Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:02/19/2015
Processo:11886/15
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:ENSINO SUPERIOR POLITÉCNICO.
ASSISTENTES E EQUIPARADOS A ASSISTENTES.
AQUISIÇÃO DO GRAU DE DOUTOR.
TRANSIÇÃO PARA A CATEGORIA DE PROFESSOR ADJUNTO.
PROIBIÇÃO DE VALORIZAÇÃO REMUNERATÓRIA.
Texto Integral:Procº nº 11886/15

2º Juízo-1ª Secção

Acção Administrativa Comum

Parecer do MP

Vem o presente recurso jurisdicional interposto pelo autor, Sindicato Nacional do Ensino Superior, em defesa dos direitos e interesses colectivos dos seus associados, docentes do Ensino Superior Politécnico, da sentença que absolveu da instância a entidade demandada, Instituto Politécnico ....

A nosso ver, o recurso não merece provimento, pelas razões que se irão explanar.

Está em causa nesta acção um pedido de reconhecimento do direito dos docentes, associados do autor, com a categoria de assistentes e equiparados a assistentes, vinculados contratualmente à entidade demandada, a transitarem para a categoria de professor adjunto, por via da aquisição em 2012, do grau de doutor, desde que verificados os demais requisitos previstos no DL nº 207/2009, de 31-8, na redacção da Lei nº 7/2010, de 13-5, bem como à percepção da remuneração mensal devida a por tais categorias, considerando-se inaplicável, a estes casos, o disposto no artº 20º nºs 6 e 7 da Lei nº64-B/2011, de 30-12( LOE para 2012), a qual manteve a proibição de valorização salarial já estabelecida no nº1 do artº 24º da Lei n.º55-A/2010 (L.O.E./2011).

Pede, ainda, o ora recorrente, que o tribunal “declare nulos e de nenhum efeito quaisquer contratos entretanto celebrados por associados do autor que tenham transitado para a categoria de professor adjunto em virtude do regime transitório na parte em que se tenha clausulado a manutenção da retribuição da categoria de assistente ou equiparado a assistente do ensino superior politécnico”.

A sentença recorrida decidiu, nomeadamente, o seguinte:

- Ser de reconhecer aos associados do recorrente, vinculados contratualmente à entidade recorrida, o direito de transitarem para a categoria de professor adjunto, por via da aquisição, em 2012, do grau de doutor, desde que verificados os demais requisitos previstos no DL nº 207/2009, de 31-8, na redacção da Lei nº 7/2010, de 13-5;

- Ser de julgar improcedente o pedido de declaração de nulidade e de nenhum efeito os contratos entretanto celebrados:

- Não ser de reconhecer o direito à percepção da remuneração mensal devida às referidas categorias, considerando-se aplicável, a estes casos, nomeadamente, o disposto no artº 20º nºs 6, 7 e 8 da Lei nº64-B/2011, de 30-12 ( LOE para 2012).

Ora, vindo o presente recurso jurisdicional interposto, apenas, da última parte decisória, será esta que importa analisar.

Vejamos, pois.

De acordo com o artigo 24ºnº1 da Lei n.º55-A/2010 (L.O.E./2011), é vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias, sob pena de nulidade desses atos e de responsabilidade civil, financeira e disciplinar. Este artigo quer dizer simplesmente que, em 2011, eram proibidas, pela L.O.E./2011, quaisquer valorizações remuneratórias no sector público. A proibição de valorização remuneratória apenas deixou de ter lugar em 2013 com a entrada em vigor da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (artigo 35.º).

Mas a Lei nº 64-B/2011, de 31-12, que estabeleceu o AO para 2012 e aplicável ao caso dos autos, manteve ainda a proibição das valorizações remuneratórias ao remeter, no nº1 do artº 20º, para o artº 19º e 24º da LOE 2011, bem como ao estabelecer nos nºs 6,7 e 8 do mesmo artigo, o seguinte:

6 — O disposto no artigo 24.º da Lei n.º 55 -A/2010, de 31 de Dezembro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 26 de Agosto, e 60 -A/2011, de 30 de Novembro, não é impeditivo da prática dos actos necessários à obtenção de determinados graus ou títulos ou da realização da formação específica que sejam exigidos, durante a vigência do presente artigo, pela regulamentação específica das carreiras.

7 — Quando a prática dos actos e ou a aquisição das habilitações ou da formação referidas no número anterior implicar, nos termos das disposições legais aplicáveis, alteração da remuneração devida ao trabalhador, esta alteração fica suspensa durante a vigência do presente artigo.

8 — As alterações da remuneração a que se refere o número anterior que venham a ocorrer após a cessação de vigência do presente artigo não podem produzir efeitos reportados a data anterior àquela cessação.

Destes normativos decorre, cremos que com suficiente clareza, a solução para a questão vertida nos autos ou seja:

1.Que a transição para a categoria de professor adjunto é possível;

2.Que essa transição não implica o auferimento de um vencimento superior ao auferido na anterior categoria, por força da proibição e suspensão estabelecidas nos nºs1 e 7do artº 20º;

3.Que após a cessação da proibição e suspensão, não há lugar á reposição dos vencimentos perdidos.

Nestes termos, não se vê, salvo o devido respeito, que interpretação poderia conduzir a uma posição diversa da adoptada na douta sentença recorrida.

Considera, porém, o recorrente, ao invés do que se expos, que uma vez reconhecido o direito à referida transição de assistentes ou equiparados a assistentes, para a categoria de professores adjuntos, têm os seus associados direito à respectiva remuneração, atento o regime remuneratório consagrado no DL nº 408/89, de 18-11 e atento o princípio da igualdade de tratamento de todos os docentes nestas condições, pela aquisição do grau de doutor no ano de 2011 e desde que verificados os demais requisitos exigidos pelo regime previsto no ECDU anterior.

No entanto, tal como decidiu a sentença recorrida, não se encontra violado o princípio da igualdade previsto no artº 13º e artº 59º nº1 alínea a) da CRP, pois a proibição de evolução remuneratória em causa é temporária, logo lícita, porque constante de Lei de Orçamento de Estado, intrinsecamente anual, remetendo a justificação deste entendimento para as decisões do Tribunal Constitucional contidas nos Acórdãos nº 396/2011, nº 613/2011 e nº 317/2013.

Invocando, ainda, os mesmos acórdãos, entendeu a sentença recorrida que a referida proibição de valorização salarial não sofre de inconstitucionalidade formal por não terem sido ouvidas as associações representativas de trabalhadores. E ainda que os nºs 6,7 e 8 do artº 20º da LOE 2012 se aplicam aos associados do recorrente e não são inconstitucionais por violação do artº 59º da CRP.

Estamos totalmente de acordo com esta argumentação.

Antes do mais, atenta a enumeração do pessoal a que se refere o nº9, do artº 19º, da LOE/2011, aplicável ao caso por força do nº1, do artº 20º, da LOE/2012 - onde estão incluídas entidades que não dependem directamente de empregadores e não são funcionários públicos strito sensu-não nos parece que o grau académico de doutor implique uma diferenciação relevante para o caso, entre o sistema educativo nacional e a carreira docente universitária, implicando a sua exclusão da LOE, como defende o recorrente.

De facto, para além de serem temporárias, as normas do nº1 do artº 24º da Lei n.º55-A/2010 (L.O.E./2011) e do nº1 do artº 20º da Lei nº 64-B/2011, são aplicáveis a entidades públicas, a todos os funcionários públicos e funcionários de carreiras especiais e também aos docentes do ensino superior.

De facto a primeira norma, para a qual a segunda remete estipula que “É vedada a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 19.º”

Ora, o citado nº9 do artº 19º refere e elenca os seguintes funcionários e titulares de cargos públicos:

9 - O disposto no presente artigo é aplicável aos titulares dos cargos e demais pessoal de seguida identificado:

a) O Presidente da República;

b) O Presidente da Assembleia da República;

c) O Primeiro-Ministro;

d) Os Deputados à Assembleia da República;

e) Os membros do Governo;

f) Os juízes do Tribunal Constitucional e juízes do Tribunal de Contas, o Procurador-Geral da República, bem como os magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público e juízes da jurisdição administrativa e fiscal e dos julgados de paz;

g) Os Representantes da República para as regiões autónomas;

h) Os deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas;

i) Os membros dos governos regionais;

j) Os governadores e vice-governadores civis;

l) Os eleitos locais;

m) Os titulares dos demais órgãos constitucionais não referidos nas alíneas anteriores, bem como os membros dos órgãos dirigentes de entidades administrativas independentes, nomeadamente as que funcionam junto da Assembleia da República;

n) Os membros e os trabalhadores dos gabinetes, dos órgãos de gestão e de gabinetes de apoio, dos titulares dos cargos e órgãos das alíneas anteriores, do Presidente e Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, do Presidente e Vice-Presidente do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, do Presidente e juízes do Tribunal Constitucional, do Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, do Presidente do Tribunal de Contas, do Provedor de Justiça e do Procurador-Geral da República;

o) Os militares das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana, incluindo os juízes militares e os militares que integram a assessoria militar ao Ministério Público, bem como outras forças militarizadas;

p) O pessoal dirigente dos serviços da Presidência da República e da Assembleia da República, e de outros serviços de apoio a órgãos constitucionais, dos demais serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, bem como o pessoal em exercício de funções equiparadas para efeitos remuneratórios;

q) Os gestores públicos, ou equiparados, os membros dos órgãos executivos, deliberativos, consultivos, de fiscalização ou quaisquer outros órgãos estatutários dos institutos públicos de regime geral e especial, de pessoas colectivas de direito público dotadas de independência decorrente da sua integração nas áreas de regulação, supervisão ou controlo, das empresas públicas de capital exclusiva ou maioritariamente público, das entidades públicas empresariais e das entidades que integram o sector empresarial regional e municipal, das fundações públicas e de quaisquer outras entidades públicas;

r) Os trabalhadores que exercem funções públicas na Presidência da República, na Assembleia da República, em outros órgãos constitucionais, bem como os que exercem funções públicas, em qualquer modalidade de relação jurídica de emprego público, nos termos do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 2.º e nos n.os 1, 2 e 4 do artigo 3.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pelas Leis n.os 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e 3-B/2010, de 28 de Abril, incluindo os trabalhadores em mobilidade especial e em licença extraordinária;

s) Os trabalhadores dos institutos públicos de regime especial e de pessoas olectivas de direito público dotadas de independência decorrente da sua integração nas áreas de regulação, supervisão ou controlo;

t) Os trabalhadores das empresas públicas de capital exclusiva ou maioritariamente público, das entidades públicas empresariais e das entidades que integram o sector empresarial regional e municipal, com as adaptações autorizadas e justificadas pela sua natureza empresarial;

u) Os trabalhadores e dirigentes das fundações públicas e dos estabelecimentos públicos não abrangidos pelas alíneas anteriores;

v) O pessoal nas situações de reserva, pré-aposentação e disponibilidade, fora de efectividade de serviço, que beneficie de prestações pecuniárias indexadas aos vencimentos do pessoal no activo.

Assim, afigura-se-nos que a igualdade de tratamento tem de ser aferida em relação a todo o pessoal a quem é aplicável a proibição em causa onde se inclui o pessoal docente ( cfr, em especial, as alíneas u), r) e k)) e não entre os docentes de um determinado organismo de ensino, como pretende o recorrente.

Por outro lado, consideramos que a norma em causa não detém qualquer conteúdo que se prenda com a legislação do trabalho, antes se refere à execução orçamental relativa à despesa com o pessoal. De facto não visa regular, com carácter de permanência, qualquer aspecto da estrutura vinculativa das relações laborais ou de emprego público, constituindo, antes, uma providência avulsa, de alcance temporal limitado, ditado por razões de urgente necessidade de diminuição do desequilíbrio orçamental (acórdão do TC n 396/2011).

Nestes termos, afigura-se -nos que a violação do princípio da igualdade ocorreria, sim, se o legislador optasse por dar um tratamento diferenciado a uma das categorias de pessoal elencadas no citado nº9, do artº 19º, da LOE/2011, permitindo –lhe uma valorização salarial que está totalmente vedada a todas as restantes categorias, as quais ainda hoje - com excepção precisamente dos docentes do ensino superior… - vêm o montante inerente á sua progressão na carreira, congelado.

Também não tem sentido defender-se a violação do regime remuneratório consagrado no DL nº 408/89, como defende o recorrente, atenta a natureza excepcional da norma suspensiva dessa aplicabilidade, bem como as razões economicistas, bem conhecidas, da mesma.

E, finalmente, o nº12 do artº 24º da Lei nº 55-A/2010, se se considerar eventualmente aplicável aos associados do recorrente, deixou de vigorar em 2012, por o OA para este ano, não prever norma semelhante.

Improcedem, assim, a nosso ver, os argumentos explanados pelo recorrente, motivo pelo qual emitimos parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.


A Procuradora-Geral Adjunta

Maria Antónia Soares