Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:10/08/2014
Processo:11542/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Fernanda Carneiro
Descritores:DISPENSA DE PROVA TESTEMUNHAL EM PROCESSO CAUTELAR.
Texto Integral:Autos de Recurso Jurisdicional CPTA (Proc. Cautelar)
Nº 11542/14


Ex. mos Senhores
Juízes Desembargadores junto do TCA Sul

A Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado para os termos e efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º, ambos do CPTA, vem emitir parecer nos seguintes termos:

M…, SA vem recorrer da douta sentença do TAF de Ponta Delgada que julgou totalmente improcedente o pedido de decretamento das providências cautelares requeridas invocando preterição dos princípios da tutela jurisdicional efectiva, da real promoção de acesso à justiça, da verdade material e do inquisitório, preconizados pelos artigos 2º, nº1 e 7º do CPTA e, pelos artigos 2º, 20º e 268º, nº4 da CRP.

Entende, no essencial, o recorrente que deveria ter sido admitida e produzida a prova testemunhal por ele indicada pelo que a dispensa de prova o impossibilitou de provar os requisitos do artigo 120º do CPTA ou então, deve considerar-se a matéria alegada mais do que suficiente para a verificação dos pressupostos do artigo 120º do CPTA.

Contra-Alegou a entidade recorrida, nos termos de fls. 168 a 169, cujo teor aqui se reproduz.

Está em causa providência de natureza conservatória e de natureza antecipatória:

Providência conservatória - notificação da requerida para que seja impedida de accionar as três cauções que para garantia da boa execução das obras de reinstalação do serviço de finanças da Horta a requerente prestou e, em consequência, impedidas as duas seguradoras M… e C… de proceder ao pagamento à Requerida dos respectivos valores até que, na acção principal seja reconhecida a ausência de responsabilidade da requerente quanto às infiltrações, uma vez que existe fundado receio de prejuízos de difícil reparação para os interesses da requerente e não é manifesta a falta de fundamento da pretensão, mostrando-se a providência adequada a assegurar a utilidade da sentença a proferir na causa principal.

Providência antecipatória - Seja notificada a requerida para devolver à requerente as três cauções supra referidas por ser provável que a pretensão a formular no processo principal venha a ser julgada procedente.

A improcedência das providências está sustentado pela douta sentença, ora recorrida, na não verificação dos requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) artigo 120º do CPTA.

Afigura-se-nos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que os fundamentos invocados no Recurso não permitem abalar os fundamentos de facto e de direito indicados na douta sentença, ora recorrida.

Decorre do artigo 120º do CPTA que o Tribunal decretará a providência cautelar requerida sempre que, mediante um juízo perfunctório possa concluir, sem necessidade de maiores indagações, que é manifesta a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal.

Como se escreve no douto Ac. do STA de 9.7.2014, 0561/14 “I - Quando está em causa a adopção de uma providência conservatória, o critério legal de decisão, relativamente ao requisito da aparência do bom direito, é um critério largo, bastando, para o efeito, que não seja manifesta a falta de fundamentação da pretensão a formular no processo principal [art. 120º/1/b) CPTA]…”

Assim, haverá que averiguar, em cada caso, em face de uma análise sucinta e perfunctória da mesma, pois só esta é compatível com a celeridade e a própria natureza das providências cautelares, que têm por características designadamente, a provisoriedade e a sumaridade, se é possível concluir, sem margem para dúvidas, que a pretensão formulada ou a formular no processo principal será julgada procedente.

No caso “sub judice” estão em causa garantias autónomas cuja função não é assegurar o cumprimento de um contrato mas sim, assegurar que o beneficiário receberá, nas condições previstas no texto da garantia, uma determinada quantia em dinheiro ( o garante assume o compromisso de pagar sem discutir a divida subjacente).

O pagamento à primeira solicitação pelo garante implica a obrigação, para este, de pagar ao beneficiário da garantia as quantias objecto da garantia, não lhe podendo opor quaisquer excepções relativas à relação principal, a menos que haja evidentes e graves indícios de actuação de má-fé ou abuso de direito.

Ora, na situação em apreço, não resulta evidente o cumprimento exacto, integral e pontual das obrigações emergentes do Contrato, desde logo face aos argumentos utilizados pela entidade requerida e pela requerente.

O requisito do “periculum in mora” encontrar-se-á preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objecto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.

Todavia, o requerente não alega factualidade demonstrativa de uma situação de facto consumada e/ou a produção de prejuízos de difícil reparação nem inequívoca fraude manifesta ou evidente abuso do beneficiário no accionamento dos seguros-caução.

Será em função das especificidades do caso concreto, traduzido na alegação da causa de pedir e da formulação do pedido, que o “ juiz a quo” decidirá da admissibilidade dos meios de prova, de forma a obter o indispensável esclarecimento da factualidade sobre a qual assentará a solução de direito.

O esclarecimento exigível corresponderá ao “estritamente necessário” (na expressão usada pela doutrina – cfr. autores e obra cit., pág. 597), para decidir o pedido de decretamento das providências cautelares requeridas, considerando a natureza sumária, perfunctória e instrumental, que caracteriza este meio processual e cuja finalidade consiste a de acautelar o efeito útil da decisão a proferir na acção principal de que depende.

É certo que a ora Recorrente arrolou testemunhas e com elas pretendia proceder à demonstração dos factos por si alegados.

Foi proferido despacho, que dispensou a prova testemunhal requerida pelas partes, o que traduz o juízo feito sobre a necessidade e a adequação da prova requerida, no sentido de a mesma não ser necessária, por a prova produzida, designadamente a documental, se afigurar suficiente e adequada para a decisão a proferir.

No caso concreto, mediante confronto entre, por um lado, aquela que é a alegação das partes e a prova documental junta aos autos e, por outro, aquela que é a fundamentação de Direito explanada na sentença recorrida, verifica-se que o Tribunal estava habilitado a decidir, no sentido que decidiu, sem necessidade de prova testemunhal.

E isto porque não foram pelo requerente alegados factos susceptíveis de determinar qualquer outra decisão.

Assim, a sentença recorrida mostra-se correcta.

Pelo exposto, emito parecer no sentido da improcedência do recurso.

Lisboa, 7 de Outubro de 2014
A Magistrada do MºPº

(Fernanda Carneiro )