Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:06/18/2014
Processo:11234/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:INDEMNIZAÇÃO POR RESPONSABILIDADE CONTRATUAL.
ACÇÃO CONTRA O ESTADO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO FUNCIONÁRIO.
SANAÇÃO OFICIOSA DAS EXCEPÇÕES.
PROPOSITURA DE NOVA ACÇÃO.
Texto Integral:Procº nº 11234/14

2º Juízo-1ª Secção

Acção sobre responsabilidade contratual

Parecer do MP

Vem o presente recurso jurisdicional interposto pelo autor, tenente /piloto da Força Aérea Portuguesa, da sentença que considerou os demandados, Ministério da Defesa Nacional e Força Aérea Portuguesa, sem personalidade judiciária que lhes permitisse intervir nesta acção, considerando, ainda, o demandado Chefe do EMFA, parte ilegítima, decidindo absolve-los da instância.

Não concordou o ora recorrente, essencialmente porque considera que os dois primeiros demandados detêm personalidade judiciária, nos termos do artº 10º, nº1 e 11º, nº2, ambos do CPTA, uma vez que a presente acção administrativa comum visa o reconhecimento do direito à resolução contrato, decorrente de despachos da autoria do terceiro demandado que considera ilegais e não só a efectivação de responsabilidade contratual e extracontratual. De todo o modo, considera que a falta de personalidade judiciária poderia ter sido corrigida pelo julgador, ao abrigo do artº 6º do NCPC.

Vejamos se tem razão:

O recorrente solicita, nesta acção, que seja reconhecido o seu direito à resolução do contrato, por incumprimento contratual dos RR e, em consequência, que os mesmos sejam condenados a pagarem-lhe as indemnizações discriminadas nas alíneas b) a f) da petição, mais juros legais ( alínea i), as despesas decorrentes da instauração deste processo ( alínea g)), sendo a obrigação do terceiro R solidária, nos termos do nº1 do artº 8º da Lei nº 67/2007, de 31-12 ( alínea h).

Os pedidos têm como fundamento, o alegado incumprimento das obrigações contratuais e legais da FAP, desde 2-7-12, por violação do dever de ocupação efectiva por parte desta entidade e ao seu inconformismo face à tentativa desta entidade de o colocar a exercer outras funções fora do âmbito das funções para que fora contratado. Ou seja, segundo refere, que em vez de exercer funções de piloto aviador, ficou a exercer funções de técnico de operações numa esquadra de voo e outras estranhas às de piloto, cuja complexidade e responsabilidade não são equiparáveis às da sua categoria e funções.

Esta alegada alteração das circunstâncias, veio na sequência do despacho nº 40/2012, de 11-9-2012, do CEMFA que determinou a redução do exercício das funções de piloto do mínimo de seis anos exigível pelo despacho nº72/2008 de 13-11, para o mínimo de três anos, possibilitando a cessação imediata e antecipada dos contratos para os pilotos que tivessem mais de três horas de voo, sem obrigatoriedade de procederem ao pagamento da indemnização ao Estado, anteriormente estipulada para os casos de antecipação do período mínimo do contrato, decorrente das despesas sofridas por aquele com a formação dos pilotos .

Daqui decorre que estamos, claramente, perante uma acção sobre responsabilidade contratual, muito embora se nos afigure que o efeito pretendido poderia ser conseguido com a impugnação atempada do citado despacho o que, para além do mais, evitaria os agora invocados prejuízos decorrentes da inércia do autor na impugnação do mesmo, o que sempre irá implicar a sua responsabilização para eventuais efeitos indemnizatórios ( artºs 37º e 38º do CPTA).

Assim, sendo a relação entre o autor e o Estado, titulada por um contrato, e tendo que ser apreciado o alegado incumprimento do contrato, é a acção administrativa comum a forma de processo adequada, nos termos da alínea h) do nº2 do artº 37º do CPTA e não da sua alínea a), a qual faz decorrer o direito de um acto ou norma administrativa e não de um contrato.

Assim sendo, só o Estado tem legitimidade para figurar na acção como parte demandada, sendo a sua representação atribuída ao MP, nos termos da primeira parte do nº2 do artº 11º do CPTA.

Bem andou, pois, a douta sentença recorrida ao considerar os dois primeiros demandados sem personalidade judiciária.


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Quanto ao terceiro demandado, afigura-se-nos que também decidiu bem a douta sentença recorrida, uma vez que o autor não invocou factos que demonstrassem a sua actuação com dolo ou com negligência grave, conforme vem exigido pelo nº1 do artº 8º da Lei nº 67/2007.

De facto, tal como se refere na anotação 4. ao citado artº 8º, em “Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas” de Carlos Alberto Fernandes Cadilha,” O demandado não poderá deixar, no entanto, de alegar os factos que demonstram a existência de negligência grave e justificam a intervenção processual do servidor, quando a obrigação seja exigida apenas a este ou a ambos os devedores, sob pena de possível invocação de ilegitimidade passiva do funcionário, por ausência de interesse em contradizer ( ver nota 2 ao artigo 6º)”.


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Mas ainda que assim não fosse, o prosseguimento da acção contra o CEMFA, só terá sentido se se considerar que o julgador poderá, ao abrigo do artº 6º do NCPC, ou nos termos do nº2, do artº 265º, do ACPC, chamar a juízo o Estado como pretende o recorrente, dado que a responsabilidade do CEMFA é solidária com a do Estado e, como tal, deverão intervir ambos na acção .

Nos termos dos citados dispositivos legais “o juiz providenciará, mesmo oficiosamente, pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação… “

Porém, afigura-se-nos que, no caso vertente, a falta de personalidade judiciária não é sanável, uma vez que não se tratou de um erro do recorrente na identificação da entidade demandada, mas de um entendimento estrutural, consubstanciado em razões de natureza jurídica que, aliás, continuam a ser defendidas pelo recorrente, em sede deste recurso ( cfr, tb, resposta do recorrente às excepções aduzidas pelos RR) .

No entanto, uma vez que as acções sobre contractos podem ser instauradas a todo o tempo, nada impede o autor de propor nova acção, corrigindo, se assim o entender, as partes processuais que figuram como agentes passivos, dado que a acção sempre teria que ser contestada pelo MP em representação do Estado, não sendo aproveitáveis os trâmites processuais da presente acção.

Termos em que, consideramos que a douta sentença recorrida se deverá manter, assim se negando provimento ao presente recurso jurisdicional.


A Procuradora- Geral Adjunta

Maria Antónia Soares