Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:02/21/2014
Processo:07597/11(1)
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2º JUÍZO - 1ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:RECURSO DE REVISTA PARA O S.T.A.
CONTRA-ALEGAÇÕES DO M.P.
DIREITO DO URBANISMO.
"PERÍMETRO URBANO" E "AGLOMERADOURBANO".
REGULAMENTO DO PNA.
PDM DE SESIMBRA.
Observações:P.A. nº 106/11-U
Texto Integral:Procº 07597/11
2º Juízo-1ª Secção

Recursos de revista

Contra-alegações

Ministério Público


Venerandos Juízes Conselheiros do

Supremo Tribunal Administrativo


A Magistrada do MP junto deste Tribunal Central Administrativo Sul vem, nos autos supra referenciados, em que intervém como parte principal, em defesa da legalidade, apresentar as contra-alegações referentes aos recursos de revista interpostos pela entidade demandada, Município de S… (1º R) e pelo contra-interessado, F… Q… C… S… ( 2º R), o que faz nos termos do artº 145º nº1, do CPTA e com os seguintes fundamentos:

I - Introdução:

O Ministério Público intentou acção administrativa especial contra o Município de S… e o contra – interessado – proprietário de um prédio rústico sito no P…, Freguesia de Nossa Senhora da Consolação do Castelo, S…, bem como de uma moradia no mesmo construída - com vista à declaração de nulidade dos despachos do Presidente da Câmara Municipal de S…de 9-9-2004 que licenciou a construção e de 29-12-04 que determinou a passagem do respectivo alvará, bem como a condenação da Entidade Demandada a demolir a obra e repor o solo nas condições em que se encontrava antes da implantação da morada e muros.

Por sentença de 7-7-2010, o TAF de A… decidiu não declarar a nulidade dos actos impugnados, bem como condicionar o decidido ao facto do Município de S… requerer, em 10 dias, o Parecer ao PNA.

Desta sentença interpôs, o MMP junto do TAF de Almada, recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), invocando a nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão e excesso de pronúncia, e ainda a revogação da sentença por erro nos pressupostos de facto e de direito.

Por douto acórdão deste TCAS de 21-11-13 foi concedido provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo MP, declarando-se a nulidade da sentença, julgando-se a acção parcialmente procedente e declarando - se a nulidade da licença das construções aqui impugnadas.

Para além disso, determinou, ainda, o douto acórdão recorrido, a demolição das edificações e a reposição do terreno no seu estado anterior em 90 dias se, após 6 meses, o contra-interessado não obtiver nova licença de construção à luz da legislação então aplicável, após parecer vinculativo favorável do PNA.

É deste acórdão que vem interposto, pelos demandados, o presente recurso de revista.

I I- Da admissibilidade do recurso de revista:

1. O 1º R pretende ver apreciadas, por esse Alto Tribunal, as seguintes questões:

a) Aferir se o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (instituído pelas Portaria 26-F/80 de 9-1 e Decreto- Regulamentar 23/98, de 14-1) corresponde a um Plano Especial de Ordenamento do Território, ou se, pelo contrário, não tem essa característica.

b) Aferir se “o perímetro do aglomerado urbano” a que se refere a alínea a), do DR 23/98, significa o mesmo que o “perímetro do aglomerado urbano” definido na Lei dos Solos ( DL nº 794/76, de 5-11) ou se, pelo contrário, se reporta ao “perímetro urbano” definido no DL nº 69/90, de 2-03, que estabelece o Regime Jurídico dos Planos Municipais do Ordenamento do Território. O PDM de S… não define o perímetro de aglomerado urbano, pelo que, segundo a 1ª R, não é necessário o parecer vinculativo a que se reporta a alínea a) do artº 12º do DR 23/98.

2. Por sua vez, o 2º R pretende ver apreciadas as seguintes questões:

a) Aferir se o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (instituído pelas Portarias 26-F/80 de 9-1 e Decreto Regulamentar 23/98, de 14-1) corresponde a um Plano Especial de Ordenamento do Território, ou se, pelo contrário, não tem as características deste.

b) Aferir se os “espaços de transição” consagrados no Plano Director Municipal de S…, integram o respectivo perímetro urbano;

c) Saber se violam os princípios da confiança, segurança jurídica e proporcionalidade e são oponíveis a um interessado de boa-fé, os efeitos de declaração de nulidade de um licenciamento de construção quando, à data da aquisição do prédio, já tinha sido aprovado, pelos órgão camarários competentes, o respectivo projecto de arquitectura, na sequência de procedimento urbanístico iniciado por terceiro;

d) Saber se o tribunal pode fixar um prazo global de seis meses para obtenção de nova licença de construção, caso obtenha parecer vinculativo favorável.

As questões suscitadas reconduzem-se, apenas, a duas questões de real importância:

1º Saber se as construções ficam ou não dentro do perímetro do aglomerado urbano ou do perímetro urbano;

2º Saber se o prévio parecer do PNA era ou não obrigatório à data da prática do acto de licenciamento em análise.

Ora, estas questões, para além de já terem sido tratadas pela jurisprudência do STA ( cfr acórdãos do STA de 12-11-2009, de 16-7-03, de 7-6-05, in www.dgsi.pt ) são condicionadas, em absoluto, pela específica matéria de facto provada documentalmente, não sendo susceptíveis, por esse motivo, de se repetirem.

Por outro lado, na matéria aqui impugnada pelos recorrentes, decidida no acórdão recorrido – declaração de nulidade e fixação do prazo de seis meses para a conclusão de novo processo de licenciamento – não se verifica qualquer erro evidente na interpretação do direito ou na sua aplicação aos factos.

Contudo, o recebimento destes recursos depende apenas da decisão desse Alto Tribunal sobre a sua admissibilidade, caso se considerem verificados os pressupostos do nº1 do artº 150º do CPTA.

III - Dos fundamentos do recurso de revista interposto pelo 2º R:

A -Questões prévias:

Suscita, o 2º R, 3 questões prévias a saber:

a) Inexistência da nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, invocada pelo MP nas alegações de recurso para este TCAS e decidida favoravelmente pelo acórdão recorrido;

b) Inexistência da nulidade por omissão de pronúncia invocada pelo MP nas alegações de recurso para este TCAS e decidida favoravelmente pelo acórdão recorrido;

c) Nulidade do acórdão recorrido, por não ter rejeitado o recurso jurisdicional para este TCAS, com fundamento em que da sentença cabia, previamente à respectiva interposição, reclamação para a conferência nos termos do nº2 do artº 26º do CPTA.

Porém, entendemos que as mesmas deverão improceder. Assim,

a) Contradição entre os fundamentos e a decisão:
´É patente a contradição entre os fundamentos e a decisão da sentença, na medida em que, considerando que a falta de emissão de parecer do Parque Natural da Arrábida, determinava a nulidade dos despachos impugnados – por considerar aplicáveis ao caso e violados, nomeadamente, os normativos da Portaria nº 26-F/80, de 9-1 [Regulamento do Parque Natural da Arrábida (RPNA)] e do Decreto Regulamentar nº 23/98 de 14-1 (Reclassificação do PNA), em conjugação com os normativos do DL nº 380/99, de 22-9[ Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial ( RJIGT)] e artº 68º do DL nº 555/99, de 16-12, do [Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE)] - não declarou essa nulidade fazendo-a depender de prévia “correcção procedimental” que consistia em pedir o Parecer ao PNA que fora omitido.

Segundo a sentença, “o Plano de Ordenamento do PNA tem natureza de Plano Especial de Ordenamento, pelo menos desde a vigência do DL n° 151/95, de 24/06”; mais refere que “nos termos do artº 12° nº 1 al) a) do cit DR, “ficam sujeitos a Parecer vinculativo do PNA a realização de obras de construção civil, a alteração do uso actual do solo ou da morfologia do solo, designadamente para edificações, fora dos perímetros urbanos tal corno definidos nos Planos Municipais de Ordenamento do território”. E continua:

“Não obstante a profusa argumentação, designadamente do Contra-interessado e do Parecer junto aos Autos pelo mesmo, o que é facto é que o Prédio em causa, se situa de modo manifesto fora do perímetro urbano, tal como definido no PDM de S…”; “Os Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas são Planos Especiais de Ordenamento do Território (artº 33° da LBOTU), pelo que vinculam de forma directa e imediata, as Entidades Públicas e privadas (art° 42° do DL nº 380/99)”; Assim, serão tendencialmente “nulas as licenças que violem o disposto em Plano Especial de Ordenamento do Território ou não tenham sido precedidas de consulta a Entidades cujos Pareceres sejam legalmente exigíveis” (art° 68° alíneas a) e c) do RJUE)”destaques nossos).

Ou seja, por um lado, a sentença considera nulas as licenças em análise por falta de parecer do PNA, mas por outro, considera que o vício de que padecem por falta desse parecer, é um vício procedimental e, consequentemente, não gera a nulidade!

Portanto, a sentença, embora considerando que “perante os normativos invocados, se está perante uma nulidade e admitindo que a função judicial não pode contribuir para um clima de impunidade”(fls 17), não a decretou nem extraiu da nulidade invocada as consequências inerentes à reposição da legalidade, que seriam, neste caso, a demolição das construções licenciadas (moradia e muro), bem como a reposição do terreno no estado em que se encontrava antes das edificações.

a) Omissão de pronúncia:
Ao não extrair, da nulidade invocada, as consequências inerentes à reposição da legalidade, que seriam, neste caso, a demolição das construções licenciadas (moradia e muro), bem como a reposição do terreno no estado em que se encontrava antes das edificações, não se pronunciou sobre o 2º pedido formulado pelo MP na sua petição que era precisamente essa demolição e reposição do terreno.

E teria, salvo o devido respeito que se pronunciar, o que não significa que o deferisse, mas que se pronunciasse sobre as consequências que as decisões anteriores teriam sobre o 2º pedido, nomeadamente se essa demolição ficava prejudicada ou protelada.

b) Falta de reclamação para a conferência:
Esta questão, suscitada por requerimento do 2º R, de 5-12-2013, foi decidida por despacho de 23-1-2014, o qual considerou esta pretensão improcedente.

Este despacho transitou em julgado uma vez que do mesmo não foi interposto recurso.

De qualquer forma, a questão improcederia, uma vez que o vicio da falta de reclamação para a conferência é atribuível à sentença e não ao acórdão ora recorrido.

Ora, o aqui recorrente não suscitou esta questão no momento apropriado, que seria quando recebeu a notificação da sentença, ou nas suas contra-alegações referentes ao recurso que o MP interpôs da mesma.

Assim, como esta questão não foi suscitada também pelas outras partes no processo, o seu não conhecimento pelo julgador, ainda que oficiosamente, não gera qualquer nulidade por omissão de pronúncia ((artº 608º nº2 do NCPC).

De facto, a abordagem oficiosa da questão não decorre de qualquer imposição legal, sendo que a mesma só faria sentido se o julgador entendesse que havia reclamação para a conferência o que pode não ser o caso.

B) Do alegado erro de julgamento do acórdão recorrido:

1. Ambos os recorrentes pretendem impugnar o acórdão recorrido na parte em que decidiu declarar a nulidade dos actos de licenciamento e passagem do alvará consequente.

2. O 2º recorrente pretende, ainda, impugnar o referido acórdão na parte em fixou um prazo de seis meses para promover novo licenciamento, com prévio parecer do PNA.

3. Os fundamentos dos dois recursos são as questões já supra enunciadas, as quais são as seguintes:

a) Aferir se o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (instituído pelas Portarias 26-F/80 de 9-1 e Decreto Regulamentar 23/98, de 14-1) corresponde a um Plano Especial de Ordenamento do Território, ou se, pelo contrário, não detém essa característica;

b) Aferir se “o perímetro do aglomerado urbano” a que se refere a alínea a) do DR 23/98 significa o mesmo que os “perímetros dos aglomerados urbanos” definidos na Lei dos Solos ( DL nº 794/76, de 5-11) ou se, pelo contrário, se reporta ao “perímetro urbano” definido no DL nº 69/90, de 2-03, que estabelece o Regime Jurídico dos Planos Municipais do Ordenamento do Território. O PDM de S… não delimita o perímetro de aglomerado urbano pelo que não é necessário parecer vinculativo

2. Por sua vez, o 2º R pretende, ver apreciadas as seguintes questões:

c) Aferir se o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (instituído pelas Portarias 26-F/80 de 9-1 e Decreto Regulamentar 23/98, de 14-1) corresponde a um Plano Especial de Ordenamento do Território, ou se, pelo contrário, não assume essa característica;

d) Aferir se os “espaços de transição” consagrados no Plano Director Municipal de S… integram o respectivo perímetro urbano.

e) Saber se viola os princípios da confiança, segurança jurídica e proporcionalidade e é oponível a um interessado de boa-fé os efeitos de declaração de nulidade de um licenciamento de construção quando, à data da aquisição do prédio, já tinha sido aprovado, pelos órgão camarários competentes, o respectivo projecto de arquitectura, na sequência de procedimento urbanístico iniciado por terceiro;

f) Saber se o tribunal pode fixar um prazo global de seis meses para obtenção de nova licença de construção, caso obtenha parecer vinculativo favorável.

4. No nosso entender são, porém, resumidamente, duas as questões que importa resolver pois, caso se considerem procedentes, determinam inevitavelmente a nulidade dos actos impugnados.

São elas, as seguintes questões, decididas favoravelmente quer pela sentença, quer pelo acórdão ora recorrido:

1º Saber se as construções ficam ou não dentro do perímetro do aglomerado urbano;

2º Saber se o prévio parecer do PNA era ou não obrigatório à data da prática do acto de licenciamento.

5. De facto, parece-nos de relevância diminuta para aferir da nulidade dos actos em apreciação, a questão suscitada pelo 1º R de saber se as edificações estão fora do “perímetro de aglomerado urbano”, ou “fora do perímetro urbano”já que a “zona de transição” em que estão inseridas, nos termos do PDM de S…, fica fora quer de um, quer de outro.

Seria, aliás, um absurdo, aderir à tese do 1º R no sentido de que o PDM de S… não delimita o perímetro de aglomerado urbano, pelo que não é necessário parecer vinculativo.

Na verdade, resulta também claramente do PDM de S…, aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros nº 15/98, de 2-2, que as construções em análise se inserem fora de aglomerado urbano e fora de perímetro urbano.

Nos termos do PDM de S…, o PNA integra uma unidade operativa de planeamento e gestão, que corresponde, na sua maior parte, a um espaço natural ( artº 7º /3º);

E constitui um espaço de transição por oposição ao espaço urbano/urbanizável ( artº 8º /9)/2), artº 31º;

Só os espaços urbanos/ urbanizáveis é que integram o perímetro urbano ( artº 28º nº2 do DL 69/90, de 2-3, alterado pelo DL nº211/92, de 8-10).

O “perímetro de um aglomerado urbano” integra apenas os espaços urbanos, caracterizados por elevados níveis de infra-estruturas e concentração de edificações onde o solo se destina predominantemente á construção[ alíneas a) e b) do nº1 do artº 28º do DL 69/90 e artº 62º nº1 do DL nº791/75 de 5-11( Política dos Solos)].

Isto significa que o perímetro urbano é mais extenso do que o perímetro do aglomerado urbano, o que significa que, estando a “zona de transição” fora de espaços urbanos e urbanizáveis, está fora do perímetro urbano e, consequentemente, do aglomerado urbano.

Nestes termos, não há dúvida de que as construções em análise, estavam sujeitas a parecer vinculativo do PNA, procedendo assim a primeira questão

6 Quanto à segunda questão:

De acordo com a sentença, “… entende-se que o Plano de Ordenamento do PNA tem natureza de Plano Especial de Ordenamento, pelo menos, desde a vigência do DL n° 151/95, de 24/06. Os Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas são Planos Especiais de Ordenamento do Território (artº 33° da LBOTU), pelo que vinculam de forma directa e imediata, as Entidades Públicas e privadas (art° 42° do DL nº 380/99)”.

De acordo com o acórdão recorrido, “Tal como o tribunal recorrido explicou, entendemos que o Plano de Ordenamento do PNA, que guia o PDM de S…/1998, tem natureza de plano especial (v. art. 33º do DL 380/99), o qual vincula de forma directa e imediata as entidades públicas e privadas (v. art° 42° do DL nº 380/99; Ac. STA de 7-6-05, P. nº 405/05; Ac. TCA Sul de 28-2-2008, P. 01404/06), como os demandados nesta AAE”.

7. Mas ainda que se considere que o Plano de Ordenamento do PNA, aprovado pela RCM nº 141/05, de 23-8, é posterior à decisão de licenciamento proferida em Setembro de 2004 e, portanto inaplicável á mesma, tal não implicaria a desnecessidade de parecer do PNA. Assim,

O Ac do STA de 16-7-03 P 01047/03, transcrevendo o acórdão do STA, proferido no processo nº 01048/03, de 2-7-03, reza assim:

“Antes de apreciar a questão equacionada, convém situar o respectivo enquadramento legal, no que seguiremos o acórdão deste STA proferido em caso idêntico no recurso nº 1048/03, cuja doutrina, que vamos transcrever, sufragamos inteiramente.

“O DL nº 19/93, de 23/1 veio criar o novo quadro de classificação das Áreas Protegidas Nacionais, desenvolvendo o regime jurídico estabelecido pela Lei nº 11/87, de 7/4 (Lei de Bases do Ambiente), impondo, nos termos do seu artº 13º, a reclassificação do PNA, segundo os critérios aí estabelecidos.

Assim, o referido artº 13º veio estabelecer que a classificação das áreas protegidas fosse efectuada por Decreto Regulamentar onde se definissem os seguintes itens:

O tipo e delimitação geográfica da área e seus objectivos específicos;

Os actos e actividades condicionados ou proibidos;

Os órgãos, sua composição, forma de designação dos respectivos titulares e regras básicas de funcionamento;

O prazo de elaboração do plano de ordenamento e respectivo regulamento.

O nº 2 da mesma disposição legal estabeleceu que a classificação de Área Protegida caducava pelo não cumprimento do prazo de elaboração de Plano de Ordenamento e respectivo regulamento.

O Dec. Regulamentar nº 23/98, de 14/10, veio proceder à reclassificação do PNA, definindo os limites, objectivos, órgãos de gestão e suas competências, e interdição de actos e actividades na área do PNA, actos e actividades sujeitos a autorização e a parecer vinculativo, estabelecendo no seu artº 18º que, no prazo máximo de 3 anos a contar da sua publicação, o PNA seria dotado de um Plano de Ordenamento do Território.

Esse prazo esgotou-se em 14 de Outubro de 2001, sem que tivesse sido elaborado e publicado o Plano de Ordenamento do Território do PNA.

Daí que o recorrente sustente que a classificação do PNA como Área Protegida, caducou nos termos do nº 2 do artº 13º do DL 19/93, deixando de ter suporte legal a exigência do referido parecer prévio.

Todavia, para obviar aos inconvenientes daí resultantes, foi publicado o DL nº 204/02, de 1/10, que veio manter em vigor a classificação das áreas protegidas operada pelos diplomas que procederam à sua criação ou à respectiva reclassificação, procurando, como se refere no respectivo preâmbulo, salvaguardar “de imediato, as componentes ambientais naturais que justificam que estas áreas se encontrem sujeitas a um especial estatuto de protecção”.

Assim, dispõe o seu

“Artigo único

I – Mantém-se em vigor a classificação das áreas protegidas operada pelos diplomas que procederam à sua criação ou à respectiva reclassificação nos termos do Decreto-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro.

2 – No prazo de dois anos, a partir da entrada em vigor do presente diploma, devem ser aprovados os planos de ordenamento das áreas protegidas que ainda não disponham de tais instrumentos especiais de gestão territorial.

3 – Os efeitos do presente diploma retroagem ao termo dos prazos fixados nos diplomas mencionados no nº 1 do presente artigo, para elaboração dos planos de ordenamento e respectivos regulamentos”.

Resulta claro da disposição transcrita que foi intenção expressa do legislador derrogar, com efeitos retroactivos, para além do mais, a norma que impunha a caducidade da classificação das áreas protegidas.

Assim, tudo está em saber se neste âmbito, é possível a retroactividade da lei.

Ora, a caducidade é um efeito jurídico, nada obstando, em princípio, que o legislador, na sua liberdade de conformação legislativa, possa obstar retroactivamente à produção de tais efeitos, tanto mais, que esse desiderato legal tem por fundamento a protecção de valores ambientais tão caros à comunidade e que têm até expressa consagração constitucional (cfr. artº 66 º da CRP)”.

7. Portanto, aquando da prolação do acto de licenciamento de 9-9-204, ainda se encontravam em pleno vigor o artº 12º alínea a) do DR nº 23/98, de 14-10, bem como o artº 14º da Portaria nº 26-F/80, de 9-1, por força dos nºs 1 e 2 do artigo único do DL nº 204/02, de 1/10.

Isto porque, o prazo de dois anos, a contar da entrada em vigor do DL nº 204/2002, de 1-10, nos termos do nº2 do seu artigo único, só terminaram no dia 2-10-2004.

Nestes termos, não tendo a licença de construção sido precedida de parecer vinculativo do PNA, é nula e de nenhum efeito, nos termos nomeadamente, do artº 19º nº5 do DR 23/98, artº 68º do RGUE e 133º do CPA.

8. Embora nos pareça uma questão secundária, dir-se-á que, a questão de saber se violam os princípios da confiança, segurança jurídica e proporcionalidade e é oponível a um interessado de boa-fé, os efeitos de declaração de nulidade de um licenciamento de construção quando, à data da aquisição do prédio, já tinha sido aprovado, pelos órgão camarários competentes, o respectivo projecto de arquitectura, na sequência de procedimento urbanístico iniciado por terceiro, é manifestamente improcedente.

Na verdade, a obrigatoriedade do pedido de parecer vinculativo e respectiva nulidade do licenciamento têm, apenas, como pressuposto, a localização do prédio fora de aglomerado urbano.

Deste modo, sendo um acto vinculado, não se pode chamar à colação os princípios gerais de direito e consignados na CRP, dado que se pressupõe que o legislador teve em conta todos esses princípios ao determinar a nulidade dos actos nos casos previstos na lei.

Por outro lado, é patente a inaplicabilidade ao caso do nº4 do artº 134º do CPA uma vez que, no caso vertente, não se verifica o decurso do tempo necessário para a atribuição de certos efeitos jurídicos a situação de facto decorrente do acto nulo.

9. E finalmente, saber se o tribunal pode fixar um prazo global de seis meses para obtenção de nova licença de construção, caso obtenha parecer vinculativo favorável, deverá ter uma resposta afirmativa caso se considere, por hipótese, de improceder o recurso subordinado onde se impugna o acórdão recorrido na parte em que decidiu pela nova licença de construção e parecer do PNA a posteriori.

Na verdade, seria intolerável a não fixação de qualquer prazo para a obtenção da nova licença, como aconteceria se estabelecesse apenas um prazo para o 2º solicitar nova licença, como este pretende.

Se é certo que o andamento do processo do novo licenciamento não é só da responsabilidade do 2º R, também é certo que o 1º R fica vinculado a tal prazo, tal como o 2º R fica vinculado a apresentar o pedido de modo a aquele poder ser cumprido.

Assim, improcede também esta impugnação.

Em tudo o mais, dão-se aqui por reproduzidos, para todos os efeitos legais, os fundamentos de facto e de direito invocados, quer na petição inicial e de mais peças processuais elaboradas pelo MMP, quer no acórdão recorrido.

Termos em que deverão os dois recursos de revista improceder, mantendo-se o acórdão recorrido na parte impugnada pelos recorrentes.

IV – Em conclusão:

1. Por sentença de 7-7-2010, o TAF de Almada decidiu não declarar a nulidade dos actos impugnados, bem como condicionar o decidido ao facto do Município de S… requerer, em 10 dias, o Parecer ao PNA.

2. Desta sentença interpôs, o MMP junto do TAF de Almada, recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), invocando a nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão e excesso de pronúncia, e ainda a revogação da sentença por erro nos pressupostos de facto e de direito.

3. Por douto acórdão deste TCAS de 21-11-13 foi concedido provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo MP, declarando-se a nulidade da sentença, julgando-se a acção parcialmente procedente e declarando - se a nulidade da licença das construções aqui impugnadas.

4. Para além disso, determinou, ainda, o douto acórdão recorrido, a demolição das edificações e a reposição do terreno no seu estado anterior em 90 dias se, após 6 meses, o contra-interessado não obtiver nova licença de construção à luz da legislação então aplicável, após parecer vinculativo favorável do PNA.

5. As questões a relevar, neste recurso, reconduzem-se a saber se as construções em análise ficam dentro ou fora do perímetro do aglomerado urbano ou do perímetro urbano e se o prévio parecer do PNA era ou não obrigatório à data da prática do acto de licenciamento em análise.

6. Estas questões, para além de já terem sido tratadas pela jurisprudência do STA (embora em situações de facto específicas), são condicionadas, em absoluto, também neste processo, pela específica matéria de facto provada documentalmente, não sendo susceptíveis, por esse motivo, de se repetirem.

7. Na matéria aqui impugnada pelos recorrentes, decidida no acórdão recorrido – declaração de nulidade e fixação do prazo de seis meses para a conclusão de novo processo de licenciamento – não se verifica qualquer erro evidente na interpretação do direito ou na sua aplicação aos factos.

8. O recebimento destes recursos depende, no entanto, da decisão desse Alto Tribunal sobre a sua admissibilidade, caso se considerem verificados os pressupostos do nº1 do artº 150º do CPTA.

9. Existe contradição entre os fundamentos e a decisão da sentença, no sentido de não declarar a nulidade dos actos impugnados, pelo que o acórdão recorrido não merece qualquer censura ao considerar procedente a nulidade da invocada pelo MMP com este fundamento.

10. Existe nulidade da sentença por omissão de pronúncia, na medida em que não conheceu do 2º pedido formulado pelo MMP na petição, pelo que o acórdão recorrido não merece qualquer censura ao considerar procedente esta nulidade.

11. Não se verifica a nulidade do acórdão recorrido, por não ter rejeitado o recurso jurisdicional para este TCAS interposto pelo MMP da sentença, com fundamento em que da sentença cabia, previamente à respectiva interposição, reclamação para a conferência nos termos do nº2 do artº 26º do CPTA.

12. Improcedem, assim, as questões prévias suscitadas pelo 2º recorrente.

13. Para aferir da nulidade dos actos em apreciação, a distinção entre “perímetro de aglomerado urbano”, e “perímetro urbano” é irrelevante já que a “zona de transição” em que estão inseridas as construções, nos termos do PDM de S…, fica fora quer de um, quer de outro.

14. O PDM de S… não delimita o perímetro de aglomerado urbano, porque apresenta outro esquema de divisão dos solos sem que, contudo, tivesse deixado de vigorar o Decreto-Regulamentar nº23/98, de 14-10 que reclassificou o Parque Natural da Arrábida como zona protegida, devendo considerar-se para efeito da sua aplicabilidade que as construções em análise ficam fora de aglomerado urbano/ perímetro urbano, tal como a zona de transição em que estão inseridas ( artº 8º/9)/a) do PDM de S… aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros nº 15/98, de 2-2, e docs de fls 13 e 112).

15. Nos termos do PDM de S…, o PNA integra uma unidade operativa de planeamento e gestão, que corresponde, na sua maior parte, a um espaço natural ( artº 7º /3º);

16. As construções estão inseridas num “espaço de transição” por oposição ao “espaço urbano/urbanizável” ( artº 8º /9)/2), artº 31ºdo PDM de S…);

17. Só os espaços urbanos/ urbanizáveis é que integram o perímetro urbano ( artº 28º nº2 do DL 69/90, de 2-3, alterado pelo DL nº211/92, de 8-10).

18. O “perímetro de um aglomerado urbano” integra apenas os espaços urbanos, caracterizados por elevados níveis de infra-estruturas e concentração de edificações onde o solo se destina predominantemente á construção[ alíneas a) e b) do nº1 do artº 28º do DL 69/90 e artº 62º nº1 do DL nº791/75 de 5-11( Política dos Solos)].

19. As construções em análise, estavam inseridas em zona de transição nos termos do PDM de S…, não estavam inseridas em espaço urbano ou urbanizável, situando-se portanto, fora de aglomerado ou perímetro urbano, pelo que estavam sujeitas a parecer vinculativo do PNA, nos termos da alínea a) do artº 14º do DR nº 23/98.

20. O Plano de Ordenamento do PNA tem natureza de Plano Especial de Ordenamento, pelo menos, desde a vigência do DL n° 151/95, de 24/06.

21. Os Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas são Planos Especiais de Ordenamento do Território (artº 33° da Lei nº48/98, de 11-8 Bases da Política do Ordenamento do Território), pelo que vinculam de forma directa e imediata, as entidades públicas e privadas (art° 42° do DL nº 380/99 de 22-9)”.

22. Ainda que se considerasse que a Portaria nº 26-F/80, de 9-1, e o Decreto - Regulamentar nº 23/98, de 14/10, não se podem classificar como Plano Especiais de Ordenamento do PNA, tal não implicaria a desnecessidade de parecer do PNA antes do licenciamento das construções.

23. Aquando da prolação do acto de licenciamento, em 9-9-204, ainda se encontrava em pleno vigor o artº 12º, alínea a), do DR nº 23/98, de 14-10, bem como o artº 14º, da Portaria nº 26-F/80, de 9-1, por força dos nºs 1 e 2 do artigo único do DL nº 204/02, de 1/10 (cfr o Ac do STA de 16-7-03 P 01047/03, bem como o acórdão do STA, proferido no processo nº 01048/03, de 2-7-03).

24. Não tendo, a licença de construção, sido precedida de parecer vinculativo do PNA, é nula e de nenhum efeito, nos termos nomeadamente, do artº 19º nº5 do DR 23/98, artº 68º do RGUE e 133º do CPA.

25. São oponíveis a um interessado de boa-fé, os efeitos de declaração de nulidade de um licenciamento de construção mesmo se, à data da aquisição do prédio, já tivesse sido aprovado, pelos órgão camarários competentes, o respectivo projecto de arquitectura, na sequência de procedimento urbanístico iniciado, já que a obrigatoriedade do pedido de parecer vinculativo e respectiva nulidade do licenciamento, em caso da respectiva omissão, resultam de lei expressa, tendo, apenas, como pressuposto, a localização do prédio fora de aglomerado urbano, perímetro urbano ou espaço urbano.

26. Sendo essa declaração de nulidade, em direito do urbanismo, um acto vinculado, não se pode chamar à colação os princípios da confiança, segurança jurídica e proporcionalidade, considerando-os violados, dado que se pressupõe que o legislador teve em conta todos esses princípios ao elaborar a lei que determina a nulidade dos actos nos casos na mesma previstos (cfr ac do STA de 26-6-2013, in procº nº 01356/12).

27. É patente a inaplicabilidade, à situação dos autos, do nº4, do artº 134º, do CPA uma vez que, no caso vertente, não se verifica o decurso do tempo necessário para a atribuição de certos efeitos jurídicos a situação de facto decorrente do acto nulo, único pressuposto exigido por este normativo.

28. O tribunal pode fixar um prazo global de seis meses para obtenção de nova licença de construção e obtenção do parecer do PNA, caso se venha a considerar legítima a substituição do pedido, formulado pelo MMP, de “demolição das construções e reposição do terreno no estado anterior às construções”, por aqueles procedimentos, no recurso subordinado interposto pelo MP.

29. Seria de resto, intolerável, a não fixação de qualquer prazo para a obtenção da nova licença, como aconteceria se se estabelecesse apenas um prazo para o 2º R solicitar nova licença, como este pretende.

30. O andamento do processo do novo licenciamento não é só da responsabilidade do 2º R, ficando o 1º R também vinculado a tal prazo, ficando, ainda, o 2º R, vinculado a apresentar o pedido, de modo a aquele prazo poder ser cumprido.

31. Em tudo o mais, dão-se aqui por reproduzidos, para todos os efeitos legais, os fundamentos de facto e de direito invocados, quer na petição inicial e de mais peças processuais elaboradas pelo MMP, quer no acórdão recorrido.

32. Improcedem, assim, todas as questões suscitadas pelos recorrentes, uma vez que o acórdão recorrido, na parte por estes impugnada, fez correcta interpretação jurídica dos normativos aplicáveis e correcta aplicação, dos mesmos, aos factos provados

33. Termos em que, deverão os dois recursos de revista improceder, mantendo-se o acórdão recorrido na parte impugnada pelos recorrentes.


Assim decidindo, farão Vossas Excelências a

Costumada JUSTIÇA!

A Procuradora-Geral Adjunta

Maria Antónia Soares