Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:07/10/2014
Processo:10358/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:PEDIDO DE ASILO.
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL - N.º 1 DO ART.º 25.º DA LEI N.º 27/2008, DE 30/06.
PROCESSO URGENTE.
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA - ART.º 27.º DO CPTA.
SENTENÇA PROFERIDA COM VIOLAÇÃO DO N.º 3 DO ART.º 40.º DA LPTA.
Texto Integral: Procº nº 10358/14
2º Juízo- 1ª Secção
Acção Administrativa Especial
Pedido de asilo
Processo urgente
Parecer do MP




Vem o presente recurso jurisdicional interposto pela entidade demandada, ora recorrente, da sentença que considerou procedente a acção administrativa especial contra si proposta pela antora, com vista à anulação do acto que lhe indeferiu o pedido de asilo e consequente atribuição do mesmo ou, em alternativa, autorização de residência por razões humanitárias.

No nosso entender, existe uma questão formal que obsta à apreciação, por este TCAS, do recurso jurisdicional interposto e, consequentemente, torna provavelmente inútil qualquer parecer sobre a questão de mérito.

E essa questão formal prende-se com a necessidade de ter sido deferida a apresentada reclamação para a conferência, antes da interposição do recurso jurisdicional.

Efectivamente, parece-nos que deveria ter sido deferida a reclamação para a conferência antes da interposição deste recurso jurisdicional.

Não obstante, foi proferido despacho de não admissão da reclamação e foi proferido despacho de admissão de recurso o qual, contudo, não vincula o tribunal superior, conforme determina o artº 651º nº 5 do CPC, pelo que importa reagir contra esse despacho que, quanto a nós, deverá ser revogado.

Vejamos porquê:


A decisão recorrida foi proferida em processo urgente de pedido de asilo, o qual segue a forma da acção administrativa especial, nos termos do artº 25º, da Lei nº 27/2008, de 30-6, tal como a própria autora refere no intróito da sua petição e ao contrário do que vem referido no despacho de 1-7-2014, de rejeição da reclamação para a conferência.

- O valor da acção é de 30.000,01€, e, como tal, deverá considerar-se superior ao da alçada dos tribunais administrativos de círculo ( artº 6º nº 3 do ETAF e 24º, nº 1, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei nº 3/99, de 13-1, na redacção do DL nº 303/2007, de 24-8).

Nos termos do nº 3, do artº 40º, do ETAF, nas acções administrativas especiais de valor superior à alçada ( dos tribunais administrativos de círculo ), o tribunal funciona em formação de três juízes, à qual compete o julgamento de facto e de direito.

Assim, qualquer decisão do relator, proferida num processo em que o tribunal funciona em formação de três juízes e se for passível de recurso jurisdicional, deverá ser, previamente, objecto de reclamação para a conferência.

Isto decorre dos princípios gerais de processo civil, mas também do nº 1 do artº 27º ao referir-se aos “demais poderes do relator”, sendo que o nº 2 abrange todos os despachos do relator proferidos no âmbito do nº 1, ou seja os previstos no CPTA e não só no artº 27º.

Estabelece o nº 2, do artº 27º, do CPTA que “ dos despachos do relator cabe reclamação para a conferência, com excepção dos de mero expediente, dos que recebam recursos de acórdão do tribunal e dos proferidos no Tribunal Central Administrativo que não recebam recursos de acórdãos desse tribunal”.

Ora, como se refere no acórdão do STA de 5-6-12 in recº nº 420/12, a designação de despacho contida no nº 2 do artº 27º abrange também as decisões do relator onde se incluem as sentenças.

Segundo este acórdão,“Das decisões proferidas por juiz singular que, nos termos da lei, devam ser apreciadas por tribunal colectivo, há sempre, e apenas, reclamação para a conferência. Nunca recurso”

Por outro lado e ainda nos termos do mesmo acórdão, não obsta à aplicação do citado nº 2 do artº 27º a natureza urgente do processo, uma vez que o nº 2 do artº 40º do ETAF não distingue entre acção administrativas especiais urgentes e não urgentes e os artºs 100º nº 1 e 102º nº 1, ambos do CPTA, remetem para a tramitação e normas aplicáveis às acções administrativas especiais.

Ora, se bem que este acórdão foi proferido numa acção de responsabilidade pré – contratual, a doutrina do mesmo aplica-se também a estas acção de pedido de asilo na medida em que como aquelas existe uma remissão expressa na lei para a mesma forma de processo, ou seja as acções administrativas especiais, e ambas são de natureza urgente.

De facto, a única diferença entre a presente acção e a acção de responsabilidade pré-contratual é que nesta a remissão para a forma de processo a utilizar está inserida em diploma autónomo e naquela a remissão encontra-se no próprio CPTA.

Assim, não se vê que uma questão meramente formal justifique um tratamento diferente entre este tipo de acções, pois a razão de ser da aplicação dos preceitos contidos no nº3 do artº 40º da LPTA e o nº2 do artº 27º do CPTA, verifica-se também neste tipo de acções que, seguindo a forma de acções administrativas especiais, não se encontram excluídas dos citados preceitos só pelo facto de estarem previstas em normas especiais não insertas no CPTA, mas que para o mesmo remetem quanto à forma do processo.

Portanto, no caso vertente, deveria ter sido admitida a reclamação para a conferência apresentada atempadamente pelo pelo autor, da sentença, nos termos do nº 2 do artº 27º do CPTA (cfr, ainda, os acs do STA de 6-3-2007, 20-5-2010, 19-10-2010, de 30-5-2012, de 5-6-2012( para uniformização de jurisprudência), de 5-12-2013( formação alargada), de 10-10-2013 e de 16-1-2014 in procs nºs 46051, 248/10, 0542/10, 0543/12, 420/12, 1360/13, 1064/13 e 1161/13, respectivamente e acs do TCAS de 26-9-13, de 11-4-2013, de 11-7-2013, 12-11-12, 4-10-12, 12-01-12, 1-3-12, 6-10-11, 20-12-12, 10-1-13, 10-1-13,23-5-13, 24-4-13 e 24-4-13, in recºs nºs 10361/2013, 09571/12, 10073/13, 09373/12, 05269/09, 08262/11, 04058/08, 07802/11, 09313/12, 07752/11, 09384/12, 09654/12, 09907/13 e 09915/13, respectivamente).

Afigura-se-nos que foi este o entendimento seguido pelo STA no acórdão de 10-10-2013 in procº nº 01064/13, decidindo que todas as decisões proferidas por juiz singular que devessem ser decididas por tribunal colectivo, nos termos do nº3 do artº 40º do ETAF estão sujeitas a reclamação para a conferência como condição prévia à interposição de recurso jurisdicional, independentemente de na mesma se fazer referência a qualquer dispositivo legal, mormente da alínea i) do nº 1 do artº 27º do CPTA.

Termos em que, pelo exposto, emitimos parecer no sentido da revogação do despacho que admitiu o presente recurso jurisdicional e não admitiu a reclamação para a conferência, devendo os autos baixar à primeira instância para aí serem os autos submetidos à conferência.

A Procuradora - Geral Adjunta



Maria Antónia Soares