Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:01/11/2012
Processo:08398/12
Nº Processo/TAF:02665/11.9BELSB
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:PEDIDO DE ASILO
Data do Acordão:02/16/2012
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator

A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos arts. 146º nº1 e 147º do CPTA, vem, ao abrigo do disposto no art. 145º nº 5 do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto, pelo então A., da sentença de fls. 68 e segs., proferida pelo TAC de Lisboa, que, julgou totalmente improcedente a presente acção, absolvendo o Réu do pedido.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, o recorrente imputa à sentença recorrida violação dos arts. 7º, 19º e 34º todos de Lei nº 27/08 de 30/06.

A entidade, ora recorrida, apresentou contra - alegações pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do julgado.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com interesse para a decisão e com fundamento na prova documental, os factos constantes dos pontos 1 a 7, a fls. 68, in fine, e 69, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

III – Desde já se nos afigura que a sentença recorrida é de manter.

Com efeito, atentas as suas alegações de recurso verifica-se que o Recorrente se limita a apresentar entendimento jurídico contrário à decisão da sentença do Tribunal a quo, sendo certo que não controverte a matéria de facto levada ao probatório, que, em grande parte, assenta nas próprias declarações que prestou constantes de fls. 25 a 31 do PA.

Na verdade, embora se possa ter como aceite que o recorrente tenha participado na manifestação de 28 de Setembro, onde, segundo declarou o seu pai foi morto e a irmã violada, vindo a morrer no Hospital, verifica-se que não se ter demonstrado que o mesmo tivesse sido espancado (cfr. facto dado como não provado.

Salienta - se que a manifestação de 28 de Setembro onde efectivamente foram massacradas, calcula - se que, 157 pessoas, ocorreu em 2009, como é consabido, ano que o ora recorrente disse desconhecer.

Por outro lado, tendo declarado que os militares o procuraram por várias vezes, na casa do amigo onde residia, em Coza, também afirmou desconhecer em que datas.

Tendo afirmado pertencer ou ser apoiante do partido político UFDG e vender camisolas e bonés alusivas ao mesmo, actividade que diz ter iniciado após a referida manifestação, afirmou, porém, desconhecer, o significado daquela sigla, afirmando pertencer àquele partido derivado à sua etnia peule, desconhecendo outros acontecimentos, como a date das eleições na Guiné Conácri ou referindo - os apenas de forma vaga e imprecisa.

O certo é que nem sequer localizando no tempo, ainda que por aproximação, as ocasiões em que diz ter sido procurado pelos militares, com os quais diz nunca se ter cruzado, sabendo do facto por amigos, só em 15 de Setembro de 2011 terá, segundo ele, abandonado a Guiné Conácri, indo para a Guiné - Bissau de táxi com um amigo.

Também quando questionado sobre a razão pela qual o requerente não tinha permanecido na Guiné Bissau, apenas referiu que não conhecia ali ninguém, isto apesar de como atrás referido ter ido para a Guiné – Bissau com um amigo de nome A… que o levou para uma casa onde estavam muitos estrangeiros e onde diz ter permanecido uma semana.

Face aos factos atrás descritos, é notório, a nosso ver, que não se encontram preenchidos os requisitos que permitam concluir que a fundamentação do seu pedido de asilo se baseia em medidas de carácter individual de natureza persecutória de que tenha sido vítima em consequência de actividades políticas por si desenvolvidas, em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz humana entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.

Não foi também invocado pelo requerente o receio de perseguições em virtude de raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, na acepção dos nºs l e 2 do art. 3° da Lei nº 27/2008, de 30.06, apenas tendo referido que deixou a Guiné - Conácri por não se sentir em segurança uma vez que os militares o procuravam, não esclarecendo sequer, como atrás se deixou dito, em que altura isso aconteceu.

Aliás, o recorrente, tendo sido sujeito a controlo documental logo à sua chegada ao Aeroporto de Lisboa, cerca das 08h00 do dia 26/09/2011, não manifestou qualquer intenção de solicitar asilo, apenas tendo surgido tal pedido no dia seguinte através de uma advogada que o recorrente, nas suas declarações, afirmou não ter contactado nem saber quem a contactou, não se compreendendo a razão pela qual não manifestou de imediato a intenção de pedir asilo.

Por outro lado, todo o alegado pelo Recorrente parte sempre do mesmo pressuposto, ou seja, o da existência de dúvidas, face ao actual contexto sócio - político da Guiné - Conácri, o que levaria à aceitação do pedido para melhor análise, em consonância com o princípio do “non - refoulement” consagrado no art. 33º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

De acordo com o ponto 204, o Manual de Procedimentos do ACNUR refere que o benefício da dúvida deverá, contudo, apenas ser concedido quando todos os elementos de prova disponíveis tenham sido obtidos e confirmados e quando o examinador esteja satisfeito no respeitante à credibilidade geral do requerente. As declarações do requerente deverão ser coerentes e plausíveis e não deverão ser contraditórias face à generalidade dos factos conhecidos, o que não é o caso.

Por outro lado, como se pode ler no Ac. deste TCAS de 24/02/2011, Rec. 07226/11, proferido em caso semelhante ao dos presentes autos, «(…) o princípio do "non - refoulement", nos termos do qual é assegurada a proibição de quaisquer formas de perturbação da segurança do indivíduo, incluindo o retorno forçado ou a negação do estatuto que o possa colocar em risco e insegurança directa ou indirecta.
O princípio de "non - refoulement" significa que ninguém será expulso ou reenviado para um país onde a sua vida ou liberdade estejam ameaçadas e aplica-se sempre que alguém se encontra no território, ou nas fronteiras de um determinado país, independentemente de ter sido, ou não, formalmente reconhecido o seu estatuto de refugiado.
Na alínea t) do n.°l do artigo 2.° da Lei n.° 27/2008, de 30 de Junho estatui-se que deve entender-se por "Proibição de repelir" (princípio de não repulsão ou non - refoulement) o princípio de direito de asilo internacional, consagrado no artigo 33.° da Convenção de Genebra, nos termos do qual os requerentes de asilo devem ser protegidos contra a expulsão ou repulsão, directa ou indirecta, para um local onde a sua vida ou liberdade estejam ameaçadas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas, não se aplicando esta protecção a quem constitua uma ameaça para a segurança nacional ou tenha sido objecto de uma condenação definitiva por um crime ou delito particularmente grave.
No caso dos autos contudo nenhum elemento objectivo conduz a que para o requerente de asilo, ora autor, a cidade de Bissau, seja um lugar pouco seguro (…).
Da mesma forma não se vislumbra uma razão humanitária fundada para o não regresso à Guiné Conacri (que é um vasto país, com mais de 240 000 Km2) (…).
Razão porque se afigura não ter sido demonstrada a necessidade de protecção subsidiária, e a concessão de autorização de residência por razões humanitárias ao cidadão autora nos presentes autos. ».

Também no caso dos presentes autos o recorrente viajou para Portugal, da Guiné Bissau, e não da República da Guiné Conácri de onde é cidadão nacional e de onde saiu, de acordo com o seu depoimento, no dia 15 de Setembro de 2011.

Ora, nenhum elemento objectivo indica que a Guiné - Bissau e nomeadamente Bissau, se possa considerar um lugar pouco seguro para o recorrente.

E, sendo certo que na Guiné - Conácri se tem verificado ao longo dos anos a violação sistemática dos direitos humanos, também, de acordo com o relatório do GAR junto ao PA, algumas notícias recentes revelam uma melhoria da situação com a presidência de Alpha Conde estando, desde 16/09, em Conácri “A missão da Federação internacional dos Direitos Humanos”, além de estar proposto um programa de reconciliação nacional, não se vislumbrando uma razão humanitária fundada para o não regresso à Guiné - Conácri.

Daí que se afigure não ter sido demonstrada a necessidade de protecção subsidiária, e a concessão de autorização de residência por razões humanitárias ao ora recorrente.

Motivo pelo qual a sentença recorrida, a nosso ver, não tenha violado as disposições legais que lhe são imputadas.

IV – Assim, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso mantendo - se a sentença recorrida.