Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:05/04/2012
Processo:03118/07
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISTA S.T.A.
Texto Integral:Tribunal Central Administrativo Sul

Proc. nº 03118/07 – Rec. Jurisdicional
2º Juízo/1ª Secção ( Contencioso Administrativo )


Venerando Juiz Desembargador Relator


A Magistrada do Mº Pº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada do Acórdão proferido a fls. 497 e segs., na Acção Administrativa Especial de impugnação e em que o Mº Pº litiga como Autor, dele vem interpor Recurso Extraordinário de Revista, para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º do CPTA, o qual tem efeito suspensivo e sobe imediatamente nos próprios autos, nos termos dos arts. 140º, 141º e 143º nº 1 do CPTA.

Por estar em tempo e ter legitimidade, requer a V. Exª que o presente recurso seja admitido naqueles termos.


Junta: Alegações de Recurso Jurisdicional e duplicados legais.



A Procuradora Geral Adjunta


( Clara Rodrigues )







Proc. nº 03118/07 – Rec. Jurisdicional
2º Juízo/1ª Secção ( Contencioso Administrativo )


ALEGAÇÕES DE RECURSO


Exmºs Juízes Conselheiros do Venerando
Supremo Tribunal Administrativo

O presente Recurso Excepcional de Revista, vem interposto, nos termos do art. 150º do CPTA, do Acórdão proferido, em 22.03.2012, nos autos supra referenciados, que julgou procedentes os recursos jurisdicionais interpostos pelas contra - interessadas Imobiliária… e Caixa Económica Montepio Geral, revogando a sentença do TAF de Leiria que havia julgado procedente a presente acção declarando nulos e de nenhum efeito a deliberação de 14 de Abril de 2003 da Câmara Municipal da Nazaré e os despachos de 22 e 29 de Julho e de 4, 9 e 20 de Agosto de 2003 do Presidente da mesma Câmara, por se tratar de actos cujo objecto é legalmente impossível.

O Acórdão, ora em recurso, entendeu revogar a sentença recorrida do TAF de Leiria, com fundamento, em resumo, que: «Pelo que vem de ser dito não tem sustentação no direito objectivo a afirmada caducidade da licença de loteamento com fundamento em incumprimento do prazo para conclusão das obras de urbanização, incorrendo o acórdão sob recurso em erro de subsunção da factualidade provada na previsão do artº 38º nº 2 alínea c) DL 448/91 de 29.11 na medida em que se trata de um domínio de caducidade ex voluntatis da Administração e não de caducidade ope legis, como foi considerado ao longo da fundamentação de direito, sendo de considerar ainda que a decisão postula a valoração jurídica pela entidade administrativa competente das circunstâncias apuradas, no seu entender susceptíveis de preencher o pressuposto legal que enforma a causa de caducidade.».

Por sua vez, a sentença proferida em 1ª instância havia considerado estarmos, no caso em apreço, perante uma caducidade ope legis, motivo por que os actos impugnados são de objecto impossível sendo o regime aplicável o da nulidade nos termos do art. 133º do CPA, porquanto: «(...) o alvará nº 2/98 foi emitido em 10 de Setembro de 1998, tendo sido fixado o prazo de 18 meses para a coclusão das obras (nº 1 do probatório). No entanto apenas em 23 de Outubro de 2002 a contra-interessada I... requereu a recepção provisória das obras, ou seja, após ter decorrido, há muito, o prazo de caducidade do Alvará.Por seu lado, o Presidente da Câmara Municipal da Nazaré, por despachos datados de 2003, veio a licenciar obras de acordo com o que connstava no alvará de loteamento nnº 2/98, ou seja, ultrapassado que estava o referido prazo de caducidade.
Ora, tendo caducado o Alvará, não poderia a Câmara Municipal ter recebido provisoriamente as obras, nem o presidente da Câmara Municipal poderia ter licenciado obras com base no referido alvará, já que estamos perante um acto cujo objecto é de realização impossível. Se o Alvará caducou, se já não existe, é juridicamente impossível a entidade demandada poder suportar - se nele para proceder à legalização de determinadas obras, dado que inexiste loteamento válido que o suporte.Como se refere no douto Acórdão do STA, proc.0912/02 de 10-01-2002, “Com efeito, é de objecto impossível o acto que pretende aferir a conformidade com o regime constante do DL 351/93, de 7-10 de um alvará já caducado.
É que convenhamos, não é física e juridacamente possível ajuizar da conformidadfe de algo que, por ter caducado, não tem existência na ordem jurídica.Estamos aqui em face de um acto cujo objecto é de realização impossível.”.
(...)
De acordo com o disposto no referido artigo 38º do Decreto- Lei nº 448/91de 29 de Novembro, já transcrito anteriormente, o alvará caduca, no caso dos autos, quando as obras não tenham sido concluídas nos prazos fixados. Ou seja, estamos perante uma caducidade ope legis.
(...) De notar que não vem referido, no corpo do artigo, que essa caducidade tenha de ser declarada, como aliás é estabelecido na actual legislação (artigo 71º do Decreto-lei nº 555/99, de 16 de Dezembro), devendo assim considerar-se que esta caducidade se verifica logo que esteja decorrido o prazo referido. Por seu lado, refere o nº 1 do artigo 39º do Decreto- Lei nº 448/91 de 29 de Novembro que ”no caso de caducidade do alvará, a câmara municipal procede ao seu cancelamento, dando o presidente da câmara conhecimento desse facto...”. Ora, como verificamos, no artigo em causa vem referido que, “no caso de caducidade do alvará ... e não no caso de declaração de caducidade do alvará, coisa bem diferente.».
Dos fundamentos das duas decisões resulta, desde logo, que se está perante duas questões jurídicas controversas, de relevância fundamental e que justifica, necessariamente, uma melhor aplicação do direito, como sejam:
1 – se no domínio do DL nº 448/91, abrangendo a operação de loteamento a realização de obras de urbanização, em que é emitido um único alvará (art. 28º nº 2), o regime da caducidade a que se reporta o art. 38º nº 2 al. c) do mesmo DL, por as obras não serem concluídas nos prazos fixados no alvará ou no prazo estipulado pelo Presidente da Câmara Municipal nos termos do nº 1 do art. 23º (não sendo pedida a sua prorrogação antes do terminus de tal prazo), opera ope legis ou, antes, ex voluntatis mediante declaração discricionária da entidade administrativa competente, ou seja, do Presidente da Câmara Municipal;
2 – no caso da caducidade ter de ser declarada, se decorrido o prazo fixado no alvará ou estipulado pelo Presidente da Câmara, sem que tenha sido pedida a sua prorrogação, nem se verificando qualquer situação de suspensão ou alteração da obra, essa mesma declaração de caducidade é ou não vinculativa para a Administração;
Estas questões (e eventualmente outras) levantam - se não só na presente acção, como em possíveis outras acções que venham a ser interpostas com o mesmo fundamento, estando - se, assim, perante questões cuja expansão e controvérsia se reveste de importância fundamental pela sua relevância jurídica, sendo ainda claramente necessária a uma melhor aplicação do direito, face à interpretação da letra e do espírito do direito aplicável ao caso – nomeadamente o inserto no art. 38º nº 2 al. c) do DL nº 448/91 – motivo pelo qual se justifica, a nosso ver, e salvo melhor opinião, uma reapreciação excepcional por esse Venerando Tribunal, que fixe uma interpretação que assegure a melhor aplicação do direito a todos os casos semelhantes, conforme se irá explanar em seguida.


Na matéria factual dada como provada na decisão de 1ª instância, que o Acórdão ora recorrido deu como reproduzida, assentou - se, no essencial e em resumo, que:
- Com data de 10 de Setembro de 1998 foi emitido o alvará nº 2/98 pela Câmara Municipal da Nazaré no qual foi fixado o prazo de 18 meses para conclusão das obras de urbanização que incidem sobre o prédio sito em Buzina, ou ladeira do Sítio da freguesia da Nazaré (fls. 304 do PA).
- Em 23 de Outubro de 2002 a contra - interessada I… requereu a recepção provisória das obras, solicitando também a redução da caução em 100% (fls. 20)
- Por deliberação de 14 de Abril de 2003 foram recepcionadas provisoriamente as obras e reduzida a caução para 12.122,95€ (fls. 20).
- Por requerimentos recebidos a 27 de Maio de 2003 foram solicitados ao Presidente da CM da Nazaré pelo contra - interessado A… autorização para construção de moradias familiares referentes aos lotes nºs 7, 8, 9, 10 e 11, de acordo com o alvará de loteamento nº 2/1998 emitido em 10/09/98, o que foi deferido por despachos, respectivamente de 9 de Agosto, 20 de Agosto, 22 de Julho, 9 de Agosto e 4 de Agosto todos do ano de 2003 (fls. 32, 43, 53, 88 e 108).
- Por requerimento recebido a 18 de Junho de 2003 foi solicitado ao Presidente da CM da Nazaré pelo contra - interessado R… autorização para construção de uma moradia familiar referente ao lote nº 12, de acordo com o alvará de loteamento nº 2/1998 emitido em 10/09/98, o que foi deferido por despacho de 29 de Julho de 2003 (fls. 70).
Não obstante, em face aos factos dados como provados, não restarem dúvidas sobre o incumprimento do prazo para conclusão das obras de urbanização, o que implica nos termos do art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91 a caducidade da licença de loteamento, considerou - se no Acórdão ora recorrido que “a previsão legal de prorrogação do prazo de conclusão das obras de urbanização a requerimento do interessado (art. 23º nº 2) retira qualquer hipótese de atribuir ao prazo de caducidade do acto administrativo de licenciamento a natureza de operatividade automática por simples decurso do tempo e consequente verificação objectiva do termo ad quem.”.
Todavia, “esqueceu - se” no acórdão recorrido que, conforme resulta dos termos conjugados dos arts. 38º nº 2 al. c) e 23º nº 2 do DL 448/91 e é jurisprudência corrente desse STA, a prorrogação do prazo para conclusão das obras tem de ser requerida antes de ocorrer a caducidade (nesse sentido cfr., entre outros, o Acs. STA de 18.06.2009, Rec. 0483/09 (este já no âmbito do DL 555/99) e de 09.12.1997, Rec. 35978).
Prorrogação essa que nem sequer foi requerida.
10º
Com efeito, de acordo com o sumário do AC. do STA de 09.12.1997, Rec. 35978, citado na sentença de 1ª instância e pelo Mº Pº de 1º instância «II - A câmara municipal não pode prorrogar um prazo que caducou, nem fixar regras diferentes das estabelecidas na lei para a respectiva contagem, nem para fixação do momento em que se inicia o prazo de caducidade das licenças de urbanização, o qual é imposto por normas de interesse e ordem pública.
III - As licenças de loteamento caducadas e os alvarás que as titulam não podem ser prorrogados, mas podem ser renovados por meio de um novo pedido de apreciação e um novo processo em que sejam observadas as regras, formalidades, exigências e consultas próprias do processo que é indicado pela lei como adequado, no momento em que o novo pedido é formulado.
IV - A prorrogação de licenças de loteamento caducadas é legalmente impossível, porque a lei a proíbe e cria os mecanismos mais radicais para obstar a que o respectivo objecto se produza. Assim, o deferimento de prorrogações pela câmara municipal de licenças caducadas, por contornar a lei de modo a conseguir o efeito de renovação das licenças, sem as garantias de procedimento exigidas, maxime a consulta das entidades estranhas à câmara que a lei impõe, é cominada com a nulidade (…).
V - A nulidade dos actos de prorrogação consiste na destruição de todos os efeitos daqueles actos, pelo que, desde as datas em que caducaram, se verifica e mantém a ineficácia absoluta dos alvarás.» (bold nosso).

11º
E, ainda como se expende no Ac. do STA de 14.01.2003, Rec. 01092/02 «O licenciamento de loteamento cuja licença caducou não pode efectuar-se por revalidação de licença caducada, mas sempre pela apresentação de novo projecto de loteamento em relação ao qual sejam ouvidas de novo todas as entidades exteriores à Câmara Municipal que a lei exige.
É o que resulta da total perda de efeitos determinada pela caducidade da licença, nos termos do artº 54º, nºs 4, 5, 6 e 7 do DL 400/84, nos quais se determina que a caducidade da licença (mesmo quando o alvará já tenha sido emitido e as obras tenham começado) determinará a imediata suspensão dos trabalhos em curso, podendo a Câmara municipal deliberar apreender mediante intimação, o alvará de loteamento, sendo que a renovação ou revalidação da licença depende sempre da observância do processo regulado naquele diploma.
A caducidade impõe a extinção do direito, pois que é do interesse público que tais situações fiquem assim definidas para sempre, sem prejuízo do direito a uma nova apreciação administrativa de uma nova pretensão do administrado. Requerida nova licença, por ter caducado a anterior, o processo obedecerá aos requisitos da lei vigente à data desse requerimento, com obtenção dos pareceres legalmente exigidos, não podendo ser utilizados os que informam o processo da licença caduca (cfr. Acs. citados de 6.02.97 e 20.05.97) » (bold nosso).
12º
Tendo - se também “esquecido” que no caso em apreço não se está perante qualquer “suspensão de trabalhos” e muito menos decorrente de facto “não imputável ao titular do alvará”, único caso em que a caducidade não opera (al. b) do nº 2 do art. 38º do citado DL)
13º
Também quanto aos “interesses multipolares” referidos na sentença recorrida, a que respeita a previsão dos arts. 47º e 48º do DL 448/91, pode ler - se no Ac. do STA de 27.10.2004, Rec. 0581/02 «Assim, os direitos de construir que pudessem derivar do licenciamento do loteamento para os particulares extinguiram-se, no que concerne às construções ainda não licenciadas, só podendo renovar-se se existir um novo licenciamento, como vem entendendo este Supremo Tribunal Administrativo ( ( ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos:
– de 9-12-1997, proferido no recurso n.º 35978, publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-9-2001, página 8677;
– de 7-3-2002, proferido no recurso n.º 48179, publicado em Apêndice ao Diário da República de 18-11-2003, página 1755;
– de 9-10-2002, proferido no recurso n.º 443/02;
– de 3-12-2002, proferido no recurso n.º 47859;
– de 14-1-2003, proferido no recurso n.º 1092/02;
– de 18-2-2004, proferido no recurso n.º 663/03. ), posição que tem suporte nos arts. 24.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de Junho, vigente à data em que foi proferida a declaração de caducidade, 54.º, n.ºs 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 400/84, de 31 de Dezembro, 38.º, n.ºs 5 e 6, 39.º e 48.º, n.º 9, do Decreto-Lei n.º 448/91, e 72.º e 79.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro. As possibilidades concedidas às câmaras municipais de expropriarem prédios cuja licença de loteamento caducou ou realizarem obras de urbanização nos mesmos consubstanciam faculdades atribuídas àquelas entidades públicas, por razões de interesse público, e não direitos dos particulares a verem licenciadas construções, depois da declaração de caducidade do alvará e antes da sua renovação. Por outro lado, os direitos atribuídos a terceiros, inclusivamente a adquirentes dos lotes, de requererem a realização de obras de urbanização nos casos de caducidade de licença de loteamento (reconhecidos pelo art. 48.º do Decreto-Lei n.º 448/91 e pelo art. 85.º do Decreto-Lei n.º 555/99), não dispensam a emissão de um novo alvará (n.ºs 9 daqueles arts. 48.º e 87.º) e só são exercitáveis por via judicial.
14º
Ainda no Ac. do STA de 17.04.2008, Rec. 0967/07 se pode ler: «Tal como resulta da decisão recorrida, demonstrado que está que as obras de urbanização não foram concluídas no prazo inicialmente concedido e mesmo depois de prorrogado o prazo - cf. pontos 2 a 5, da matéria de facto - verificado está o pressuposto de aplicação da alínea c), do n.° 2, do artigo 38, do DL n.° 448/91, norma em que se fundou a deliberação impugnada para declarar a caducidade do alvará, sendo certo que, para além da fundamentação acima transcrita, acresce que o poder discricionário de a Câmara Municipal conferido pelo artigo 47, do mesmo diploma, não obsta à declaração de caducidade do alvará, antes a pressupõe já que o prazo do loteador para tal não pode ser mais prorrogado - cfr. artigo 23, n.°2, conjugado com o art. 38, n.°2, al. c), do DL 448/91 - pelo que, tal como o decidido, não foi violada qualquer daquelas disposições legais.» (bold nosso).

15º
De todos estes Acórdãos, e outros, proferidos por esse Venerando Tribunal resulta, a nosso ver e salvo o devido respeito por opinião contrária, que a caducidade a que se reporta o art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91 opera ope legis, não dependendo de declaração discricionária da Câmara Municipal ou do seu Presidente.
16º
Mas, mesmo que dependesse de uma declaração da referida entidade Administrativa, sempre a mesma teria de ser, nos termos da citada disposição legal, a de caducidade, uma vez que não foi requerida qualquer prorrogação do prazo antes da sua ocorrência e se está perante um acto vinculado.
17º
Na verdade, como se afirma no Ac. desse STA de 18.06.2009, Rec. 0483/09, proferido em caso idêntico ao dos presentes autos, embora já no domínio do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro (RJEU), com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho «Estamos perante um prazo de caducidade, de 18 meses (art.º 71, n.º 3, d), do RGEU), que, confessadamente, não foi respeitado pela recorrente. Sabendo-se que os prazos de caducidade só se suspendem ou interrompem quando a lei o previr (art.º 328 do CC), que começam a correr quando o direito puder ser exercido (art.º 329), que só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo (art.º 331) e, fundamentalmente, que a "caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal" (art.º 331, n.º 1) tem de concluir-se que a caducidade opera por si, sendo desnecessário um acto expresso a declará-la. Constituindo a caducidade uma forma de extinção de direitos resultante do seu não exercício durante um determinado prazo (Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição, 373 e ss), extinto o direito ele deixa de existir, saindo, em virtude da caducidade, da esfera jurídica do seu titular. Logo, tendo em consideração a matéria de facto, o alvará concedido à recorrente caducou 18 meses após ter sido passado, muito antes da emissão do acto impugnado que se limitou a declarar a caducidade - o alvará é de 1991 (…).
(…)
Ora, se a caducidade operou independentemente da declaração contida no acto recorrido e, portanto, se o respectivo prazo se extinguiu por si, por manifesta imposição legal, é patente que o acto, situando-se no estrito desenvolvimento de poderes vinculados, não pode violar nenhum dos princípios referidos pela recorrente, designadamente os princípios da proporcionalidade, da boa fé e da protecção da confiança, princípios conformadores da actividade administrativa discricionária que, conjuntamente com todos os restantes princípio jurídicos administrativos, constituem os seus limites internos. De resto, como é sabido, o princípio da legalidade, aqui patentemente evidenciado, consome aqueles princípios que, por essa razão, também não podem ter saído violados.» (bold nosso).
18º
Assim, que no caso em apreço, incumprido que foi o prazo para conclusão das obras de urbanização, sem que tenha sido requerida a sua prorrogação que se verifique, nos termos do art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91, a caducidade da licença de loteamento, sendo os actos impugnados objecto de realização impossível e como tal nulos nos termos do art. 133º nº 2 al. c) do CPA.
19º
Não se verificam, no caso, quaisquer efeitos putativos pelo decurso do tempo, os quais decorrem da necessidade de estabilização das relações jurídico - sociais e dependem de períodos dilatados de tempo em que tais situações se verificam, devendo a sua admissão estar sempre ligada à ideia de persecução do interesse público ( cfr. Ac. STA de 16.06.98, Rec. 43415), o que não é o caso dos presentes autos, já que os actos impugnados datam de 2003 e a presente acção foi proposta em 2005.
20º
Além de que, a considerar tais efeitos, se iria beneficiar a loteadora e a entidade licenciadora, sanando actos de licenciamento nulos, em benefício de quem foi responsável pelas ilegalidades geradoras dessa mesma nulidade (cfr. mesmo Acórdão).
21º
Pelo que sempre o Acórdão ora em recurso deveria ter julgado improcedentes os recursos das contra - interessadas e mantido a sentença proferida na 1ª instância.
22º
Ao assim não ter decidido, o Acórdão ora recorrido incorreu em vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do art. 38º nº 2 al. c) do DL nº 448/91 de 29.11.





CONCLUSÕES

A)
Na presente acção, como em outras possíveis acções que venham a ser interpostas com o mesmo fundamento, está - se, perante questões, como sejam, designadamente, saber se:
1 – se no domínio do DL nº 448/91, abrangendo a operação de loteamento a realização de obras de urbanização, em que é emitido um único alvará (art. 28º nº 2), o regime da caducidade a que se reporta o art. 38º nº 2 al. c) do mesmo DL opera ope legis ou, antes, ex voluntatis mediante declaração discricionária da entidade administrativa competente, ou seja, do Presidente da Câmara Municipal;
2 – no caso da caducidade ter de ser declarada, se decorrido o prazo fixado no alvará ou estipulado pelo Presidente da Câmara, sem que tenha sido pedida a sua prorrogação, atento o disposto no art. 38º nº 2 al. c) do mesmo DL essa mesma declaração de caducidade é ou não vinculativa para a Administração.

B)
Tais questões, pela sua controvérsia e eventual futura expansão revestem - se de importância fundamental pela sua relevância jurídica e clara necessidade de melhor aplicação do direito, motivo pelo qual se justifica, salvo melhor opinião, uma reapreciação excepcional por esse Venerando Tribunal, de acordo com o art. 150º nº 1 do CPTA.
C)
O Acórdão, ora recorrido, que revogou a sentença de 1ª instância, seguindo de perto a sua fundamentação de facto, considerou, em resumo que «não tinha sustentação no direito objectivo a afirmada caducidade da licença de loteamento com fundamento em incumprimento do prazo para conclusão das obras de urbanização, incorrendo o acórdão sob recurso em erro de subsunção da factualidade provada na previsão do artº 38º nº 2 alínea c) DL 448/91 de 29.11 na medida em que se trata de um domínio de caducidade ex voluntatis da Administração e não de caducidade ope legis, como foi considerado ao longo da fundamentação de direito, sendo de considerar ainda que a decisão postula a valoração jurídica pela entidade administrativa competente das circunstâncias apuradas, no seu entender susceptíveis de preencher o pressuposto legal que enforma a causa de caducidade.».

D)
Por esse motivo, concluiu que não podia manter - se a declarada nulidade da recepção provisória das obras de urbanização (arts. 50º nºs 1 e 3 do DL nº 448/91 e art. 87º nºs 1 e 3 RJUE) por deliberação da Câmara Municipal da Nazaré de 14.04.2003 e das autorizações de obras de construção de moradias nos lotes nºs 8, 9, 10, 11 e 12 (art. 4º nº 3 c) RJUE) por despachos de 22 e 29.07.2003 e 4, 9 e 20.08.2003 do respectivo Presidente, procedendo, assim, ambos os recursos, revogando o acórdão proferido na 1ª instância e absolvendo os recorrentes dos pedidos.
E)
Ora, em face aos factos dados como provados, não restam dúvidas sobre o incumprimento do prazo para conclusão das obras de urbanização, o que implica nos termos do art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91 a caducidade da licença de loteamento.
F)
Não obstante, o Acórdão ora recorrido cosiderou que “a previsão legal de prorrogação do prazo de conclusão das obras de urbanização a requerimento do interessado (art. 23º nº 2) retira qualquer hipótese de atribuir ao prazo de caducidade do acto administrativo de licenciamento a natureza de operatividade automática por simples decurso do tempo e consequente verificação objectiva do termo ad quem.”.
G)
Todavia, conforme resulta dos termos conjugados dos arts. 38º nº 2 al. c) e 23º nº 2 do DL 448/91 e é jurisprudência corrente desse STA, a prorrogação do prazo para conclusão das obras tem de ser requerida antes de ocorrer a caducidade (nesse sentido cfr., entre outros, o Acs. STA de 18.06.2009, Rec. 0483/09 (este já no âmbito do DL 555/99) e de 09.12.1997, Rec. 35978).
H)
Prorrogação essa que nem sequer foi requerida.
I)
Na verdade, “a Câmara Municipal não pode prorrogar um prazo que caducou”, sendo a “prorrogação de licenças de loteamento caducadas legalmente impossível, cominada com a nulidade, a qual consiste na destruição de todos os efeitos daqueles actos, pelo que, desde as datas em que caducaram, se verifica e mantém a ineficácia absoluta dos alvarás.” (cfr. Sumário do Ac. do STA de 09.12.1997, Rec. 35978). (bold nosso).

J)
Ainda como se expende no Ac. do STA de 14.01.2003, Rec. 01092/02 «A caducidade impõe a extinção do direito, pois que é do interesse público que tais situações fiquem assim definidas para sempre, sem prejuízo do direito a uma nova apreciação administrativa de uma nova pretensão do administrado. » (bold nosso).
L)
No caso em apreço não se está perante qualquer “suspensão de trabalhos decorrente de facto não imputável ao titular do alvará”, único caso em que a caducidade não opera (al. b) do nº 2 do art. 38º do citado DL), pelo que o apelo a tal argumento, pela sentença recorrida, não tem aqui razão de ser.
M)
Também quanto aos “interesses multipolares” referidos na sentença recorrida, a que respeita a previsão dos arts. 47º e 48º do DL 448/91, pode ler - se no Ac. do STA de 27.10.2004, Rec. 0581/02 «Assim, os direitos de construir que pudessem derivar do licenciamento do loteamento para os particulares extinguiram-se, no que concerne às construções ainda não licenciadas, só podendo renovar-se se existir um novo licenciamento, como vem entendendo este Supremo Tribunal Administrativo.
(...) os direitos atribuídos a terceiros, inclusivamente a adquirentes dos lotes, de requererem a realização de obras de urbanização nos casos de caducidade de licença de loteamento (reconhecidos pelo art. 48.º do Decreto-Lei n.º 448/91 e pelo art. 85.º do Decreto-Lei n.º 555/99), não dispensam a emissão de um novo alvará (n.ºs 9 daqueles arts. 48.º e 87.º) e só são exercitáveis por via judicial.».
N)
Ainda de acordo com o Ac. do STA de 17.04.2008, Rec. 0967/07 «o poder discricionário da Câmara Municipal conferido pelo artigo 47º, do mesmo diploma, não obsta à declaração de caducidade do alvará, antes a pressupõe já que o prazo do loteador para tal não pode ser mais prorrogado - cfr. artigo 23, n.°2, conjugado com o art. 38, n.°2, al. c), do DL 448/91.
O)
De todos estes Acórdãos mencionados, e outros, proferidos por esse Venerando Tribunal resulta, a nosso ver e salvo o devido respeito por opinião contrária, que a caducidade a que se reporta o art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91 opera ope legis, não dependendo de declaração discricionária da Câmara Municipal ou do seu Presidente.
P)
E, mesmo dependendo de uma declaração da referida entidade Administrativa, sempre a mesma teria de ser, nos termos da citada disposição legal, a de caducidade, uma vez que não foi requerida qualquer prorrogação do prazo antes da sua ocorrência e se está perante um acto vinculado.
Q)
Na verdade, como se afirma no Ac. desse STA de 18.06.2009, Rec. 0483/09, proferido em caso idêntico ao dos presentes autos, embora já no domínio do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro (RJEU), com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho «(...) a caducidade opera por si, sendo desnecessário um acto expresso a declará-la.(...). Logo, tendo em consideração a matéria de facto, o alvará concedido à recorrente caducou 18 meses após ter sido passado, muito antes da emissão do acto impugnado que se limitou a declarar a caducidade - o alvará é de 1991 (…).
Ora, se a caducidade operou independentemente da declaração contida no acto recorrido e, portanto, se o respectivo prazo se extinguiu por si, por manifesta imposição legal, é patente que o acto, situando-se no estrito desenvolvimento de poderes vinculados, não pode violar (...) os princípios da proporcionalidade, da boa fé e da protecção da confiança, princípios conformadores da actividade administrativa discricionária que, conjuntamente com todos os restantes princípio jurídicos administrativos, constituem os seus limites internos. De resto, como é sabido, o princípio da legalidade, aqui patentemente evidenciado, consome aqueles princípios que, por essa razão, também não podem ter saído violados.» (bold nosso).
R)
Também no caso em apreço, incumprido que foi o prazo para conclusão das obras de urbanização (sem que tenha sido requerida a sua prorrogação) que se verifique, nos termos do art. 38º nº 2 al. c) do DL 448/91, a caducidade da licença de loteamento, sendo os actos impugnados objecto de realização impossível e como tal nulos, nos termos do art. 133º nº 2 al. c) do CPA.
S)
Não se verificam igualmente, no caso em apreço, quaisquer efeitos putativos pelo decurso do tempo, os quais decorrem da necessidade de estabilização das relações jurídico - sociais e dependem de períodos dilatados de tempo em que tais situações se verificam, devendo a sua admissão estar sempre ligada à ideia de persecução do interesse público (cfr. Ac. STA de 16.06.98, Rec. 43415), o que não é o caso dos presentes autos, já que os actos impugnados datam de 2003 e a presente acção foi proposta em 2005.
T)
Além de que, a atender - se, no caso, à existência de efeitos putativos, ir - se - ia beneficiar a loteadora e a entidade licenciadora, sanando actos de licenciamento nulos, em benefício de quem foi responsável pelas ilegalidades geradoras dessa mesma nulidade (cfr. mesmo Acórdão).
U)
Pelo que sempre Acórdão ora em recurso deveria ter julgado improcedentes os recursos das contra - interessadas e mantido a sentença proferida na 1ª instância.
V)
Ao assim não ter decidido, o Acórdão ora recorrido incorreu em vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do art. 38º nº 2 al. c) do DL nº 448/91 de 29.11.


Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso de revista ser admitido como tal e considerado procedente, em consequência revogando - se o Acórdão recorrido e substituindo - o por outro que, mantendo a sentença proferida em 1ª instância, determine a nulidade dos actos impugnados, com o que V. Exªs, Venerandos Conselheiros, farão a costumada

JUSTIÇA

A Procuradora Geral Adjunta


( Maria Clara Rodrigues )