Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:07/15/2011
Processo:07821/11
Nº Processo/TAF:00121/02
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:ACÇÃO PARA RECONHECIMENTO DE DIREITO E INTERESSE LEGALMENTE PROTEGIDO.
SERVIÇO MLITAR.
REGIME CONTRATO.
SUBSÍDIO DE INTEGRAÇÃO.
Data do Acordão:01/19/2012
Texto Integral:I – O presente recurso jurisdicional vem interposto pelo então Réu, Chefe do Estado Maior da Força Aérea, da sentença de fls. 171 e segs. do TAC de Lisboa, que julgou parcialmente procedente, por provada, a presente acção de reconhecimento de direito e interesse legalmente protegido, condenando o ora recorrente no pagamento ao A. da quantia de €4.716,6, acrescida dos juros de mora desde Novembro de 1997.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, o ora recorrente imputa à sentença recorrida a nulidade, por omissão de pronúncia, da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC ex vi do art. 1º da LPTA e erro de julgamento por errónea interpretação do nº 2 do art. 4º do Dec. Lei nº 157/92 de 31/07.

O então A., ora recorrido apresentou contra - alegações, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

II – Na sentença em recurso foram considerados como assentes os factos constantes das alíneas A. a G., do ponto II, a fls. 171 e 173, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Quanto á invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia (al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC).

Fundamenta o recorrente tal nulidade dizendo que a sentença recorrida não se pronunciou sobre a questão fulcral – a existência de um contrato novo e um contrato antigo – não abordando o cerne da questão, no ponto de vista do ora recorrente, e que é a questão da opção prevista no nº 2 do artigo 4º do Decreto - Lei nº 157/92, de 31 de Julho.

Mas assim não se nos afigura.

Com efeito, na sentença recorrida pode ler - se:
A questão controvertida entre as partes respeita a saber se a atribuição do subsídio de integração na vida civil instituído pelo Decreto - Lei nº 336/91 de 10 de Setembro, depende da aplicação ao militar do novo regime de contrato, introduzido pelo Decreto - Lei nº 157/92 de 31 de Julho.
Vejamos:
(…)
Para responder à questão colocada seguimos a orientação fixada no Acórdão do STA, de 30.04.2008, P. 0933/07, nos termos da qual:
«I – (…) // II – O militar que, incorporado no serviço militar a 1.10.1990, e após o cumprimento do serviço efectivo normal (SEN), passou ao regime de contrato a 1.1.1992, tem direito ao subsídio de integração previsto no art. 8º, al. b) do citado DL nº 336/91, independentemente de ter ou não optado pelo novo regime de contrato que veio a ser instituído pelo DL nº 157/92, de 31 de Julho“ (bold nosso).

Quer dizer, a sentença recorrida, ao contrário do invocado pelo recorrente, pronunciou - se sobre a questão da opção prevista no nº 2 do artigo 4º do Decreto - Lei nº 157/92, de 31 de Julho, por remição para a orientação fixada no Ac. do STA de 30.04.2008, cujo sumário transcreveu, e que consistia no direito ao subsídio em causa dos militares em RC, independentemente de terem optado ou não pelo novo RC instituído pelo DL nº 157/92.

Assim, que não exista a alegada omissão de pronúncia por parte da sentença recorrida.

IV – Quanto ao invocado erro de julgamento por errónea interpretação do nº 2 do art. 4º do Dec. Lei nº 157/92 de 31/07.

Desde já entendemos que a sentença recorrida não enferma de qualquer erro de interpretação.

Com efeito pese embora a jurisprudência constante dos Acs. deste TCAS de 28.04.2005, Rec. nº 04555/00, de 23.06.2005, Rec. 06417/02 e de 14.10.2004, Rec. 00031/04, salvo o devido respeito a ela não aderimos, mas antes perfilhamos a jurisprudência fixada pelo STA transcrita na sentença em recurso, mas sobretudo na do Ac. do mesmo STA de 12.07.2006, Rec. 01125/05, por se tratar de situação em tudo idêntica à dos presentes autos, tendo em conta a matéria factual dada como provada.

Assim, passamos a citar alguns dos fundamentos do mesmo Acórdão que se mostram de maior interesse para os presentes autos, atenta a posição do recorrente e a matéria factual assente:
« (…) a dúvida está em saber se o militar, para receber o subsídio, deveria estar em RC de acordo com o figurino da Lei nº 30/87, na redacção da Lei 22/91, isto é, após cumprimento do SEN e do RV (ver nº5, do art. 4º da Lei 30/87), ou seja, no “velho” regime de contrato (RC) ou se no “novo” regime de contrato, considerando, portanto, as alterações introduzidas pelo DL nº 157/92.
Em boa verdade, na nossa opinião, a dificuldade é mais aparente que real.
Com efeito, se estamos a falar de um diploma de 1991 (DL n 336/91, de 10/09), parece óbvio que na alusão ao RC previsto na Lei nº 30/87, na redacção da Lei nº 22/91, o legislador não podia estar a referir-se a um diploma posterior, aquele que viria a criar o “novo” regime de contrato (RC), e que sabemos ser o DL nº 157/92.
Isso, porém, não quer dizer que aquele diploma impedisse que os militares que viessem a ingressar no “novo” regime estivessem de fora do benefício ali previsto. Efectivamente, quando o diploma de 1991 aludia ao RC, estava a referir-se ao único regime de contrato então existente. Portanto, a interpretação actualista mais adequada para esse diploma - que não sofreu qualquer alteração posterior – é a que vê na previsão do preceito o reconhecimento de um direito a um subsídio de integração a qualquer militar que tivesse prestado serviço militar em regime de contrato. Um tal incentivo, foi uma maneira mais que o legislador encontrou para atrair maior número de militares às fileiras das Forças Armadas.
Se nessa ocasião não havia mais do que um regime de contrato, podemos seguramente concluir que a preocupação do legislador não poderia ter sido a de privilegiar uns militares em detrimento de outros ou de estabelecer qualquer distinção entre eles: nessa ocasião todos estavam na mesma situação, bastando que tivessem sido militares em RC ou RV.
E a prova de que para esse legislador (o legislador do DL nº 336/91) não importava o aspecto substantivo do regime é que ele se satisfez com a remissão para um diploma que definia os termos gerais do serviço militar (Lei de Serviço Militar: Lei nº 30/87) em vez de remeter para o texto legal onde estavam prescritos os termos específicos, substantivos e materiais, desse exercício do ponto de vista, por exemplo, da duração do regime, condições de admissão, funções, requisitos especiais de promoção, antiguidade, formação profissional, etc, como era o Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR: Lei nº 30-A/90, de 24/01, alterada pela Lei nº 27/91, de 17/07).
Parece-nos também residir aí a evidência de que o legislador não quis confinar o subsídio aos militares que prestaram o RC ou o RV em função das condições de acesso e modo desse exercício - diferenciadas consoante fosse “novo” ou “antigo” o regime respectivo - mas unicamente aos militares que prestaram o serviço voluntariamente ou sob a modalidade de contrato.
E sendo assim, apesar de no momento em que foi produzido o DL nº 336/91 não se poder falar em “novo” RC, ele não podia deixar de vir aplicar-se aos militares que posteriormente vissem a estar no ”novo” RC. Ou seja, porque não foi estabelecida qualquer distinção, é completamente indiferente que o militar tivesse prestado esse serviço em RC no “antigo” ou no “novo” regime.
Por conseguinte, nesta perspectiva, o recorrente estava a prestar serviço efectivo “…no regime de contrato (RC) em regime de contrato a que se refere o art. 4º da Lei nº 30/87, de 7 de Julho, na redacção dada pela Lei nº 22/91, de 19 de Julho” (art. 1º do DL nº 336/91), pelo que tinha direito ao subsídio.
Encaremos agora a discussão no plano em que a colocou a entidade recorrida para indeferir o pedido.
Para assim decidir, considerou que este subsídio apenas seria de atribuir ao recorrente se tivesse optado pelo novo regime ao abrigo do nº 2 do art. 4º do DL nº 157/92. Ou seja, considerou a existência de dois regimes nos seguintes termos:
«a. Se os militares podem optar pela transição para o novo regime de contrato, também podem optar pela não transição para esse novo regime, ou seja, podem continuar sob o anterior regime de contrato.
b. Se o legislador consagrou, em sede de disposições transitórias, a possibilidade de opção pela transição directa para o novo regime, é porque o novo regime não substitui o anterior, aceitando a coexistência de dois regimes, o antigo e o novo».
Ora, esta posição arranca da ideia de que o subsídio referido no art. 1º do DL nº 336/91 implica que o regime de contrato aplicável deva ser o “novo” a que acima fizemos referência. De acordo com ela, se o militar não faz a opção inscrita no nº2 do art. 4º do DL nº 157/92, então não chega a adquirir o direito ao incentivo.
Esta interpretação, porém, peca em dois pontos.
Em primeiro lugar, se se quiser ver no art. 1º citado o estabelecimento de alguma restrição (em nossa opinião, não estabelece), então a sua letra apontaria para que o subsídio fosse atribuível aos militares no regime de contrato (RC) «…a que se refere o artigo 4º da Lei nº 30/87, de 7 de Julho, na redacção dada pela Lei nº 22/91, de 19 de Junho». (sic). Ou seja, aos militares que tivessem desempenhado o serviço ao abrigo do regime “antigo”, porque o “novo” foi introduzido com as alterações trazidas pelo DL nº 157/92, isto é, quase um ano depois. Assim sendo, parece que a entidade recorrida incorre num vício de raciocínio, porque se serve de uma norma transitória (art. 4º, nº2,) - de um diploma ( DL 157/92) que introduz um regime “novo” - a fim de fazer a sua ligação a um outro diploma (DL 336/91) que se limitava a prever a constituição de um direito estranho às alterações posteriores do regime de contrato em que os militares pudessem exercer o serviço militar. E como vimos, a norma transitória em análise limitou-se a permitir um acesso directo ao novo regime de contrato, não só em termos de tempo de serviço cumprido necessário para o efeito, como naquilo que ele tinha de substantivo, não tendo qualquer interferência na atribuição de subsídios previstos em diploma destinado a esse específico fim.
Em segundo lugar, mesmo longinquamente admitindo que se possa, ou deva, fazer essa concatenação de diplomas, de modo a ver-se nela a necessidade de o militar estar no novo regime de contrato (ab origine ou sob opção posterior), então a interpretação que a entidade recorrida faz do art. 4º atrás mencionado também não merece o nosso aplauso.
Com efeito, como se diz em aresto deste STA, e que traduz a melhor exegese sob esse ponto de vista, «Julgamos que o art. 4º, n.º 2 do Dec.Lei 157/92, de 31 de Julho ao referir-se aos militares que tenham ingressado no regime de contrato referido no número anterior está a referir-se aos militares que à data da publicação do diploma se encontravam em regime de contrato. A expressão literal “tenham ingressado”, só faz sentido se reportada ao passado, isto é, àqueles que já tenham ingressado no regime de contrato antes da publicação do Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho.
Em primeiro lugar por força do elemento literal: a expressão usada “tenham ingressado”, é uma forma verbal composta (pretérito perfeito do conjuntivo), reportando a acção, ou o estado, ao passado – cfr. ANTÓNIO AFONSO BAGANHA, Gramática Universal da Língua Portuguesa, Texto Editora, pág. 173 e 174.
Por outro lado, só esses militares, se encontravam à data da publicação da nova lei, numa situação de facto susceptível de causar problemas pela sucessão do regime legal no tempo. O art. 4º, n.º 2 tem plena utilidade e justificação suficiente, na regulamentação desta situação, uma vez que estes militares ingressaram num regime de contrato que é alterado na vigência desse contrato, sendo assim problemática a sua permanência no regime vigente à data do ingresso.
Quando o art. 4º, n.º 1 nos diz que os militares incorporados até 31 de Dezembro de 1992 “podem ingressar no regime de contrato a que se refere o Livro IV do Estatuto dos Militares das Forças Armadas” faz todo o sentido que esteja a referir-se ao Estatuto das Forças Armadas na sua nova redacção, ou seja, na redacção dada pelo Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho, que modificou substancialmente todo esse Livro IV. Não era curial um diploma alterar o Livro IV do Dec-Lei 34/A/90, de 24 de Janeiro e nas suas próprias disposições transitórias, remeter para esse mesmo Livro IV, na sua redacção anterior. Os militares que ainda não tinham ingressado no regime de contrato (regime antigo) quando o Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho, é publicado, nunca se encontram numa situação de facto justificativa de uma norma de direito transitório especial: quando ingressassem no regime de contrato, ingressariam no regime vigente à data desse ingresso (o novo regime). O sentido útil do preceito é, assim, apenas o de garantir o ingresso automático, sem necessidade cumprir os novos requisitos do regime de contrato.
Finalmente, o argumento da entidade recorrida segundo a qual é evidente que há dois regimes de contrato, coexistentes em alguns casos, não é concludente. É que, como vimos, é verdade existirem dois regimes de contrato: o novo e o antigo. Como é verdade ainda que o antigo é o previsto no Livro IV do Dec. Lei 34/A/90, de 24 de Janeiro, antes da alteração introduzida pelo Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho. Estas questões foram acima analisadas. Só que da existência de dois regimes, e da respectiva caracterização, não decorre que seja o regime antigo o aplicável aos militares que se encontravam na situação prevista no art. 4º, n.º 1 do Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho. A resposta a esta questão, não depende da existência de dois regimes, mas do âmbito de aplicação subjectiva de cada um deles. Ora, como vimos acima, a subsistência dos dois regimes justificava-se apenas para os militares que, no momento em que é alterado o regime de contrato, já se encontravam nesse regime. Situação esta (e apenas esta) que fazendo subsistir no tempo uma relação jurídica cujo regime jurídico é substancialmente modificado, justifica plenamente a norma transitória do art. 4º, n.º 2 do Dec. Lei 157/92, de 31 de Julho» (Ac. de 5/04/2005, Proc. nº 01946/03).
Ora, de acordo com a matéria provada, o recorrente fez o SEN (Serviço Efectivo Normal) entre 1/04/92 e 1/04/93, sendo que nesta última data iniciou o serviço em regime de contrato (RC) até 17/10/97.
Não fez a opção para o novo RC, nem tinha que fazer. Na verdade, porque o contrato foi celebrado já no âmbito da vigência do DL nº 157/92, ou seja, por ele ter já o SEN cumprido, ingressou directamente no novo regime de contrato a que se refere o livro IV do EMFAR com as alterações introduzidas por esse DL nº 157/92.
E assim, porque a sua situação não era aquela que está imanente ao nº2 do art. 4º desse diploma (que se dedica, pois, aos militares que já estavam no anterior regime e contrato e que podiam, a partir de então, beneficiar do “novo” regime), e uma vez que ele já estava no “novo” regime, é de todo evidente que não tinha que declarar a sua opção pelo “novo RC”.
Por todo o exposto, reconhecemos-lhe, portanto, direito ao recebimento do subsídio de integração previsto nos arts. 1º e 8º, al. b), do DL nº 336/91, ao contrário do que, em erro de julgamento, ajuizou o acórdão recorrido.» (bold nosso).

Saliente - se que, no caso dos presentes autos, de acordo com a matéria factual assente, também o ora recorrido fez o SEN (Serviço Efectivo Normal) entre 24/02/92 e 1/02/93, sendo que nesta última data iniciou o serviço em regime de contrato (RC) até 25/11/97.

Daí, que o seu regime de contrato tenha já ocorrido na vigência do DL nº 157/92, ou seja, por ele ter já o SEN cumprido, ingressou directamente no novo regime de contrato a que se refere o livro IV do EMFAR com as alterações introduzidas por esse DL nº 157/92.

Logo, não fez, nem tinha que fazer a opção para o novo RC, por o contrato já ter sido celebrado no âmbito da vigência do DL nº 157/92.

Independentemente desse facto, pelas razões expendidas no acórdão ora citado sempre o recorrente tinha direito ao subsídio de integração previsto nos arts. 1º e 8º, al. b), do DL nº 336/91, conforme decidiu a sentença recorrida, não incorrendo no erro de julgamento que lhe é imputado.

V – Assim, em face de todo o exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso mantendo - se a sentença recorrida.