Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:10/17/2011
Processo:08096/11
Nº Processo/TAF:00196/09.6BECTB
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:FUNDO GARANTIA SALARIAL.
ARTº 319º Nº 1 DL Nº 35/2004.
DOCUMENTOS CONTRADITÓRIOS.
ÓNUS DA PROVA.
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator


A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos do art. 146º nº1 do CPTA, vem, ao abrigo do disposto no art. 145º nº 5 do CPC, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto, pelos então AA., da sentença proferida, a fls. 311 e segs., pelo TAF de Castelo Branco, que julgou improcedentes os pedidos formulados na presente acção especial.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, o ora recorrente imputa à sentença em recurso erro de interpretação e aplicação do direito, com violação dos arts. 58º e 130 nºs 1 e 4 do CIRE e art. 205º nº 3 da CRP e violação do art. 671º do CPC.

A entidade ora recorrida, contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com relevo para a decisão e com base na prova documental, os factos constantes dos pontos 1 a 16, do ponto II, de fls. 312 a 317, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

III – Desde já se nos afigura que a decisão recorrida é de manter mas pelos motivos que em seguida se expõem.

Em questão está a data da cessação do contrato de trabalho a considerar, nomeadamente, se Janeiro de 2004, como o entendeu o acto impugnado e a sentença recorrida, ou antes 03.01.2005, como defendem os recorrentes, a fim de aferir, face ao disposto no art. 319º nº 1 do DL nº 35/2004 de 29/07, se há ou não lugar ao pagamento pelo R. dos créditos salariais emergentes do mesmo contrato de trabalho aos AA.

Invocam os ora recorrentes, em resumo e no essencial, que a sentença recorrida não considerou o poder de fiscalização do Juiz sobre a actividade do administrador consignado no art. 58º do Cód. de Insolvência e Recuperação de Empresas e o de controlar e verificar a natureza e o montante dos créditos reclamados nos termos do nºs 1 e 3 do art. 130º do mesmo Código, desrespeitando a sentença de graduação e reconhecimento de créditos proferida na acção de insolvência.

Por outro lado, afirma verificar - se contradição entre a matéria factual assente e a fundamentação para a decisão recorrida.

Vejamos:

Quer dos documentos juntos aos autos, quer do proc. instrutor não consta qualquer sentença de graduação de créditos proferida no proc. de insolvência, mas sim a sentença que declarou insolvente a empresa A…, (fls. 126 e segs. dos autos), sendo que dela não consta a definição concreta da data de cessação dos contratos de trabalho, o mesmo acontecendo relativamente à sentença que julgou improcedente a recuperação da mesma empresa (fls. 113 e segs. dos autos), uma lista dos créditos reclamados (fls. 132 e segs. dos autos), o mapa de rateio parcial efectuado pelo administrador da insolvência (fls. 123 e segs. do proc instrutor), o mapa de rateio final enviado pelo Sindicato ( fls. 161 do proc. instrutor).

Motivo por que a sentença recorrida não podia sequer considerar e respeitar qualquer sentença de graduação de créditos, sendo que os mapas atrás referidos nem sequer apontam para quaisquer datas do vencimento dos créditos.

Assim, que não tenha havido qualquer violação pela sentença recorrida dos arts. 58º e 130º do CIRE

Por outro lado, o teor dos documentos juntos, quanto à data da cessação do contrato de trabalho, são contraditórios entre si.

Com efeito do doc. referido no ponto 1 da matéria de facto assente consta a data de Janeiro de 2004 como “suspensão do contrato de trabalho”, mas nos documentos referidos no ponto 2 da matéria de facto assente, respeitante à Declaração de Situação de Desemprego, da entidade patronal, para efeito de subsídio de desemprego dos AA., consta a data também de Janeiro de 2004 como a de “cessação do contrato de trabalho”. Por sua vez, das cartas referidas no ponto 3 da matéria assente resulta que os contratos estariam suspensos e dos do ponto 4 que a rescisão do contrato teria ocorrido em 03.01.2005. Todavia, logo no ponto 1 do doc. fls. 47 diz - se que o ali reclamante e aqui A. trabalhou para a insolvente desde 26/02/1972 e até 19/01/2004 e naquela reclamação bem como nas restantes dos outros ora AA. que no dia 03/01/2005 a “administração da insolvente comunicou aos trabalhadores o encerramento da empresa, considerando - se assim aqueles mesmos AA. despedidos e não voltaram ao serviço porque a fabrica encerrou”, o que contraria os documentos do ponto 4 da matéria factual assente, dos quais resulta teriam sido os AA. a rescindirem o contrato na referida data de 03/01/2005.

Ora, estando - se perante factos constitutivos do direito dos AA., ora recorrentes, não há dúvidas de que era sobre eles que recaía o ónus da prova dos mesmos – cfr. art. 342º nº 1 do C. Civil.

E, sendo que força probatória dos documentos referidos nos factos assentes não foi ilidida com base na sua falsidade, fazendo por isso prova dos factos que neles são atestados (cfr. arts. 371º nº 1 e 372º nº 1, ambos do C. Civil), não se pode dar prevalência a uns sobre os outros.

Daí, haveria que considerar contraditório e insusceptível de compatibilização, o conteúdo daqueles documentos e, em consequência, teria de se entender que os AA. não conseguiram provar, como lhes competia (cfr. nº 1 do art. 342º do C. Civil) que a cessação do contrato de trabalho ocorreu dentro da data a que se reporta o disposto no art. 319º nº 1 do DL nº 35/2004, o que tem como consequência a improcedência da acção.

Assim, que a decisão de improcedência da acção não seja contraditória com os factos dados como provados, embora com os fundamentos constantes deste parecer.

IV – Pelo que, em face do exposto e em conclusão emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo - se a decisão recorrida, mas com os fundamentos exarados neste parecer.