contrato, ou, assim não se entendendo, ser atribuído o valor de €145.085,11, correspondente ao valor do lucro estimado na proposta de preço que apresentou no concurso, mencionando, para o efeito, o Ac. deste TCAS de 13/10/2009, proferido no Proc. nº 05403/09.

No que se refere á aplicação do art. 34º do CPTA, entendemos não assistir razão ao recorrente.

Na verdade, como ensinam Mário Aroso de Almeida e Carlos A. Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, em anotação ao art. 34º «1. Apesar da epígrafe do artigo, o nº 1 do artigo 34º apresenta - se como um preceito que tem em vista estabelecer um critério específico de fixação do valor da causa, que é especialmente aplicável a dois tipos de situações: (a) processos respeitantes a bens imateriais e (b) processos relativos a normas administrativas. Não se trata, portanto, de uma norma subsidiária destinada a funcionar em todos os casos não especialmente regulados, mas antes de uma norma que completa o regime legal de verificação do valor das causas.».

No caso em apreço, não estão em causa “normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, nem situações administrativas relativas a “bens imateriais”, previstas no art. 34.º do CPTA e pelo mesmo consideradas de “valor indeterminável”, as quais dizem respeito àquelas situações em que “estejam em causa ou se discutam bens, utilidades, posições jurídicas ou interesses insusceptíveis de avaliação económica ou pecuniária directa ou imediata.”, o que também não é o caso dos autos.

No caso a utilidade económica do A. com a presente acção é que lhe seja adjudicado o objecto do concurso, no valor da sua proposta, em consequência da anulação do acto impugnado, seguindo - se a celebração do respectivo contrato no mesmo valor.

Todavia, nem por isso, a utilidade económica do A. não é a do preço da proposta por ele apresentada, mas sim a do lucro que estima obter com a referida adjudicação, por ser este o benefício económico que pretende obter, que como refere nas suas alegações é diferente do custo económico.

Com efeito, como se pode ler no acórdão deste TCAS atrás referido, cujos fundamentos sufragamos «Os presentes autos respeitam a um processo de contencioso pré-contratual, intentado ao abrigo do art. 100º do CPTA, para impugnação de acto administrativo relativo à formação de um contrato, onde é essencialmente pedido a anulação da deliberação (…) que procedeu à adjudicação e a condenação do Município a efectuar a adjudicação à ora recorrente.
Trata-se, pois, de um processo relativo a um acto administrativo, cujo valor corresponde ao conteúdo económico do acto, nos termos do art. 33º do CPTA, que “terá de ser concretizado de acordo com as regras especiais enunciadas nas diversas alíneas do artigo, se forem aplicáveis ao caso, ou de acordo com as regras gerais previstas no art. 32º, se se tratar de qualquer situação não subsumível a alguma das sub - hipóteses elencadas naquele preceito” (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha in “Comentário ao C.P.T.A.”, 2005, pág. 156).
Por não estar expressamente previsto nas várias alíneas do citado art. 33º, o conteúdo económico do acto administrativo de adjudicação da prestação de serviços de (…) tem de ser apurado em função da regra geral constante do nº 2 do art. 32º do CPTA que manda atender à quantia equivalente ao benefício que se pretende obter com a acção.
E é a equivalência monetária deste benefício que corresponde ao valor da causa, por representar a utilidade económica do pedido (cfr. nº 1 do art. 31º do CPTA).
Assim, à causa deveria ter sido fixado o valor de 32.747,68 €uros correspondente ao lucro estimado pela recorrente, por ser esse o benefício que ela pretendia obter através do pedido de condenação da Administração à prática de nova adjudicação (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha, ob. cit., pág. 158) e não o correspondente ao valor da sua proposta.».

Também, no caso dos presentes autos e com os mesmos fundamentos deve proceder o recurso do despacho que fixou o valor da causa em €1.450.851,12, a substituir por outro que fixe tal valor em €145.085,11.

IV – Quanto ao recurso do despacho saneador/sentença.

Invoca a recorrente ter a sentença recorrida incorrido em violação dos arts. 57º nº 1 al. c), 70º nº 2 al. b) e 146º nº 2 al. o) do CCP e em errada interpretação e aplicação do disposto no nº 2 da cláusula 10º do Caderno de Encargos, com fundamento em que ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, a contra - interessada I…, na fórmula de revisão de preços apresentada, não observou e respeitou o limite máximo constante do nº 2 da cláusula 10 do CE, mais precisamente, o resultado da aplicação do índice de preços no consumidor.

Mas assim não se nos afigura.

O artigo 56º, nº 1 do CCP define proposta como “a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo”, esclarecendo depois o nº 2 que se entende “por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspecto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos” (bold nosso).

Ora, o critério de adjudicação do concurso em causa foi o do “mais baixo preço”, o qual, nos termos do nº 2 do art. 74º do CCP, só pode ser adoptado “quando o caderno de encargos defina todos os restantes aspectos da execução do contrato a celebrar, submetendo apenas à concorrência o preço a pagar pela entidade adjudicante pela execução de todas as prestações que constituem o objecto daquele.” (bold nosso).

Assim, que a apresentação da fórmula de revisão de preços a propor nos termos do art. 7º al. h) do PC e art.10º nº 2 do CE, porque poderia ser apresentado durante a execução do contrato não constituía um atributo da proposta e como tal nem sequer, a nosso ver, tivesse de ser apreciado pelo júri na fase pré - contratual.

Aliás, não é por acaso que na al. h) do art. 7º do PC se escreve “ Se o concorrente propuser revisão de preços, entregará a fórmula (…)” e no art. 10º nº 2 do CE se estipula “ O pedido de revisão de preços será da iniciativa do adjudicatário, a apresentar com a antecedência mínima de cento e vinte (120) dias de calendário da data de produção de efeitos (…)”, o que indica que a referida fórmula de revisão de preços não tinha, necessariamente, de ser apresentada com a proposta, apreciada pelo júri e levar à exclusão da contra - interessada (bold nosso ).

Por outro lado, a fórmula de revisão de preços apresentada pela contra - interessada, baseada na actualização da tabela salarial, não retira o cumprimento por esta da 2ª parte do nº 2 do art. 10º do CE, já que sempre o valor resultante daquela fórmula nunca poderá exceder o índice de preços ao consumidor.

Sendo que a contra - interessada, por Declaração que juntou e que não é genérica (cfr. al. G. dos factos assentes), se obrigou a executar o contrato em conformidade com o Caderno de Encargos.

E, na verdade, como referiu a contra - interessada na sua contestação o nº 2 do ponto 10 do CE não impõe que o critério de revisão dos preços seja o índice de preços ao consumidor, mas sim que o critério de revisão de preços não exceda o índice de preços ao consumidor, não tendo sido indicada naquela ou em qualquer outra disposição do CE ou do PC, qualquer fórmula de cálculo de revisão de preços.

Aliás, podendo até acontecer, como refere a entidade recorrida na sua contestação, que nos anos 2012 e 2013, em que pode ocorrer a revisão de preços, as actualizações salariais sejam inferiores ao índice de preços no consumidor.

Assim, ao ter decidido em consonância com o ora exposto, a sentença recorrida não nos mereça censura, não tendo incorrido no erro de interpretação e aplicação do art. 10º nº 2 do CE e restantes violações ao CPP que lhe são assacadas.

V – Pelo que, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de:
- ser dado parcial provimento ao recurso interposto da decisão que fixou o valor da causa, revogando - a e substituindo - a por outra que fixe tal valor em €145.085,11, por ser este o benefício económico pretendido alcançar;
- ser negado provimento ao recurso interposto da sentença, mantendo - se a mesma.