Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:Administrativo
Data:11/22/2011
Processo:08255/11
Nº Processo/TAF:01041/11.8BELSB
Sub-Secção:2º. Juízo
Magistrado:Clara Rodrigues
Descritores:PROV. CAUT. SUSPENSÃO EFICÁCIA.
NULIDADE DA SENTENÇA (NÃO).
AL. A) Nº 1 ART. 120º CPTA.
"PERICULUM IN MORA" - AL. B) Nº 1 ART. 120º CPTA.
INADMISSIBILIDADE RÉPLICA.
Data do Acordão:02/09/2012
Texto Integral:Venerando Juiz Desembargador Relator


A Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificada nos termos e para efeitos dos artºs 146º nº1 e 147º do CPTA, vem emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:

I – O presente recurso vem interposto pela então Requerente, da sentença de fls. 279 e segs., do TAC de Lisboa, que indeferiu a presente providência cautelar de suspensão de eficácia do Despacho do Presidente do IRN – Instituto dos Registos e do Notariado, IP, de 21.02.2011 que determinou a não renovação da sua comissão de serviço no cargo de coordenadora do Sector de Administração de Recursos Humanos, e que fossem desencadeadas as diligências necessárias à abertura do correspondente procedimento concursal de recrutamento.

Nas conclusões das suas alegações de recurso, a recorrente imputa à sentença recorrida a nulidade das als. b) e d) do nº 1 do art. 668º do CPC e violação dos arts. 95º nº 2, 120º nºs 1 als. a), b) e nº2 e art. 128º todos do CPTA, requerendo ainda a admissão do requerimento resposta à oposição oferecida, revogando - se o despacho preliminar à sentença que considerou aquele articulado como não escrito.

A Entidade, ora recorrida, contra - alegou pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

II – Na sentença em recurso foram dados como provados, com interesse para a decisão e com fundamento na prova documental, os factos constantes das alíneas A) a E), sob o título “OS FACTOS”, de fls. 285 a 291, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

III – Quanto à imputada nulidade da al. b) do nº 1 do art. 668º do CPC.

Invoca a recorrente existir tal nulidade por entender que a matéria de facto dada como provada omite factos relevantes à boa decisão da causa, designadamente a matéria factual subjacente aos arts. 63º a 83º do requerimento inicial, os quais considera provados e evidenciados nos autos, seja documentalmente através do processo instrutor, seja por admissão expressa da recorrida nos arts. 75º a 86º da oposição e que permitem concluir e dar como assente que a formalidade de audição prévia não foi efectuada.

Como é consabido «só a falta absoluta de fundamentação é razão de nulidade da sentença, pois uma exposição medíocre ou insuficiente dos fundamentos, permitindo descortinar as razões que a ditaram, sujeita a decisão à possibilidade de ser revogada ou alterada em recurso» (cfr. Acs. do STA de 27/5/98 Rec. nº. 37068, de 16/6/99 Rec nº. 44915 e de 6/6/89 in BMJ 388º. 580).

Ora, no caso em apreço, a sentença recorrida, não padece da referida nulidade já que não existe uma falta absoluta de fundamentação.

Aliás, mesmo que houvesse lugar a considerar provado um ou outro facto não constante da matéria factual assente, sempre tal aditamento poderia ter lugar nesta instância ao abrigo do art. 712º do CPC, por isso, não implicando a nulidade da sentença.

Todavia, a nosso ver, nem sequer há lugar a qualquer aditamento.

Com efeito, os arts. 63º a 83º do r.i. respeitam à não audição prévia da Requerente invocando matéria de direito na defesa da necessidade legal de tal audição e assim da preterição duma formalidade essencial, enquanto que os arts. 75º a 86º da oposição do Requerido impugnam essa mesma necessidade de audição prévia, no caso em apreço, invocando da mesma forma matéria de direito em defesa da sua posição.

Tratando - se, pois de matéria duvidosa e discutível, face à Lei nº 2/2004 de 15/01, com as alterações da Lei nº 51/2005 de 30/08, considerar - se provado que a requerente não foi ouvida em audiência prévia, nada traz de interesse para efeitos da decisão sobre a manifesta evidência da procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal.

Por outro lado, retira - se da matéria de facto dada como provada que a Requerente não foi ouvida em audiência prévia, facto que o Requerido não nega, o que, no caso em apreço, não releva, pois, estando- - se no âmbito de uma Providência Cautelar, o que não é manifestamente evidente é se a mesma audiência era formal e legalmente essencial.

Assim, que a sentença recorrida não enferme da imputada nulidade.

IV – Quanto à imputada nulidade da sentença por omissão de pronúncia da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC.

Fundamenta a recorrente tal nulidade por, segundo ela, a sentença recorrida não ter apreciado e conhecido, pelo menos indiciariamente, as causas invocadas de invalidade do acto suspendendo.

É jurisprudência corrente que: «A nulidade de omissão de pronúncia estabelecida na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, verifica-se quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar, devendo apreciar as questões que lhe foram submetidas que se não encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (artigo 660.º, n.º 2 do mesmo diploma).
Por questões deve entender-se as matérias respeitantes ao pedido, à causa de pedir ou aos pressupostos processuais, e não os argumentos ou razões invocadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista» – cfr., entre muitos outros, Acórdão STA de 13/05/03, Rec. nº 02047/02 (bold nosso).

Ora, na sentença recorrida, o Mmº juiz a quo – após analisar conceptualmente o disposto nas als. a), b) e c) do nº 1 e no nº 2 do art. 120º do CPTA – concluiu:
«No caso subjudice, as questões relativas ao mérito são discutíveis, obrigando a uma análise aprofundada que não cabe no juízo sumário que importa formular no âmbito dos processos cautelares, donde a medida cautelar requerida não pode ser decretada nos termos da al. a), do nº 1, do art. 120º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, como pretende a Requerente, ficando, assim, a sua adopção dependente desde logo, da existência de periculum in mora, pressuposto de concessão de quaisquer medidas cautelares, independentemente da sua natureza 8cfr. artigo 120º, nº 1, alíneas b) e c) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos».

Quer dizer, a Mmº Juiz a quo, numa apreciação perfunctória das questões invocadas pelo ora recorrente, considerou que se estava perante matéria controversa, discutível, que não se compadecia com uma análise perfunctória e sumária característica das providências cautelares.

Com efeito, na providência cautelar a apreciação do fumus boni iuris obedece a juízo de prognose ou de probabilidade que pressupõe uma cognição sumária da situação de facto e de direito, não podendo, nem devendo, a providência cautelar substituir - se à acção principal, nem comprometer ou antecipar o juízo de fundo que, nesta última, caberá formular (cfr. Mário Aroso de Almeida in “Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 256).

Ora, tal como se afirma no Ac. STA de 22/10/08, Rec. 0396/08 « As situações a enquadrar no artº 120º, nº 1, a) do CPTA, designadamente no conceito de acto manifestamente ilegal, não devem oferecer quaisquer dúvidas quanto a essa ilegalidade que, assim, deve poder ser facilmente detectada, face aos elementos constantes do processo e pela simples leitura e interpretação elementar da lei aplicável, sem necessidade de outras averiguações ou ponderações. Na verdade, o que é manifesto, é líquido, salta à vista, não oferece dúvida.».

Daí que, no caso em apreço, a Mmª Juiz a quo não tivesse de analisar em concreto da existência ou não de cada um dos vícios assacados ao acto suspendendo, pois, tratando - se de questões controversas e discutíveis, face aos argumentos aduzidos pelas partes, a necessitar de demonstração e de ponderação aprofundada de direito, a sua apreciação e resolução deverá ter lugar na acção principal.

Assim, que improceda a alegada nulidade por omissão de pronúncia.

V – Quanto à imputada violação do art. 120º nºs 1 al. a) do CPTA.

Como o temos consignado noutros pareceres, desde já importa referir que além da instrumentalidade são características das providências cautelares a provisoriedade que se manifesta no facto de que “ não está em causa a resolução definitiva de um litígio “ e a sumaridadeque se manifesta numa cognição sumária da situação de facto e de direito, própria de um processo urgente “ – José Carlos Vieira de Andrade in “ A Justiça Administrativa, 4ª edição.

Assim, que relativamente à apreciação pelo Tribunal do “ fumus boni iuris “ o juiz se tenha de conter numa “ apreciação perfunctória da aparência do bom direito “, não podendo a providência cautelar antecipar, a título definitivo a decisão a proferir no processo principal – cfr. Mário Aroso de Almeida in “ O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos “.

Com efeito, as decisões em matéria de providências cautelares estando limitadas à verificação ou inverificação dos requisitos necessários para o decretamento das providências requeridas, não devem incidir sobre o mérito da causa.

Ora, os vícios de forma imputados, de falta de fundamentação e de audiência prévia, no caso em apreço, face ao teor do despacho suspendendo e à Lei nº 2/2004 de 15/01, com as alterações da Lei nº 51/2005 de 30/08, à impugnação feita pela recorrida, bem como face ao disposto no art. 100º do CPA e quanto a este também ao alegado pela recorrida sobre não ter havido instrução, são questões controversas, a dirimir na acção principal, não se compadecendo com uma apreciação sumária de que resulte a sua evidência.

Pelo que ao decidir pela não verificação do disposto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, a sentença em recurso não nos merece censura.

VI – Quanto à imputada violação da al. b) do nº 1 do art.120º do CPTA.

Considerou a Mmª Juiz a quo que a Requerente não alegou quaisquer factos concretos que permitam avaliar os prejuízos que invoca “sendo certo que não está em causa o invocado direito à progressão na carreira (…) salvaguardado no art. 28º do Estatuto do Pessoal Dirigente (…), podendo a requerente, também candidatar - se ao concurso para recrutamento de titular para o cargo de coordenador do Sector de Administração de Recursos Humanos do IRN,IP., no qual se mantém, no exercício de funções em gestão corrente, até ao provimento de novo titular no cargo nos termos da lei.”, após o que considerou não verificado o requisito do periculum in mora.

E, em nosso entender, tal decisão não merece censura.

Com efeito, no seu r.i., como agora no presente recurso, a Requerente apenas invocou, em termos de prejuízo e mesmo de facto consumado, o “direito á sua progressão na carreira respectiva, direito que integra, materialmente, o direito à liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública”, o que “afecta psicologicamente a Requerente, trazendo - lhe um sentimento de tristeza e depressão, assim como grande desmotivação com a sua vida, que perde grande parte do seu sentido na impossibilidade de prosseguir, com a oportunidade devida, a sua carreira.”

Ora, como resulta do r.i., a ora recorrente é Técnica Superior, de nível 39 e posição remuneratória 8, do IRN, estando a exercer funções de Coordenadora do Sector de Administração de Recursos Humanos do IRN, em comissão de serviço, para o qual foi provida em 22 de Abril de 2008, pelo período de três anos (cfr. al. A) dos factos provados).

Daí, como refere a sentença recorrida, o direito à progressão na carreira da Requerente é salvaguardada pelos arts. 28º, 29º e 30º da Lei 2/2004, com as alterações sucessivas, sendo certo que o acesso ao cargo que ora ocupa em comissão de serviço apenas pode ter lugar por via de concurso, a que a requerente não fica impedida de concorrer se reunir as condições para tal.

O certo é que a Requerente, não podia, por via da sua comissão de serviço, progredir automaticamente para titular do cargo dirigente que está a desempenhar (o que parece pretender), a não ser por concurso de acordo com a citada Lei.

Por outro lado, a Requerente, ora recorrente, sabia que a sua comissão de serviço, findos os três anos, podia ou não ser renovada, pelo que sempre as suas expectativas de permanecer no cargo tinham de ser limitadas, além de que a proceder a acção principal sempre a reintegração da situação que existiria poderá ter lugar.

Pelo que a afectação psicológica de que a Requerente diz sofrer não possa ser aferida em termos de nexo causal pela impossibilidade da sua progressão na carreira, que como vimos é possível.

Não tendo invocado outros “prejuízos”, nem se verificando forte receio de uma situação de facto consumado que não se verifique o requisito do periculum in mora, tal como, a nosso ver, bem decidiu a sentença em recurso.

Consequentemente, que se torne desnecessário averiguar do fumus boni iuris para efeitos da al. b), bem como da ponderação de interesses do nº 2 do art. 120º do CPTA.

VII – Quanto à violação do art. 128º do CPTA pela sentença recorrida.

Não obstante o Tribunal recorrido, ter considerado prejudicado o conhecimento dos requerimentos formulados pela Requerente quanto à Resolução Fundamentada não deixou de afirmar que os motivos invocados na referida Resolução justificavam a execução imediata do acto suspendendo, no que a recorrente discorda.

Todavia, face ao acórdão a proferir neste Tribunal ad quem, seja no sentido do provimento ou improvimento do presente recurso interposto, sempre o conhecimento de tal questão se mostrará prejudicado por inutilidade ou impossibilidade superveniente.

VIII – Quanto ao recurso interposto do despacho proferido imediatamente antes da sentença.

Em tal despacho foi decidido considerar como não escrita a resposta à defesa apresentada pelo Requerido na sua oposição, pelos motivos nele exarados para os quais remetemos por economia expositiva e por deles concordarmos.

Efectivamente, ao contrário do alegado pela recorrente, na oposição que apresentou, a requerida não deduziu qualquer excepção limitando - - se a impugnar os vícios imputados ao acto suspendendo, invocando, para o efeito, que a não renovação da comissão de serviço nos termos em que foi proferida não obriga à realização da audiência de interessados, por ter cessado, de acordo com o art. 25º nº 1 al. a) da Lei 2/2004 e que o dirigente máximo do serviço não tem qualquer obrigação legal de apreciação do desempenho e resultados obtidos do dirigente cessante, uma vez findos os três anos da comissão de serviço.

O que, como é obvio, não constitui matéria de excepção.

E, preceituando o artigo 118º nº 3 do CPTA que o processo é concluso ao juiz, logo que juntas as contestações ou decorrido o respectivo prazo, que não possa ser admitida réplica na Providência Cautelar, se não foi deduzida nenhuma excepção pelo requerido, o que é o caso.

IX – Assim, em face de todo o exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento a ambos os recursos, mantendo - se, respectivamente a sentença e despacho recorridos.