Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:04/19/2012
Processo:08111/11
Nº Processo/TAF:162/10.9BEBJA
Sub-Secção:2.º JUÍZO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:ARGUIÇÃO DE NULIDADES E PEDIDO DE REFORMA DE ACORDÃO DO T.C.A. SUL.
REJEIÇÃO POR ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DE REVISTA.
RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL PARA O S.T.A. DO ACÓRDÃO QUE DECIDIU ESSA REJEIÇÃO.
Texto Integral:Procº nº 08111/11
Processo nº162/10.9 BEBJA

Contra-alegações do MP em representação do Estado Português


Venerandos Juízes Conselheiros do STA

A Magistrada do Ministério Público junto deste TCAS vem, em representação do Estado, apresentar contra-alegações referentes ao recurso ordinário ou, subsidiariamente, recurso de revista para esse Supremo Tribunal Administrativo (STA), interposto em 20-3-2012, pela Autora, ora Recorrente, Logística Florestal- Central de Produção e Serviços Florestais, S.A., do acórdão deste TCA de 8-3-2012 que decidiu indeferir a reclamação para a conferência ( por convolação oficiosa de recurso de revista interposto pela Recorrente em 24-1-2012), do despacho de 4-1-2012, do Exmo Desembargador - Relator do processo, que indeferiu o pedido de reforma formulado em 16-12-2011, ao abrigo do artº 669º nº2 alínea a) do CPC e a arguição de nulidades (por omissão de pronúncia nos termos da alínea d) do nº1 do artº 668º do CPC, na parte referente à decisão sobre a matéria de facto, e nos termos do nº1 in fine do artº 201º do CPC por violação do princípio do contraditório), relativos ao acórdão de 30-11-11 que considerou improcedente a acção proposta contra o Estado, pela ora Recorrente.

1 - Da inadmissibilidade dos referidos recursos jurisdicionais.

1.1.Quanto ao recurso ordinário:

Tem o STA se pronunciado diversas vezes no sentido de que ainda que o tribunal de segunda instância conheça ex novo de uma questão, da decisão da mesma não cabe recurso ordinário de agravo (agora apelação ) para a sua apreciação pelo STA.

De facto, considera essa jurisprudência que os conhecimentos do tribunal de segunda instância criam a segurança necessária na respectiva a decisão, de tal modo que não se torna necessário apelar a uma decisão de um tribunal superior.

Nestes termos, não cabe qualquer recurso ordinário do acórdão em análise para o STA, por falta de normativo no CPTA que o preveja.

E isto porque o legislador ordinário tem ampla liberdade para restringir os recursos apenas a alguns processos e a algumas decisões, dado que a CRP não estabelece qualquer direito ao recurso jurisdicional( cfr acórdão do TC de 15-7-1993 e do STA (P), de 15-12-91, ambos in www.dgsi.pt e ainda Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa, pág 405, nota 899; Mário Torres, in Três Falsas Ideias simples em matéria f de recursos jurisdicionais no contencioso administrativo, pág 759; Lopes do Rego, in Estudos sobre a jurisprudência constitucional, pág 74 e 81-84, todos citados nas notas de rodapé referentes às anotações ao artº 142º do CPTA in “Comentários ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”,2005, pág 711).

No caso vertente, não existe qualquer norma que preveja recurso ordinário de apelação para o STA dos acórdãos proferidos pelo TCAS, pelo que o mesmo não poderá ser admitido.

1.2. Quanto ao recurso de revista:

Foi o próprio recorrente que considerou que o acórdão que decidiu a acção não admitia recurso de revista e, por isso, do mesmo cabia pedidos de reforma e arguição de nulidades autónomos. Assim, por maioria de razão, também não caberá, em princípio, recurso de revista do acórdão que decidiu rejeitar o pedido de reforma daquele acórdão.

Independentemente de se concordar ou não com essa rejeição, no caso concreto trata-se, na verdade, de uma questão de menor complexidade técnica e de irrelevantes consequências para o caso tratado nos autos, tornada neste momento, numa discussão meramente académica, conforme se irá tentar demonstrar, uma vez que o acórdão que decidiu a acção, absolvendo o Estado, já não é impugnável através de recurso jurisdicional.

Ora, tem considerado o STA em casos idênticos que não se verificam os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista previsto no artº 150º do CPTA( cfr acs do STA de 7-12-11, in procº nº 01033/11 e ac do STA de 2-4-2009, in procº nº 0321/09)

Assim, nos termos do Ac do STA de 7-12-11, in procº nº 01033/11,

“O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA.

Temos assim que, de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA)”.

Ora, a tese deste acórdão aplica-se ao caso presente.

Para além disso, não deixa a questão suscitada neste recurso, de ser relativa a um processo cautelar e, como a própria recorrente reconhece, o STA tem, por norma, recusado o recurso de revista interposto neste tipo de processos.

E finalmente, não se mostrando clara ou grosseiramente violado nenhum preceito legal com a decisão tomada pelo acórdão recorrido, não se verifica, salvo melhor opinião, a necessidade de “melhor aplicação do direito”.

Na verdade, não há dúvida de que o recurso de revista previsto no artº 150º do CPTA é um recurso ordinário e não extraordinário.

Assim, no caso de a admissão do recurso de revista do acórdão que decidiu de mérito, ser viável, seria esse STA o tribunal competente para apreciar o pedido de reforma/ arguição de nulidades, tal como parece concluir-se dos artºs 731 e 732º por remissão para o artº 716º também do CPC, aplicáveis subsidiariamente ao caso presente por força do art º140º do CPTA.

Como porém não foi interposto recurso desse acórdão proferido em 30-11-11, a decisão que não deferiu o pedido de reforma e arguição de nulidades, não pode ser impugnada quer nos termos do nº2 do artº 670º do CPC, quer nos termos do seu nº 3.

É certo que a nulidade processual obedece a um regime diferente.

Porém, no caso vertente, foi invocada fora de prazo, motivo pelo qual fica prejudicado o seu conhecimento.

Assim, sendo, não se pode considerar que a interpretação consignada no acórdão recorrido está clara e inequivocamente errada para efeitos de melhor aplicar o direito.


***

À cautela, e nos termos do artº 684-A nº1 do CPC, procede-se à seguinte impugnação:

1.3. I legalidade do despacho de 4-1-2012 e do acórdão de 8-3-2012. que confirmando o despacho de 4-1-2012, não conheceu do pedido de reforma e da arguição das nulidades ( fls 2062)

O pedido de reforma/ arguição de nulidades deveria ter sido rejeitado por ser extemporâneo dado que foi apresentado para além dos 5 dias que a lei concede para os processos urgentes

Além disso, o douto acórdão citado, na parte em que decidiu a convolação da interposição de recurso em reclamação para a conferência, é também ilegal porque, para que tal convolação fosse possível, teria o recurso de revista que ter dado entrada no prazo de cinco dias que é o prazo estipulado na lei para a reclamação para a conferência nos processos urgentes, o qual terminava em 15-1-2012.

Ora, o recurso convolado em reclamação interposto do despacho do relator de 4-1-2012, deu entrada na Secretaria deste TCAS em 24-1-2012, ou seja já depois de ter passado o prazo de reclamação para a conferência, pelo que o mesmo não poderia ter sido convolado.

Mas também não deveria ter sido convolado pelo facto de que, nos termos do nº2 do artº 670º nº2 do CPC , aplicável por força do artº 716º nº2 do CPC, do despacho( ou acórdão) de indeferimento da arguição de nulidade ou do pedido de reforma não cabe recurso. E não havendo recurso, também não há reclamação para a conferência com vista à abertura dessa via impugnatória.

Efectivamente, ao contrário do que defende o recorrente, a lei não distingue entre “indeferimento” e “rejeição” dos citados pedidos pelo que, ubi lex non distuinguit nec nos distinguire debemus.

Assim, terá que se interpretar o indeferimento como não deferimento, uma vez que a lei apenas distingue estas duas situações.

Por outro lado o nº2 do artº 670º é, ao contrário do que defende a recorrente, aplicável ao recurso de revista, uma vez que também aqui a lei não distingue entre os vários tipos de recurso.

Deveria, pois, ter sido rejeitado e não convolado, o recurso jurisdicional interposto do despacho de 4-1-2012, mantendo-se este por ter transitado em julgado (independentemente de concordarmos ou não com ele).

De resto, as consequências da rejeição e do indeferimento são as mesmas, ou seja, deixar inócuo o acórdão reclamado, no caso de não ter sido interposto recurso jurisdicional de revista excepcional do mesmo.

No caso vertente não foi interposto recurso de revista do acórdão deste TCAS que considerou improcedente o recurso jurisdicional interposto pela Autora, mantendo-se, em consequência, a sentença da primeira instância que julgou improcedente a presente acção, confirmada por aquele .

Na verdade, tendo sido revogado o artº 686º do CPC que determinava a interrupção do prazo de recurso jurisdicional com a apresentação de pedido de reforma do acórdão, à luz da lei actualmente vigente, este pedido não suspende esse prazo.

Assim, na falta de interposição de recurso de revista deste acórdão no prazo de 15 dias, pela ora Recorrente, a apreciação do pedido de reforma e a arguição de nulidades, não vai permitir ao Autor essa impugnação, ainda que não concorde com a decisão proferida. ((cfr nºs 3 e 5 do artº 670º do CPC).

Nestes termos, com as últimas alterações ao Código de Processo Civil, deixou de ser possível invocar nulidades e solicitar a reforma de acórdãos se do mesmo não tiver sido interposto recurso jurisdicional, não podendo haver renúncia ao recurso .

Assim, não é aplicável neste momento a doutrina constante de fls 15 das alegações da recorrente, que aliás só se aplica aos recursos interpostos das decisões da primeira instância e não da segunda instância.

O fundamento do despacho reclamado e do acórdão confirmativo daquele, é o seguinte:

“Todavia, dado que o acórdão proferido nesta 2ª instância admite recurso ordinário de revista ao abrigo do regime do artº 150º do CPTA- vd artºs 149º e segs do CPTA – tal significa que a situação exposta é subsumível na hipótese do artº 668º nº4 do CPC, aplicável ex vi do artº 140º do CPTA, que exclui a arguição da nulidade junto do mesmo tribunal que proferiu o acórdão e, consequentemente, o respectivo conhecimento e decisão, sendo também este enquadramento a dar ao artº 716º nº2 do CPC.

Do mesmo modo, a peticionada reforma do acórdão em causa, ao abrigo do regime do artº 669º nº 2 a) do CPC, tem como pressuposto normativo expresso, que não caiba recurso da decisão.

O que significa que cumpre indeferir o requerido – artº 670º nº1 CPC”-

O recorrente defende, porém, nas suas alegações de recurso jurisdicional que sendo o recurso de revista excepcional, só admissível em determinados casos, é como se o acórdão não admitisse recurso para efeitos de ser possível o pedido de reforma e a arguição de nulidades, pelo que estas questões deveriam ter sido apreciadas.

Tal como já referimos, parece-nos que não será assim, na medida em que, renunciando o Autor ao recurso de revista, não pode, no pedido de reforma ou na arguição de nulidades, pretender o mesmo efeito que obteria caso interpusesse tal recurso.

De facto, a reclamação do acórdão para a sua reforma ou correcção tem a mesma função, quer este admita ou não recurso ordinário. A diferença reside na forma dessa impugnação; por via da reclamação caso não admita recurso; por via de recurso caso este seja admissível.

Ora, no caso presente, tal como defendemos na resposta de 2-1-2012 ao pedido de reforma e arguição de nulidades do acórdão de 30-11-11, o Autor vai para além do que é possível decidir no âmbito dos pedidos formulados, nomeadamente pretendendo alterar o acórdão por forma a ser proferido outro acórdão substancialmente diferente e não pretendendo corrigir manifestos lapsos pelo que, consubstanciando um verdadeiro recurso jurisdicional, caso esse Alto Tribunal decida pela respectiva apreciação por este TCAS, os mesmos deverão ser indeferidos nos termos da citada resposta.

Em conclusão:

1. O recurso ordinário não é admissível tendo o STA se pronunciado diversas vezes no sentido de que ainda que o tribunal de segunda instância conheça ex novo de uma questão, da decisão da mesma não cabe recurso para a sua apreciação pelo STA.
2. O legislador ordinário tem ampla liberdade para restringir os recursos apenas a alguns processos e a algumas decisões, dado que a CRP não estabelece qualquer direito ao recurso jurisdicional
3. No caso vertente, não existe qualquer norma que preveja recurso ordinário de apelação para o STA dos acórdãos proferidos pelo TCAS, pelo que o mesmo não poderá ser admitido.
4. O próprio recorrente considerou que o acórdão que decidiu a acção não admitia recurso de revista e, por isso, do mesmo cabia pedidos de reforma e arguição de nulidades autónomos pelo que, por maioria de razão, também não caberá, em princípio, recurso de revista do acórdão que decidiu rejeitar o pedido de reforma daquele acórdão.
5. Trata-se, na verdade, de uma questão menor suscitada numa providência cautelar e cuja decisão não é manifestamente ilegal, pelo que a intervenção do STA parece não se justificar, sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA e Ac do STA de 7-12-11, procº nº 01033/11)
6. Impugna-se à cautela, nos termos do artº 684-A nº1 do CPC, o acórdão de 8-3-2012, na parte em que decidiu a convolação da interposição de recurso em reclamação para a conferência, pois para que tal convolação fosse possível, teria o recurso de revista ter dado entrada no prazo de cinco dias que é o prazo estipulado na lei para a reclamação para a conferência nos processos urgentes, o qual terminava em 15-1-2012.
7. O recurso convolado em reclamação, interposto de despacho do relator de 4-1-2012, deu entrada na Secretaria deste TCAS em 24-1-2012, ou seja já depois de ter passado o prazo de reclamação para a conferência, pelo que o mesmo não poderia ter sido convolado.
8. Também não deveria ter sido convolado pelo facto de que, nos termos do nº2 do artº 670º nº2 do CPC , aplicável por força do artº 716º nº2 do CPC, do despacho( ou acórdão) de indeferimento ou rejeição da arguição de nulidade ou do requerimento de aclaração da sentença não cabe recurso. E não havendo recurso também não há reclamação para a conferência com vista à abertura dessa via impugnatória.
9. Não tendo sido interposto recurso de revista do acórdão deste TCAS que considerou improcedente o recurso jurisdicional interposto pela Autora, mantem-se em consequência, a sentença da primeira instância que julgou improcedente a presente acção, confirmada por aquele .
10. Na falta de interposição de recurso de revista do acórdão deste TCAS que manteve a sentença da primeira instância, no prazo de 15 dias, pela ora Recorrente, a apreciação do pedido de reforma e a arguição de nulidades, não vai permitir ao Autor essa impugnação, ainda que não concorde com a decisão proferida. ( cfr nºs3 e 5 do artº 670º do CPC).
11. Renunciando o Autor ao recurso de revista por considerar não ser este admissível no caso presente, não pode no pedido de reforma ou na arguição de nulidades ainda que admissível, pretender o mesmo efeito que obteria caso interpusesse tal recurso.
12. A impugnação do acórdão com vista à sua reforma ou reparação de nulidades tem a mesma função, quer este admita ou não recurso ordinário. A diferença reside na forma dessa impugnação; por via da reclamação caso não admita recurso; por via de recurso caso este seja admissível.
13. O Autor vai para além do que é possível decidir no âmbito dos pedidos formulados, nomeadamente pretendendo alterar o acórdão de 30-11-11, por forma a ser proferido outro acórdão substancialmente diferente e não pretendendo corrigir manifestos lapsos pelo que a reclamação apresentada, de resto extemporaneamente por ocorrer fora do prazo de cinco dias, consubstancia, ainda que camufladamente, um verdadeiro recurso jurisdicional.
14. Assim, caso esse Alto Tribunal decidisse, por mera hipótese, pela respectiva apreciação por este TCAS, os mesmos deveriam ser indeferidos nos termos da resposta de 2-1-2012 apresentada pelo MP em representação do Estado ao pedido de reforma e arguição de nulidades apresentada pela Autora em 16-12-2011.
Termos em que os recursos ordinário e de revista não deverão ser admitidos ou caso se decida pela sua admissão- o que não se concede - deverão ser considerados improcedentes, mantendo-se o acórdão impugnado ou revogando-se o mesmo com base nas ilegalidades que à cautela se invocaram, não se conhecendo do pedido de reforma e a arguição de nulidades.

Assim decidindo, farão Vªs Excelências a costumada,

Justiça!

A Procuradora Geral Adjunta

Maria Antónia Soares