Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:02/18/2015
Processo:06811/10
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Fernanda Carneiro
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO ANULATÓRIO;
ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO PORTUGUÊS;
CUMULAÇÕES DE PRETENSÕES NÃO CONSENTIDAS PELO OBJECTO DO PROCESSO.
Texto Integral:

Execução de Sentença - CPTA

Nº 06811/10

2º Juizo 1ª Sec. ( Contencioso Administrativo)




CONTRA-ALEGAÇÕES DO ESTADO PORTUGUÊS



Excelentíssimos Senhores Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo

A Magistrada do Ministério Público junto do TCAS vem nos autos supra referenciados apresentar as suas contra - alegações referentes ao recurso de apelação para o STA que os exequentes I…, M… e J…, interpuseram do douto Acórdão do TCA SUL proferido, em 18-12-2014, nos autos supra identificados.

Os fundamentos indicados no recurso são a ilegalidade do despacho prévio que rejeitou os meios de prova oferecidos pelos exequentes, a insuficiência da matéria fáctica dada como provada e o erro na apreciação e valoração da prova produzida.

Decidiu o douto Acórdão recorrido, em via de execução do julgado anulatório do TCA Sul proferido no rec. Nº 11881/03 de 11.02.2006 , confirmado pelo Ac. do STA de 03.02.2007 proferido no rec. Nº 123/07 no tocante ao despacho de 08.08.2002 do SEAI em:
A. Absolver o Estado Português da presente instância no tocante aos pedidos indemnizatórios deduzidos;
B. Em via de execução do julgado anulatório, condenar o Ministério da Administração Interna (Mai) no dever de reconstituição da carreira dos exequentes e no pagamento, conforme discriminação supra (indicada no douto Acórdão), do valor resultante a liquidar em execução de sentença, relativamente aos diferenciais remuneratórios, em valor liquido de impostos e contribuições por retenção na fonte;
C. Relativamente ao ordenado em B. fixa-se o prazo corrido de 60 dias, contado do trânsito em julgado da presente decisão.

O douto Acórdão, ora Recorrido, fundamentou a absolvição da instância do Estado Português nos fundamentos que a seguir, em síntese, se indicam:

“Em sede de processo de execução de sentença de anulação são aplicáveis os critérios gerais da legitimidade, ativa e passiva, previstos nos artigos 9º e 10º do CPTA o que, no caso concreto, significa que a execução deverá ser proposta contra a pessoa coletiva de direito público ou o ministério em que se insiram os órgãos incumbidos do
dever de executar, ou seja, deve ser demandada a pessoa colectiva

Ou o ministério responsáveis pelo ato anulado ( cfr. Artº 174º), que já figuraram como demandados no processo impugnatório ( cfr. Artº 10º, nº2. (..)” ( 1)
Pelo que vem dito, conjugando com o disposto nos artºs 10º, nº2 e 174º, nº2 do CPTA , temos que no caso presente a legitimidade processual passiva em linha com o dever de executar compete, exclusivamente, ao Ministério da Administração Interna.”

“Não têm cabimento neste meio processual os pedidos indemnizatórios deduzidos contra o Estado e substanciados em matéria de responsabilidade civil extracontratual, pois, como nos diz a doutrina especializada, o processo de execução de sentenças da anulação regulado nos artigos 173º a 179º do CPTA “ (..)funciona como um complemento de natureza declarativa da ação administrativa especial, nos termos do nº3 do artº 47º do CPTA “(..)” cujo objeto processual “(..) inclui a averiguação de causa legitima de inexecução, a especificação do conteúdo do dever de executar a sentença de anulação proferida por referência ao artº 173º do CPTA, a apreciação jurídica dois atos praticados durante a fase de execução espontânea e a fixação de indemnização por inexecução(..)…

Ou seja, o dever objetivo de indemnizar em que a Administração fica constituída decorre, exclusivamente, da circunstância de a execução ser impossível , referindo-se aqui a lei ao ressarcimento daqueles danos que, na esfera jurídica do recorrente, se produzem em consequência da impossibilidade de obter o cumprimento de tais deveres e que, portanto, não existiriam se eles pudessem ter sido cumpridos; não cobrindo já os eventuais danos que o ato ilegal possa ter causado e que, pela sua natureza, a execução de sentença não teria sido, em qualquer caso, apta a remover pelo que teriam subsistido mesmo que ela tivesse podido ter lugar… este dever de indemnizar funciona como um sucedâneo da execução de sentença e, portanto, da tutela primária: a partir do momento em que se reconhece que não é possível eliminar a situação ilegal… mais não resta do que reparar o dano… a compensação por impossibilidade de repristinar há-- de compensar o recorrente pela perda da posição em que ele teria ficado colocado se tivesse sido possível extrair as consequências da anulação judicial .
Dados os limites adjetivos da convolação do processo de execução da sentença de anulação em condenação indemnizatória ( artºs 166º ex vi 176º, nº7, 177º, nº3 e 178º do CPTA, no caso de o interessado pretender ressarcir-se de todos os danos eventualmente resultantes da atuação ilícita da Administração terá de interpor a competente ação autónoma de responsabilidade civil por ato ilícito…. “


A – Questão Previa

1. Admissibilidade do Recurso

Não é admissível recurso de Apelação do acórdão recorrido.

Com efeito, dispõe o art.º 150º do CPTA:

1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

Por outro lado, os recorrentes não invocam, nem fundamentam, verificar - se qualquer daqueles requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA.

Ora, como se escreve no douto Acórdão do STA de 16-01-2013, 01060/13 “…E seguro é que é sobre o requerente que recai o ónus de alegar e intentar demonstrar a verificação dos requisitos legais de admissibilidade deste extraordinário meio processual de sindicância jurisdicional, alegações e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. art.ºs 676º n.º 2, 684º n.º 1 (in fine) e 2, e 685º-A n.º 1 e 2 do CPC, subsidiariamente aplicável -. …”

Não alegam nem demonstram os recorrentes, no requerimento de interposição de recurso, que as questões por si suscitadas se assumem de relevância jurídica ou social ou que exista qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCA Sul.

É vasta a jurisprudência desse Venerando Tribunal que se tem pronunciado sobre os referidos pressupostos necessários à admissibilidade deste tipo de recurso jurisdicional, citando - se, a título de exemplo, o Ac. proferido em 07 - 12 - 11, no Proc. nº 01033/11:

“O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA.
Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA)”.

Como também se expende no Acórdão desse Venerando Tribunal de 22/03/07, Rec. 0217/07, « (…) a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância, sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins tidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA).”

Acontece que, no caso em apreço, como atrás se referiu, não foram invocados pelos recorrentes os pressupostos que condicionam a admissão do recurso de revista, ónus que sobre eles recaia e que não satisfizeram.

Acresce, que a situação em análise não é passível de se reconduzir ao quadro de uma eventual necessidade de admissão do recurso com o fim de obter uma melhor aplicação do direito.

Com efeito, nem sequer o recorrente invoca que a doutrina e/ou jurisprudência se tenham vindo a pronunciar em sentido contrário sobre a questão, desse modo se tornando necessária a sua clarificação para se obter uma melhor aplicação.

Nem se evidencia que a posição assumida no Acórdão recorrido esteja desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis, não se detectando qualquer erro clamoroso ou ostensivo no aresto em causa, sendo que o decidido no Acórdão recorrido radicou num quadro factual determinado.

Sendo que o recurso de revista, nos termos do disposto no artigo 150º, n° 2 a 4, do CPTA, só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual, competindo ao tribunal de revista aplicar definitivamente o direito aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o que obsta, salvo os casos referidos no seu n° 4 (que, no caso em análise se não verificam) a que tribunal de recurso se pronuncie sobre a matéria de facto.

Por outro lado, nem os Recorrentes alegam, nem o sindicado aresto evidencia, sobre os controvertidos pontos, decisão ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, em termos de poder qualificar-se como susceptível de integrar “erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ”.

Por último, será de realçar que não se vislumbra que a matéria subjacente se tenha revelado e seja “de elevada relevância e complexidade” jurídicas susceptíveis de “suscitar dúvidas sérias na jurisprudência e doutrina”, nem que a questão apreciada e decidida pelas instâncias, “seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis”.

Entendemos, em consequência, que o presente recurso de apelação não é legalmente admissível, no caso se operar a convolação em recurso de revista, este não deverá ser conhecido, por não preencher os requisitos do art.º 150º nº 1 do CPTA, mas V. Exªs melhor decidirão.

B - QUANTO AO MÉRITO DO RECURSO

Para o caso de assim não se considerar e o recurso ser conhecido, entendemos então que esse Venerando Tribunal deverá decidir pela manutenção do julgado no que respeita à absolvição da instância do Estado Português.

Aliás, nem sequer os recorrentes nas suas alegações e/ou termos conclusivos do recurso, aludem a tal segmento da decisão, ora recorrida.

De facto, não são invocados pelos recorrentes quaisquer fundamentos que permitam concluir que pretendem impugnar a decidida absolvição da instância do Estado Português, alicerçada na sua ilegitimidade passiva e cumulação de pretensões não consentida pelo objeto do processo.

Nem sequer a invocada ilegalidade da rejeição dos meios de prova oferecidos pelos exequentes/ora recorrentes, poderá abalar os fundamentos em que assentou a decisão que determinou a absolvição da instância do Estrado Português.

Já que as razões que suportaram tal decisão se reconduziram a fundamentos exclusivamente de direito: da conjugação dos artigos artigos 9º, 10º, nº2 e 174º, nº2 todos do CPTA resulta que a legitimidade processual passiva em linha com o dever de executar compete exclusivamente, ao Ministério da Administração Interna; quanto aos pedidos indemnizatórios deduzidos contra o Estado e consubstanciados em matéria de responsabilidade civil extracontratual, existe cumulação de pretensões não consentida pelo objeto do processo, dado os limites adjetivos da convolação do processo de execução da sentença de anulação em condenação indemnizatória - artigos 166º ex vi 176º, nº7, 177º, nº3 e 178º do CPTA – tendo o interessado que pretender ressarcir-se de todos os danos eventualmente resultantes da atuação ilícita da Administração, de interpor a competente acção autónomas de responsabilidade civil por ato ilícito), insuscetíveis de serem contrariados pelos meios de prova oferecidos pelos recorrentes.

Pelo que o douto Acórdão, ora em recurso, pelos fundamentos nele aduzidos e para os quais remetemos, não mereça qualquer censura, devendo ser mantido no que respeita à absolvição da instância do Estado Português dos pedidos indemnizatórios peticionados.


CONCLUSÕES

1º No presente recurso está em causa a decisão contida no douto Acórdão do TCA Sul que em via de execução do julgado anulatório do TCA Sul proferido no rec. Nº 11881/03 de 11.02.2006 , confirmado pelo Ac. do STA de 03.02.2007 proferido no rec. Nº 123/07 no tocante ao despacho de 08.08.2002 do SEAI, decidiu absolver o Estado Português da presente instância no tocante aos pedidos indemnizatórios deduzidos e, em via de execução do julgado anulatório, condenou o Ministério da Administração Interna no dever de reconstituição da carreira dos exequentes e no pagamento, conforme discriminação efetuada no Acórdão, do valor resultante a liquidar em execução de sentença, relativamente aos diferenciais remuneratórios, em valor liquido de impostos e contribuições por retenção na fonte;

2º O recurso de Apelação para o STA interposto pelos recorrentes é legalmente inadmissível porquanto dispõe o art.º 150º nº1 do CPTA que “ - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo ..”;

3º Por outro lado, os recorrentes não invocam, nem fundamentam, verificar - se qualquer dos requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA.

4º Sendo que é sobre os requerentes/recorrentes que recai o ónus de alegar e demonstrar a verificação dos requisitos legais de admissibilidade deste extraordinário meio processual de sindicância jurisdicional, alegações e demonstração a efetuar no requerimento de interposição de recurso, conforme fundamentos constantes do douto Ac. do STA de 16.01.2013, 01060/13, para os quais remetemos;

5º Não alegando nem demonstrando os recorrentes, no requerimento de interposição de recurso, que as questões por si suscitadas se assumem de relevância jurídica ou social ou que exista qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCA Sul, não se verificam os requisitos legais da admissibilidade do recurso de revista previsto no artigo 150º do CPTA;

6º Entendemos, em consequência, que o presente recurso de apelação não é legalmente admissível e, no caso se operar a convolação em recurso de revista, este não deverá ser conhecido, por não preencher os requisitos do art.º 150º nº 1 do CPTA mas, V. Exas decidirão;

Caso assim se não entenda,
7º Da análise dos termos conclusivos do recurso verifica-se que não há qualquer alusão ao segmento do acórdão, ora recorrido, que decidiu a absolvição da instância do Estado Português;

8º Com efeito, não são invocados pelos recorrentes quaisquer fundamentos que permitam concluir que pretendem impugnar a decidida absolvição da instância do Estado Português, alicerçada na sua ilegitimidade passiva e cumulação de pretensões não consentida pelo objeto do processo;

9º Nem sequer a invocada ilegalidade da rejeição dos meios de prova oferecidos pelos exequentes/ora recorrentes poderá constituir fundamento de recurso de tal segmento da decisão recorrida ou ser suscetível de abalar os fundamentos, exclusivamente de direito em que assentou a decisão que determinou a absolvição da instância do Estrado Português.

10º Pelo que o douto Acórdão, ora em recurso, pelos fundamentos nele aduzidos e para os quais remetemos, não mereça qualquer censura, devendo ser mantido no que respeita à absolvição da instância do Estado Português dos pedidos indemnizatórios peticionados.

Nestes termos e nos mais de direito deverão V. Exªs Venerandos Conselheiros não conhecer do recurso interposto pelos recorrentes ou, assim não o entendendo, negar provimento ao mesmo mantendo o douto Acórdão recorrido, na parte em que decidiu a absolvição da instância do Estado Português, com o que, V. Exªs farão a costumada

JUSTIÇA

A Procuradora - Geral Adjunta


( Fernanda Carneiro )