Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:09/20/2011
Processo:07996/11
Nº Processo/TAF:00156/10.4BELLE
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:ACÇÃO ESPECIAL.
NULIDADE SENTENÇA (AL. D) Nº 1 ARTº 668º CPC).
CONHECIMENTO DOS VÍCIOS IMPUTADOS AO ACTO IMPUGNADO PELO TRIBUNAL AD QUEM.
IMPROCEDÊNCIA DA ACÇÃO.
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator


A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos do art. 146º nº1 do CPTA, vem, ao abrigo do disposto no art. 145º do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto, pelo então A., da sentença proferida, a fls. 132 e segs., pelo TAF de Loulé, que julgou totalmente improcedente a presente acção administrativa especial de anulação, em consequência, absolvendo o Município demandado dos pedidos.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, o ora recorrente, imputa à sentença em recurso a nulidade das als. b) e d) do nº 1 do art. 668º do CPC.

O Município, ora recorrido, contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com base na prova documental, testemunhal e por acordo, os factos constantes dos pontos 1. a 14, do ponto II, de fls. 134 a 136, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Imputa o recorrente à sentença recorrida as nulidades das als. b) e d) do nº 1 do art. 668º do CPC, por, quanto à primeira, não especificar os fundamentos de direito que justificam a decisão e, quanto à segunda por não se ter pronunciado quanto a todas as causas de invalidade invocadas contra o acto administrativo.

A) Quanto à nulidade da al. b) do nº 1 do art. 668º do CPC.

Conforme é consabido «só a falta absoluta de fundamentação é razão de nulidade da sentença, pois uma exposição medíocre ou insuficiente dos fundamentos, permitindo descortinar as razões que a ditaram, sujeita a decisão à possibilidade de ser revogada ou alterada em recurso» (cfr. Acs. do STA de 27/5/98 Rec. nº. 37068, de 16/6/99 Rec nº. 44915 e de 6/6/89 in BMJ 388º. 580).

Ora, no caso em apreço, a sentença recorrida, não padece da referida nulidade já que não existe uma falta absoluta de fundamentação.

É certo que parte da sentença recorrida se imiscui em considerações de natureza ética, no entanto não deixa de se fundamentar no disposto no art. 70 nº 3 do Cód. Estrada para aferir, numa interpretação, que pode ou não ser errónea, que o “estacionamento de veículos afectos ao serviço de determinadas entidades”, como no caso ao Consulado do México, não se destina aos veículos utilizados pelos funcionários que trabalhavam no referido Consulado.

Assim que inexista falta de fundamentação absoluta ainda que se possa considerar insuficiente, deficiente ou errada.

B) Quanto à nulidade da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC

Entendemos assistir razão ao recorrente.

Na verdade, o ora recorrente, enquanto A., na p.i. imputou ao acto impugnado os vícios de forma por falta de fundamentação e falta de audiência prévia, em violação, respectivamente, dos arts. 123º nº 1 al. d), 124º nº 1 al. e) e 125º nº 1 e do art. 100º todos do CPA e do vício de violação de lei, por violação do art. 140º nºs 1 al. b) e 2 do CPA e ainda violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP.

Ora, sobre tais vícios, a Mmª Juiz a quo não fez qualquer espécie de apreciação, sobre eles não emitindo qualquer pronúncia sobre a sua procedência, improcedência ou prejudicialidade do seu conhecimento, não obstante se tratar de questões sobre as quais se devia pronunciar por se tratar de matérias respeitantes à causa de pedir (art. 660º nº 2 do CPC) incorrendo por isso na nulidade de omissão de pronúncia da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC.


IV – Daí que, nos termos do art. 149º nº 1 do CPTA, deva este tribunal ad quem, após anular a sentença, conhecer dos imputados vícios do acto.

1 - Relativamente ao vício de falta de fundamentação do acto impugnado

Em nosso entender o despacho impugnado é de considerar fundamentado explicitando os motivos que levaram á retirada do lugar de estacionamento privativo antes concedido ao Consulado do México, conforme resulta do ponto 5 dos factos provados.

Na verdade, o artigo 125º nº1 CPA não exige uma exposição exaustiva, mas apenas uma “exposição sucinta” dos fundamentos da decisão, exigência que no caso, a nosso ver, se mostra suficientemente satisfeita, tanto mais que o ora recorrente demonstrou “ter entendido a que propósito aquele acto concreto foi praticado, em que medida afecta a sua esfera jurídica e em que medida pode atacá-lo contenciosamente” (cfr. Marcelo Caetano, in Manual de Direito Administrativo, Almedina, 10ª edição, Vol-1, pág. 477).

Na verdade, um acto estará, devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo da mesma, e optar conscientemente entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação (cfr. Ac. do Pleno de 16.03.2001 – Rec. 40.618), iter cognoscitivo e valorativo que, resulta dos autos ter o ora recorrente apreendido, desde logo pelo teor dos documentos nºs 2 e 3 juntos à p. i., que o ora recorrente enviou em resposta ao acto que posteriormente impugnou.

Motivo pelo qual o apontado vício de fundamentação deverá ser considerado improcedente.

2 - Relativamente à alegada falta de audiência prévia.

Salvo o caso de inexistência ou de dispensa, consagrados no referido artigo 103.º do CPA, a audiência dos interessados tem lugar quando tiver havido instrução, sendo pacífico, na doutrina e na jurisprudência, que o conceito de instrução, para este efeito, «integra a actividade administrativa destinada a captar os factores e interesses relevantes para a decisão final, nela se incluindo informações, pareceres, apresentação ou realização de provas, realização de diligências, vistorias, exames e avaliações necessárias à prolação da decisão» (Ac. STA de 28/01/03, Rec. nº 0838/02).

Ora, como resulta do teor de fls. 65 dos autos, não existiu processo de instrução, tendo sido colocada a sinalização de estacionamento reservado ao Consulado do México em acto meramente de gestão do domínio público da circulação nos termos do art. 70º nº 3 do CE, acto de gestão esse que levou igualmente à sua retirada.

Aliás, o ora recorrente não juntou qualquer doc. de onde resultasse “qualquer pedido de estacionamento reservado” e/ou de “despacho de concessão do mesmo”, sendo que as reclamações e inspecção dos serviços de fiscalização referidas no acto impugnado podem ter tido lugar informalmente.

Pelo que não resultando dos autos ter havido instrução que não houvesse lugar à audiência prévia prevista no art. 100º do CPA.

Por outro lado, e não obstante, nem por isso o ora recorrente ficou prejudicado já que se pronunciou sobre o teor do acto impugnado, na ocasião ainda não executado, explicitando as suas razões, que não foram atendidas.

3 - Quanto à imputada violação do art. 140º nºs 1 al. b) e 2 do CPA.

O acto de reserva de uso privativo de estacionamento constitui um acto de gestão de acordo com o art. 70º nº 3 do CE, de natureza discricionária, ainda que tal discricionariedade tenha de obedecer a uma ponderação do interesse público e privado em questão.

Pelo que o mesmo acto não é constitutivo de direitos, podendo de acordo com a mesma gestão ser retirada tal reserva sempre que o interesse público o exija ou se verifique a inutilidade de mesma.

Assim, que não se verifique qualquer violação do art. 140º do CPA, pelo acto impugnado.

4 - Quanto à imputada violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP.

Invoca o recorrente tal violação no que alega ter havido tratamento desigual verificado entre o Consulado do México e outros Consulados sediados na mesma cidade, porquanto a “revogação” de todos os lugares reservados aos mesmos terem decorrido em momento bastante posterior.

Ora, tendo tais lugares reservados a outros Consulados sido por retirados, ainda que algum tempo depois, não resulta qualquer violação do direito de igualdade como desconhece a situação, até ali, era ou não igual à do Consulado do México, o que o recorrente não invocou.

Assim que, a nosso ver, improcedam todos os vícios imputados ao acto recorrido.

V – Pelo que, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de:
- ser declarada nula a sentença por omissão de pronúncia (art. 668º nº 1 al. d) do CPC;
- ser a mesma substituída por outra que apreciando os vícios do acto invocados, julgue improcedente a presente acção , absolvendo a Entidade Demandada dos pedidos.