Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:02/16/2012
Processo:08482/12
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL.
Texto Integral:Vem o presente recurso jurisdicional interposto pela Autora da sentença que considerou improcedente a acção por si proposta contra o Fundo de Garantia Salarial, com vista à declaração de nulidade ou anulabilidade do despacho de 3-5-2010, do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, bem como à condenação do Demandado á prática do acto devido, traduzido no pagamento, por este, da quantia de 16.272.10 € .
Segundo a recorrente, à data da declaração de insolvência não se encontrava prescrito o direito de crédito da Recorrente, nem se encontrava ainda definido o seu direito até porque estava em causa a apreciação dos fundamentos para um despedimento ilícito; E da conjugação dos artºs 319º e 320º resulta que os créditos que a recorrente detém no período de referência deverão ser pagos integralmente e os créditos fora do período de referência - para além dos 6 meses – o montante a pagar não pode exceder o triplo da retribuição mínima mensal garantida. Assim, considera que a sentença fez incorrecta aplicação destes preceitos legais.

Vejamos se tem razão:

A Recorrente requereu, em 23-3-2009, ao Fundo de Garantia Salarial, o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, no valor de 19,611,23 €.

O despacho impugnado indeferiu –lhe o pedido com fundamento em que” os créditos requeridos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da acção ( insolvência, falência, recuperação de empresa ou PEC), nos termos do nº1 do artº 319º da Lei nº 35/2004, de 29-7, ou após a data da propositura da mesma acção, nos termos do nº2 do mesmo artigo”

A data da última retribuição da Autora foi 30-6-2007, tendo ocorrido a cessação do seu contrato de trabalho em 18-7-2007.

A acção para declaração de insolvência da sociedade empregadora, foi proposta no dia 25-3-2008, tendo a respectiva declaração de insolvência ocorrido por sentença de 26-9-2008, publicada no DR, II série, de 8-9-2008.

Nesta acção e dentro do prazo fixado para o efeito na referida sentença, a Recorrente reclamou o seu crédito de 19,611,23 €., nos termos exigidos pelo nº1 do artº 128º do CIRE, o qual lhe foi reconhecido conforme notificação que lhe foi feita pelo Administrador de Insolvência de 28-10-08.

Vejamos agora o que referem as disposições legais aplicáveis do Regulamento do Código de Trabalho ( RCT):

Artigo 317.o

Finalidade

O Fundo de Garantia Salarial assegura, em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação nos termos dos artigos seguintes.

Artigo 318.o

Situações abrangidas

1 — O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo anterior, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente.

Artigo 319.o

Créditos abrangidos

1 — O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da acção ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior.

2 — Caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.o 1 do artigo seguinte, o Fundo de Garantia Salarial assegura até este limite o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência.

Artigo 320.o

Limites das importâncias pagas

1 — Os créditos são pagos até ao montante equivalente a seis meses de retribuição, não podendo o montante desta exceder o triplo da retribuição mínima mensal garantida.

2 — Se o trabalhador for titular de créditos correspondentes a prestações diversas, o pagamento é prioritariamente imputado à retribuição.

A cresce que nos termos do artº 91º nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente;

Mas se nos termos do nº1 do artº 128º, do mesmo Código, os credores devem reclamar a verificação dos créditos vencidos, só após o respectivo reconhecimento é que os podem solicitar ao Fundo de Garantia Salarial.

Nos termos da segunda parte do nº2 do artº 319º do RCT, o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos vencidos após os seis meses que antecedem a data da propositura da acção, caso não haja créditos vencidos neste período

Ora, tendo em vista que não existem créditos vencidos nos seis meses que antecedem a propositura da acção de declaração de falência, a qual ocorreu em 25-3-2008, ou seja, entre 25-9-2007 e esta data, parece-nos que só após o vencimento e reconhecimento dos créditos da Recorrente na acção de insolvência, em 28-10-2008, é que se podem os mesmos considerar vencidos - e, nomeadamente, o crédito por despedimento ilícito uma vez que o mesmo precisa de ser demonstrado e declarado pelo Tribunal - para efeito de ser atribuído pelo FGS , a competente indemnização.

A ser como a Entidade Demandada pretende, ou seja, que os créditos se venceram à data da cessação do contrato de trabalho, em 18-7-2007, e que,

portanto, a acção de declaração de falência teria que ser proposta nos seis meses posteriores, para o trabalhador ter direito à indemnização do FGS, ficaria sem qualquer efeito prático o nº2 do artº 319º, bem como o vencimento de todas as obrigações do insolvente determinado pela declaração de insolvência, a que se refere o artº 91º nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), e ainda o reconhecimento dos créditos a que se refere o nº 1 do artº 128º do CIRE..

Ou seja, a finalidade para que foi criado o FGS de, em caso de falência ou insolvência do empregador, assegurar ao trabalhador uma indemnização para pelo Estado, ficaria na maioria dos casos sem qualquer efeito prático.

E isto porque, quando a insolvência fosse decretada e os créditos vencidos e reconhecidos, já o trabalhador não teria direito ao respectivo pagamento nem pela empregadora nem pelo FGS, o que nos parece um conta-senso dada a manifesta inutilidade que teriam esse vencimento e reconhecimento.

Nestes termos, afigura-se-nos que procede o presente recurso jurisdicional, devendo a sentença ser revogada e ser determinado ao FGS que proceda ao pagamento da quantia peticionada.