Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:06/28/2011
Processo:07769/11
Nº Processo/TAF:00308/08.7BEALM
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:PARQUE NATURAL DA ARRÁBIDA.
CONSTRUÇÃO MORADIA.
PARECER VINCULATIVO.
NULIDADE LICENCIAMENTO.
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator

A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos do art. 146º nº1 do CPTA, vem, ao abrigo do disposto no art. 145º nº 5 do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto, pela então A., da sentença proferida, a fls. 779 e segs., pelo TAF de Almada, que julgou improcedente a presente acção não anulando ou declarando nulo o despacho de 29/11/2007, da Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas do Litoral de Lisboa e Oeste, que determinou a demolição da obra licenciada pela CM de S…, realizada pela A. na Estrada de Ramada – Casais da Serra.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, a ora recorrente, então A., imputa à sentença em recurso erro de direito por aplicação do dos arts. 16º, 17º,18º, 19º e 50º nº 1 do POPNA, erro de interpretação e aplicação do direito com violação do art. 19º nºs 9 e 11 e art. 20º nº 3 do RJUE, do art. 133º nº 2 al. a) do CPA, dos arts. 124 e 125º do CPA , erro de direito com violação da Portaria nº 26-F/80 de 09/01 e arts. 42º e 43º do DL nº 380/99 de 22/09 da Lei de bases da Política de ordenamento do Território e de Urbanismo e art. 154º do DL nº 380/99 de 22/09.

A Entidade recorrida, ICBN, contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com base na prova documental, os factos constantes dos pontos 1) a 29), de III, de fls. 791 a 795, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Desde já a sentença em recurso não nos merece qualquer censura, atentos os fundamentos de facto e de direito nela invocados para os quais remetemos por deles concordarmos.

O ora Recorrente, como fundamento da ilegalidade do acto impugnado, começa por invocar que “qualquer ordem de demolição deverá respeitar os limites impostos à revogação dos actos administrativos constitutivos de direitos, designadamente os seus limites temporais”, isto por entender que a ordem de demolição interfere com o licenciamento ao abrigo do qual realizou as obras de construção.

Todavia, logo após, admite a possibilidade de ser ordenada a demolição se o licenciamento camarário ao abrigo do qual as obras foram realizadas for nulo.

E esse é o caso.

Com efeito, situando - se a propriedade onde se pretende erigir a construção em causa dentro dos limites do Parque Natural da Arrábida, em área de Paisagem Protegida, face ao disposto no art. 12º da Portaria nº 26-F/80 de 09/01, bem como o disposto no art. 2º nº 2 al. c) do DL nº 380/99 de 22/09, conjugado com o art. 103º do mesmo diploma legal, a cominação de concordância ou deferimento tácito não se aplica, tendo concluído o Mmº Juiz a quo, bem, ser, face a esta legislação especial, que deve ser avaliada a possibilidade de autorização de construção.

Resultando que o prédio em questão se situa em zona de paisagem protegida não restam dúvidas face a tais normativos que a licença de construção em causa dependia de parecer prévio favorável do PNA e que tal parecer é vinculativo, tendo o incumprimento dos mesmos normativos, por consequência, a nulidade do acto de licenciamento.

Na verdade, a falta de pronúncia expressa, por parte do PNA, nos 45 dias seguintes à consulta que lhe foi feita pelo Município sobre a pretensão da construção em questão não configura qualquer deferimento tácito.

E, de acordo com o ponto 13) da matéria de facto dada como provada, que o recorrente não impugna, em 13/05/2004, antes da concessão da licença pela CM (em 15/12/2004) esta recepcionou o ofício do PNA sobre o projecto de arquitectura, transmitindo parecer desfavorável.

Quer dizer, tal Parecer Prévio embora emitido posteriormente aos referidos 45 dias, foi - o de forma expressa, mas negativamente e comunicados à Câmara Municipal de Setúbal.

Assim, mesmo que se admitisse a tese da formação de parecer tácito favorável ao deferimento sobre o pedido de licenciamento da obra a construir, o certo é que tal parecer foi negativo por acto expresso posterior, o qual eliminou da ordem jurídica o eventual acto tácito anterior.

Todavia entendemos que nem sequer houve lugar a qualquer acto tácito, pois estando - se perante lei especial (Portaria nº 26-F/80 de 09/01, Dec. Reg. Nº 23/98 de 14/10 e DL nº 380/99 de 22/09) relativamente ao DL nº 555/99, na redacção do DL nº 177/2001, e sobretudo perante instrumentos de gestão territorial, que qualquer acto contrário àqueles instrumentos fosse nulo, nos termos do art. 103º do DL nº 380/99 de 22/09, pelo que não pode haver deferimento tácito.

No caso em apreço o Parecer favorável do PNA era obrigatório, e sendo desfavorável, como veio a ser, era vinculativo, pelo que mesmo existindo licenciamento por parte do Município, este é nulo e por isso não poderia nunca produzir efeitos, estando - se aqui, no mínimo perante a tal legislação especial de que fala o artigo 19º nº 9 do RJUE, sendo em face desta legislação especial que deve ser avaliada a possibilidade do pedido de licenciamento ( cfr., em sentido idêntico, Ac. deste TCAS de 20/12/2006, Rec. 02133/06 ).

Sendo esta legislação que temos vindo a mencionar que a sentença recorrida aplicou, apenas referindo o Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Arrábida, aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros nº 141/2005 de 23/08 já no fim da decisão sobre a referida questão da falta de Parecer, afigurando - se que face ao acto impugnado onde tal Plano é mencionado para aferir da impossibilidade de legalização da construção, a sentença recorrida mais não pretendeu do que afastar tal possibilidade.

Ao ter decidido neste sentido a sentença em recurso não nos merece censura, não enfermando, em nosso entender, de qualquer erro de direito e violação de lei.

Também ao ter decidido pela inexistência do vício de forma por falta de fundamentação a sentença, em nosso entender, não mereça censura, pelos fundamentos nela exarados para os quais remetemos por economia expositiva e por deles concordarmos.

Aliás a ora recorrente demonstrou “ter entendido a que propósito aquele acto concreto foi praticado, em que medida afecta a sua esfera jurídica e em que medida pode atacá-lo contenciosamente” (cfr. Marcello Caetano, in Manual de Direito Administrativo, Almedina, 10ª edição, Vol-1, pág. 477).

Na verdade, um acto estará, devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo da mesma, e optar conscientemente entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação (cfr. Ac. do Pleno de 16.03.2001 – Rec. 40.618), íter cognoscitivo e valorativo que, resulta dos autos ter o ora recorrente apreendido.

Quanto ao vício de usurpação de poder que configura a nulidade do acto nos termos do art. 133º nº 2 al. a) do CPA.

Ao contrário do que parece defender a recorrente uma coisa é o acto de doação, de cariz privado, outra é o fraccionamento de terrenos que forçosamente tiveram de anteceder ou originaram a possibilidade de doação.

Ora foi este fraccionamento que necessitava de autorização do PNA (e não a doação feita), pelo que não existe qualquer abuso de poder, além de que o acto impugnado não tem só por fundamento o fraccionamento sem autorização do PNA, mas também as construções realizadas sem o parecer favorável da referida Entidade.

Por outro lado e quanto à não aplicação do Decreto Regulamentar nº 23/98 de 14/10, por tal fraccionamento ter ocorrido em 1987, segundo afirma a recorrente, tal não resulta provado, tanto mais que as doações feitas remontam a 2001 (cfr. docs. juntos com a contestação), em que já estava em vigor tal Decreto Regulamentar.

De qualquer forma ainda que tivesse ocorrido naquela data de 1987, estava em vigor a Portaria nº 26-F/80 de 09/01, que no seu art. 12º nº 3 já previa a necessidade da autorização da Direcção do Parque para quaisquer trabalhos, obras ou actividades.

Quanto aos restantes vícios apontados igualmente entendemos pela sua improcedência pelos fundamentos exarados na sentença recorrida para os quais remetemos, bem como para as contra - alegações do recorrido, por deles inteiramente concordarmos e por economia expositiva.

IV – Assim, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo - se a sentença recorrida.