Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:01/16/2014
Processo:10779/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º Juízo - 1.ª Secção
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA.
AGENTE DA GNR.
CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA.
PROCESSO DISCIPLINAR.
APOSENTAÇÃO COMPULSIVA.
PONDERAÇÃO DE INTERESSES.
GRAVE DANO PARA O INTERESSE PÚBLICO.
Texto Integral:Procº nº 10779/14

2º Juízo-1ª Secção

Suspensão de eficácia

Parecer do MP

Vem o presente recurso jurisdicional interposto pelo requerente, guarda da GNR, da sentença que considerou improcedente o pedido de suspensão de eficácia que formulou contra o Ministério da Administração Interna e que tem como objecto a decisão que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva.

Nas suas alegações, o recorrente põe em causa a douta sentença recorrida no que se refere à decisão de inexistência do periculum in mora, bem como à decisão da ponderação de interesses a favor do interesse público.

Mas afigura-se-nos que não terá razão.

De facto, quanto ao periculum in mora, embora se considere que o recorrente especificou suficientemente os prejuízos que lhe vai acarretar a imediata execução da pena expulsiva que lhe foi aplicada ( cfr artºs 156º a 170º do requerimento inicial), parece-nos que não estará, o recorrente, em situação da qual decorra grave perigo para a sua subsistência e da sua família.

Mas mesmo que assim não se considere, parece-nos que em termos de ponderação de interesses sempre relevaria, neste caso, o grave prejuízo para o interesse público se fosse suspensa a aplicabilidade da pena.

De facto, tendo o recorrente ao serviço da GNR, cometido 10 crimes de corrupção passiva, pelos quais foi condenado criminalmente, parece-nos que, atenta a gravidade da sua actuação, bem como a sua repercussão pública, a suspensão da execução da pena decretada por um tribunal criaria uma imagem de impunidade não consentânea com o respeito devido à Instituição policial em causa, no exercício de obstar a que tais situações saiam impunes e, como tal, se repitam.

A condenação criminal - pese embora a diferenciação de factos integrativos, bem como os meios de produção de prova desses factos, entre o processo criminal e o processo disciplinar - não pode deixar de ser considerado um facto indiciador de especial relevância para a condenação em pena disciplinar.

Assim decidiu o STA ao considerar que,

“Sem unidade de ilicitude o desvalor jurídico de natureza penal releva, no âmbito disciplinar como índice de qualificação da infracção, pelo alarme social que provoca e pela danosidade associada que, em regra, terá para a eficiência do serviço, a prática de uma falta que seja, ao mesmo tempo, qualificada como crime” (ac do STA de 21-9-04, in Procº nº 04146).

Por outro lado, o douto acórdão deste TCAS de 24-1-13, proferido no procº nº 09543/12 em caso muito semelhante, ao do presente, refere textualmente o seguinte:

“Dispõe n.º 2 do artigo 120.º do CPTA que «a adopção das providências será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, em que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências».

Conforme decorre dos autos, o ora Recorrente é cabo da Infantaria da GNR. Por Acórdão proferido em 22.06.2006, pela 1º Vara Criminal de Lisboa, 3º secção, p. 1594/01.9TALRS, foi dado por provado que o ora Recorrente cometeu 3 crimes de corrupção passiva, tendo sido condenado, em cúmulo jurídico, em 3 anos e 6 meses de prisão e na pena acessória de proibição de exercício de funções pelo período de 5 anos. Interposto recurso, por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08.07.2008, foi alterada a pena aplicada ao Recorrente, tendo-a fixado, em cúmulo jurídico, na pena única de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, com a condição do aqui Requerente entregar a quantia de 500,00 € ao Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, tendo ainda revogado a pena acessória de proibição de exercício de funções.

Em 13.06.2011, foi proferida acusação no âmbito do processo disciplinar, com fundamento nos factos dados como provados no âmbito do processo crime. Pela decisão suspendenda foi o Recorrente punido com a pena disciplinar de reforma compulsiva.

Ou seja, no caso, a conduta cometida pelo Recorrente, no exercício das suas funções, é altamente reprovável e censurável.

Assim, mantendo-se o Recorrente em exercício de funções após ter sido condenado criminalmente por ter praticado um crime de corrupção passiva, sem dúvida que fica beliscada a imagem e prestígio da instituição a que pertence, podendo implicara a perturbações no serviço.

Na situação em apreço haverá um interesse público qualificado, especifico e concreto, relativo à imagem de honradez dos agentes da GNR, não conciliável com a manutenção em exercício em funções de um agente que foi acusado e punido criminal e disciplinarmente por crime de corrupção.

A conduta pela qual o ora Recorrente vem acusado, é muito grave, como se disse. Na sequência da mesma, foi alvo de uma acusação em processo-crime, da qual resultou uma condenação em 1º instância e no tribunal superior. Foi identicamente acusado em processo disciplinar, tendo sido proferida a decisão suspendenda. Alega o Recorrente que interpôs recurso da decisão criminal, que não transitou, por isso, em julgado. Contudo, os recursos que o ora Recorrente interponha, no processo crime ou do processo disciplinar, não afastam, nesta providência cautelar, a aparência de gravidade da sua conduta, que justifica a prevalência do interesse público face ao seu interesse individual. Basta aquelas acusação e punições para que se deva considerar fortemente beliscada a imagem e o prestígio da GNR, caso mantenha no seu seio, e a exercer as suas funções, um agente que praticou os actos pelos quais o Recorrente foi punido.

Existe um interesse público na manutenção da imagem de correcção e legalidade das actuações dos militares da GNR, que não é compatível com a manutenção em funções de um agente que foi acusado e punido, criminal e disciplinarmente, pela prática de um crime de corrupção.

Em suma, não obstante haver no caso dos autos um prejuízo para o Recorrente, adveniente da sua perda de parte da sua remuneração, existe também um interesse público especifico, qualificado e concreto, que é muito superior aos interesses do Recorrente e que justifica o não decretamento da presente providência”.

, Estamos, pois, de acordo com a sentença recorrida, ao dar como não verificados os requisitos constantes da alínea b) do nº1 e nº2 do artº 120º do CPTA, motivo pelo qual emitimos parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.


A Procuradora-Geral Adjunta

Maria Antónia Soares