Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02293/08
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:12/18/2008
Relator:LUCAS MARTINS
Descritores:PROVISÕES DE CRÉDITO
COBRANÇA DUVIDOSA
ESPECIALIZAÇÃO DE EXERCÍCIOS
Sumário:1) A provisão por créditos de cobrança duvidosa, prevista no actual artigo 35°, n.º1, al. c), do CIRC, só é fiscalmente atendível, quando existam provas de terem sido efectuadas diligências, para o seu recebimento.
2) O princípio da especialidade de exercícios (art.º18º do CIRC) leva a que, apenas, possam ser escriturados, em cada exercício (ano), os proveitos e os custos que nele efectivamente tenham sido realizados. Só assim não sendo, se na data de encerramento das contas do exercício forem imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos (cf. nº2 do citado artº18)
3) Todavia, não é qualquer desconhecimento dos custos - ainda que o mesmo se venha a demonstrar, por parte do sujeito passivo - que releva à excepção do regime-regra da periodização do lucro tributável; antes terá de ser um desconhecimento fundamentado, no sentido de não só desculpável como atendível, à luz do princípio de justiça, a fim de não penalizar, excessiva e desproporcionadamente, aquele sujeito passivo, por não ter contabilizado o custo no exercício normalmente devido, em virtude de tal se ter ficado a dever a comportamento tido como normalmente exigível, segundo critérios de um “bonnus pater familiae”.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:- «... & ... – ............... (Portugal), S.A.», com os sinais dos autos, por se não conformar com a decisão proferida pelo Mm.º juiz do TAF de Lisboa e que lhe julgou improcedente esta impugnação que houvera deduzido contra liquidação adicional de IRC/95, dela veio interpor o presente recurso apresentando, para o efeito, as seguintes conclusões;






A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida em 10.07.2007 nos autos acima referenciados que julgou os autos de impugnação “não provados e improcedentes”.

B. Recorre-se da sentença proferida nos autos com fundamento em impugnação da matéria de facto e errónea aplicação do Direito, tendo igualmente o presente recurso por objecto a reapreciação da prova gravada.

C. A matéria de facto dada como provada na Sentença Recorrida apresenta deficiências, omissões e inexactidões de suprema importância para a boa resolução da causa, sendo tais deficiências, omissões e inexactidões evidenciadas pelos documentos juntos aos autos e pelos depoimentos das testemunhas.

D. A paupérrima (salvo o devido respeito) matéria de facto dada como provada será, na opinião da Recorrente, a eventual causa dos gritantes erros de facto e de direito que foram cometidos pelo Tribunal a quo.

E. De acordo com a prova documental e a prova testemunhal produzidas, deve este Alto Tribunal aditar, ao abrigo do disposto no artigo 712.º n.º 1 alínea a) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigos 749.º e 762.ºdo mesmo Código, todos aplicáveis por força do disposto no artigo 283.º do CPPT, os seguintes pontos à matéria de facto provada;

“6-a) a Holding fazia o seguro para todo o grupo, imputando depois os custos a cada sociedade do Grupo, incluindo à impugnante”.

“6-b) as facturas emitidas pela Holding foram integralmente liquidadas pela impugnante.

“7-a) Ficou provado que a impugnante pagou as facturas de consultadoria feita pela Holding “casa-mãe” da impugnante.”

“7-b) a Holding “casa-mãe” da impugnante prestou serviços de consultadoria à impugnante durante o exercício de 1995.”.

“13-a) A provisão para créditos de cobrança duvidosa de 23.200.000$00, deve-se a uma factura emitida pela impugnante à sociedade A............., Lda. em 07.07.94, no valor 46.400.000$00, e que não se encontra paga no final do exercício”

“13-b) a factura emitida pela impugnante dizia respeito ao serviço, prestado à A............. Lda., de produção do programa televisivo “M.............” para a SIC”.

“13-c) a SIC cancelou o programa “M..............”, ficando a A............. Lda. sem meios económicos, não tendo pago a factura á Recorrente”.

“13-d) a contabilidade da impugnante e da A............. era realizada pelas mesmas pessoas, tendo sido entendido que não havia a necessidade de ser feita prova escrita”

“13-e) A provisão para créditos de cobrança duvidosa, de 23.200.000$00, não foi aceite pela AT por dois motivos: a impugnante e a sociedade A............. Lda., eram controladas pela mesma entidade ( que detinha 98% da A.............) e porque não foram apresentadas provas das diligências para o recebimento da referida factura”.

“16-a) As 3 facturas emitidas pela C......... em Junho de 1994 extraviaram-se

“16-b) Existia uma grande movimentação na conta-corrente entre as duas empresas”.

“16-c) a impugnante apenas teve conhecimento do custo quando foi alertada para o facto pelo ROC, já em 1995, após o ROC ter directamente obtido informações sobre as contas da C........... e ter efectuado a reconciliação dos saldos da impugnante e da C...........”.

“16-d) a impugnante não tinha forma de saber que tinha uma dívida para com a C..........., em momento anterior ao envio das facturas de substituição”.

“17) As prestações de serviços realizadas pela R & O e pelas A........ e P.......... não foram postas em causa pela AT.

“18) A AT considerou que as facturas apresentadas pela impugnante quanto ao pagamento das facturas emitidas pela A.............. e P.......... não eram aceitáveis, pois considerou que os pagamentos a não residentes têm de ser feitos por transferência bancária, e só isso pode provar a saída do dinheiro para o estrangeiro”.

“19) A impugnante aprestou provas contabilísticas perante a AT do pagamento do montante de Esc. 1.508.340$00 relativamente à dívida perante R & O e do pagamento do montante de Esc. 16.069.650$00 relativamente à dívida perante as A.......... e P..............”.

20) A impugnante alegou perante a AT que a restante parte da dívida foi paga directamente pelo administrador B............., por causa dos problemas de tesouraria da sociedade criados pela apresentação da TVI ao processo de recuperação de empresas, tendo provado que era credora dessa empresa e que foi lesada nesse processo”.

F). Nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 264.º, 660.º e 668.º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil, o Acórdão Recorrido é nulo por omissão de pronúncia.

G). Com efeito, o Tribunal a quo refere que: São as seguintes as questões a resolver: 3.1. Deve ser aceite a dedução fiscal dos custos com seguros no valor de 7.097.288$00 e consultadoria no valor de 4.112.455$00 facturados pela ..&... Media Holding NV? (sublinhado nosso).

H. No entanto, o tribunal a quo nunca se pronuncia sobre o custo com a consultadoria que foi facturado pela ...&....Media Holding NV no valor 4.112.455$00, não se pronunciando assim sobre uma das questões que expressamente considera serem de resolver, sendo manifestamente nula nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil.

I. A AT colocou sistematicamente em causa a veracidade dos dados contabilísticos da Recorrente, sem apresentar qualquer erro, inexactidão ou outro indício fundado para esse efeito, violando assim a presunção de veracidade estabelecida no 78.º do antigo CPT.

J. Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, ficou provado que a Recorrente devia os montantes contabilizados como custo pelos seguros registados na conta Seguros –CEE – Produção e ficou completamente provado que a Recorrente liquidou estes montantes, pelo que a Sentença Recorrida deverá ser revogada e deverá ser anulada a liquidação adicional impugnada nesta parte.

K. Refira-se, aliás, que mesmo tendo em conta a matéria de facto dada como provada pela Sentença Recorrida, nunca poderia o Tribunal a quo manter a liquidação impugnada nesta parte,uma vez que a AT nunca apresentou qualquer indício minimamente sério de que a contabilidade não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte.

L. Assim, tanto AT como o Tribunal a quo ignoraram ostensivamente a presunção de veracidade da escrita do contribuinte, estando esta organizada segundo a lei comercial e fiscal, ignorando os custos registados com os seguros, devidamente suportados com facturas e os certificados da seguradora, sem para o efeito apresentarem “indícios sérios e credíveis de que as operações constantes das facturas não se realizaram efectivamente” –pelo que a liquidação viola o disposto no artigo 78.º do antigo CPT nesta parte.

M. O Tribunal a quo considerou como provado, no item 7), que “Encontram-se previstos no contrato de 01/05/1994 entre a .....& ... media Holding Nve a ..... &.... A.......... SA, Serviços de Consultadoria – doc. Fls. 131 e 132 dos autos”, mas omitiu, entre outros, o facto provado pela Recorrente de que as facturas emitidas pela Holding à Recorrente pelos serviços de consultadoria prestados pela Holding foram, efectivamente, pagas.

N. Mesmo tendo em conta apenas a matéria de facto dada como provada pela Sentença Recorrida, nunca poderia o Tribunal a quo manter a liquidação impugnada nesta parte, uma vez que a AT nunca apresentou qualquer indício minimamente sério de que a contabilidade não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte.

O. Decidiu já este Alto Tribunal, reiteradamente, que: “Nas despesas devidamente documentadas tem de presumir-se a veracidade do custo para efeitos de determinação do lucro tributável em sede de IRC” (conforme Acórdão n.º 200/03 de 17-12-2003), presunção essa que não foi respeitada pela AT ou pelo Tribunal a quo.

P. O Tribunal a quo concluiu pela improcedência da impugnação judicial quanto à dedutibilidade uma provisão por crédito de cobrança duvidosa, referindo o seguinte;

“É inaceitável que a impugnante conceda crédito a uma empresa que sabe que não lhe vai pagar, quando ambas as empresas têm as mesmas pessoas a dirigi-las, (logo, quando concede o crédito, sabe que não vai receber). Se o fez efectivamente, então, foi com conhecimento evidente que não ia receber o dinheiro. Logo, estes montantes não podem ser aceites como crédito mal parado porque injustificado.”.

Q. Salvo o devido respeito, a decisão do tribunal a quo quanto a esta questão é, no mínimo, surrealista.

R. A Recorrente nunca “concedeu crédito” à A............. ou a qualquer outra entidade, nem os autos versam sobre qualquer concessão de crédito!!!

S. Conforme consta dos autos e foi longamente falada na inquirição de testemunhas, a provisão para crédito de cobrança duvidosa que não foi aceite pela AT foi constituída porque a A............. não pagou uma factura emitida pela Recorrente, factura essa que dizia respeito a serviços de produção prestados pela Recorrente à A............. (no âmbito da produção do programa televisivo “M.................” contratado com a SIC, conforme ficou igualmente provado).

T. A AT nunca colocou em causa que o facto do crédito que a Recorrente detinha sobre a A............. estar em mora há mais de 6 meses (a factura foi emitida em 07.07.94 e a provisão constituída no final do exercício de 2005).

U. Por outro lado, o Tribunal a quo deu como provado que a Recorrente e a devedora tinham nos órgãos sociais as mesmas pessoas, tendo igualmente ficado provado nos autos que a contabilidade de ambas as empresas era também efectuada pelas mesmas pessoas.

V. Desta forma, o facto da Recorrente não ter apresentado à AT provas de terem sido efectuadas diligências para o recebimento da factura em causa, deixa de ser relevante, tendo em conta que os órgãos sociais e contabilidade de ambas as empresas era realizada pelas mesmíssimas pessoas.

W. Aliás ficou provado testemunhalmente (o que tem sido sempre admitido pela jurisprudência) que essas diligências ocorreram – ou melhor, não podiam deixar de ocorrer, em virtude dos órgãos sociais de ambas – e também do facto do serviço de contabilidade ser realizada pelas mesmas pessoas – as empresas serem exactamente os mesmos.

X. A insistência na prova escrita nesta situação particular demonstra que a AT subscreve um delirante positivismo extremadoa forma pela forma – que vai contra os princípios basilares do Direito Fiscal!

Y. De acordo com o entendimento da AT, se uma pessoa na contabilidade ou num órgão social da Recorrente tivesse escrito uma carta a si própria pedindo o pagamento de uma factura que sabia que não podia pagar, aí a provisão já seria aceite fiscalmente!!

Z. Resulta do exposto que, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, a dedutibilidade fiscal da provisão não apresenta qualquer impedimento legal, pelo que a Sentença Recorrida deverá ser revogada e deverá ser anulada a liquidação adicional nesta parte.

AA. O n.º 2 do artigo 18.º do Código do IRC admite que os custos manifestamente desconhecidos à data do encerramento do exercício sejam deduzidos no exercício seguinte, tendo sido exactamente o que sucedeu com a Recorrente no que diz respeito às 3 facturas emitidas pela C........... que se extraviaram, pelo que a liquidação deverá ser anulada nessa parte.

BB. A AT considerou que as provas apresentadas pela Recorrente quanto ao pagamento das facturas emitidas pela A.............. e P.................. não eram aceitáveis, pois considerou que os pagamentos a não residentes têm de ser feitos por transferência bancária, e só esta transferência poderá provar a efectiva saída do dinheiro para o estrangeiro.

- Não houve contra-alegações.

- O EMMP, junto deste Tribunal, emitiu o douto parecer de fls. 391 pronunciando-se, a final, no sentido de, a final, ser revogada a decisão recorrida e anulada a liquidação impugnada.

*****


- Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

- A sentença recorrida, com suporte na prova documental carreada,- com especial destaque para as expressamente referenciadas no probatório -, e testemunhal produzida, nos autos, e segundo alíneas da nossa iniciativa, deu por provada a seguinte;

- MATÉRIA DE FACTO -


A). A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção por parte dos Serviços de Inspecção Tributária da 1.ª Direcção de Finanças de Lisboa, ao exercício de 1995, que originou a liquidação de IRC n.º..................... – Doc. fls. 105 e 21 dos autos.

B). A Administração Tributária não aceitou custos no montante de 25.493.760$00 relativo às facturas encontradas nas rubricas de “Seguros – CEE – Produção e Consultadoria”, “Conservação e Reparação” e Royalties – Doc. fls. 21 e ss..

C). Não aceitou ainda, os custos no montante de 23.200.000$00 relativos a uma provisão constituída para créditos de cobrança duvidosa, nem custos no montante de 3.020.000$00 que considerou deverem ser contabilizados no exercício de 1994, e considerou existir imposto em falta no montante de Esc. 1.294.593$00 relativamente ao pagamento de royalties – Doc. fls. 21 e ss..

D). A Administração Tributária relativamente às rubricas “Seguros – CEE – Produção e Consultadoria” não aceitou os respectivos montantes, 7.097.288$00 “Seguros – CEE – Produção” e 4.112.455$00 “Consultadoria”, como custo, por considerar que as facturas que os justificam têm todas as características de “facturas de favor” – Doc. fls. 27 e ss..

E). Entendeu que as facturas têm aquelas características por:
a) terem sido emitidas pela empresa “... & .... Media Holding NV” que é accionista principal do grupo “..... & ..... Media Group”,
b) tendo sido solicitada à impugnante a apresentação do respectivo contrato ter sido referido pela impugnante que “por lapso ou perda, a empresa não possuía aqueles contratos”
c) tendo sido solicitada à impugnante a prova de pagamento, ter sido respondido que ainda não havia sido feito esse pagamento, excepto quanto a uma factura no valor de 925.560$00, que foi paga.
d) A empresa suportar vários tipos de seguros no mercado nacional no montante de 5.936.026$00 – Doc.fls. 27 e ss..

F). A impugnante no ano de 1995 foi beneficiária de seguros da C................... doc. fls. 124 dos autos.

G). Encontram-se previstos no contrato de 01/05/1994 entre a ..... &.... Media Holding NV e a..... &..... A................... SA, Serviços de Consultadoria –doc.fls. 131 e 132 dos autos.

H). Relativamente à rubrica “Conservação e Reparação”, a AT não aceitou o custo de 2.810.340$00, constante de duas facturas da empresa “... & ........................” por considerar que não foi feita a prova do seu pagamento, tendo sido efectuada uma transferência daquele valor da conta de fornecedores para a conta de valores a regularizar, e por os nomes dos intervenientes serem os dos responsáveis da “.... & .... A............, SA”, e, assim, ter entendido que existiam indícios de “facturas de favor” – Doc. fls. 28.

I). Quanto às Royalties, a AT verificou que tinham sido contabilizadas facturas emitidas por duas entidades não residentes, “A.........” e “P.....................” no montante de 11.473.677$00 – Doc. fls. 28 e ss..

J). A AT considerou que existiam indícios de facturas de favor por:
a) ter sido efectuada em Dezembro de 1995 a transferência do valor daquelas facturas da conta de fornecedores para uma conta de valores a regularizar,
b) após ter sido solicitada a prova do pagamento à impugnante, a AT ter considerado que não foram apresentadas provas fidedignas – Doc. fls. 28 e ss..

K). Os montantes contabilizados como Royalties correspondiam a serviços prestados por várias entidades – depoimento da testemunha M.................

L). As correcções relativas à não retenção na fonte quanto ao pagamento de Royalties, não foram consideradas nem contabilizadas para efeitos de serem acrescidas à matéria colectável nesta liquidação controvertida – Doc. fls. 21 e ss., em especial 23, e fls. 105.

M). Relativamente à “Provisão para créditos de cobrança duvidosa”, de 23.200.000$00, a impugnante não apresentou à AT provas de terem sido efectuadas diligências para o recebimento da factura em causa – Doc. fls. 31 e ss..

N). A impugnante e a devedora tinham nos órgãos sociais as mesmas pessoas – Doc. fls. 31.

O). O valor de 3.020.000$00 não foi aceite como custo pela AT por o mesmo constar de facturas que vieram substituir outras de Junho de 1994 em virtude do seu extravio, entendendo assim que este custo não era imprevisível ou manifestamente desconhecido da impugnante em 1994 – Doc. fls. 32.

P). A impugnante não controlava a conta corrente referente aos serviços prestados pela outra sociedade – depoimento das duas testemunhas inquiridas.
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- Mais se deram como não provados, quaisquer outros factos diversos dos referenciados nas precedentes alíneas, enquanto relevantes à decisão de mérito a proferir e, particularmente, os seguintes;
§ Os seguros internacionais em causa eram de um tipo que as seguradoras portuguesas não faziam;
§ A Holding fazia o seguro para todo o grupo, imputando depois os custos;
§ As facturas tivessem sido pagas à Holding após 2002.
§ Que a impugnante, posteriormente a 2001, pagou as facturas relativas à consultadoria feita pela casa mãe.
§ Que a impugnante tenha pagou serviços às sociedades “A...............”, “P.............” e “.....&....”, nem tão pouco, que relativamente àquelas duas primeiras, que tivessem sido efectivamente prestados os serviços.

- Em sede de fundamentação do julgamento da matéria de facto tida por não provada e acima transcrita, consignou-se, expressamente, na decisão recorrida, o seguinte;

“(...)
A não prova” dos factos relativos aos seguros deveu-se “(...) à inexistência de uma qualquer apólice de seguro emitida no ano em questão (mesmo o documento de fls. 124 só foi emitido em 2000), o que é manifestamente contrário aos costumes comerciais, bem como à inexistência de comprovativos de pagamentos que coincidam com os valores em causa e que lhes façam directamente referência:
(...).”

No que concerne à falta de prova de pagamentos das facturas referentes a consultadoria feita pela casa-mãe, ela ficou a dever-se aos “(...) mesmos motivos”.

Nesta matéria e no que respeita aos alegados serviços prestados pelas sociedades “A...........”, “P...............” e “....&...”, o julgamento empreendido pela decisão recorrida ficou a dever-se ao “(...) facto da prova produzida não ser suficientemente convincente.”.

- Mais se refere(iu), ainda, na decisão ora em crise que “As correcções relativas à não retenção na fonte quanto ao pagamento de Royalties, não foram consideradas nem contabilizadas para efeitos de serem acrescidas à matéria colectável nesta liquidação controvertida, porque a matéria colectável de 58.676.272$00 – 6.962.512$00 resulta em 51.713.760$00, que é o montante das correcções técnicas impugnadas, que dão o imposto liquidado de esc.: 31.681.734$00, e que é a liquidação impugnada tudo conforme Doc. fls. 21 e ss., em especial fls. 23, e fls. 105.

*****

- ENQUADRAMENTO JURÍDICO -


- Nas suas conclusões de recurso a recorrente imputa, desde logo, à decisão recorrida, vício de forma, fulminado com a nulidade e consistente em omissão de pronúncia, vício esse que logra prioridade de apreciação.

- Na realidade, nas conclusões F) a H), inclusive, a recorrente sustenta que, apesar do Mm.º juiz recorrido ter indicado, ele própria, entre as questões a resolver as de saber se é de aceitar a dedução fiscal com custos de seguros e de consultadoria, nos valores, respectivamente, de 7.097.288$00 e 4.112.455$00, ambos facturados pela “.... & ... Media Holding NV”, não emitiu, no entanto, qualquer pronúncia no que toca ao custo de 4.112.455$00 referente à consultadoria.

- Ora e como é sabido o vício de omissão de pronúncia prende-se com o poder vinculado do Juiz, enquanto entidade decidente, de apreciar todas as questões que, enquanto tal, lhe sejam submetidas pelas partes litigantes, salvo se e na medida em que tal conhecimento se mostre prejudicado pela solução que haja sido dada a outra ou outras (cfr. art.º 660.º/2 do CPC, “ex-vi” art.º 2.º/e do CPPT).

- E, na esteira de jurisprudência e doutrina pacífica, citando-se, a título meramente exemplificativo, um Ac. deste Tribunal (1) “Questões para este efeito são «todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes» (...) e não podem confundir-se « as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão» (...).Ou como aponta Rodrigues Bastos (...), as questões a que se reporta o aludido normativo são questões sobre o mérito da acção suscitadas quer pela causa de pedir invocada, quer pelo pedido formulado (...)”.

- Assim, o que releva à questão de saber se ocorre vício de omissão de pronúncia, dando de barato que o juiz não conheceu uma qualquer questão, nos termos acima referidos, é apurar se tal questão foi, efectivamente, submetida á sua apreciação nos articulados, e não já, se o juiz a elencou como uma das questões decidendas e depois não apreciou.

- Ora, no caso, se é certo que a recorrente não deixa de afirmar, no seu articulado inicial, insurgir-se contra a totalidade das correcções técnicas operadas pela AT, ao rendimento colectável declarado, em sede de IRC e para o exercício de 1995, pretendendo ver aceitação aquele rendimento declarado (cfr., v.g., art.º 59.º da PI), a verdade é que na invocação das razões de facto (causas de pedir) por que pretende aquele resultado final se debruçou, isoladamente, em cada uma das correcções operadas, como, aliás, ela própria o afirmou ir fazer em 8.º da daquele mesmo articulado.

- Ora, cotejando o articulado inicial com o relatório da acção inspectiva que está na base das referidas correcções, constata-se que, uma delas, no valor global de Esc. 25.493.760$, respeita(ou) a “Fornecimentos e Serviços Externos” (cfr., v.g., art.º 5.ºda PI e fls. 33 dos autos); Mas este valor global é o resultado do conjunto das correcções operadas no âmbito de seguros, consultadoria, conservação e reparação, e ainda por referência a facturas emitidas por duas sociedades não residentes, como o atesta o ponto 6.2. do relatório e constante de fls. 27 a 31 dos autos.

- A recorrente, por seu turno, no articulado inicial, reportou-se a estas correcções nos art.ºs. 9.º a 28.º, inclusive, do mesmo; Ora o que se nos afigura é que a recorrente, em nenhum de tais artigos (como, aliás, no total do articulado inicial), em parte alguma colocou ao Tribunal recorrido, como o fez para as restante rubricas corrigidas, qualquer questão relativa a uma ilegal correcção da referida “consultadoria”, não se podendo, a nosso ver, considerar que tal questão foi suscitada de uma forma geral e abstracta, em decorrência de pretender o atendimento do rendimento declarado e, assim, considerar ilegal a totalidade das correcções, não só porque tal não consubstancia nenhuma causa de pedir adequada, como porque, no que se refere ás restantes rubricas e como acima se referiu, a recorrente fundamentou, de facto e de forma casuística, as razões porque entende que as correcções aí operadas enfermam de ilegalidade.

- Mas sendo assim então impõe-se concluir que se não mostra violado o comando legal constante do n.º 2 do art.º 660.º do CPC.

Erro de Julgamento da Matéria de Facto:

- Nas quatro primeiras conclusões de recurso, a recorrente acusa a decisão recorrida de erro de julgamento no âmbito da matéria de facto nuclearmente porque entende ter sido feita, nos autos, prova cabal de factualidade relevante à decisão de mérito a proferir, e que elenca na última de tais conclusões (concl. E)), a qual, contudo, não foi transposta para o probatório

- Respeitando as correcções à matéria colectável apresentada referente ao exercício de 1995 e operadas pela AT a operações declaradas pela impugnante e relativas a (a)seguros feitos no mercado externo comunitário, a (b)consultadoria prestada pela “Holding” do grupo económico em que se insere a recorrente, a (c)provisão constituída para créditos de cobrança duvidosa, a (d)violação do princípio da especialização de exercícios e a (e)serviços prestados por três empresas não nacionais, o inconformismo da recorrente com o decidido, neste âmbito (matéria de facto) reporta-se a qualquer delas, pelo que, na apreciação do recurso nesta matéria nos iremos debruçar sobre cada uma delas.

- Vejamos então;

a) Seguros;

- Quanto aos seguros verifica-se, do relatório da acção inspectiva a que foi sujeita a recorrente e que está na base das correcções em questão, que a AT constatou que a impugnante houvera contabilizado custos no valor global de Esc.; 7.097.288$ referentes a facturas emitidas pela “holding” do Grupo – a ....& ....Media Holding NV – e respeitantes a seguros efectuados no mercado externo comunitário; Ora, a AF, porque lhe não foram exibidos os contratos referentes a tais seguros, - que foram solicitados à impugnante que justificou a sua não apresentação “por lapso ou perda” –, ainda porque apenas foi comprovado o efectivo pagamento de parte daquela importância, no montante de Esc. 925.560$, afirmando, a impugnante, que o remanescente se encontrava em dívida, e ainda porque a recorrente suportou, nesse ano, seguros no mercado nacional no valor de Esc. 5.936.026$, não aceitou tais custos, considerando, por um lado, que os mesmos não se revelavam necessários à formação dos proveitos e, por outro, que as facturas em questão, emitidas pela “holding” tinham «(...) todas as características de “facturas de favor” (...)» - cfr. fls. 27 dos autos.

- A recorrente insurge-se contra o decidido nesta matéria porque considera que fez prova cabal da existência dos referidos seguros que, além do mais, demonstrou igualmente e com documentação junta com as alegações em 1.ª instância, terem sido, entretanto, liquidados.

- Diga-se, desde já, que confrontando a documentação junta pela recorrente com as suas alegações pré-sentencias, não se nos apresenta líquido a demonstração do efectivo pagamento das facturas em causa emitidas pela “holding” do grupo; Contudo, tal circunstância também se nos não afigura como essencial à decisão da legalidade ou ilegalidade da actuação da AT, ao não aceitar como custos de exercícios as importâncias relativas aos referidos seguros.

- É que, a nosso modo de ver, assume particular relevância à decisão a proferir a final,- e não só no que à questão dos seguros se refere -, a consideração de que, por atendimento ao referido princípio da especialização de exercícios, o que efectivamente relevará será a circunstância do sujeito passivo ter, ou não, efectivamente incorrido na realização de determinadas operações, acarretando despesas, num determinado momento, na medida em que tais despesas sejam necessárias ao normal desenvolvimento da actividade daquele, nos termos do exigido pelo art.º 23.ºdo CIRC.

- Ora, dentro desta linha argumentativa, cabe referir que, a nosso modo de ver, a recorrente fez, efectivamente, prova de ter incorrido nos referidos custos com seguros; E fê-la, não só documentalmente, como testemunhalmente.

- Assim, do ponto de vista documental, a recorrente juntou aos autos documentação, que não foi directamente impugnada pela AT, e que certifica a realização dos aludidos seguros em 1995, como parece irrecusável concluir-se em face dos docs. que consubstanciam fls. 120 a 127, inclusive, dos autos.

- Por outro lado, a observação/contestação, a tal documentação, constante do relatório da acção inspectiva – cfr. fls. 35 dos autos – afigura-se-nos destituída de pertinência já que se é um facto que a aludida documentação, nalguns casos, se reporta a períodos que não respeitam ao exercício de 1995, não é menos verdade que esse mesmo suporte documental se reporta, pela positiva, a vários períodos de 1995,nalguns casos por reporte a programas televisivos específicos.

- E a realização de tais seguros foi, igualmente, confirmada pelas testemunhas inquiridas, que relevaram razão de ciência adequada aos depoimentos prestadas (uma ex e uma actual técnicas de contas da impugnante), tendo mesmo sido afirmado pela segunda delas a razão da necessidade de tais seguros na medida em que as seguradoras nacionais, que foram procuradas para o efeito, os não realizavam, uma vez que só seguravam a “cassete”, o que era mínimo em relação ao valor da produção que acabava por ser seguro fora fronteiras; E mais esclareceram, ainda, a conveniência comercial, por parte da “holding”, desses seguros de produção, relativamente às diversas empresas do grupo a operarem em mercados distintos, entre os quais a impugnante, no nosso País, a quem imputavam, depois, os custos respectivos, por se tornar mais económico relativamente aos mesmos seguros se efectivados individualmente por cada uma das aludidas empresas, o que bem se compreende e aceita e, nessa medida se justificando que as respectivas facturas fossem emitidas pela “holding” à impugnante e não directamente pela(s) seguradora(s).

- Por consequência, perde pertinência o argumento suscitado pela AT de que a impugnante suportou seguros no nosso País no valor de Esc. 5.936.026$, uma vez que não individualiza nem coteja esses seguros com aqueles que se encontram em discussão sendo certo que aquela – impugnante -, desde o direito de audição que vem referindo que os seguros em causa não eram, sequer, realizáveis em seguradoras nacionais – cfr. fls.112/113 dos autos -.

- Por isso se considera que assiste razão á recorrente nesta matéria, havendo, nessa medida, que aditar, a coberto do disposto no art.º 712.º/1 do CPC, ex vi do art.º 2.º/e, do CPPT, as seguintes alíneas ao probatório:

R). A impugnante incorreu, no exercício de 1995, em despesas com a realização de seguros de produção, realizados em mercados externos – cfr. docs. de fls. 120 a 127,inclusive e depoimentos testemunhais prestados em audiência de julgamento;

S). Foi diligenciada a realização de tais seguros no mercado interno, através de empresas nacionais que, contudo, apenas admitiram segurar a “cassete”, de valor infímo –cfr. depoimento da 2.ª testemunha -;

T). Os seguros em questão foram concretizados pela “holding” do grupo em que se integrava a impugnante, - a ...&.... Media Holding NV -, por estratégia comercial, na medida em que menos onerosos do que se realizados individualmente por cada um das empresas – cfr. depoimentos testemunhais referidos;

U). Subsequentemente a “holding” imputava a cada uma das empresas do grupo, entre as quais a impugnante, as despesas com os referidos seguros, na medida em que a elas respeitassem – cfr. depoimentos testemunhais prestados.

b) Consultadoria;

- No que a esta matéria diz respeito a AF não aceitou como custos de exercício o valor de Esc. 4.112.455$, ancorando-se, para o efeito e exclusivamente, “(...) nos mesmos motivos indicados para os seguros e ao abrigo da mesma disposição legal”cfr. fls. 27, “in fine”.

- Diga-se que, de igual forma, a impugnante sustenta nas suas alegações de recurso ter feito prova de que pagou os referidos Esc. 4.112.455$, através dos docs. que juntou, de igual forma, com as alegações em 1.ª instância e consubstanciados de fls. 266 a 278, inclusive, dos autos, documentos esses que, tal como para o seguros, o Mm.º juiz recorrido não terá ponderado.

- Tais docs. consubstanciam;
§ Uma nota explicativa, da autoria da impugnante – fls. 266;
§ Oito facturas e uma nota de crédito, demonstrativas do valorem causa – fls. 267 a 275,inclusive;
§ Três documentos bancários, emitidos pelo B......., comprovativos de pagamentos sobre o estrangeiro e em favor da “holding”.

- Ora, da análise que conseguimos fazer de tais documentos, não se nos afigura que deles se possa extrapolar, de forma líquida, que a recorrente pagou, efectivamente, as importâncias referentes á consultadoria alegadamente prestada pela “holding” do grupo.

- Assim e desde logo cabe notar que os valores pagos pela referida entidade bancária nacional, expurgados dos valores referentes a despesas bancárias e imposto, ascendeu a € 24.938,70 (9.975,00+9.975,72+4.987,98), o que corresponde a Esc. 4.999.760$, o que é um valor que em nada coincide com a importância aqui controvertido de 4.112.455$.

- Por outro lado, estando, facturas e nota de crédito, datadas de 1995, nenhuma prova se faz da taxa de câmbio utilizada e da sua conformidade legal no sentido de poder aferir que o valor creditado através da nota que constitui fls. 235 dos autos, no valor de 235.000 Francos Belgas corresponde ao diferencial que, deduzido do valor facturado, que, de igual forma se não sabe como apurada a sua correspondência a Esc., permite apurar o valor final aqui em causa de Esc. 4.112.455$.

- Mas, também aqui, para a consideração de tais despesas como custos de exercício o que releva é saber se a impugnante incorreu nas mesmas, independentemente de as ter, ou não liquidado e, na afirmativa, em que momento, sendo certo que, o ao invés do que sustenta a recorrente nas suas alegações (cfr. 160.º de tal peça processual, a fls. 360), a AF ao não aceitar estes custos não se suportou, apenas, na falta de prova do respectivo pagamento e em consideração da entidade credora ser a “holding”, mas, ainda e também, por força da remessa para a fundamentação da não aceitação dos custos referentes a seguros, por considerar que as respectivas facturas eram “facturas de favor” o que, necessariamente, trás pressuposto a não aceitação das operações a que correspondem as despesas em causa.

- Ora, em face do que se vem de referir, particularmente no que concerne á prova documental referida, o que se acabou por demonstrar foi o que referiram as testemunhas inquiridas que, reafirme-se, apresentam razão de ciência adequada e cuja credibilidade e idoneidade não se encontra, minimamente, posta em crise.

- E, qualquer delas foi peremptória a afirmar que a “holding”, no exercício em questão, concedeu apoio à impugnante, que se traduziu, designadamente, na realização de reuniões com elementos daquela, em acompanhamento da gestão da recorrente, que do mesmo estava carecida em virtude de ser uma empresa nova no mercado, constituída em 1994, sendo certo que a “holding” era mais antiga e, por isso, com mais experiência .

- Por consequência, tal matéria, tanto quanto possível expressando os depoimentos prestados, deverá ser transposta para o probatório, à luz das possíveis soluções de direito e, por isso, independentemente, da relevância que venha a ter para o sentido decisório final.

- Nessa medida, adita-se, nesta matéria, a seguinte alínea ao probatório;

V). No ano de 1995 elementos da ....&...... Media Holding NV vieram a Portugal, para reuniões com elementos da impugnante com objectivos de acompanhamento da respectiva gestão em virtude da pequena experiência da última formada em 1994 – cfr. depoimentos testemunhais.

c) Provisão para créditos de cobrança duvidosa;

- Quanto a esta correcção o que a recorrente pretende é que se adite ao probatório matéria de facto, que entende ter sido provada, designadamente através da prova testemunhal, que ateste a existência do crédito, por parte da impugnante sobre a “A................, Ld.ª”, facturado em 94, pelo valor de Esc. 46.400.000$, que se encontrava em mora e por pagar.

- E afigura-se-nos que, também aqui, a prova produzida por via testemunhal permite concluir que, na realidade, a “A.................”, contratou com a empresa de televisão SIC, a produção de um programa de automóveis, denominado “M.............” que, aquela, por sua vez subscontratou na impugnante; tal programa, no entanto não chegou ao fim, tendo sido cancelado pela estação de televisão.

- Por outro lado a “A.......................” não liquidou à impugnante a referida factura relativa à subcontratação na produção do aludido programa.

- Mas, do mesmo passo que os referidos depoimentos referem o que se acabou de dizer, atestam, de igual forma e com idêntica veemência, que a impugnante nenhuma diligência efectiva fez no sentido de cobrar tal crédito, na medida em que partiu do princípio que ela não seria paga por saber das dificuldades de tesouraria daquela, uma vez que eram as mesmas as pessoas dos órgãos sociais de uma e de outra, da mesma forma que as respectivas contabilidades eram realizadas pelas mesmas pessoas e que, “por isso, tinham de saber” de tal realidade.

- Assim entende-se ser aditar, nesta matéria, ao probatório, a seguinte fcatualidade;

X). A impugnante,no exercício de 1995, constitui uma provisão para créditos de cobrança duvidosa, no valor de Esc. 23.200.000$ - cfr. fls. 31 dos autos.

Y). O crédito em causa respeita a uma factura, no valor de Esc. 46.400.000$, de 1994, emitida pela impugnante à empresa “A.....................” que é, igualmente, uma empresa do grupo económico em que se insere a recorrente – cfr. relatório da acção inspectiva;

Z). O crédito em questão refere-se à subcontratação da “A............., ld.ª” na impugnante, da contratação que aquela primeira fez com a estação de televisão SIC, para a realização de um programa de automóveis, denominado “M.............” – cfr. depoimentos testemunhais prestados;

Y). O programa televisivo mencionado na precedente alínea não chegou ao fim por ter sido cancelado pela SIC.

Z). A impugnante jamais diligenciou, por qualquer forma, a cobrança do crédito a que se reportam as quatro precedentes alíneas – cfr. depoimentos testemunhais, particularmente o prestado pela 2.ª testemunha.


d) Violação do Princípio da Especialização de Exercícios;
- No que concerne ás correcções de exercício anteriores, no valor de Esc. 3.026.810$, o que os autos permitem inferir é que, as mesmas se reportam a três facturas emitidas pela “C...........”, enquanto fornecedora da recorrente, no exercício da sua actividade normal de aluguer de estúdios, e que, atendendo ao volume das prestações de serviços, havia uma espécie de conta-corrente em que, à medida que chegavam as facturas elas eram pagas; Contudo no que concerne às três facturas em questão elas ter-se-ão extraviado, já que não chegaram à posse da recorrente que delas apenas teve conhecimento quando da revisão oficial feita pelo ROC no final do ano, em face da informação prestada pela “C...........” nesta matéria e que não coincidia com o contabilizado pela impugnante.

- Por consequência e independentemente da relevância que se venha a entender ser de conferir a tal factualidade, para a solução de direito que se entende ser de aplicar, deve a mesma ser levada ao probatório que, assim e em conformidade, se adita com mais as seguintes alíneas;

Aa). A impugnante contabilizou como custo do exercício de 1995, a importância de Esc. 3.026.810$ relativa a três facturas emitidas pela empresa “C...........” datadas de 1995DEZ29 – cfr. fls. 32 dos autos;

Ab). Nos termos do descritivo de tais docs. atesta-se que os mesmos se destinaram a substituir outras tantas facturas, de JUN94, extraviadas – cfr. mesmas fls. 32 dos autos;

Ac). A impugnante apenas detectou a existência das facturas referidas em Aa)., no final do ano de 1995, quando o seu ROC, ao proceder á revisão final das contas, obteve da “C...........” a informação da existência das facturas de 1994 – cfr. depoimentos testemunhais;

e) Serviços prestados por empresas não nacionais (R&O, A....... e P.............);

- Diz, desde logo, a recorrente, que o Tribunal se esqueceu do facto, extremamente importante, de que, no que concerne á facturas emitidas por estas três empresas, a AF apenas “(...) colocou em causa a efectiva prestação de serviços porque considerou que a prova do pagamento dessas facturas não era convincente” cfr. art.º 105.ºdas alegações – o que não é, a nosso ver, inteiramente verdade já que, no que concerne às facturas emitidas pela “....&....” a AT, tal como se dá conta no probatório fixado em 1.ª instância – cfr. al. H). -, considerou ainda que, em face da identidade dos nomes dos intervenientes com os dos responsáveis da recorrente, tais facturas consubstanciavam “facturas de favor” o que coloca em questão a realização dos serviços facturados independentemente da prova do seu pagamento; Só no que respeita às outras duas empresas é que a AF coloca em crise a realização dos serviços facturados por considerarem inexistir provas fidedignas do respectivo pagamento, esclarecendo que, tratando-se de não residentes tal prova apenas poderia ser feita através de transferência bancária.

- Sem embargo de se não acompanhar o entendimento da limitação da prova, no caso de pagamentos a não residentes, à prova de transferências bancárias, o que é certo, é que, a nosso modo de ver e nos próprios termos do alegado pela recorrente, a prova dos referidos pagamentos não foi levada a cabo.

- Na realidade não se vislumbra como pretende, a recorrente, fazer tal prova, quando se arrima apenas e tal respeito, à seguinte factualidade alegada;
I- No que toca à R&O, que parte do valor em questão, na quantia de Esc. 1.598.340$ lhe foi paga através de cheques, cheques esses que, no entanto, foram emitidos a favor do responsável daquela, bem como de dois indivíduos, de nomes B............... e A............., relativamente aos quais não se invoca qualquer legitimidade para receber em nome da .....&....., com agravante do primeiro deles, (B...............)ser, antes, um dos “colaboradores” da impugnante – cfr. fls. 115 e 116 dos autos; O remanescente, por seu turno, já teria sido pago pelo referido colaborador (B........................) em virtude da impugnante, em 1995 atravessar grandes dificuldades – cfr. fls. 145 – o que significa que o referido B............. teria funcionado, em simultâneo, como cobrador, por conta da credora ......&.....e pagador por conta da devedora e recorrente, o que para além de se nos afigurar incompreensível não está minimamente demonstrado que, ainda que correspondam à realidade tais pagamentos àqueles dois individuos e feito, em simultâneo, por um deles, signifiquem o pagamento á ..&... das facturas em causa;
II- No que concerne às “A...........” e “P.........” valem, “mutatis mutandis” este mesmo tipo de considerações se tivermos em linha de conta que os pagamento teriam sido feitos ou a colaboradores da recorrente, de quem se desconhece qualquer relacionamento legitimador para receberem em nome de tais empresas, ou, uma vez mais em simultâneo, por um desses mesmos colaboradores, sempre o referido B.................

- Por outro lado, os depoimentos testemunhais prestados em audiência de julgamento são absolutamente ausentes sobre esta matéria, pelo que, o que se impõe concluir é que a recorrente nada provou, quer quantos aos referidos pagamentos, quer quanto ao efectivo incorrer de tais custos no exercício de 1995, pelo que nada há a acrescentar ao probatório nesta matéria, independentemente da relevância de tal ausência de prova, questão que apenas colide com a subsunção dos factos ao regime jurídico aplicável

*****
- SUBSUNÇÃO FACTUAL AO ENQUADRAMENTO JURÍDICO -


- Uma vez fixada a factualidade tida por relevante à decisão proferir importará, agora e por razões de sistematização, tecer algumas considerações sobre o regime legal aplicável;

- Ora, como é sobejamente sabido o nosso ordenamento jurídico consagra, como regime regra da tributação, o método declarativo, colocando nessa medida, na esfera de actuação dos particulares contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos; Mas porque assim é tem por inerente a contrapartida da exigência de uma cooperação estreita entre o contribuinte e a AT, no desiderato de se alcançar a tributação dos rendimentos reais, cooperação essa que impõe, desde logo, que aquele faculte à primeira, todos os elementos que viabilizem o correcto apuramento da respectiva situação tributária.

- Quando assim não suceda, ou seja, em caso da ruptura daquele dever vinculado a que o contribuinte se encontra(va) adstrito e por causa que lhe seja imputável, de cooperação com a AT, esta fica, “ipso facto”, não só legitimada mas verdadeiramente compelida, por força do princípio da legalidade tributária a que se encontra adstrita, a coligir os necessários elementos que viabilizem a concretização da obrigação a que se encontra sujeita, de controle e apuramento do efectivo, -ao menos tanto quanto possível-, do lucro tributável pelo recurso a uma metodologia alternativa, a saber por correcções técnicas ou por métodos indicários.

- Isto porque o recurso a qualquer de tais metodologias não depende de um critério discricionário da AFiscal, antes, qualquer deles constitui um seu poder vinculado, na estrita medida do necessário ao evitar da evasão fiscal por parte dos contribuintes faltosos, com o duplo objectivo, no mínimo, de evitar, por um lado o “emagrecimento” ilegítimo dos recursos do Estado e, por outro, de repartir equitativamente, como constitucionalmente imposto, a carga fiscal sendo que , ao que aqui e agora nos importa considerar, a AT se encontra vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos tributar e, ao invés, se tal apuramento se vier a revelar inviável, então não pode deixar de lançar mão dos métodos presuntivos, ainda que estes se revelem marcados “[...] por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação”, revelando-se como “uma última ratio fisci , ...”(2).

- Por outro lado, de acordo com as regras do ónus da prova em sede de direito administrativo tributário,- onde, há luz dos vigentes princípios de descoberta da verdade material e, da consequente, oficiosidade de investigação e indagação das provas, não há uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja, sem embargo de, pela impossibilidade de manutenção de um “non liquet” a ausência de prova de factos relevantes não poder deixar de desfavorecer quem com ela estava onerado-, é à AT que cabe a obrigação “... da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto , quando se mostrem verificados esses pressupostos ...” (3).

- Por outro lado a constituição de provisões inserem-se no âmbito de princípios de prudência consagrados no POC e prendem-se com a necessidade de acautelar consequências futuras, em face das suas implicações nos resultados finais de exercício, e decorrentes de factos certos presentes (do exercício) mas sujeitos a concretização futura fortemente indiciada.

- Como esclarece Vitor Faveiro, citado por Correia dos Santos (Neto) (4) “(...) são provisões de um certo exercício os lançamentos que, nesse mesmo exercício, se fazem na conta de resultados, como valores negativos, correspondentes a factos nele ocorridos mas cuja concretização fica dependente de eventualidades que só nos exercícios seguintes podem ocorrer».

- Ou seja, e com particular incidência nos créditos de cobrança duvidosa que, aqui, nos ocupam «do princípio da prudência, inscrito no POC e do facto de as provisões estarem conexionadas com este princípio, decorre que as “provisões para cobranças duvidosas” (conta 28) se destinam a “... fazer face ao risco da cobrança das dívidas de terceiros” e que o conceito de provisão anda ligado a perdas futuras de ocorrência provável. Pelo que, em termos contabilísticos, releva apenas e tão somente o “risco de cobrança”.» (5).

- E este “risco de cobrança” conexionado com os quantitativos a provisionar tem de ser objecto de uma criteriosa adequação, quer do ponto de vista qualitativo, quer do ponto de vista quantitativo, na medida que uma utilização de provisões desenquadrada da realidade prevísivel, num juízo de prógnose futura, terá como consequência um falsear dos resultados finais e do rendimento a tributar desde logo por uma possível criação de reservas ocultas(6) /(7).

- Por isso que, atenta tal necessidade de evitar uso indiscriminado e abusivo das provisões para cobrança de créditos duvidosos, a lei, depois de contemplar a respectiva dedutibilidade, sem delimitação deste conceito, tenha descido ao pormenor de tipificar as situações susceptíveis de consubstanciarem o referido risco de cobrança bem como, de forma taxativa, dos créditos atendíveis para este efeito, através das distintas alíneas dos n.ºs 1 dos art.ºs 33.º e 34.º do CIRC (8).

- Assim e como se escreve naquele já referido Ac. deste Tribunal «(...) como forma de prevenir a utilização abusiva da conta das provisões contabilísticas, permitida pelo uso do conceito indeterminado de “créditos de cobrança duvidosa” no art. 33º nº 1 al. a), o legislador efectivou uma delimitação desse conceito indeterminado, especificando nas diversas alíneas do nº 1 do art. 34º quais as provisões que no âmbito específico dos custos podem relevar fiscalmente:
- que os créditos resultem da actividade normal; l
- que sejam evidenciados como tal na contabilidade; .
- que, no final do exercício, possam ser considerados de cobrança duvidosa; .
- que esse “risco de incobrabilidade” se mostre “devidamente justificado”, o que ocorre sempre que se verifique uma das seguintes situações: .
- o devedor tenha pendente processo especial de recuperação de empresa ou processo de falência,
- os créditos tenham sido reclamados judicialmente, .
- os créditos estejam em mora há mais de 6 meses e se demonstre terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento. .
Foi objectivo claro do legislador, para efeitos fiscais, não deixar tais questões (não só o que deva considerar-se risco de incobrabilidade como também o momento em que esse risco ocorre ao arbítrio ou à subjectividade dos critérios de cada contribuinte..

- Por último no que concerne à indispensabilidade dos custos para a obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, prevista no art.º 23.º/1 do CIRC e aqui, também, em questão, não deixamos de nos identificar com a jurisprudência e a doutrina, quando preenche tal conceito por reporte ao interesse societário do sujeito passivo que pretende qualificar as (determinadas) despesas como custos fiscalmente relevantes e de que é exemplo, entre outros, o Ac. deste Tribunal, tirado no Proc. n.º 1.107/06, de 2007JUL17, para o qual remetemos.

- Acompanha-se, assim, o entendimento da ilegitimidade da administração pública, rectius da administração fiscal, em emitir juízos de valor sobre a bondade da gestão empresarial prosseguida, na esteira do escopo societário, sempre que tal juízo de valor reflicta uma pronúncia sobre a oportunidade de determinado tipo de conduta empresarial e, por maioria de razão, sobre a orientação dessa mesma conduta, enquanto conduta devida para a obtenção de ganhos.

- Isto é, acolhe-se o argumento de que a emissão de um juízo de valor sobre “(...) a bondade da gestão empreendida (...)”, por parte da AF, é ilegítimo para qualificação de uma determinado despesa enquanto custo ao abrigo do art.º 23.º/1 se e na medida em que essa aferição repousar numa ponderação de causalidade entre o custo e os proveitos.


- Delimitado, assim, o regime jurídico a que há que atender na resolução das questões que, aqui se controvertem, vejamos, então e agora,, qual a solução jurídica a consagrar pela subsunção ao mesmo da factualidade tida por assente.

- E a primeira referência que se nos afigura irrecusável de fazer é que, no caso dos autos, a recorrente não cumpriu, na plenitude exigida, com o princípio da cooperação com a AT a que estava vinculada – independentemente de quaisquer juízos de mérito que possam suportar a violação de tal dever -, uma vez que, como é afirmado no relatório, tinha contabilizado determinados custos aqui em causa para os quais não possuía os adequados documentos de suporte, seja no que concerne ao respectivo pagamento, seja no que diz respeito aos contratos que servem de suporte á realização das operações cujo custo não foi aceite; E tal violação legitima, por isso mesmo, a utilização, pela AF, da presente metodologia correctiva, na medida em que suficientemente adequada às rectificações devidas, como importa a transferência do ónus probatório para a recorrente, nos termos acima referidos.


a) Quanto aos seguros e consultadoria;

- Nesta matéria e como resulta da factualidade aditada ao probatório e com suporte nas razões justificativas então elencadas, há que concluir que a recorrente logrou demonstrar ter incorrido nas respectivas despesas no exercício de 1995, por um lado e, por outro, que o juízo empreendido pela AT no sentido que os respectivos custos não são de qualificar como necessários/indispensáveis à formação dos proveitos é ilegítimo precisamente porque se ancora numa aferição, para a qual a AT carece de legitimidade, de causalidade entre os custos e os proveitos (para além de que, no que concerne aos seguros, tal entendimento carece mesmo de qualquer fundamentação substancial enquanto se arrime à afirmada concretização de seguros no mercado nacional no valor de Esc. 5.936.028$, uma vez que se não sabe a que seguros de reporta a AF, sendo certo que a recorrente alegou e demonstrou que as seguradoras nacionais não os realizavam senão no que concerne ás “cassetes”

- E, por consequência, imperiosa se torna a ilação de que, nesta matéria, a razão se encontra do lado da recorrente que, assim, terá direito a ver considerados como custos de exercícios os declarados e relativos às referidas rubricas (Seguros e Consultadoria).

b) Quanto à provisão de créditos para cobrança duvidosa;

- Nesta matéria afigura-se-nos axiomática a conclusão de que a razão nunca pode ser dada à recorrente; É que, independentemente do mais, está demonstrado que a recorrente não diligenciou, por qualquer forma, a cobrança do crédito para que constituiu a provisão o que era um requisito legal inultrapassável imposto pela al. c), do n.º 1, do art.º 34.º do CIRC, na redacção anterior a 2001(9).

- Pretendia a recorrente ultrapassar tal questão de forma favorável à sua pretensão com a invocada circunstância de serem as mesmas as pessoas que compunham os órgãos sociais de devedora e credora, da mesma forma que eram as mesmas as pessoas que realizavam as contabilidades daquelas empresas, bem sabendo por isso das dificuldades de tesouraria da devedora e, nessa medida, conhecedora, a credora, do não pagamento.

- Afigura-se-nos, no entanto, um argumento sem qualquer consistência, tendo em linha de conta a imperiosa necessidade imposta por lei da demonstração da necessidade da provisão por impossibilidade de cobrança do crédito.

- É que, como aliás pretende a recorrente, a relevância de tal provisão, ao que aqui releva, não se repercute só, nem essencialmente, ao nível das relações entre a recorrente e aquela devedora, mas entre a impugnante e terceiros, no caso a Administração Fiscal, a quem tem de esclarecer fundadamente e sem margem para dúvidas, ter diligenciado a cobrança do crédito em causa.

- É que não há que esquecer – argumento, aliás, de que a própria recorrente se serviu nesta mesma matéria, como atesta o art.º 32.º da p.i. -, a impugnante a a “A........................, Ld.ª”, consubstanciam duas pessoas colectivas distintas, autónomas e com personalidades jurídicas próprias; Mas sendo assim é evidente que não é aceitável uma “promiscuidade” de relacionamento em que, em resultado da identidade das pessoas que compunham os respectivos órgãos sociais e que realizavam as respectivas contabilidades, se tomem, impunemente, decisões unilaterais em clara violação do determinado na lei, pretendendo auferir dos direitos por esta conferidos no pressupostos do seu estrito acatamento.

- Por consequência e independentemente daquela identidade de pessoas e do admissível (ainda que hipotético) conhecimento que tivessem, enquanto agentes junto da impugnante, de que a devedora não pagava por dificuldades financeiras, o que era imperioso era demonstrar que, apesar de tal convicção, a recorrente diligenciara, ainda assim, pela respectiva cobrança, já que só uma posição positiva da devedora perante tal tipo de interpelação, era adequada a legitimar da ilação de que o crédito era incobrável, circunstância que, como nos parece mais do que óbvio, nada tem a ver com qualquer positivismo extremado e, muito menos, delirante (cfr. conclusão W).

- E se a recorrente, como ela própria admite e se demonstrou à saciedade em sede de prova testemunhal, que nenhumas diligências fez, junto da “A...................., Ld.ª”, no sentido de cobrar o crédito em questão, é um axioma que bem procedeu a AT ao não aceitar a provisão em causa e, nessa mesma medida, bem decidiu o Mm.º juiz recorrido nesta matéria.

c) Quanto á violação do princípio da especialização de exercícios.

- Também aqui temos por líquido que a razão falece, por completo, à decisão recorrida;

- Na realidade e, uma vez mais, o que releva ao caso é o momento em que a recorrente incorreu nos custos, sendo esse o que releva para a sua relevância fiscal, é o momento da constituição da despesa, nos termos do estatuído pelo art.º 18.º do CIRC, como regime-regra; Contudo e tendo em vista a prevalência da realidade substancial que norteia o direito tributário, e tendo em linha de conta que a periodização do lucro tributável consubstancia um corte, ainda que necessário, no processo contínuo da vida das empresas, o legislador admitiu, a título excepcional, a violação do referido princípio da especialização de exercícios, devendo, ao que aqui releva, os custos serem atendidos no exercício em que são conhecidos, ainda que incorridos em exercícios anteriores, se os mesmos configurarem uma situação de imprevisibilidade ou de manifesto desconhecimento, por parte do sujeito passivo, no final do exercício em que foram suportados (cfr.n.º 2, do art.º 18.º do CIRC).

- “In casu”, sendo manifesto não se tratar de uma situação de imprevisibilidade, pretende, contudo, a recorrente ver atendidos os custos em causa, no exercício de 1995, sem embargo de terem sido suportados/incorridos no exercício anterior (1994), com suporte no segundo segmento da parte final do n.º 2 do referido art.º 18.º do CIRC, isto é no seu manifesto desconhecimento no final do exercício de 1994, por respeitarem a umas facturas emitidas pela “C...........”, em 1994, que se terão extraviado, e das quais a recorrente, por tal facto aliado à circunstância de ter um grande movimento com a referida “C...........”, para o que foi criada uma espécie de conta-corrente, em que as facturas eram pagas à medida em que iam chegando, apenas terá tido conhecimento no final do exercício de 1995, quando, na revisão final das respectivas contas, o ROC veio a apurar, através da “C...........”, a existência das facturas em questão, não contabilizadas pela impugnante.

- No entanto, a nosso modo de ver, a lei não de basta, para contornar o princípio da especialização de exercícios em causa, com a não intencionalidade do sujeito passivo em não obter vantagem ilegítima, já que tal princípio tem por desiderato a não adulteração dos resultados fiscais, independentemente de qualquer juízo de culpa, ainda que natureza meramente ético, imputável ao sujeito passivo; Nessa medida, as únicas circunstâncias legalmente admissíveis, ao que aqui nos importa e tal como passíveis de permitirem o atendimento de custos de um exercício anterior num exercício posterior são a imprevisibilidade ou o manifesto desconhecimento desses custos, por parte do sujeito passivo, no final do exercício a que os mesmos digam respeito.

- Ora e até porque a lei não deixa de estabelecer um paralelo de equivalência entre a “imprevisibilidade” e o “manifesto desconhecimento”, para os efeitos em questão, crê- -se que não é qualquer desconhecimento dos custos, ainda que, o mesmo se venha a demonstrar, por parte do sujeito passivo, que releva à excepção do regime-regra da periodização do lucro tributável; Antes terá de ser um desconhecimento fundamentado, no sentido de, não só desculpável como atendível, à luz do princípio de justiça, a fim de não penalizar excessiva e desproporcionadamente aquele sujeito passivo por não ter contabilizado o custo no exercício normalmente devido, em virtude de tal se ter ficado a dever a comportamento tido como normalmente exigível, segundo critérios de um “bonnus pater familiae”, assim se percebendo o “pé de igualdade”, que o legislador estabeleceu entre a “imprevisibilidade” e o “manifesto desconhecimento”, seguramente com objectivos de melhor alcançar a verdade material subjacente.

- De outra forma estaria aberta a porta para que um qualquer contribuinte “fugisse” ao princípio de periodização do lucro tributável, pelo simples desconhecimento dos custos, desde que não estivesse subjacente a tal desconhecimento a intenção de obter qualquer vantagem ilegítima; E, assim se entende a referência da lei ao “manifesto desconhecimento” e não apenas ao mero “desconhecimento”.

- Ora, no caso, o desconhecimento da recorrente, dando de barato que ele ocorreu, não tem nada de fundamentado, no sentido de lhe não ser exigível outro comportamento, uma vez que tudo se deve a uma deficiente elaboração da sua contabilidade que, ainda que por razões de incapacidade material mas que não são justificação, e decorrente de uma grande movimentação comercial entre ela e a “Cienmate”, se limitava a pagar as facturas que recebia desta última, à medida que tal sucedia, sem, necessariamente, qualquer controlo dos serviços que justificavam essas facturas, pois que se assim não fosse não podia deixar de conhecer os custos em causa e o momento em que foram incorridos.

- A nosso ver trata-se de um procedimento de todo inadmissível, até da perspectiva dos próprios interesses da recorrente, nas suas relações da “C...........”, já que a ter sido como afirmado, designadamente pelas testemunhas inquiridas, a recorrente acabava por pagar tudo o que lhe fosse facturado, devida ou indevidamente, já que não tinha qualquer controlo sobre os serviços que lhe eram debitados; E isto transporta-nos a uma outra ilação qual seja de que a ser assim, então a recorrente não pode deixar de estar, também, impossibilitada de demonstrar que incorreu nesses mesmos custos.

- Em resumo, pois, se conclui que o facto das facturas em causa se terem extraviado, dando de barato que assim tenha sucedido, não constitui circunstância subsumível ao conceito de despesas “manifestamente desconhecidas”, plasmadas na lei como necessárias à violação legal do principio da periodização do lucro tributável.

d) Quanto à prestação de serviços pelas “....&....”, “...............” e “P..........”;

- Finalmente, no que a esta matéria importa, também a conclusão final não pode deixar de ser desfavorável à recorrente, já que, como acima se referiu, no âmbito da apreciação a que se procedeu do julgamento da matéria de facto, a recorrente não só não provou o pagamento das facturas emitidas por tais entidades, como não provou a realização das operações que lhes estão subjacentes, sendo certo que, ao invés do que advoga, era a ela que incumbia tal prova já que a sua contabilidade não continha os necessários elementos demonstrativos da sua aderência á realidade, como lhe era imposto pelo princípio da cooperação a que se encontra sujeita, nos termos acima referidos, desde logo e na própria linha da argumentação que desenvolveu, no que concerne aos respectivos pagamentos, como, também acima, se referenciou.
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- D E C I S Ã O -

- Nestes termos acordam, os juízes da secção de contencioso tributário do TACS, em conceder provimento parcial ao recurso e, em consequência;
a) Em anular a decisão recorrida na parte em que decidiu que a correcção de custos operada pela AF, no que concerne às rubricas “Seguros – CCE – Produção” e “Consultadoria” era legal e, nessa mesma medida e por substituição, em julgar procedente a presente impugnação judicial determinando-se, em consequência a correspectiva anulação parcial da liquidação impugnada;
b) Em julgar improcedente o recurso no que toca ao remanescente das correcções, mantendo-se, nessa medida, a decisão recorrida, na ordem jurídica.
- Custas pela recorrente, em ambas as instâncias, na proporção em que não obteve ganho de causa.
08DEZ18
LUCAS MARTINS
PEREIRA GAMEIRO
JOSÉ CORREIA
(1) Cfr. Rec. nº. 958/98.
(2) Cfr. autor e obra citados , 302/303.
(3) Cfr. Ac. deste Tribunal , de 02.06.04 , tirado no Rec. 3.279/00.
(4) Cfr. Imposto único sobre o Rendimento , vol. II , comentários ao art.º 33.º do CIRC.
(5) Cfr. Ac. deste Tribunal de 06FEV21 , Rec. 7.016/02.
(6) Cfr. obra e local citado na nota 5.ª.
(7) No mesmo sentido o mencionado Ac. deste Tribunal.
(8) «De acordo com as alíneas do n.o 1 deste artigo, a enumeração das provisões aceites como custos fiscais não é exernplificativa finas sim taxativa, o que significa que , para além das enumeradas, mais nenhuma espécie de provisão é relevante para a Administração Fiscal .» - cfr. autor , obra e local referido na nota 5.ª.
(9) Como, aliás, o continua a ser em face do determinado pelo art.º 35.ºdo mesmo compêndio legal e resultante da referida revisão.