Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:10/03/2014
Processo:10723/13
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Fernanda Carneiro
Descritores:CONTRA-ALEGAÇÕES.
PRESCRIÇÃO DO DIREITO INDEMNIZATÓRIO.
Texto Integral:Recurso Jurisdicional de Acção Administrativa Comum Ordinária
Nº 10723/13



CONTRA-ALEGAÇÕES DO ESTADO


Excelentíssimos Senhores Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo

A Magistrada do Ministério Público junto do TCAS vem nos autos supra referenciados apresentar as suas contra - alegações referentes ao recurso extraordinário de revista que o autor, F…, interpôs do douto Acórdão do TCA SUL proferido, em 19-06-2014, nos autos supra identificados que negou provimento ao recurso que interpusera da douta sentença proferida em 19-06-2013 que, conhecendo da pertinente exceção perentória, absolveu o R. do pedido, por prescrição do direito de indemnização.

Entendeu o douto Acórdão, ora Recorrido, não acolher os argumentos do A. porquanto e, em síntese:

- Resulta da PI que o A. pretende ser indemnizado pelo facto de natureza administrativo ­- tributária (que alega ser ilícito) do acionamento de uma garantia bancária referente à empresa de que era sócio-gerente;

- O facto ilícito danoso é, para o A. a decisão da AT de que certas condutas económicas da empresa tinham certo enquadramento jurídico, do qual resultou a final a penhora da sua pensão – o dano concretizado – que surgiu após o acionamento da garantia bancária em 21-2-2002, que a CCA pagou entre Março e Maio de 2002 pelo que a penhora, aliás pedida por terceiro, não resulta, nem mediatamente, do alegado facto ilícito, sendo aliás o facto relevante pra a ilicitude, a conduta da AT e não a conduta de terceiro que satisfaz a garantia e depois, ao abrigo do direito civil, persegue o seu devedor;


- A CCA deduziu execução contra a empresa do autor e contra este, como co-executado tendo o A sido citado em 24.01.2008 e deduzido oposição por embargos do executado pelo que os factos constitutivos do seu direito, pressupostos da alegada responsabilidade civil já eram logicamente conhecidos pelo A no momento em que foi citado para a execução cível deduzida pela CCA ;

- O A. confunde a eventual “ falta de interesse processual nesta acção” com “não ter fundamento para esta acção” ao defender que o prazo de prescrição só teve inicio após o trânsito em julgado - em Outubro de 2009 – da decisão referente à oposição;

- Não existiu qualquer facto interruptivo para efeitos do artigo 323º, nº1 do CC, nomeadamente a reclamação graciosa tributária por parte da dita empresa pois, não tem sentido considerar que tal atitude da empresa exprime directa ou indirectamente, a intenção do A. exercer o direito indemnizatório.

- Assim, tendo a acção inicio em 15.9.2011 e tendo o R. Estado Português , sido citado em 04-09- 2012, prescreveu o eventual direito indemnizatório em 24.01.2011.


Defende o A. que o douto Acórdão recorrido violou o disposto noa artigos 498º, nº1 e 323º, nº1, ambos do Código Civil, com os fundamentos a seguir, em síntese, indicados:

- o prazo de 3 anos previsto no artigo 498º, nº1 do CC, só se poderia iniciar após o trânsito em julgado da decisão que julgou improcedente a oposição à execução no âmbito do processo nº 143/2002 da 3ª Sec. da 1ª Vara Cível de Lisboa – Outubro de 2009;

- Caso os embargos viessem a ser procedentes, deixaria de ter fundamento para a instauração da presente ação administrativa comum, com processo ordinário, com vista ao pagamento de todos os prejuízos que resultaram da execução da garantia bancária;

- Antes de Outubro de 2009 não sequer tinha legitimidade para propor uma ação contra o Estado pois já não era gerente da empresa em causa desde 5.5.98 sendo que essa legitimidade só veio a verificar-se depois de ver penhorada a sua pensão no referido processo 143/2002;

- só com as penhoras de 1/3 da sua pensão de invalidez, efetuadas no âmbito da execução nº 143/2002, nunca antes de Outubro de 2009, é que o recorrente teve conhecimento da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil e de que se tinham verificado todos os prejuízos indicados na petição inicial;

- A dedução da reclamação graciosa pela sociedade F… configura causa de interrupção prevista no n.º 1 do artigo 323.º do CC, tanto mais que, na altura, seria a parte legitima para tal efeito e nunca o recorrente.


A – Questão Previa

1.Admissibilidade do Recurso

QUANTO AOS FUNDAMENTOS DO RECURSO DE REVISTA

Dispõe o art.º 150º do CPTA:
1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

O recorrente não invoca, nem fundamenta, verificar-se qualquer daqueles requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA.

Ora, como se escreve no douto Acórdão do STA de 16-01-2013, 01060/13 “…E seguro é que é sobre o requerente que recai o ónus de alegar e intentar demonstrar a verificação dos requisitos legais de admissibilidade deste extraordinário meio processual de sindicância jurisdicional, alegações e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. art.ºs 676º n.º 2, 684º n.º 1 (in fine) e 2, e 685º-A n.º 1 e 2 do CPC, subsidiariamente aplicável -. …”

Por outro lado, as questões suscitadas pelo recorrente – não verificação da prescrição e existência de causa interruptiva da prescrição - não se assumem de qualquer relevância jurídica ou social, pelo menos fora deste processo, nem foi invocado ou existe qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCAS.

É vasta a jurisprudência desse Venerando Tribunal que se tem pronunciado sobre os referidos pressupostos necessários à admissibilidade deste tipo de recurso jurisdicional, citando - se, a título de exemplo, o Ac. proferido em 07 - 12 - 11, no Proc. nº 01033/11:
“O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA.
Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA)”.

Também como se expende no Acórdão desse Venerando Tribunal de 22/03/07, Rec. 0217/07, « (…) a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância, sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins tidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA).”

Acontece que, no caso em apreço, não foram invocados pelo recorrente nem se mostram preenchidos os pressupostos que condicionam a admissão do recurso de revista.

Em primeiro lugar, a situação em análise não é passível de se reconduzir ao quadro de uma eventual necessidade de admissão do recurso com o fim de obter uma melhor aplicação do direito.

Com efeito, nem sequer o recorrente invoca que a doutrina e/ou jurisprudência se tenham vindo a pronunciar em sentido contrário sobre a questão, desse modo se tornando necessária a sua clarificação para se obter uma melhor aplicação.

Nem se evidencia que a posição assumida no Acórdão recorrido esteja desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis, não se detectando qualquer erro clamoroso ou ostensivo no aresto em causa, sendo que o decidido no Acórdão recorrido radicou num quadro factual determinado.

Em segundo lugar, no presente recurso está em causa:
- a decisão contida no douto Acórdão recorrido que confirmou o acórdão de 1ª instância, ambos decidindo pela inexistência de qualquer facto interruptivo para efeitos do artigo 323º, nº1 do CC e pela verificação da prescrição do direito indemnizatório.

Ora, para aferir se houve violação ou não dos artigos 498º, nº1 e 323º, nº1 do CC terá que se apreciar previamente a matéria de facto já que a questão de direito que se suscita não é definível em abstracto, variando caso a caso, com a questão concreta apresentada no processo e com a interpretação do julgador na situação específica, radicando o Acórdão recorrido num quadro factual determinado.

Sendo que o presente recurso de revista, nos termos do disposto no artigo 150, n° 2 a 4, do CPTA, só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual, competindo ao tribunal de revista aplicar definitivamente o direito aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o que obsta, salvo os casos referidos no seu n° 4 (que, no caso em análise se não verificam) a que tribunal de recurso se pronuncie sobre a matéria de facto.

Em terceiro lugar nem o Recorrente alega, nem o sindicado aresto evidencia, sobre os controvertidos pontos, decisão ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, em termos de poder qualificar-se como susceptível de integrar “erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ”.

O Tribunal ora recorrido – o TCASul – fixou incontestada e definitivamente os factos materiais da causa e com o apoio jurisprudencial e doutrinário que expressamente convoca, concluiu e decidiu, negando provimento ao recurso, assim mantendo a decisão proferida em 1º instância.

Por último, será de realçar que não se vislumbra que a matéria subjacente se tenha revelado e seja “de elevada relevância e complexidade” jurídicas susceptíveis de “suscitar dúvidas sérias na jurisprudência e doutrina”, nem que a questão apreciada e decidida pelas instâncias, “seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis”.

Entendemos, em consequência, que o presente recurso extraordinário de revista não deverá ser conhecido, por não preencher os requisitos do art.º 150º nº 1 do CPTA, mas V. Exªs melhor decidirão.

B - QUANTO AO MÉRITO DO RECURSO DE REVISTA

Para o caso de assim não se considerar e o recurso ser conhecido, entendemos então que esse Venerando Tribunal deverá decidir pela manutenção do julgado.

O entendimento do recorrente de que o prazo de 3 anos previsto no artigo 498º, nº1 do CC, só se poderia iniciar após o trânsito em julgado da decisão que julgou improcedente a oposição à execução no âmbito do processo nº 143/2002 da 3ª Sec. da 1ª Vara Cível de Lisboa – Outubro de 2009 – porquanto só nesta data teria conhecimento do direito que lhe competia e da extensão integral dos danos que peticionou, não se pode aceitar pelas razões, a seguir indicadas.

Da factualidade dada como assente resulta que o Recorrente foi sócio da sociedade por quotas “ F…” até 2000 e sócio-gerente até Maio de 98 (factos dados como provados 1) e 2).

Também foi dado como provado que em Março de 97 a F… constituiu garantia bancária especifica para circulação intra-comunitária com o nº 80/97, no âmbito da qual a C… se obrigou com principal pagador, ao primeiro pedido da Direcção Geral das Alfândegas de Lisboa, a pagar no prazo de 8 dias a contar da data do pedido todos as quantias da responsabilidade da F… bem como que, como contra garantia junto da C…, foi subscrita uma livrança pela sociedade e avalizada pelos sócios ( factos provados 5) a 7) .

Ora, o os actos que determinaram o acionamento da garantia – não pagamento de divida referente à liquidação do imposto sobre o tabaco - que o Recorrente reputa ilícito foram do conhecimento deste último pelas notificações levadas a cabo pela Direção das Alfândegas, Alfandega do Jardim do Tabaco, em 97 e Abril de 98, período em que desempenhava as funções de gerente ( CFR. FACTOS PROVADOS DE 1) a 9).

Por outro lado, foi o ora recorrente citado em data anterior a 24-01-2008, da execução instaurada pela C… contra a F… em que é co-executado o recorrente,para cobrança da quantia que aquela pagou em virtude da entidade afiançada no âmbito da garantia bancária nº 80/97 – “F…” – não ter procedido ao pagamento da divida relativa à liquidação do referido imposto sobre o tabaco ( cfr. factos dados como provados nºs 10 a 13).
Assim, em data anterior a 24.1.2008, já o recorrente tinha conhecimento e estava em condições de formular um juízo objetivo pelo qual poderia qualificar o acto como gerador de responsabilidade civil, sendo-lhe já perceptível ter sofrido danos em consequência dele, isto é, já tinha o recorrente conhecimento dos pressupostos fácticos da responsabilidade civil.

Quando ocorreu o trânsito da decisão dos embargos de executado deduzidos pelo recorrente – Outubro de 2009 – já há muito ele era conhecedor da lesão, porquanto o acto que definiu a situação jurídica em causa e que o próprio Autor, ora recorrente, identifica como lesivo para os seus interesses e, como tal gerador do direito à indemnização – actuação ilícita da AT ao acionar a garantia bancária - , ocorreu antes de 2008 e, portanto muito antes do trânsito em julgado da decisão proferida na oposição à execução.

Ora, como se escreve no douto Ac. do STA de 6.2.2014, 01811/13:
“I – O «conhecimento», pelo lesado, «do direito que lhe compete» – como refere o art.º 498º, n.º 1, do Código Civil – consiste em ele conhecer os factos constitutivos dos requisitos da responsabilidade, pelo que não traduz a sua consciência de que haja uma possibilidade legal de ressarcimento.
II – Assim, a circunstância do lesado se ter abstido de encarar os factos lesivos por uma certa perspectiva jurídica, que levaria à responsabilização de determinadas entidades, é inapta para modificar o termo inicial do prazo de prescrição, diferindo-o para o momento em que lhe ocorresse olhar os factos por esse prisma….
…IV – Daí que esse lesado, conhecendo a lesão, não possa ignorar uma das suas óbvias linhas de causalidade e diferir para o momento futuro em que se lembrou dela o «dies a quo» do prazo prescricional do direito a exercer contra os respectivos agentes.”

Quanto ao não conhecimento da extensão integral dos danos antes do trânsito da decisão da improcedência dos embargos e da penhora bem como à falta de legitimidade do recorrente para instaurar uma acção contra o Estado antes daqueles momentos, também falece a argumentação do recorrente pois, como se escreve no douto Acórdão desse Venerando Tribunal de 6.2.2014, 0512/13:

“ I - O direito de indemnização por responsabilidade civil extra-contratual dos entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo o direito de regresso, prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da extensão integral dos danos, nos termos do disposto no art. 498º, nº 1, do Código Civil….”.

Aliás, nos casos em que o lesado ignore a extensão do seu dano, até o artigo 556º, , nº1 b) do CPC ( anterior 471º, n1, al b) permite que ele formule logo um pedido de indemnização genérico a liquidar antes de começar a discussão da causa – artº 358º nº1 do CPC);

Tal possibilidade do lesado deduzir um pedido genérico mostra bem que o prazo prescricional já está em curso pois, de outro modo, cair-se-ia no absurdo de dizer que o lesado já pode exercer o seu direito (embora em termos genéricos) e, simultaneamente, que ele não trem ainda “ conhecimento do direito que lhe compete”.

A procedência dos embargos e inerente extinção da execução levaria a uma eventual falta de interesse processual na acção não se confundindo com não ter fundamentos para esta acção, como bem refere o Acórdão recorrido.

Quanto à alegação de que a Reclamação Graciosa deduzida pela empresa F... constitui facto interruptivo da prescrição no termos do nº1 do artigo 323º do CC também não será de aceitar.

De facto, verifica-se que o procedimento invocado pelo recorrente - Reclamação Graciosa - foi deduzida por um terceiro, a empresa F… e não pelo ora recorrente, não relevando se o recorrente tinha ou não legitimidade para o efeito para deduzir tal procedimento.

Com efeito, invocando o recorrente um facto interruptivo caberia ao mesmo demonstrar que, para evitar a ocorrência da prescrição tomou, qualquer das atitudes previstas no artigo 323º do CC prova.

É que, tem que ser o próprio titular, isto é, quem se arroga o direito, a tomar as atitudes previstas no artigo 323º do CC.

Com efeito, invocando o recorrente um facto interruptivo, caberia ao mesmo demonstrar que para evitar a ocorrência da prescrição tomou qualquer das atitudes previstas no artigo 323º do CC, o que não logrou fazer.

Acresce que a cópia da reclamação graciosa junta a fls. 328 a 334 nem sequer demonstra qual a data de entrada na Alfândega para que se possa aferir da sua tempestividade.

Por outro lado, a reclamação graciosa do acto de liquidação, no âmbito do CPT, não tinha efeito suspensivo do pagamento da quantia liquidada – cfr. Douto AC. do STA de 13-05-98, recurso 21447, AP – DR de 30-11-2001.

Pelo que o douto Acórdão, ora em recurso, pelos fundamentos nele aduzidos, para os quais remetemos, não mereça qualquer censura, devendo ser mantido.

CONCLUSÕES

1º No presente recurso está em causa a decisão contida no douto Acórdão recorrido que confirmou o acórdão de 1ª instância, ambos decidindo pela inexistência de qualquer facto interruptivo para efeitos do artigo 323º, nº1 do CC e pela verificação da prescrição do direito indemnizatório;

2º O recurso de revista, a que alude o nº 1, do artigo 150º do CPTA, tem por objectivo possibilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, sendo que os pressupostos da sua admissibilidade caracterizam a natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso;

3ºO recorrente não invoca, nem fundamenta, verificar-se qualquer daqueles requisitos ínsitos no nº1 do artigo 150º do CPTA ;

4ºAs questões suscitadas pelo recorrente no recurso reconduzem-se à não verificação da prescrição e à existência de causa interruptiva da prescrição imputando ao Acórdão recorrido a violação do disposto nos artigos 498º, nº1 e 323º, nº1 do CC;

5º Tais questões não se assumem de qualquer relevância jurídica ou social, pelo menos fora deste processo, nem foi invocado ou existe qualquer erro clamoroso de aplicação da lei aos factos que implique uma decisão diferente da que foi tomada por este TCAS;

6ºNão se evidencia que a posição assumida no Acórdão recorrido esteja desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis, não se detectando qualquer erro clamoroso ou ostensivo no aresto em causa, em termos de poder qualificar-se como susceptível de integrar “erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ”;

7º A situação em análise não é passível de se reconduzir ao quadro de uma eventual necessidade de admissão do recurso com o fim de obter uma melhor aplicação do direito porquanto, salvo o devido respeito por opinião contrária, não se verifica que a matéria subjacente se tenha revelado e seja “de elevada relevância e complexidade” jurídicas susceptíveis de “suscitar dúvidas sérias na jurisprudência e doutrina”, nem que a questão apreciada e decidida pelas instâncias, “seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis”.

8º Em consequência, o presente recurso extraordinário de revista não deverá ser conhecido, por não preencher os requisitos do art. 150º nº 1 do CPTA;

Caso assim se não entenda,
9º O recorrente, como resulta da PI, pretende ser indemnizado pelo facto de natureza administrativo ­- tributária ( que alega ser ilícito) do acionamento de uma garantia bancária referente à empresa “ F… ” de que era sócio-gerente;

10º Da matéria fáctica provada resulta que em Março de 97 a F… constituiu garantia bancária especifica para circulação intra-comunitária com o nº 80/97, no âmbito da qual a C… se obrigou com principal pagador, ao primeiro pedido da Direcção Geral das Alfândegas de Lisboa, a pagar no prazo de 8 dias a contar da data do pedido todos as quantias da responsabilidade da F… bem como que, como contra garantia junto da C… foi subscrita uma livrança pela sociedade e avalizada pelos sócios ( factos provados 5) a 7);

11ºResulta também da factualidade dada como assente, que o Recorrente foi sócio daquela empresa até 2000 e gerente até Maio de 1998 e que teve conhecimento dos actos que determinaram o acionamento da garantia – não pagamento de divida referente à liquidação do imposto sobre o tabaco - que reputa ilícito através das notificações levadas a cabo pela Direção das Alfândegas, Alfandega do Jardim do Tabaco, em 97 e Abril de 98, período em que desempenhava as funções de gerente ( CFR. FACTOS PROVADOS DE 1) a 9);

12ºResulta igualmente provado que foi o ora recorrente, citado, em data anterior a 24-01-2008, da execução instaurada pela C… contra a F… para cobrança da quantia que aquela pagou em virtude da entidade afiançada no âmbito da garantia bancária nº 80/97 – “F…” – não ter procedido ao pagamento da divida relativa à liquidação do referido imposto sobre o tabaco ( cfr. factos dados como provados nºs 10 a 13;

13ºAssim, quando ocorreu o trânsito da decisão dos embargos de executado deduzidos pelo recorrente em Outubro de 2009 já há muito ele era conhecedor da lesão porquanto, o acto que definiu a situação jurídica em causa e que o próprio Autor, ora recorrente, identifica como lesivo para os seus interesses e, como tal gerador do direito à indemnização – actuação ilícita da AT ao acionar a garantia bancária - , ocorreu antes de 2008 e, portanto muito antes do trânsito em julgado da decisão proferida na oposição à execução;

14ºEm data anterior a 24.1.2008, já o recorrente estava em condições de formular um juízo objectivo pelo qual poderia qualificar o acto como gerador de responsabilidade civil, sendo-lhe já perceptível ter sofrido danos em consequência dele, isto é, já tinha o recorrente conhecimento dos pressupostos fácticos da responsabilidade civil;

15ºOra, como se escreve, designadamente, no douto Ac. do STA de 6.2.2014, 01811/13:
“I – O «conhecimento», pelo lesado, «do direito que lhe compete» – como refere o art. 498º, n.º 1, do Código Civil – consiste em ele conhecer os factos constitutivos dos requisitos da responsabilidade, pelo que não traduz a sua consciência de que haja uma possibilidade legal de ressarcimento.”;

16ºNos termos do disposto no artigo 498º, nº1 do CC, o direito de indemnização por responsabilidade civil extra-contratual dos entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da extensão integral dos danos;

17ºAliás, nos casos em que o lesado ignore a extensão do seu dano, até o artigo 556º, , nº1 b) do CPC ( anterior 471º, n1, al b) permite que ele formule logo um pedido de indemnização genérico a liquidar antes de começar a discussão da causa – art.º 358º nº1 do CPC);

18ºTal possibilidade do lesado deduzir um pedido genérico mostra bem que o prazo prescricional já está em curso pois, de outro modo, cair-se-ia no absurdo de dizer que o lesado já pode exercer o seu direito (embora em termos genéricos) e, simultaneamente, que ele não trem ainda “ conhecimento do direito que lhe compete”;

19º Por outro lado, a procedência dos embargos e inerente extinção da execução levaria a uma eventual falta de interesse processual na acção não se confundindo com não ter fundamentos para esta acção, como bem refere o Acórdão recorrido;

20º Pelo exposto, falece o entendimento do recorrente de que o prazo de 3 anos previsto no artigo 498º, nº1 do CC, só se poderia iniciar após o trânsito em julgado da decisão que julgou improcedente a oposição à execução no âmbito do processo nº 143/2002 da 3ª Sec. da 1ª Vara Cível de Lisboa – Outubro de 2009 – porquanto só nesta data e com a realização da penhora, teria conhecimento do direito que lhe competia e da extensão integral dos danos que peticiono;

21º Bem como cai por terra a tese de que lhe faltava legitimidade para instaurar uma ação contra o Estado antes do trânsito da decisão que julgou improcedentes os embargos e da realização da penhora;

22º Quanto à alegação de que a Reclamação Graciosa deduzida pela empresa F… constitui facto interruptivo da prescrição no termos do nº1 do artigo 323º do CC também não será de aceitar;

23ºCom efeito, tem que ser o próprio titular, isto é, quem arroga o direito, a demonstrar que, para evitar a ocorrência da prescrição, tomou as atitudes previstas no artigo 323º, nº1 do CC, o que o recorrente não logrou fazer porque o procedimento por si invocado - Reclamação Graciosa - foi deduzida por um terceiro, a empresa F…l, e não pelo ora recorrente, não relevando se tinha ou não legitimidade para o efeito pois, o certo é que tal atitude da empresa não exprime direta ou indiretamente a intenção do ora recorrente exercer o direito indemnizatório;

24º Pelo que, ao decidir como decidiu o douto Acórdão, ora em recurso, mantendo a sentença da 1ª instância, não merece qualquer censura, devendo ser mantido.

Nestes termos e nos mais de direito deverão V. Exªs Venerandos Conselheiros não conhecer do presente recurso extraordinário de revista ou, assim não o entendendo, negar provimento ao mesmo mantendo o douto Acórdão recorrido, com o que, V. Exªs farão a costumada

JUSTIÇA


A Procuradora - Geral Adjunta


( Fernanda Carneiro )