Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:09/11/2012
Processo:09145/12
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
Texto Integral:
Tribunal Central Administrativo Sul


Proc. nº 09145/12 – Rec. Jurisdicional

2º Juízo/1ª Secção ( Contencioso Administrativo )


Venerando Juiz Desembargador Relator

A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos artºs 146º nº1 e 147º do CPTA, vem, ao abrigo do disposto no art. 145º nº 5 do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto, pela então Requerente, da sentença de fls. 1066 e segs., do TAC de Lisboa, que julgou improcedente a presente providência cautelar e absolveu a Entidade Requerida e a Contra - Interessada da instância.

Nas conclusões das suas alegações de recurso a recorrente imputa à sentença recorrida erro e contradição na apreciação da matéria de facto dada como provada e não provada e violação do art. 120º nº 1 als. a) e b) do CPTA.

A entidade ora recorrida e a contra - interessada, apresentaram contra - alegações, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida, tendo a contra - interessada ainda requerido a ampliação do objecto do recurso nos termos do art. 684º-A do CPC, a título subsidiário.

II – Na sentença recorrida foram dados como provados, com interesse para a decisão e com fundamento na prova documental e testemunhal, os factos constantes das als. A) a NNNN), do ponto III. 3.1., de fls. 1095 a 1122, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Quanto ao imputado erro e contradição na apreciação da matéria de facto dada como provada e não provada, pela sentença recorrida.

A nosso ver inexiste qualquer contradição na apreciação da matéria de facto dada como provada nas als. Y), OOO) e EEEE) com o facto dado como não provado no ponto 6., da respectiva matéria, como pretende o recorrente, já que face ao facto dado como provado na al. AA), a eliminação dos recalces não terá de conduzir necessariamente a um elevado risco da ruína do edifício da Requerente, sendo que o facto descrito na al. EEEE) traduz a realidade do possível risco existente.

Quanto ao facto que a Requerente entende deveria ter sido dado como provado a que se referem os pontos 24º a 26º das conclusões afigura - se que o mesmo faz parte da matéria controvertida a decidir na acção principal, pelo que o mesmo não deverá ser aditado.

Relativamente ao facto cujo aditamento se pretende na conclusão 27º das alegações da recorrente afigura - se tal como refere a CI nas suas alegações ser o mesmo irrelevante para a decisão da presente medida cautelar, pelo que o seu aditamento deve ser indeferido.

IV – Quanto à imputada violação do art. 120º nº 1 al. a) do CPTA, pela sentença recorrida.

A sentença recorrida depois de analisar o requisito do art. 120º nº 1 al. a) do CPTA, concluiu não ser evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, dando por não verificado tal requisito.

Na verdade, as questões colocadas ao tribunal, e os argumentos jurídicos invocados pelas partes, profundamente explanados na sentença recorrida, são questões a dirimir não se apresentando como indiscutíveis.

É que, não sendo líquida, por evidente, a resolução de tais questões e tendo - se por assente que no âmbito das providências cautelares, a apreciação do fumus boni iuris obedece a juízo de prognose ou de probabilidade que pressupõe uma cognição perfunctória e sumária da situação de facto e de direito, não podendo, nem devendo, a providência cautelar substituir - se à acção principal, nem comprometer ou antecipar o juízo de fundo que, nesta última, caberá formular ( cfr. Mário Aroso de Almeida in “Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 256 ), que não restem, a nosso ver, quaisquer dúvidas, sobre a não verificação do requisito do disposto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, tal como o decidiu a sentença em recurso.

Pelo que, entendemos não existir qualquer violação pela sentença recorrida do disposto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA.

V – Quanto à imputada violação do disposto na al. b) do nº 1 do art. 120º do CPTA

Considerando, embora, não ser evidente a procedência da pretensão formulada pela Requerente no processo principal, considerou a sentença recorrida que igualmente não era manifesta a falta de fundamento da acção principal, verificando - se o requisito do fumus boni iuris para efeitos da al. b) da citada disposição legal, ou seja, na sua vertente negativa, passando a apreciar do requisito cumulativo do periculum in mora.

E, com fundamento no facto da CI ter, por sua iniciativa, suspendido os trabalhos no prédio em causa em nome da “segurança das pessoas e bens”, o que registou no Livro de Obra em 10.10.2010, entendeu a Mmª Juiz a quo não se verificar risco para a segurança das pessoas e bens, por «não estar demonstrado que se verifique fundado receio da CI prosseguir as obras e dessa forma colocar em risco a segurança do edifício da Requerente», concluindo pela inexistência de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a Requerente, ora recorrente, visa assegurar no processo principal e assim da inexistência do periculum in mora, julgando improcedente a presente providência.

Todavia, assim não se nos afigura.

Com efeito, a iniciativa da suspensão dos trabalhos pela CI, ainda que não demonstrado que a mesma os pretende prosseguir a breve trecho, não confere ao recorrente o benefício que a procedência do processo cautelar permitiria, mas antes a decidida improcedência acaba por permitir a continuação da obra com os inerentes riscos logo que a CI também por iniciativa própria o entenda.

Na verdade o que está em causa é a suspensão da eficácia dos despachos que respectivamente aprovaram o projecto de arquitectura e de deferimento do pedido de licenciamento da ampliação do Hotel em causa, cuja execução (sem a prévia execução do projecto estrutural a que se refere a al. AA) da matéria de facto dada como provada), coloca fundados receios de risco de segurança do edifício da recorrente e para as pessoas e bens e, consequentemente, do fundado receio de uma situação de facto consumado e de produção de prejuízos de difícil ou mesmo impossível reparação.

Sendo que a suspensão dos trabalhos por vontade da própria CI não a obriga de a qualquer momento os poder prosseguir, no caso de não concessão da presente providência.

Assim, ao contrário do decidido na sentença em recurso, entendemos por verificado o requisito do periculum in mora a que se reporta a al. b) do nº 1 do art. 120º do CPTA, disposição esta que a sentença recorrida violou.

V – E, a ser dessa forma decidido haverá, pois, que efectuar a ponderação de interesses a que se reporta o nº 2 do art. 120º do CPTA.

Ora, é lógico que a “segurança do edifício da recorrente e das pessoas e bens” como interesse público que é se sobrepõe aos interesses da CI meramente económicos e ressarcíveis, pelo que não nos restam dúvidas que os danos que poderão resultar da não concessão da providência se mostram superiores ao da sua concessão, pelo que, a nosso ver, deverá a mesma ser concedida.

VI – Relativamente à requerida ampliação do objecto do recurso nos termos do art. 684º do CPC, a título subsidiário, pela Contra -Interessada.

A) Quanto à imputada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Defende a CI, nesta parte recorrente, que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a excepção, por si invocada, da ineptidão da petição inicial que conduz à absolvição da instância, dado verificar - se uma contradição lógica entre o pedido de suspensão de eficácia e a causa de pedir, que consiste na nulidade dos actos suspendendos por impossibilidade legal dos respectivos objectos, motivo pelo qual a decisão é nula.

Acontece porém que a sentença recorrida aquando da apreciação do fumus boni iuris considerou que “(…) donde não se pode concluir que os actos suspendendos têm objecto físico impossível. E também não têm objecto juridicamente impossível pois os mesmos incidiram sobre o prédio identificado em A) dos FA), inscrito a favor da CI. (…) Assim, não se pode concluir que estejamos perante actos cujos efeitos sejam parcialmente, física ou juridicamente impossíveis e portanto que os actos suspendendos sejam nulos.”.

Ao desta forma ter decidido que a sentença em recurso, implicitamente, tenha considerado inexistir a suscitada “contradição” e consequente ineptidão da petição inicial.

Aliás, como bem refere o aqui recorrido, sempre a impugnação de actos nulos é legalmente admissível o que implica que o pedido da suspensão da sua eficácia também o seja.

B) Quanto ao imputado erro de julgamento quanto à verificação do fumus boni iuris para efeitos da al. b) do nº 1 do art. 20º do CPTA.

Entendemos inexistir tal erro pelos fundamentos atrás invocados e os invocados na sentença em recurso, que aqui se dão por reproduzidos, tanto mais que na referida al. b) apenas se exige um fumus non malus iuris.

C) Quanto à requerida prestação de garantia nos termos do art. 120º nº 4 do CPTA.

Conforme referem os Profs. Mário Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos” em anotação ao art. 120º nº 4 «(…) Trata – se de previsão que encontra correspondência no art. 390º nº 2 do CPC, destinando - se tal como aquela, a assegurar aos requeridos o ressarcimento dos prejuízos que possam resultar da adopção de providências que mais tarde se venham a revelar infundadas ou não venham a ter o devido seguimento num processo principal.».

Atentos os factos dados como provados o aqui recorrente tem a obra parada por sua iniciativa, desde 2010, sendo que o deferimento da presente providência apenas vem garantir que o mesmo não a possa prosseguir até decisão da acção principal.

O mesmo recorrente invocou não estar demonstrada a sua intenção de prosseguir a obra até à obtenção de uma solução técnica.

Assim, não se denota nem o recorrente concretiza em que é que a adopção da presente providência possa mais tarde se vir a revelar infundada ou não venha a ter o devido seguimento num processo principal, nem que seja a adopção da presente providência a causar, numa obra já parada por iniciativa própria, o prejuízo monetário que invoca.

Daí que, a nosso ver, não se verifiquem os pressupostos do art. 120º nº 4 do CPTA para a prestação da referida garantia.

VI – Pelo que, em face do exposto e em conclusão emito parecer no sentido de:
- ser dado provimento ao recurso interposto pelo então Requerente da providência, revogando - se a sentença recorrida e substituindo - a por outra que defira a presente providência, suspendendo os actos suspendendos;
- se julgue improcedente a ampliação do recurso requerido pela CI.


Lisboa, 2012 - 09 - 11

A Procuradora Geral Adjunta



( Clara Rodrigues )