Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:07/08/2014
Processo:11222/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA.
MANIFESTA PROCEDÊNCIA DA ACÇÃO PRINCIPAL.
APRECIAÇÃO DAS ILEGALIDADES DO ACTO SUSPENDENDO.
PONDERAÇÃO DE INTERESSES DE NATUREZA PÚBLICA.
DIREITOS DOS CIDADÃOS EM CONCRETO E EM ABSTRACTO.
Texto Integral:Procº nº 11222/14
2º Juízo-1ª Secção

Suspensão de Eficácia

Parecer do MP

Vem o presente recurso jurisdicional interposto pela entidade demandada, C..., do acórdão que deferiu o pedido de suspensão de eficácia formulado pelo requerente, C..., da deliberação de 14-02-2013, que determinou a desocupação e entrega do terreno com a área de 1,6 hectares propriedade da CostaPolis, acrescida de 1520m2, aproximadamente, em domínio público marítimo, integrado na Zona de Intervenção das Praias Urbanas, que ocupa como Parque de Campismo, livre de pessoas e bens, no prazo de 120 dias, sob pena de despejo imediato, com eventual recurso às entidades policiais competentes.

Questão prévia:

Segundo o recorrido, cabia reclamação para a conferência da sentença uma vez que a mesma foi proferida nos termos da alínea h) do nº1 do artº 27º do CPTA.

Não tem, porém, razão, a nosso ver.

De facto, só nas acções administrativa especiais, de valor superior à alçada dos tribunais de primeira instância, é que tem aplicação o artº 27º do CPTA.

E isto porque o nº3, do artº 40º, do ETAF, determina que as acções administrativas especiais de valor superior à alçada são decididas pela formação de três juízes, o que equivale a que um deles exerça as funções de relator.

Ora, no caso das providências cautelares, o julgador não funciona como relator, uma vez que o processo não é decidido por um tribunal colectivo, já que não é uma acção administrativa especial.

Nestes termos, improcede a questão prévia formulada pelo recorrido , bem como a reclamação para a conferência do despacho de admissão de recurso, tal como bem decidiu o M Juiz a quo.

***

Quanto ao mérito do recurso jurisdicional afigura-se-me que a sentença deverá manter-se.

1.De facto, afigura-se-nos que se verifica o requisito do periculum in mora, atendendo aos factos dados como provados nos artºs 34º, 35º e 36º da factualidade assente, os quais traduzem uma situação de facto consumado para 3000 cidadãos que não só são despejados do parque de campismo depois de 60 anos de utilização, como não lhes foi colocada qualquer alternativa para transferirem os seus bens, muitos deles a morarem no Parque com carácter de permanência e já com uma idade avançada, uma vez que os novos parques de campismo que estavam perspectivados e que permitiam a sua transferência, foram inviabilizados por razões que são estranhas ao recorrido ( cfr artºs 31º e 32º da factualidade assente).

2.Por outro lado, não se nos afigura manifesta a improcedência da acção, não tendo, nem podendo, deste modo, ser apreciada, na providência cautelar , a questão da invocada ilegalidade do acto suspendendo, uma vez que a acção principal é o meio adequado para esse efeito, pelo que também se verifica o requisito do fumus boni iuris.
De facto, não foi invocada qualquer ilegalidade do acto suspendendo que resulte evidente. Este facto não precisa de ser explicado pelo julgador, pelo que não incorre em omissão de pronúncia por não ter apreciado as ilegalidades invocadas.
Se as tivesse que apreciar, seria sinal que não eram manifestas, o que tornava inútil essa apreciação.
Só teria que fundamentar a decisão se considerasse evidentes as ilegalidades, ou alguma delas e, consequentemente, manifesta a procedência a acção principal, pois esta situação é uma situação excepcional que conduz à procedência do pedido de suspensão sem necessidade de apreciação dos restantes requisitos normalmente exigidos para o efeito, contidos nas alíneas b) e c) do nº1 do artº 120º do CPTA.

3.E finalmente, ponderando os interesses em presença, afigura-se-nos que o interesse do recorrido deverá prevalecer sobre o interesse da entidade demandada.

De facto, o interesse da entidade demandada, sem dúvida também relevante, prende-se com a necessidade de implementação, no terreno ocupado pelo P..., do Programa Polis, 1, instituído pelo DL nº 229/2001, de 20-8, sendo que, para o referido terreno está prevista, de acordo com o Plano de Pormenor das Praias Urbanas da Costa da Caparica, aprovado pelo DL nº 119/2000, de 4-7, a instalação de equipamentos colectivos úteis à população em geral, para aproveitamento de uma área de protecção costeira, zona de protecção em ordem a cumprir o Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra-Sado, publicado no DR Nº144, I série B, de 25-6-2003, que prevê o recuo das parques de campismo a norte, entre os quais o da recorrida.

Só que o concurso para execução da empreitada de requalificação do espaço público, no local do PC, ao contrário do que a recorrente, referira, não chegou a ser aberto ( artº 28º da factualidade assente), não estando, assim, em causa a aplicação do financiamento pelo Programa Operacional Temático Valorização do Território, previsto para 2007- 2013.

Além disso, competia à recorrente, na impossibilidade de transferência do Paque de Campismo para o Pinhal Inglês como ficara acordado( cfr artº 32º da factualidade assente), apresentar outra alternativa para essa transferência, o que não consta que tivesse feito.

De referir que embora estejam em confronto dois interesses de natureza pública, um deverá prevalecer sobre o outro, porque existe uma maior afectação imediata dos interesses e direitos fundamentais dos cidadãos defendidos pelo recorrido, do que no caso do interesse público que a recorrente visa prosseguir.

Ou seja, em caso de conflito entre os direitos dos cidadãos identificados e os direitos dos cidadãos em geral, decorrentes da prossecução dos direitos do urbanismo, parece-me que deverão prevalecer os primeiros, até que lhes seja apresentada uma alternativa, como aliás estava previsto e foi sempre negociado entre a recorrente e o recorrido.

Verificam-se, assim, no meu entender, todos os requisitos necessários ao decretamento da providência conservatória requerida, contidos na alínea b) do nº1 e nº2 do artº 120º do CPTA.

Termos em que emito parecer no sentido da manutenção da sentença recorrida e improcedência do presente recurso jurisdicional.

A Procuradora –Geral Adjunta