Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02484/08
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:02/17/2009
Relator:LUCAS MARTINS
Descritores:IMPUGNAÇÃO
IRC
JUNÇÃO DE DOCUMENTOS; SUA OPORTUNIDADE.
MÉTODOS INDIRECTOS; SEUS PRESSUPOSTOS.
TRIBUTAÇÃO PELO LUCRO REAL
Sumário:1.Em sede de recurso jurisdicional é possível, às partes, juntarem documentos para prova dos fundamentos da acção ou da defesa até aos vistos dos adjuntos.
2. É de admitir, sem qualquer cominação, a junção de documentos, pela recorrente, com a apresentação das respectivas alegações de recurso, se o mesmo é relevante à decisão de mérito a proferir e a respectiva obtenção apenas foi possível depois da sua última intervenção processual anterior à decisão final.
3. Em caso de recurso legitimado, por parte AFiscal, a metodologia alternativa ao regime regra (sistema declarativo) para apuramento da matéria colectável, a utilização de métodos indirectos tem como pressuposto a inviabilidade de alcance daquele desiderato através de correcções técnicas, cabendo-lhe o respectivo ónus probatório.
4.A circunstância da utilização de métodos indirectos implicar o abdicar de um grau de equivalente certeza entre o resultado alcançado e o efectivamente obtido não permite, contudo, a procura das circunstâncias mais próximas da realidade.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:- Sociedade A....................., S.A., com os sinais dos autos, por se não conformar com a decisão proferida pelo Mm.º juiz do TAF de Castelo Branco e que julgou parcialmente procedente esta impugnação judicial que deduziu contra liquidação adicional de IRC, e respectivos juros compensatórios, referente ao exercício de 1997, dela veio interpor o presente recurso para o que formulou as seguintes conclusões;

a). A ora recorrente apresentou impugnação judicial da liquidação do montante de 223.286$00 (duzentos e vinte e três mil duzentos e oitenta e seis escudos) referente ao IRC do exercício de 1997, que inclui 54.270$00 de juros compensatórios, concluindo que o acto de liquidação incorria nos seguintes vícios;

i). Vício de violação do disposto no art.º 23.º do CIRC por não aceitação como custo as despesas efectuadas com serviços agrícolas prestados pela T....... CRL;
ii). Errada determinação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos;
iii). Vício de violação do disposto nos art.ºs 87.º a 90.º da LGT e art.ºs 51.º e 52.º do CIRC, por não estarem reunidos os pressupostos legais para a sua aplicação com a consequente ilegalidade na determinação de lucro tributável com recurso a métodos indirectos.

b). A então ora impugnante terminava pedindo que a impugnação judicial fosse julgada procedente e provada e, consequentemente, anulada a liquidação efectuada, fixando-se o prejuízo do exercício de 1997 em 45.103.263$00, atendendo à ilegalidade da liquidação efectuada, por violação, entre outros, do disposto nos art.ºs 17.º, 18.º, 20.º, 23.º, 51.º e 53.º, todos do CIRC, e art.º 87.º a 90.º da LGT.”

c). Notificada da aliás douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, no processo supra identificado, e não se conformando com o teor da mesma, interpôs, ao abrigo do disposto no art.º 280.º e nos termos do disposto no art.º 282.º, ambos do CPPT, recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, de cuja admissão foi a recorrente devidamente notificada;

d). A douta sentença recorrida considera como questões decidendas as seguintes;
a). Se ficou demonstrado que os custos contabilizados com serviços agrícolas facturados pela T....... SA correspondem a serviços efectivamente prestados à impugnante;
b). Erro nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos;
c). Errónea quantificação da matéria tributável.

e). Relativamente à primeira das referenciadas questões, e face à prova produzida nos autos, a douta sentença recorrida concluiu que a administração fiscal não poderia deixar de aceitar como custo fiscal do exercício o valor dos serviços prestados pela T.......... SA à impugnante, no montante global de 1.290.495$00 (valor sem IVA), razão pela qual e com estes fundamentos o Tribunal decidiu julgar a impugnação parcialmente procedente e anular a liquidação impugnada, na parte em que resultar de correcções assentes naqueles referidos custos, sendo de salientar que a decisão foi tomada, tendo especialmente em conta a prova testemunhal produzida;

f). Quanto ao resto a douta sentença recorrida manteve o acto impugnado, ou seja, não reconheceu a existência do erro nos pressupostos da aplicação dos métodos indirectos, nem concluiu pela errónea quantificação da matéria colectável;

g). Esta decisão foi tomada, depois de ter sido dada como assente a matéria de facto que consta do probatório e que se transcreveu nas presentes alegações de recurso;

h). A douta sentença recorrida considera como factos não provados, os seguintes;

“Com interesse para a decisão nada mais se provou de relevante, designadamente, não se provou que a quebra nos proveitos de 1997 resulte da diminuição do preço de comercialização de ameixas e milho.”

i). Relativamente ao invocado erro nos pressupostos da aplicação dos métodos indirectos, a douta decisão recorrida escuda-se quanto à questão de direito, no disposto no n.º 2 alínea a) do artigo 75.º, da LGT, invocando que a administração fiscal recorreu a tais métodos com base nos seguintes factos:

i). omissões na contabilização de compras, uma vez que foram contabilizadas vendas de trigo sem que a contabilidade registe a aquisição de sementes de trigo;
ii). suprimentos efectuados pelo administrador com o objectivo de regularizar o saldo credor de caixa;
iii). A existência de relações especiais com a C................. com o intuito de forjar custos;
iv). E o aumento de custos agrícolas (+ 16,42%) e o número de trabalhadores (+ 39%) em 1997 e ter registado uma variação negativa de vendas, relativamente ao ano anterior de 29,55%.

j). Concluiu o Tribunal, sem mais, que estes factos traduzem omissões à contabilidade e contém indícios seguros de que a contabilidade não reflecte a matéria tributável real da impugnante, pelo que legitima a aplicação de métodos indirectos;

l). Nestes termos importa desde logo ter em consideração que a douta sentença recorrida não considera como provados diversos factos trazidos aos autos e de extrema importância para aferição do mérito da causa;

m). Assim, entende a ora recorrente que devem ser acrescidos ao probatório os seguintes factos:

Quanto aos factos relevantes para apuramento da legalidade da aplicação dos métodos indirectos:

11. A impugnante procedeu á aquisição de sementes de trigo, que contabilizou no exercício de 1996, e suportou diversos outros custos que estão devidamente documentados (Vd. Doc. n.º 2 junto á p.i.).

12. A impugnante semeou no ano de 1997, 99,5 hectares de trigo, conforme consta do pedido de ajuda ao INGA (Vd. Doc. n.º 1 junto à p.i.), tendo esses serviços procedido à fiscalização da área semeada e pago o respectivo subsídio (Vd. Doc. n.º 4 junto à p.i.).

13. A administração fiscal acresceu ao rendimento colectável do accionista que procedeu à realização de suprimentos à sociedade, o valor dos juros presumidos (Vd. pág. 7 do Relatório).

14. A administração fiscal acresceu aos custos declarados pela empresa o montante de 1.750.447$00 (Vd. pág. 7 e 8 do Relatório e o seu Anexo 4), relativamente aos juros presumidos que ela efectivamente não suportou por inexistência de fluxos financeiros.

A convicção do Tribunal deveria ter sido formada, com base na prova documental junta aos autos, que a administração fiscal não questionou, bem como a devida valoração da prova testemunhal produzida, o que a sentença recorrida não efectuou.

Relativamente aos produtos comercializados pela impugnante deveria ter ficado provado o seguinte, tendo em consideração a verificação ou não de erro na quantificação da matéria colectável.

15. A impugnante semeou no ano de 1997, 99,5 hectares de trigo, conforme consta do pedido de ajuda ao INGA (Vd. Doc. n.º 1 junto à p.i.), tendo esses serviços procedido à fiscalização da área semeada e pago o respectivo subsídio (Vd. Doc. n.º 4 junto à p.i.) (situação esta já listada no novo probatório que se requer seja fixado, mas com implicação na apreciação das duas questões decidendas.

16. Em 99,5 hectares de terreno a impugnante produziu 52.320,00kg de trigo, que comercializou a um preço médio de 25,61, tendo apurado um volume de vendas de 1.339.940$00 e atingido uma produção por ha de cerca de 535,88 kg.

17. A impugnante recebeu esse ano do INGA, a denominação “ajuda co-financiada” ou ajuda à produção, cujo valor para essa campanha foi de 15$00 por kg. (Vd. Doc. n.º 4).

18. Do valor de vendas total do ano de 1997, no montante de 71.161.637$00, correspondem a milho vendas no valor de 48.302.575$00, equivalente a 67,88% do volume total, tendo utilizado para efeito 103,5 ha.

19. A impugnante recebeu nesse ano do INGA a denominação “ajuda co-financiada” ou ajuda à produção, cujo valor para essa campanha foi fixado em 7$50 por kg vendido.

20. Desse mesmo volume de vendas, correspondem a ameixas, vendas no valor de 21.519.123$00, equivalente a 30,24% do volume de vendas, tendo sido utilizada uma área de 41 ha.

21. A diminuição de proveitos, no exercício de 1997, resultou, entre outros factores, da diminuição do preço de comercialização de ameixas e de milho.

n). No que diz respeito aos factos não provados, para além da necessidade de se retirar daquelas que foram consideradas como tal, a não realização de prova que a quebra dos proveitos de 1997 resultou da diminuição do preço de comercialização de ameixas e milho, face aos documentos juntos aos autos e à prova testemunhal produzida deve acrescentar-se:

Não ficou provado que existiam relações especiais entre a impugnante e a C............., devendo constar como provado precisamente o contrário – a não existência dessas relações especiais, conforme decisão judicial transitada em julgado (Vd. Doc. n.º 1 junto às alegações de recurso).

o). A alteração da matéria de facto dada como provada, como se aguarda, conduzirá inapelavelmente, à constatação, que é manifesto o erro sobre os pressupostos de aplicação dos métodos indirectos.

p). Importa, por isso, constatar que no discurso fundamentador utilizado para efeitos de aplicação da metodologia indiciária, a administração fiscal e consequentemente o tribunal a quo que lhe reconheceu razão, deve atender-se essencialmente que:

- no nosso ordenamento jurídico, o regime regra de tributação é o do método declarativo – cfr. art.º 81.º da LGT;
- a fixação da matéria tributável por métodos indirectos constitui um método excepcional de tributação do rendimento, e que, por isso, só é legalmente possível quando o recurso a correcções técnicas se revele, de todo, impraticável – cfr. art.º 87.º da LGT;
- a administração fiscal tem o ónus de demonstrar a factualidade susceptível de abalar a presunção de verdade das operações constantes da escrita do contribuinte – cfr. art.º 75.º da LGT;
e que,
- em caso de determinação da matéria colectável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação – cfr. art.º 74.º. n.º 3 da LGT.

q). O que a administração fiscal não poderia, certamente, era considerar que se encontravam verificados os pressupostos legalmente definidos para a aplicação de métodos indirectos à então impugnante, para efeitos da determinação do seu lucro tributável relativo ao exercício de 1997, quando, na prática, os pressupostos em que assenta tal decisão não se verificam;

r). É, pois, evidente, que não estão reunidos os pressupostos para aplicação dos métodos indirectos;

s). A manter-se esta decisão, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação, entre outros, do disposto no art.º 75.º da LGT;

t). A douta sentença recorrida também não dá como procedente de argumentação a que a administração fiscal terá cometido um excesso de quantificação da matéria colectável;

u). Torna-se evidente que a análise desta questão fica naturalmente prejudicada, caso o Tribunal ad quem venha a satisfazer a pretensão da ora recorrente no que à verificação do erro sobre os pressupostos de aplicação dos métodos indirectos diz responder, e consequentemente, revogar, neste particular, a douta sentença recorrida;

v). Quanto ao excesso de quantificação, o Tribunal a quo baseia a sua decisão no facto de a ora recorrente apenas ter construído à sua análise na produção de trigo, quando a administração fiscal procede a quantificação da matéria colectável com base na rentabilidade fiscal evidenciada para o sector de actividade e assente, quer na produção de trigo, quer na de milho e ameixas;

x). E se estes valores forem referenciados à totalidade da produção, a douta sentença recorrida invoca que a impugnante ora recorrente nada logrou provar de convincente quanto à existência de erro, por excesso, na apreciação da matéria colectável;

z). A alteração do probatório, como se espera, vai permitir alterar este estado de coisas;

aa). A manter-se esta decisão, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação, entre outro do disposto no art.º 90.º da LGT.

Em suma;

A). A douta sentença recorrida uma errada interpretação dos factos dados como provados;

B). Por outro lado, com bastante relevância para a apreciação do mérito da causa, não deu como provados factos que dos autos resultam indiscutivelmente como tal, isto no que diz respeito tanto à prova documental produzida como, inclusivamente, no que diz respeito à prova testemunhal apresentada;

C). A douta sentença recorrida deu como não provados, factos cuja prova ao longo do processo, quer testemunhal, quer documental, é inequívoca;

D). Deve ser dada como provada a inexistência de relações especiais entre a ora recorrente e a C............;

E). A substancial alteração dos pressupostos de facto com base nos quais o Tribunal a quo reconhece a legitimidade da administração fiscal para proceder à determinação da matéria colectável, vai permitir concluir da ilegitimidade de tal procedimento;

F). Teria sido, por isso, perfeitamente possível, que a administração tivesse procedido ao apuramento da matéria colectável com recurso ao regime regra – a metodologia de avaliação directa;

G). Não consta do processo que a administração fiscal tenha demonstrado – já que a ela lhe cabia esse ónus – uma factualidade susceptível de abalar a presunção de verdade das operações constantes da escrita da contribuinte ora recorrente;

H). Não tendo a douta sentença recorrida concluído nesse sentido, validou uma violação flagrante do disposto no art.º 75.º da LGT;

I). A revogação da douta sentença recorrida quanto a esta questão – erro nos pressupostos da aplicação de métodos indirectos – fará precludir a necessidade de apreciação da segunda questão ainda controvertida.

J). Contudo, se assim não se entender, a ora recorrente também não pode de maneira nenhuma concordar que a douta sentença recorrida não tenha dado como provada a existência de erro na quantificação da matéria colectável;

L). Também aqui a sentença recorrida não levou ao probatório, factos que indiscutivelmente, face à prova produzida, deveriam ali ter figurado;

M). O erro na quantificação dessa matéria colectável é evidente, como é manifesta a falta de fundamentação da decisão recorrida para assim concluir;

N). Finalmente, reposta a situação patrimonial da empresa contribuinte ora recorrente, no momento anterior à prática dos actos de liquidação objecto de impugnação judicial e do presente recurso, alternativa não resta do que reconhecer, como é de lei, os prejuízos fiscais incorridos no exercício de 1997.

- Conclui que, pela procedência do recurso, se revogue a decisão recorrida, anulando-se a liquidação impugnada, quanto ao imposto e JC’s, “(…) fixando-se o prejuízo do exercício de 1997 em 45.103.263$00 (…)”, com as consequências legais.

- Com as suas alegações de recurso a recorrente fez juntar um documento, consubstanciando fls. 296 a 351, inclusive, dos autos.

- Não houve contra-alegações.

- O EMMP, junto deste Tribunal, emitiu o douto parecer de fls. 358 pronunciando-se, a final, pela improcedência do recurso.

*****

- Colhidos os vistos legais vêm, os autos, à conferência para decisão.

- A decisão recorrida, segundo alíneas da nossa iniciativa deu, por provada, a seguinte;
- MATÉRIA DE FACTO -

A). A impugnante dedica-se à actividade de produção e comercialização de produtos agrícolas, nomeadamente, trigo, ameixas e milho e prestação de serviços agrícolas;

B). No ano de 2000, foi, a impugnante, sujeita a uma acção de inspecção abrangendo o ano de 1997, que culminou com o projecto de relatório de inspecção, de 23/05/2000, que constitui fls. 32 e de consta, textual, expressa e, designadamente, o seguinte:

« 3.2. IRC
3.2.1. Conta 622363 Serviços Agrícolas
Encontram-se contabilizadas, nesta conta, as facturas abaixo descritas, referentes a serviços agrícolas prestados pela Terra CRL.
(…)
Como referimos no relatório elaborado na acção de fiscalização na terras CRL, esta cooperativa, tem contabilizado Prestações de Serviços Agrícolas, contudo pela análise feita à mesma, verifica-se que:
“… Janeiro a Abril tem só um empregado que eventualmente poderia estar adstrito a estas prestações de serviços, contudo pela análise efectuada, esta hipótese fica afastada, … e de Maio a Setembro não tem nenhum trabalhador …”.

Concluindo os factos referidos no relatório da terras CRL, são condição suficiente e fundamentam a nossa convicção de que as facturas emitidas por Soc. A.............., S.A., não se referem a serviços efectivamente prestados a esta empresa, sendo como tal simuladas as facturas emitidas no valor de esc. 1.290.495$00 (valor s/ IVA).

Assim, os valores contabilizados como custos no sujeito passivo em análise, não são aceites como custos da actividade, ao abrigo do art.º 23.º do CIRC, uma vez que não podem ser considerados indispensáveis à realização da sua actividade, visando somente a simulação de custos.

(…)

IV – Descrição e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos.
4.1. IRC
O sujeito passivo liquida e deduz respectivamente à taxa de 5% e 17% pelas suas operações activas e passivas, que consistem na produção e comercialização de trigo, ameixas e milho e Prestações de Serviços Agrícolas, evidenciando na contabilidade as seguintes margens brutas de comercialização:
1996 – 191,99%
1997 – 168,07%

Pela análise efectuada à conta 25 Suprimentos de Sócios, verifica-se que a mesma é movimentada com o objectivo de fazer face a saldos credores de caixa, contudo e apesar de todos os movimentos realizados, o saldo final e inicial de 1997 é credor.

Com o objectivo de se efectuar um estudo aos resultados evidenciados na contabilidade, foi feita a análise às contas Compras, Custo da Mercadoria Vendida, Vendas e Variação de Produção, verificando-se que:
- não foi efectuada qualquer prova referente a sementes de trigo;
- não há existências finais de produtos nem variação de produção;
- o sujeito passivo efectua vendas de trigo, conforme fotocópias das facturas constantes do Anexo 2.

Face aos dados evidenciados, o s.p. alega que a justificação que encontra para esta situação será o facto de as sementeiras de trigo terem início em Janeiro.

Apesar de não ser uma situação normal, uma vez que as culturas de trigo são de Outubro a Janeiro, aceitamos a justificação do s.p., contudo o mesmo não sabe explicar o facto de não existir compras de sementes de trigo no exercício de 1997.

EXERC.VENDASCUSTOS AGRÍCOLASN.º TRAB.
1996101.021.617$39.606.362$19
199771.161.637$46.111.112$25
VARIAÇÃO(29,55%)16,42%31%

A contabilidade revela um decréscimo das vendas de 29,5% contudo os custos dos serviços agrícolas tem um acréscimo de 16,42% apesar de ter mais seis trabalhadores ao seu serviço.

A rentabilidade fiscal apresentada pelo s.p. nos últimos três exercícios foi de:
1995 – 18,31%
1996 – 7,91%
1997 – (58,80%)

Investimento financeiro – 32.000.000$00, relativo ao aumento de capital da T...... CRL, contudo no mesmo dia é efectuado um depósito no Banco .................. na conta à ordem da G........, proveniente do administrador J..............

Face ao exposto nos pontos anteriores, existem indícios de que a contabilidade não reflecte de forma clara e inequívoca o resultado efectivamente obtido, verificando-se algumas irregularidades que em resumo são:
1 – Suprimentos efectuados pelo administrador com o objectivo de regularizar saldos credores de caixa.
2 – Omissão na contabilização de compras;
3 – Relações especiais com a C.......... com o objectivo de forjar custos.

As anomalias detectadas, indicam a omissão de vendas, não revelando a contabilidade de forma clara e inequívoca a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, pelo que ao abrigo da alínea d), do n.º 1, do art.º 51.º do CIRC e art.º 87.º e 90.º da LGT, propomos a determinação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos.

V – Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.

5.1. IRC
5.1.1 Suprimentos – presunção de juros
Conforme referido no ponto 3.4.3.do relatório de fiscalização da C........., a Administração fiscal desqualifica os movimentos de suprimentos aos seus cooperantes.

Dado que estamos em presença de rendimentos de aplicações financeiras, presumivelmente remuneradas, sem determinação de taxa ou quantitativo, assim e de acordo com a Portaria n.º 1171/95, de 25/09, a taxa de juros aplicada é de 10% ao abrigo do n.º 1 do art.º 559.º do Código Civil.

Para o efeito, foram calculados os juros devedores para o s.p., juros estes a acrescer aos rendimentos do seu titular J..................

Do apuramento efectuado resultou custo para o s.p. no valor de esc. 1.750.447$00 conforme consta do Anexo 4.

5.1.2. Omissão de Vendas
O método de cálculo das vendas consideradas omissas, foi o seguinte:
De acordo com o art.º 90.º da LGT e dado que o sujeito passivo apresenta uma rentablidade fiscal inferior aos indicadores para o CAE da sua actividade, procede-se à determinação de vendas omissas com base na rentabilidade fiscal evidenciada para o sector (valores de referência 1994, 1995 e 1996) – 0,79.

“Convém realçar que, com o objectivo da nossa análise corresponder o melhor possível à realidade do s.p., foram solicitados ao INGA os valores atribuídos referentes aos subsídios de exploração, contudo, até ao fim da acção de fiscalização os mesmos não foram facultados”».

C). Com base nas conclusões do relatório, foram propostas correcções à matéria colectável do IRC, de natureza meramente aritmética no montante de 15.562.022$00 e, como recurso a métodos indirectos, no montante de 41.499.443$00 (mapa resumo das correcções, a fls. 31);

D). A impugnante reclamou da matéria tributável fixada com recurso a métodos indirectos para o Sr. Director de Finanças (fls. 52);

E). A reclamação foi indeferida por despacho de 08/05/2001, a fls. 70, que manteve as correcções propostas no relatório de inspecção com base na posição assumida pelo perito da Fazenda Pública e vertida na Acta de Reunião de Peritos n.º 14, de 02/05/2001, a fls. 67;

F). Consta daquela Acta, como posição do perito da Fazenda Pública, designadamente, o seguinte: «Quanto à presunção referente ao volume de negócios não faz sentido, não podemos estar de acordo com tal posição pois em 1996 a empresa com 19 trabalhadores e com 39.606.362$00 de custos agrícolas obteve vendas de 10.021.617$00, em 1997 aumenta o número de trabalhadores para 25 (+6), aumenta os custos agrícolas para 46.111.112$00 (+16,42%) e, no entanto, diminui as vendas para 71.161.637$00 (-29,55%). Então para que andou o s.p. a aumentar o número de trabalhadores e os outros custos agrícolas? Não parece fazer sentido. O s.p. não apresentou nenhum dado que demonstre que 1997 foi um mau ano agrícola.

G). Em seguimento e com relação ao ano de 1997, foi efectuada a liquidação adicional de IRC e Juros Compensatórios n.º 8310011454, de 21/08/2001, na importância de 223.286$00, com data limite de pagamento até 22/10/2001 (documento de cobrança a fls. 25);

H). A impugnação deu entrada na Repartição de Finanças de .......... em 16/01/2002 conforme carimbo por ela aposto na petição inicial;

I). No exercício de 1997, a impugnante apresentara um prejuízo declarado de 42.338.022$00 (declaração de rendimentos Mod. 22/IRC, a fls. 25);

J). A importância contabilizada pela impugnante como custo de serviços agrícolas corresponde a trabalhos prestados pela T........, CRL, consistentes, nomeadamente, em ligação dos pivots de rega e respectivo acompanhamento, reparação dos mesmos pivots com excepção da parte eléctrica, tratamentos da área fitosanitária (herbicidas, insecticidas e acaricidas), controlo e gestão do crescimento das culturas.
*****
- Mais se deram como não provados quaisquer outros factos diversos dos constantes das precedentes alíneas, enquanto relevantes à decisão de mérito a proferir e, designadamente, “(…) que a quebra nos proveitos de 1997 resulte da diminuição do preço de comercialização de ameixas e milho.”.
*****

- Em sede de fundamentação do julgamento da matéria de facto e ao que aqui releva, consignou-se, de forma expressa, na decisão recorrida, o seguinte;

«[…]

No que respeita ao preço de venda da ameixa e do milho, alegadamente comercializados com descontos na ordem dos 20% e 40% sobre o ano anterior e que a impugnante diz constituir a razão de ser da diminuição dos proveitos do exercício de 1997, não pode a convicção do tribunal sustentar-se no depoimento da única testemunha que sobre isso declara, (…), Director da Cooperativa T......... CRL.

É que não se afigura credível, num juízo de normalidade, que uma cooperativa que comercializa produtos de uma empresa que cultiva 41 hectares de ameixa com uma produção média de 14 ou 15 toneladas, por hectare, não planeie e assegure atempadamente meios de escoamento da produção, para mais de um produto muito perecível, colocando-se, à última hora, na dependência de um único intermediário quanto às condições do preço.».
*****
- ENQUADRAMENTO JURÍDICO -

- Com as alegações de recurso a recorrente fez juntar aos autos o documento que constitui fls. 297 a 351, inclusive.

- Por consequência, a primeira questões que se impõe enfrentar, de natureza adjectiva, consiste em saber da possibilidade legal de tal junção e da manutenção do referido documento nos autos.

- Assim, e ao que aqui importa, dispõe o art.º 523.º do CPC, que os documentos, como meios de prova, da acção ou da defesa, devendo ser apresentados com o articulado em que se invoquem os factos que se destinem a demonstrar, podê-lo-ão, no entanto ser, ainda e por livre iniciativa das partes litigantes, enquanto apresentantes, até ao encerramento da discussão em 1ª instância, ainda que com a condenação da apresentante em multa, salvo demonstração de que o, ou os, não pôde oferecer com o articulado próprio.

- Por outro lado, os artºs. 523º , 524º e 706º, todos daquele último diploma legal, possibilitam que tais documentos, possam ser juntos ao processo, em caso de recurso, até ao início dos vistos dos adjuntos, sempre que ocorra alguma das seguintes circunstâncias;
ü Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (art.º 524º/1 CPC);
ü Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº. 524º/2 CPC);
ü Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª instância (artº. 524º/2 CPC);
ü Quando tal ocorrência impositiva da junção de documentos seja a decisão recorrida da 1ª instância (cfr. artº. 706º/1 CPC).

- Como é axiomático a verificação das circunstâncias que se acabam de elencar tem, como não pode deixar de ser, como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre desde logo directamente da circunstância dos docs. terem de ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado art.º 523.º) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no art.º 543.º do mesmo compêndio legal.

- Passando, agora, ao caso dos autos patenteia-se que a razão de ser da presente impugnação se prende com a discordância da impugnante na tributação a que foi sujeita, no exercício de 1997, por recurso a métodos indirectos bem como, com a quantificação da matéria tributável que, através de tal metodologia, lhe veio a ser fixada.

- Por outro lado, a fundamentação da AF para lançar mão da referida metodologia ancorou-se, entre outras razões complementares e cumulativas, num alegado estabelecimento de relações especiais entre a impugnante e a cooperativa de produção agrícola «C........», com o objectivo de se forjarem custos (cfr. fls. 38 dos autos); Por seu turno, a decisão aqui em crise, refere e adere a este mesmo circunstancialismo, como o atesta o seguinte passo do seu discurso jurídico:

«[…]
Para recorrer a métodos indirectos no apuramento da matéria tributável, a AF assinala omissões na contabilização de compras, uma vez que foram facturadas pela impugnante vendas de trigo sem que a contabilidade reflicta qualquer aquisição de sementes de trigo; suprimento efectuados pelo administrador com o objectivo de regularizar saldos credores de caixa e relações especiais com a C...... com o intuito de forjar custos; (…).

Tais factos, se por um lado traduzem omissões à contabilidade, por outro, constituem indícios seguros de que a contabilidade não reflecte a matéria tributável real da impugnante e legitimam a aplicação de métodos indirectos (…).» (cfr. fls. 150 dos autos).

- Ora, o referido documento consubstancia um acórdão deste Tribunal, prolatado em 2005FEV15, que se pronuncia sobre as aquelas referidas relações especiais entre a impugnante e a «C............», por referência ao exercício de 1997, “rectius”, à legalidade do despacho do Sr. SEAFiscais que indeferira, á recorrente, um recurso hierárquico que houvera interposto da decisão da AT em proceder a correcção da sua matéria colectável de IRC, quanto ao exercício de 1997, com recurso à faculdade conferida pelo art.º 57.º do CIRC, no relacionamento comercial estabelecido entre a impugnante e a aludida «C..............».

- Por outro lado e como resulta dos autos, quando o referido acórdão foi proferido, na referida data de 2005FEV15, já se tinha consumado, havia muito, a última intervenção da recorrente nos presentes autos, antes da decisão recorrida, intervenção essa que teve lugar com a apresentação das alegações pré-sentenciais em 1.ª instância ocorrida em 2004OUT26.

- Assim sendo tem-se por patente quer a relevância do referido documento, enquanto decisão final, à apreciação de mérito a proferir nestes autos, quer a impossibilidade material da sua junção aos autos, pela impugnante, antes da prolação da decisão ora recorrida, pelo que entende que o mesmo é de manter sem qualquer tipo de cominação para a apresentante.
*****
- Como decorrência necessária do que se vem de referir, adita-se ao probatório, a coberto do disposto no art.º 712.º/1 do CPC, uma nova alínea, com o seguinte teor;

K.) Por decisão deste Tribunal, de 2005FEV15, foi determinada a anulação da decisão do Sr. SEAFiscais de indeferimento do recurso hierárquico interposto pela impugnante, das correcções à sua matéria colectável referente ao exercício de 1997com fundamento em relações especiais estabelecidas entre ela e a «C..........», nos termos referidos na precedente alínea B). (cfr. doc. de fls. 297 a 351, inclusive, que, aqui, se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais)..
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- Como acima se deu conta, a recorrente insurge-se contra a decisão recorrida na medida em que deu cobertura legal ao procedimento da AF, ao tributá-la, no exercício de 1997, por recurso à metodologia indirecta, no entendimento de que se não arrima a fundamentação substancial adequada à consubstanciação dos requisitos legais necessários ao efeito, por um lado, e ao quantificar a matéria colectável pela forma e montante em que a fixou.

- E, em defesa da sua linha argumentativa pugna, desde logo, pelo erro de julgamento quanto á matéria de facto o qual, em seu entender, se devidamente corrigido face aos elementos probatórios coligidos para os autos, implicará, inelutavelmente, uma decisão que lhe seja favorável.

- Cumpriria, por isso, prosseguir, agora, a apreciação do recurso pelo imputado erro de julgamento da matéria de facto.

- A verdade, contudo, é que se nos afigura que, mesmo á luz dos elementos levados ao probatório, a razão se encontra do lado da recorrente, razão porque se torna irrelevante a apreciação do aludido erro de julgamento.

- Vejamos a razão de ser deste nosso entendimento, para o que se mostra curial uma breve resenha ao regime jurídico aplicável.

- Assim e como é sobejamente sabido, o nosso ordenamento jurídico consagra o princípio do sistema declarativo, como meio de apuramento da matéria colectável, surgindo as outras vias da sua determinação, da iniciativa da AF, como meios subsidiários ou residuais.

- De facto e como é bem de ver o sistema jurídico tinha, necessariamente, de prever meios alternativos ao apuramento da matéria colectável dos impostos, no caso daquele princípio não operar por motivos imputáveis ao contribuinte, como será, além do mais e designadamente, o caso de não disponibilizar os elementos necessários ao controlo da sua situação tributária, por parte da AT, no exercício do poder vinculado que a esta está conferido por lei, ou de os disponibilizar com fundadas suspeitas, segundo juízos de probabilidade e normalidade adequada, de que não têm aderência á realidade, tendo presente que, se por um lado «... a fiabilidade do registo contabilístico dos factos patrimoniais» se «fundamenta(...) na chamada escrituração comercial, constituída pelos livros e registos obrigatórios e submetidos a formalidades legais, pelos livros facultativos ou a estes equiparados (folhas soltas , volantes ou avulsas , v.g. folhas de caixa , artºs. 31º a 37º do C. Com.) e, ainda, pelos documentos justificativos, não sendo de esquecer que, de acordo com a lei, a escrituração comercial é, não só, o meio descritivo dos factos patrimoniais como, também, o modo formal da respectiva comprovação.» (1), por outro, a regularidade formal da contabilidade, não implica, por si só, qualquer contradição insanável com a atestação da impossibilidade de quantificação directa e exacta da matéria colectável, impondo-se, por isso e neste circunstancialismo, o recurso a métodos indiciários; dito de outra forma, não é a correcção formal da escrita dos contribuintes que acarreta a sua aderência à realidade substancial .

- Do que resulta que, tendo os elementos contabilísticos do contribuinte de se encontrar organizados segundo os sãos princípios da lei comercial e fiscal, quer do ponto de vista da forma, quer do ponto de vista substancial, casos em que gozam de uma presunção de veracidade, tal não implica, no entanto e “a contrario”, como já acima se referiu,- pela circunstância de tais elementos se encontrarem organizados correctamente do ponto de vista meramente formal -, a inibição da AT , no uso daqueles poderes de controlo, servindo-se dos meios legais alternativos ao declarativo no apuramento da matéria colectável, já que o que importa é apurar, tanto quanto possível e ao que aqui releva, o rendimento tributável efectivo.

- Por outro lado, o lançar mão de qualquer dos meios disponíveis, - correcções técnicas/métodos indiciários -, e de um deles em detrimento do outro, não depende de um critério discricionário da AFiscal, antes, qualquer deles constitui um seu poder vinculado, sendo que , ao que aqui nos importa considerar, a AT se encontra vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos a tributar e, ao invés, se e na medida em que tal apuramento se venha a revelar inviável, não pode, então, deixar de lançar mão da metodologia indirecta, o que vale por dizer que esta pressupõe uma situação que se mostre “Marcada por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação” , revelando-se como “uma última ratio fisci , ...” (2)..

- Importa, também, referir que a demonstração dos necessários pressupostos legais ao recurso a metodologia alternativa, designadamente a indiciária, cabe à AF (3)/(4).

- Por último cabe, ainda, ter presente que, no caso de utilização de metodologia indirecta, sendo, embora, opção do legislador o abdicar de um grau de certeza na tributação - inerente á maior subjectividade própria da mesma em que, só por circunstâncias meramente fortuitas, a quantificação apurada será aderente à realidade - não deixa, no entanto de ter como baliza, o princípio, com assento constitucional, de que a metodologia em causa há-de alcançar, na medida do possível, as circunstâncias de facto mais próximas da realidade, com susceptibilidade de apreciação, nomeadamente, jurisdicional (5).

- Subsumindo, agora, o caso dos autos, ao que se vem de dizer, crê-se, como se começou por afirmar, ter de se concluir no sentido de que, tal como sustenta a recorrente, a AF não alegou e demonstrou, como se lhe impunha a verificação dos necessários e legais pressupostos ao recurso á metodologia indirecta, nos precisos termos em que, dela, veio a fazer uso, com violação do referido princípio programático de tributação tendencial pelo lucro realmente obtido pela pessoas colectivas.

- Vejamos, ainda aqui, o porquê do que se vem de afirmar.

- A decisão recorrida, para concluir pela adequada fundamentação substancial da AF, “in casu”, para lançar mão da referida metodologia, após transcrição feita dos n.ºs 1 e 2, do art.º 75.º da LGT, ancorou-se, tão só, no discurso jurídico da sentença já acima transcrito a propósito da junção de documento com as alegações de recurso(6), com a única diferença de que fez, ainda, juntar aos fundamentos do recurso a métodos indirectos a circunstância da recorrente “(…) ter aumentado os custos agrícolas (+16,42%) e o número de trabalhadores (+31%) em 1997 e registado uma variação negativa das vendas, relativamente ao ano anterior, de 29,55%.”.

- Ou seja, à luz da fundamentação empregue pela AF, tem-se por líquido que as verdadeiras e essenciais razões porque entendeu lançar mão da metodologia em causa, radicaram nas alegadas omissão de compra de sementes de trigo, em 1997, no facto de não haver existências finais nem variação de produção deste tipo de mercadoria, sendo certo que a impugnante efectua vendas do mesmo e nas imputadas relações especiais com a «C..........»; as restantes circunstâncias elencadas no relatório, nos termos transcritos em B). do probatório, ou seja os suprimentos efectuados pelo administrador e o decréscimo das vendas em 29,25%, por referência ao ano anterior, quando os factores de produção custos agrícolas e mão de obra aumentaram, respectivamente, 16,42% e 31%, por comparação com o mesmo período, apresentam-se como meramente adjuvantes ou corroborativas do juízo de suspeição de falta de aderência á realidade do resultado fiscal declarado.

- Na realidade, a simples diminuição das vendas, nos apontados termos e apesar do aumento dos referidos custos de produção, não tem de implicar, necessariamente, que o resultado fiscal tenha sido adulterado e, nessa medida, que a contabilidade não o espelhe de forma fiel, pois se tal fosse uma extrapolação incontornável, tal significaria, necessariamente, que qualquer falência era, necessariamente, fraudulenta.

- E, por isso mesmo e por maioria de razão, não pode, também e por si só, implicar que, a dar de barato que a declarada diminuição das percentagem de vendas era artificial e fraudulenta, a AF não tinha outra alternativa senão recorrer a presunções, afastando, liminarmente, o recurso a correcções técnicas; para que assim possa suceder é indispensável que a AF se suporte em circunstâncias de facto susceptíveis de explicitar tal falta de aderência à realidade na diminuição das vendas e que essas circunstâncias sejam, por outro lado, impeditivas de um apuramento directo, por correcções técnicas, da matéria tributável.

- Ora, no caso, as circunstâncias susceptíveis, em abstracto, de induzirem tal conclusão, à luz da fundamentação empregue pela a AF, apenas podem ser as acima elencadas, referentes ao trigo, de uma banda e, de outra, as alegadas relações especiais, já que, como temos por evidente, os alegados suprimentos do sócios, - para além de se traduzirem, a nosso ver, em meros juízos conclusivos de que se destinaram a fazer face a saldos credores de caixa -, a concluir-se pela sua falta de aderência á realidade, apenas legitimariam a respectiva correcção técnica, na medida em que os respectivos montantes não são desconhecidos.

- Ora, dessas, as alegadas relações especiais deixaram de constituir fundamentação adequada, na medida em que se encontra decidido, por acórdão passado em julgado, que era de eliminar da ordem jurídica a decisão do Sr. SEAF que indeferira recurso hierárquico interposto pela impugnante contra a correcção operada pela AF, no caso vertente, precisamente a coberto das alegadas relações especiais.

- Ficam, portanto e nuclearmente, as questões relativas á compra das sementes de trigo, `inexistência em inventário de 1996, de tal tipo de produto, bem como de registo de variação de produção, sendo certo que a impugnante efectua vendas de trigo.

- Ora, - sem embargo do que poderia ser referido no âmbito da prova, desde logo no que concerne às referidas sementes, tendo linha de conta que a impugnante referiu tê-las adquirido em finais de 1996, tendo-as contabilizado ainda que não as tendo levado a inventário, para as semear em Janeiro de 1997 (o que não deixa de pressupor a sua disponibilidade para o efeito) e que a AF, ainda que com reservas, não deixou de aceitar como verdadeiro tal facto (cfr. 1.º § de fls. 141 dos autos) do mesmo passo que limitou a sua extrapolação da inexistência finais à examinação das declarações mod. 22 de IRC apresentadas (cfr. acta da reunião de peritos, na segunda metade de fls. 68 dos autos) -, crê-se que, mesmo sem questionar a argumentação da AT, isto é, que não existiam as alegadas existências finais(96)/iniciais(97) de sementes de trigo e que não foi efectuada qualquer compra das mesmas no exercício em causa, sendo certo que a recorrente procedeu a vendas do produto em questão, se tem de concluir pela ilegalidade da actuação da AT, nos precisos termos em que o fez por violação do referido princípio da tributação tendencial do lucro real das empresas e da inerente aplicação residual e como medida última, dos métodos indirectos.

- É que, como aliás se dá conta na sentença recorrida para se julgar improcedente a presente impugnação, - na apreciação da errada quantificação -, há que não esquecer que a impugnante se dedica à actividade de à comercialização, ao que aqui nos importa, de trigo, ameixas e milho, sendo que, se atentarmos no alegado pela recorrente, a produção de trigo é mesmo residual relativamente à produção de ameixas e de trigo, para além de que a área reservada para a produção daquele, - a que a sentença não deixa de anuir (cfr. fls. 151) -, é, também e rotativamente, destinada á produção de girassol.

- Ora e independentemente da residualidade da produção de trigo, - que, no entanto, cabe reafirmar, não sendo contestada por quem quer que seja, confere, necessariamente, maior dimensão o erro de actuação de que se entende enfermar a conduta da AT -, a verdade é que tratam-se de produções absolutamente diferenciadas e independentes entre si, o que não pode deixar de acarretar consequências divergentes ao nível dos resultados de exploração obtidos.

- Por isso que se entenda que, na correcta ponderação do efectivo resultado obtido pela impugnante se impunha aferir dos elementos relevantes a cada uma daquelas espécies de produção agrícola, o que significa que, o atendimento, em termos gerais e residuais do índice de rentabilidade fiscal para o CAE da sua actividade, ao abrigo do art.º 90.º da LGT, tal como foi feito, apenas encontraria justificação na medida em que, em relação a todos eles, se verificassem causas de impossibilidade de apuramento da matéria colectável; A não ser assim, isto é, a ser possível a correcção por métodos directos relativamente a qualquer daqueles sectores de produção/comercialização, estava a AF, em relação a eles, impedida de utilizar a metodologia indirecto, com suporte nos critérios de quantificação utilizados, sob pena de se estar objectivamente a afrontar o princípio da tributação, ainda que tendencial, do lucro real das empresas, na medida em que os resultados parcelares daquelas actividades (produção/comercialização de trigo, milho e ameixas) são forçosamente diferenciados, quer quantitativa, quer e particularmente, qualitativamente.

- Ora, sendo à AF que cabe aportar demonstrativamente a factualidade legitimadora do recurso à metodologia indiciária, designadamente por impossibilidade de tributação directa ainda que por correcções técnicas, a verdade é que, no caso e como acima referido, nenhuma irregularidade aponta á contabilidade quanto aos resultados apurados relativamente à produção/comercialização de milho e ameixas, cingindo-se apenas ao trigo (as alegadas inexistências de compras de sementes em 1997, bem como de existências finais em 96 e de variação de produção), pelo que o recurso a métodos indirectos, dando de barato os pressupostos para o efeito a que se arrima, se mostra ilegal, já que está por demonstrar que idênticos pressupostos de verificassem em relação ao milho e às ameixas.

- Por outro lado, na medida em que o acto tributário impugnado abrangeu a totalidade da actividade da recorrente, desconhecendo-se em que medida é que para ele contribuiu cada um daqueles referidos sectores que a compõem, assertivo se torna que a dita ilegalidade o inquina na sua totalidade.

- E, com o ser assim, prejudicada fica a apreciação do alegado erro de quantificação.

- Uma última palavra para o pedido cumulativo formulado pela recorrente no sentido da manutenção do prejuízo declarado relativo ao exercício de 1997.

- O processo de impugnação judicial tributário consubstancia um contencioso de anulação em que, pela sua procedência, o impugnante logra obter a anulação do acto tributário impugnado, com as inerentes consequências legais, como seja o caso do direito a juros indemnizatórios em caso de pagamento indevido de quantia decorrente daquele.

- Contudo o Tribunal não se pode substituir à Administração Fiscal naquilo que seja da sua competência, como é o caso da fixação positiva de valores ou rendimentos relevantes para efeitos fiscais, pelo que nunca o pedido em causa poderia obter ganho de causa.

*****

- D E C I S Ã O -

- Nestes termos acordam, os juízes da secção de contencioso tributário do TCASul em conceder provimento ao recurso, assim se revogando a decisão recorrida e, por substituição, em julgar procedente, por provada, a presente impugnação assim se determinando a anulação do acto de liquidação impugnado.
- Sem custas.
09FEV17
LUCAS MARTINS
PEREIRA GAMEIRO
JOSÉ CORREIA
(1) Cfr. Ac. deste Tribunal , in Rec. n.º 2.597/99.
(2) Cfr. JLSaldanha Sanches em “A Quantificação da Obrigação Tributária” , 302/303.
(3) Uma vez que nos termos das regras do ónus da prova em sede de direito administrativo tributário ,-onde , há luz dos vigentes princípios de descoberta da verdade material e , da consequente , oficiosidade de investigação e indagação das provas , não há uma particular incumbência de provar , por parte de quem quer que seja , sem embargo de , pela impossibilidade de manutenção de um “non liquet”, a ausência de prova de factos relevantes não possa deixar de desfavorecer quem com ela estava onerado-, é à AT que cabe a obrigação “... da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação , designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo , por contrapartida , “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto , quando se mostrem verificados esses pressupostos ...”.
(4) Cfr. Ac. de 02.06.18 , Rec. nº. 6.388/02.
(5) Cfr. Prof. Saldanha Sanches in “A Quantificação da Obrigação Tributária” , 305.
(6) Cfr. págs. 18 do próprio acórdão.