Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:03/29/2012
Processo:08668/12
Nº Processo/TAF:1449/10.6BELSB
Sub-Secção:2.ª
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES.
DECRETO-LEI N.º 362/78
DECRETO-LEI N.º 210/90.
ACTO DECIDIDO OU CONSOLIDADO (NÃO).
Texto Integral:Tribunal Central Administrativo Sul

Proc. nº 08668/12 – Rec. Jurisdicional
2º Juízo/1ª Secção ( Contencioso Administrativo )



Venerando Juiz Desembargador Relator

A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos artºs 146º nº1 do CPTA, vem emitir parecer sobre o presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto pela CGA, então Ré, da sentença de fls. 39 e segs., do TAC de Lisboa, na parte em que julgou improcedente, por não provada, a questão prévia suscitada de caso decidido.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, afigura - se resultar que a ora recorrente pretende imputar à sentença recorrida o vício de erro de julgamento, com violação do art. 2º do DL nº 210/90 de 27/06.

O então A., ora recorrido, contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do julgado.

II – Na decisão em recurso foram dados como provados, com relevância para a decisão e com base na prova documental junta aos autos e ao PA e por acordo, os factos constantes das alíneas A) a V) do ponto III, de fls. 42 a 46, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

III – Em questão está saber se, como defende ao recorrente sustentando - se no Ac. do STA de 13/07/2011, Rec. nº 102/11, que fez juntar com as alegações de recurso, o ato de arquivamento de 27.05.1985, que recaiu sobre o pedido de pensão formulado pelo ora recorrido, em 16.09.1980, ainda que fazendo referência a uma possível reabertura para ulterior reapreciação, constitui indeferimento do mesmo pedido, consolidado na ordem jurídica, pelo que à data de 01.11.1990, data da caducidade do regime do DL nº 362/78, de acordo com o DL nº 210/90, estando arquivado, já não estava pendente para efeitos do art. 2º deste último DL e como tal não havia qualquer pensão requerida que houvesse de ser decidida.

Pese embora, a solução dada pelo citado Acórdão do STA, com cujos fundamentos, salvo o devido respeito, não estamos de acordo, e porque não estamos perante matéria factual assente coincidente com a do referido Acórdão, afigura - se - nos que o presente recurso deve improceder, pelas razões que em seguida se expõem.

Da matéria factual assente, que o recorrente não põe em causa, resulta, designadamente, das als. B) e E) a O), que, quer relativamente ao ato de arquivamento, do qual apenas foi dado conhecimento ao mandatário do ora recorrido em 18.10.1995, quer relativamente ao ato de indeferimento de 19.02.2002, não se pode considerar que os mesmos constituem caso resolvido ou decidido, face ao requerimento do A. formulado em 2010 e sobre o qual recaiu o ato expresso, de 23.06.2010, proferido pela recorrente.

Com efeito, tendo o ora recorrido requerido, em 16/09/1980, a concessão da aposentação ao abrigo do Dec. Lei nº 362/78 de 28/11, na redacção dada pelos Decs. Leis nº 23/80 de 29/02 e 118/81 de 18/05, foi o respectivo processo mandado arquivar, pelo facto de não terem sido enviados os documentos pedidos desde 18/01/84 (cfr. alíneas D) a H) da matéria factual assente e doc. fls. 65 do PA).

Renovado o pedido, pelo ora recorrido, em 20/03/2002, com fundamento no Acórdão nº 72/2002 do TC, foi pelo ofício datado de 19/12/2002 (e não 19/02, como por lapso é indicado na al. O) dos factos assentes, cfr. doc. fls. 22 junto ao PA) lhe comunicado que “… conforme foi comunicado oportunamente ao interessado, o seu requerimento de 16.09.1980 foi mandado arquivar por despacho de 1985.05.27, por não terem sido apresentados os documentos necessários À sua conclusão. Assim, tendo - se formado acto tácito de indeferimento em função do tempo decorrido, sem que tivesse procedido à sua impugnação contenciosa, tal acto (de arquivamento) consolidou - se face ao disposto no art. 141º do Código do Procedimento Administrativo (…). Ora, o regime do DL 362/78 foi, entretanto, revogado pelo DL nº 210/90 de 27 de Junho, pelo que já não é possível a atribuição da pensão em causa” (cfr. al. O) dos factos dados como provados).

E, em 31.05.2010, o ora recorrido, juntando certidão do cartão de cidadão (nacionalidade portuguesa) e certidão da contagem do tempo de serviço e descontos legais efectuados para a compensação de aposentação, requereu à CGA, a atribuição da pensão requerida em 16/09/1980 (al. S) dos factos assentes), requerimento sobre o qual recaiu a decisão expressa de indeferimento, com fundamento no facto das provas complementares de efectividade terem chegado fora do prazo, sendo deste despacho, notificado ao ora recorrido por ofício de 24.06.2010, que foi deduzido o pedido de condenação da ora recorrente à prática de ato devido, na presente acção especial, proposta em 13.07.2010 (alíneas U) e V) dos factos dados como provados).

Ora, como se pode ler no Ac. deste TCAS de 27/01/2005, Rec. 00449/04, com o qual estamos em perfeita consonância, e que temos vindo a citar noutros pareceres em matéria idêntica à dos presentes autos « O artº 9º, nº2 do CPA, dispõe que “Não existe o dever de decisão quando, há menos de dois anos contados da data da apresentação do requerimento, o órgão competente tenha praticado um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos.”
Deste normativo resulta com suficiente clareza, numa interpretação a contrario, que o dever de decisão da Administração sobre as pretensões que lhe são dirigidas se renova passados que sejam mais de dois anos sobre a prática de anterior acto. Este dever renovado de decisão vem de encontro ao reforço das garantias dos administrados, presumindo-se tal prazo de dois anos como o tempo mínimo de estabilidade das circunstâncias ou pressupostos do primeiro acto (Mário Esteves de Oliveira in CPA Comentado, 1993, vol. I, pag. 172), possibilitando-se aos administrados o exercício mais amplo dos seus direitos, fixando-se o quadro legal no qual os administrados podem questionar, de novo, a Administração, sobre situações anteriormente apreciadas e decididas.
Por outro lado, como se fez constar no Ac. do STA de 14.11.01, in Rec. 46256 (disponível em www.dgsi.pt), “(...) o nº2 veio também retirar à anterior definição da situação do interessado o carácter de caso resolvido ou decidido, na justa medida em que se recoloca o interessado na mesma situação em que se encontrava quando pela primeira vez formulou o pedido. Não há, assim, qualquer razão para afirmar que só o acto anterior é lesivo(...).”
(…) perante a nova pretensão do recorrente (…) não pode deixar de se entender que o recorrente, ao formular tal nova pretensão viu reabrir-se a possibilidade legal de ver satisfeita a mesma em termos substantivos. Ora, é precisamente esta possibilidade legal, de o administrado poder obter nova apreciação substantiva da sua pretensão, que, colocando o administrado na mesma situação jurídica em que se encontrava quando formulou a pretensão pela primeira vez, que potencia a situação de o mesmo obter da Administração um deferimento ou indeferimento da sua pretensão. Assim sendo, a decisão que sobrevier a nova pretensão, seja expressa ou seja tácita, desde que negativa, apresenta-se com lesividade própria dos direitos ou interesses do administrado.» (sublinhado nosso).

Assim, renovado que foi o pedido do ora recorrido, em 2010, com a junção dos docs. até então em falta, decorridos muito mais de dois anos sobre os atos notificados em 1995 e 2002, que a ora recorrente tivesse obrigação de sobre ele se pronunciar, nos termos do art. 9º do CPA, o que fez, pelo que não há que considerar qualquer consolidação dos mesmos atos, sendo este último ato que se apresenta definidor da situação jurídica actual do ora recorrente, para efeitos do pedido de condenação à prática do acto devido formulado.

Na verdade, a reiteração ou renovação, pelo A., ora recorrido, do pedido anterior, juntando os documentos cuja falta tinha determinado o arquivamento procedimental e os argumentos anteriormente utilizados pela CGA para indeferir o seu pedido, não só retirou “o carácter de caso resolvido ou decidido, na justa medida em que se recoloca o interessado na mesma situação em que se encontrava quando pela primeira vez formulou o pedido, como também não possa ser entendido como um pedido novo, mas tão - só como isso mesmo, ou seja, a reiteração do mesmo pedido, como tal não sendo extemporâneo, por não lhe ser aplicável o DL nº 210/90, atento o seu nº 2.

Assim, que a sentença recorrida, ao decidir pela improcedência da referida excepção de caso decidido ou consolidado na ordem jurídica e, consequentemente, da não caducidade do regime, a nosso ver, e embora pelos fundamentos exarados neste parecer, não tenha incorrido nos vícios que lhe são apontados.

IV – Pelo que, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo - se a decisão recorrida, embora com os fundamentos deste parecer.



Lisboa, 2012 - 03 - 29

A Procuradora Geral Adjunta


( Clara Rodrigues )