Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:909/09.6BESNT
Secção:CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO
Data do Acordão:12/19/2018
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EXAME E DECISÃO DE DOIS RECURSOS.
CRITÉRIO MERAMENTE CRONOLÓGICO COMO FUNDAMENTO PARA O EXAME DE UM DELES.
I.R.C.
NOÇÃO DE CUSTOS.
REQUISITO DA INDISPENSABILIDADE DE UM CUSTO.
SUBSÍDIOS JURISPRUDENCIAIS RELATIVOS À APLICAÇÃO DO ARTº.23, DO C.I.R.C.
O TRIBUNAL É LIVRE DE CONHECER DOS ASPECTOS JURÍDICOS DA CAUSA (CFR.ARTº.5, Nº.3, DO C.P.CIVIL).
OBRAS DE CARÁCTER PLURIANUAL. ARTº.19, DO C.I.R.C.
MÉTODO DO ENCERRAMENTO DA OBRA E MÉTODO DA PERCENTAGEM DE ACABAMENTO.
ARTº.19, Nº.5, DO C.I.R.C.
APURAMENTO DE RESULTADOS DE OBRAS EM QUE AINDA NÃO TENHAM SIDO SUPORTADOS OS CUSTOS TOTAIS.
PRÉVIA NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA DOS CUSTOS AO ABRIGO DO ARTº.23, DO C.I.R.C.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO DEVE BASEAR-SE NUM RESULTADO RACIONALMENTE SUSTENTADO.
ARTº.115, DO C.I.R.C., CONSAGRA AS OBRIGAÇÕES CONTABILÍSTICAS DOS SUJEITOS PASSIVOS DE I.R.C.
PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIOS.
PRINCÍPIO DA TRIBUTAÇÃO DAS EMPRESAS PELO RENDIMENTO REAL (CFR.ARTº.104, Nº.2, DA C.R.P.).
Sumário:1. Visando os recursos deduzidos o despacho identificado no probatório e que indeferiu, com base no mesmo fundamento, as reclamações da conta deduzidas por ambos os recorrentes, entende este Tribunal apreciar os mesmos com base num critério meramente cronológico, assim se começando por examinar e decidir a apelação apresentada pela Fazenda Pública (cfr.artº.124, do C.P.P.Tributário).
2. A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”. Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
3. Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito. Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
4. O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à A. Fiscal actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário.
5. Quanto ao enquadramento no aludido artº.23, do C.I.R.C., deve fazer-se menção a três subsídios jurisprudenciais relativos à aplicação de tal normativo:
a-É entendimento da jurisprudência que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa de cariz subjectivista. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr.artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica;
b-Um custo indispensável não tem de ser um custo que directamente implique a obtenção de proveitos. Há vários custos que só mediatamente cumprem essa função e que nem por isso deixam de ser considerados indispensáveis, nos termos do artº.23, do C.I.R.C.;
c-A questão do ónus da prova da indispensabilidade do custo passa ao lado da presunção de veracidade da escrita correctamente organizada (cfr.artº.75, nº.1, da L.G.T.) pois não se questiona a veracidade (existência e montante) da despesa contabilizada mas a sua relevância, face à lei, para efeitos fiscais, no caso, da sua qualificação como custo dedutível, em sede do citado artº.23, do C.I.R.C.
6. O Tribunal é livre de conhecer dos aspectos jurídicos da causa (interpretação e aplicação das regras de direito), com independência das razões invocadas pelas partes (cfr.artº.5, nº.3, do C.P.Civil).
7. Compreendem-se no artº.19, do C.I.R.C., as obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um (1) ano, isto é, aquelas cuja duração de execução se estende para além de um exercício económico. Nesta definição cabem, a título exemplificativo, a construção de pontes, barragens, estradas, edifícios, navios e bens de equipamento, não se circunscrevendo, portanto, à construção civil e empreitadas de obras públicas e privadas. São excluídas da previsão do preceito, todavia, as actividades de ciclo de produção ou de tempo de construção inferior a doze meses, embora com início e termo situados em dois períodos fiscais anuais diferentes. Consagra-se no preceito a possibilidade de as empresas que realizam obras de carácter plurianual adoptarem, na determinação dos resultados, o método do encerramento da obra ou o método da percentagem de acabamento, reconhecidos de há longa data pela prática contabilística e recomendados pelas normas internacionais de contabilidade.
8. Pelo primeiro método os resultados só são determinados e registados quando a obra é dada por concluída ou substancialmente concluída (grau de acabamento superior a 95% - cfr.artº.19, nº.3, al.a), do C.I.R.C.), sendo os custos incorporados nas obras acumuladas até final nas existências e as prestações recebidas dos clientes relevadas como adiantamentos. Verifica-se, em consequência, o diferimento e a concentração de tributação do lucro no exercício da conclusão da obra. Por sua vez, o método da percentagem de acabamento permite que os resultados sejam evidenciados na contabilidade à e na medida do desenvolvimento físico da obra, isto é, em função do estádio de avanço da obra. A percentagem de acabamento pode ser aferida por diversos critérios, sendo o mais usual o recurso ao cálculo de percentagens dos custos incorporados na obra até certa data sobre a totalidade dos custos estimados. Ao revelar-se o resultado no período em que em princípio é produzido, obtém-se uma distribuição da carga fiscal ao longo do tempo de duração da obra. A possibilidade de opção entre os dois métodos identificados (método do encerramento da obra ou método da percentagem de acabamento) é muito restringida pelo legislador (cfr.artº.19, nº.2, do C.I.R.C.), o qual impõe a utilização do método da percentagem de acabamento nas obras públicas ou privadas em que haja lugar a facturações parciais do preço estabelecido e as obras realizadas tenham atingido o grau de acabamento correspondente aos montantes facturados e, igualmente, nas obras efectuadas por conta própria e vendidas fraccionadamente.
9. Dispõe o artº.19, nº.5, do C.I.R.C., que no apuramento de resultados de obras em que ainda não tenham sido suportados os custos totais necessários para o seu acabamento, se aceita o diferimento dos proveitos correspondentes ao custos estimados a suportar. Saliente-se, todavia, que do ponto de vista contabilístico, quando a obra estiver substancialmente concluída (grau de acabamento superior a 95%), os custos que faltarem para o seu fecho devem ser estimados e considerados como acréscimo de custo, conforme estatui o ponto 7 da Directriz Contabilística 3/91, a qual consagra o tratamento contabilístico dos contratos de construção.
10. Apesar de tudo o acabado de referir quanto ao regime a aplicar às obras de carácter plurianual (regime este que, eventualmente, se poderia aplicar ao caso dos autos), certo é que a correcção sob exame e estruturada pela A. Fiscal se baseia num enfoque prévio ao dito regime e que passa pelo crivo do artº.23, do C.I.R.C., sendo que o acréscimo de custos em resultado do realojamento de colectividades, carece de prova, nomeadamente documental, que o comprove. Prova essa que incumbia à sociedade impugnante produzir (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.).
11. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
12. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
13. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
14. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
15. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
16. O Tribunal de 2ª. Instância pode/deve modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova produzidos, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a regra da livre apreciação da prova, quando aplicável, um resultado diferente do produzido pelo Tribunal “a quo” que seja racionalmente sustentado.
17. O artº.115, do C.I.R.C., consagra as obrigações contabilísticas dos sujeitos passivos de I.R.C. (cfr.anterior artº.98, do C.I.R.C.), sendo que no seu nº.3, al.a), se estabelece a necessidade dos lançamentos contabilísticos estarem devidamente apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário.
18. O princípio da especialização ou do acréscimo encontra-se consagrado no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outras palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados.
19. O princípio da tributação pelo lucro real, como opção de tributação relativa aos entes empresariais, encontra consagração no artº.104, nº.2, da C.R.Portuguesa. Porém, tal princípio, não é absoluto, como desde logo a redacção da sua norma o pressupõe, ao dispor que a tributação das empresas incide "fundamentalmente" sobre o seu rendimento real, e não em todo e qualquer caso, antes tendo de ser concatenado com outros princípios e normas constantes em outros diplomas legais infra-constitucionais, como seja, por exemplo, o da satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas (artº.103, nº.1, da C.R.P.), tal como os artºs.18 e 23, do C.I.R.C.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:909/09.6BESNT
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
1-O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.622 a 632 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a impugnação pela sociedade impugnante, "A……… - Planeamento, Desenvolvimento Urbano e Construções, S.A.", intentada, visando acto de liquidação adicional de I.R.C., relativo ao ano de 2004 e no montante total de € 546.044,39.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.665 a 672 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença parcialmente procedente da impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC nº 2009 83100…., referente ao exercício de 2004, a qual resultou das correcções, efectuadas pela AF, à matéria colectável em que foram desconsiderados determinados custos por si relevados na contabilidade, por ter sido entendido que os mesmos não estão devidamente comprovados e não são indispensáveis para a realização dos proveitos como seja o acréscimo de custos relativos a realojamento de colectividades e uma estimativa de custos relativos a trabalhos de obras a efectuar num parque urbano; outros custos que não respeitaram o princípio da especialidade dos exercícios, assim como a constituição de provisão para processos judiciais em curso, a que acresce as correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre imóveis;
2-A douta sentença ora recorrida considerou a impugnação procedente na parte das correcções relativas a acréscimos de custos em resultado do realojamento de colectividades;
3-Entendeu a douta sentença que:
“…não obstante a Administração Fiscal não ter determinado o apuramento dos resultados pela consideração do regime das obras de carácter plurianual em que as mesmas patentemente, se incluíam, ainda assim seria de obviar à contabilização dos proveitos que não poderiam ser convenientemente balanceados com os correspondentes custos por estes últimos não se encontrarem ainda integralmente suportados quanto aos referidos encargos inerentes ao realojamento dos respectivos moradores, através da consideração de uma receita antecipada da parte dos proveitos correspondentes aos custos estimados a suportar (i.e. aceita-se um deferimento dos proveitos correspondentes aos custos estimados para a suportar), nos termos do disposto no nº5 do art.19º do CIRC e nºs 5 e 7 da Circular nº 5/90, da DGCI, o que não obsta a que quando a obra estiver substancialmente concluída os custos que faltarem para a sua conclusão devem ser estimados e considerados como acréscimo de custo - cf. nº 7 da Directriz Contabilística nº 3/91.”;
4-Com o devido respeito e salvo melhor opinião não concordamos com tal decisão, pelo que contra a sentença recorrida convocamos a seguinte argumentação:
5-A questão em apreciação nos autos diz respeito à legalidade do acto de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios do ano de 2004, a qual resultou de uma inspecção que a AT efectuou à impugnante e que assenta em correcções por terem sido desconsiderados custos contabilizados e imputados à execução do Parque Urbano do N…., por os mesmos não estarem devidamente comprovados e não serem indispensáveis para a realização dos proveitos e se os proveitos com a venda dos lotes de terreno do loteamento em causa podem reflectir os custos com a execução do Parque Urbano;
6-O procedimento inspectivo que deu origem à liquidação ora em crise, teve origem numa comunicação proveniente do Departamento de Investigação e Acção Penal à Direcção de Finanças em 03 de Fevereiro de 2006;
7-Resulta do art.23º, nº1 do CIRC, que são custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora;
8-Assim, para que os custos enumerados no artigo 23º do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário que se verifiquem dos requisitos cumulativos, a saber:
a-Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais;
b-Que sejam indispensáveis para a realização de proveitos;
9-No relatório da Inspecção no ponto III – Acréscimo de custos (parque urbano e realojamento das colectividades) afirma-se que foi contabilizado, a título de “acréscimos de custos” na conta 2735, custo a suportar de futuro com o realojamento de colectividades, no montante de € 589.478,81, cuja imputação foi efectuada aos diversos lotes;
10-No entanto conforme consta do alvará de loteamento nº …/2001, da Câmara Municipal da Amadora, designadamente no ponto 3 do capítulo “Condicionantes do licenciamento” pela realização de infra-estruturas urbanísticas, são devidas taxas, nos termos do art. 20º do Regulamento Municipal de Taxas e Licenças da Administração Urbanística, num total de 533.806.800$00 (€ 2.662.617,09). Estas taxas sofreram uma redução de € 535.889,82 nos termos da Cláusula primeira do Protocolo em anexo III ao Alvará;
11-A referida cláusula do protocolo menciona que a primeira outorgante (A….) efectuará por sua conta e risco os trabalhos de urbanização especificados nos projectos aprovados pela Câmara Municipal, respeitando todas as prescrições do alvará de loteamento e, efectuará o pagamento de todas as taxas devidas, com excepção da dedução autorizada pelo presente contrato;
12-A referida dedução refere-se a custos com o realojamento das colectividades: “Os Al…..”, "Esc…." e "D…. Ginásio Clube";
13-Assim, a empresa ao proceder, no ano de 2004, à contabilização da referida importância como acréscimo de custos e à sua redistribuição pelos lotes, está a sobreavaliar os custos, no exercício em análise, sobretudo, no referente aos lotes vendidos neste exercício;
14-Isto, não só, porque a referida verba já foi objecto de compensação, ao ser deduzida do valor global das taxas de infra-estruturas devidas ao Município da Amadora, mas também porque está a considerar como custos do exercício, despesas que não ocorreram;
15-Acresce dizer que a concretização das obras para realojamento das colectividades, que de acordo com o Alvará de Loteamento, ficou ao encargo da impugnante, pelo menos até 2009 (data da conclusão da inspecção) não foram concretizadas, e consequentemente não existiram custos efectivos com as mesmas;
16-No douto parecer do Magistrado do Ministério Público o qual corroboramos, é dito que: “(…) da prova documental resulta claramente que a demora na aprovação do Plano de Pormenor do Parque Urbano do N….., ao invés do defendido pela impugnante, é-lhe imputável, pois, como se pode verificar da leitura do art.4º do Regulamento do Plano de Pormenor do Parque Urbano do N….., publicado na 2ª série, do DR, nº 7, de 10 de Janeiro de 2008, foi alterado o Plano Director Municipal (PDM) da Amadora, uma vez que se altera parcialmente a classe de espaços, transformando um espaço até então classificado pelo RPDM da Amadora como “espaço verde de protecção e enquadramento urbano” (art.36º do RPDM) para “espaço industrial proposto”- art.34º do RPDM.”;
17-E continua o douto parecer: “A presente alteração foi efectuada para permitir a instalação de um posto de abastecimento de combustível, junto do parque Urbano do Neutel, posto este pertencente ao Sr. J….. e à sociedade S…… Filho & Irmão, Lda., que era sócia da empresa A….. – Planeamento e Desenvolvimento Urbano e Construção, Lda., aqui impugnante, proprietária de uma das parcelas de terreno que integram a Unidade de Execução do PP do parque Urbano N….. (cf. P.A.nº 04/2013-A-Ac.Esp);
18-E diz ainda: “…é do nosso conhecimento profissional, que correm termos nos Serviços do Ministério Público, deste TAF vários processos com vista à apreciação de várias ilegalidades cometidas, quer no âmbito da aprovação do loteamento em causa, quer no PP do Parque Urbano do N….., pelo que, para além de os referidos custos ainda não se terem verificado, talvez nunca venham a sê-lo.”;
19-A sentença recorrida ao assim não entender, padece de erro de julgamento, tendo a actuação da AT sido conforme à lei, não se verificando o vício que é imputado ao acto tributário, sendo que este por ser legal, deverá manter-se;
20-Nestes termos e com o douto suprimento de Vªs Exªs, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue totalmente improcedente a presente impugnação, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.
X
Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância deste primeiro recurso deduzido.
X
2-"A……. - PLANEAMENTO, DESENVOLVIMENTO URBANO E CONSTRUÇÕES, S.A.", com os demais sinais dos autos, também deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto a sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.622 a 632 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a impugnação pela sociedade recorrente intentada, visando acto de liquidação adicional de I.R.C., relativo ao ano de 2004 e no montante total de € 546.044,39, na parte em que não obteve ganho de causa.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.745 a 790 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A sentença recorrida merece censura por duas razões. Primeiro porque decide sobre matéria já transitada em julgado, com a sentença proferida em 23 de Outubro de 2010. Segundo porque labora em erro de facto e de direito, relativamente à matéria sobre a qual ainda tem competência para decidir;
2-A única questão sobre a qual o Tribunal recorrido tem competência para decidir é relativa à imputação e contabilização dos custos com a execução do Parque Urbano;
3-A esse propósito os inspetores tributários disseram: “no caso em análise, e uma vez estarmos perante estimativas, não se poderá considerar que os custos contabilizados pelo sujeito passivo estejam devidamente comprovados. Quanto à sua indispensabilidade, uma vez que o alvará de loteamento não prevê quaisquer custos a incorrer com a construção das infraestruturas do parque como condição para a aprovação do mesmo, os referidos custos, contabilizados pelo sujeito passivo, no exercício de 2004, a título de acréscimos de custos, não poderão ser considerados como imputáveis aos lotes que compõem o loteamento em causa, por não existir um nexo causal entre os mesmos e os proventos obtidos pela sociedade, quando da venda dos referidos lotes.... ....considerando que foram alienados 16 lotes em 2004, os montantes imputados aos mesmos, provenientes das estimativas de custos efetuada no valor global de € 789.913,65, deverá ser corrigido, por ter, indevidamente, influenciado o resultado líquido do exercício..". p. 21 e 22 do relatório inspeção tributária;
4-Por outras palavras, a Fazenda Pública não aceitou € 789.913,65 de custos, porque entendeu não haver nexo causal entre os mesmos e os proveitos obtidos pela sociedade, como nem sequer estavam devidamente comprovados;
5-Ora, a prova documental e testemunhal produzida não só confirma a existência desse nexo, como evidencia que os custos contabilizados pela impugnante estão devidamente comprovados;
A INDISPENSABILIDADE. O NEXO CAUSAL ENTRE OS CUSTOS E OS PROVEITOS.
6-O depoimento do Presidente do Município fundamentado nos documentos de fls. 411 a 521 do Volume IlI esclarece:"...a construção do Parque Urbano fez parte das condições de emissão do alvará de loteamento e das obrigações impostas ao urbanizador..";
7-No mesmo sentido o depoimento do Diretor de Urbanismo do Município igualmente fundamentado nos mesmos documentos esclarece: "…O Parque Urbano resulta da própria ação de loteamento daquele território, como resulta a implantação dos arruamentos ou dos passeios...não haveria a possibilidade do loteamento ser licenciado sem a obrigação de construção do Parque Urbano...";
8-De igual modo, o teor das informações DF 1815/99 - fls. 413 - DF 1168/01 - fls. 435 - DF 59/01 - fls. 450 - DF 54/01 - fls. 441, as várias deliberações Camarárias, nomeadamente, a que refere: "...por deliberação de 3 de Outubro de 2001 foram aprovadas as alterações a introduzir no loteamento...sendo necessário para o efeito proceder à elaboração do Plano de Pormenor para o futuro Plano de pormenor do N…. ...fls. 501;
9-Ora, atento o teor dos documentos e dos depoimentos é inequívoco que incorrer nos custos com a execução do Parque Urbano foi condição indispensável para a aprovação do loteamento e consequente venda dos lotes;
COMPROVAÇÃO DOS CUSTOS
10-Os “custos" contabilizados como inerentes à execução do Parque Urbano estão justificados por uma estimativa orçamental - artigo 115/3/a do CIRC;
11-A prova documental produzida evidencia que na base dessa estimativa orçamental está a informação 54/01, de 27 de Abril de 2001, subscrita pelo Diretor do Departamento de Urbanismo do Município da Amadora, Arquiteto S….. (fls. 440 e segs IlI Volume);
12-A fls. 3 (fls. 442 IlI Volume) dessa informação consta a rubrica "Arranjos exteriores - Parque urbano e resíduos sólidos - 533.415.000$00” A fls. 4 (fls. 443 III Volume) da referida informação verifica-se que esse valor foi igualmente contabilizado para efeitos do cálculo da caução prestada pelo recorrente, no montante de 893.011.939$00, por força do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 23 do D.L. 448/91 de 29 de Novembro;
13-Note-se que o valor da estimativa orçamental contabilizada - 468.340.000$00 - é inferior ao valor exigido à recorrente pelo Município para prestação caução - 533.414.99$00;
14-Essa caução destinava-se a garantir a boa execução do Parque Urbano e seria acionada em caso de incumprimento, ou cumprimento defeituoso;
15-No seu depoimento do Presidente do Município da Amadora refere: ".... É assim, nos calculámos infraestruturas, duas coisas, uma coisa é o loteamento propriamente digo, outra coisa é o parque urbano. Quando é feito os cálculos em relação as diferentes infraestruturas necessárias, é feito separadamente, ou seja, uma parte aferida em relação ao loteamento em si fora do parque urbano e outra dentro do parque urbano. E por isso, isso dá um valor. Portanto, isso significa que no cálculo, para o cálculo da caução foi estimado o custo com a realização das infraestruturas e dos arranjos exteriores...";
16-Também no seu depoimento o Diretor do Urbanismo refere: Agora iríamos ao documento 14 (fls. 440 e segs), que é o tal documento aonde estão indicadas as estimativas. Senhor arquiteto, na informação de 27 de Abril de 2001 e na outra 14 de Maio 2001, está dito que para o cálculo da caução é igualmente estimado o custo com realização das infraestruturas e dos arranjos exteriores do parque urbano. Se nos pudesse elucidar acerca desse cálculo?”....Essa situação vem na sequência, daquilo que a pouco estávamos a referir, que neste documento página 3, 4, é perfeitamente claro que o parque urbano, arranjos exteriores são considerados a par, ou igualdade de circunstâncias, ou ombro a ombro, como se queira dizer, com os arruamentos, abastecimento de água, linhas sequenciais dos resíduos sólidos, portanto, está em pé de igualdade digamos com as outras infraestruturas que eram necessárias para o bom funcionamento futuro da urbanização, como se veio enfim, depois a construir, aquilo que era possível na altura e o Parque Urbano ficou um pouco retardado, por causa de o plano de pormenor não existir, não se podia executar sem o plano de pormenor. Portanto, ai é referido perfeitamente as verbas que foram contabilizadas para arruamentos, arranjo de exteriores, posto de eletricidade, postos de abastecimento de água, saneamento. Tudo está contabilizado ai nessa página. Portanto, comprova que a referida execução estava em pé de igualdade com as outras referidas estruturas necessárias ao bom funcionamento da urbanização....".Senhor Arquiteto iremos ao documento 16. (Fls. 464 a 475 IlI Volume) A Informação de 24 de Setembro de 2001 que acompanha essa deliberação Camarária de 21 de Outubro, especifica qual é o montante do custo do parque urbano. Esse custo é para ser suportado por quem?''... Bom basta referir a primeira linha do referido documento, que diz A…., Planeamento Urbano e Construção, portanto é o requerente que suporta isto. É o documento que vem no fundo confirmar aquilo que eu já havia referido. Aquele número que referi que está como garantia bancaria não foi inventado, foi sustentado diz aqui como foi encontrado....";
17-Os depoimentos e os documentos evidenciam não só a que a estimativa de custos tem aderência com a realidade, - linha 24 e 25 de fls. 9 da sentença - já que se baseia, em cálculos executados por funcionários e formalizados num documento oficial do Município da Amadora; como também que a A…. desde 27 de Abril de 2001 incorreu na obrigação de suportar os custos com a execução do Parque Urbano;
18-Falecem assim os pressupostos em que assenta o ato de liquidação controvertido. A saber a inexistência de nexo causal e a falta de idoneidade da estimativa que suporta a contabilização;
19-O Tribunal valida o ato de liquidação, com fundamentos diferentes dos constantes do relatório da inspeção tributária;
20-A esse propósito, o Tribunal de 1ª instância refere: " A questão põe-se noutra sede, a de saber se os mesmos não tendo sido incorridos até à data da sua conclusão e venda das frações, ainda assim poderiam ser considerados. Ora, a estimativa de custos não tem qualquer aderência com a realidade. Como bem reconhece o Município na resposta à solicitação da IT (referido anexo VII do relatório)… a determinação dos resultados quanto aos custos imputáveis à fração vendida resultariam impossíveis na medida em que não se conhecendo os custos totais da obra tornava-se inviável a consideração como receita antecipada de parte dos proveitos correspondentes aos custos estimados a suportar nos termos do nº 5 do artigo 19 do CIRC... ";
21-Ora, ao Tribunal de 1ª instância não cabe sanar os vícios dos atos de liquidação, mas tão só pronunciar-se sobre a sua legalidade em face dos pressupostos enunciados pela Administração Tributária;
22-O ato de liquidação impugnado e para o qual se pede a tutela independente do Tribunal é o proferido pela inspeção tributaria. E é sobre esse ato que o Tribunal tem competência para se pronunciar;
23-Com esta ressalva, cabem aqui algumas considerações sobre a pronuncia judicial;
24-Primeiro, ao contrário do que o diz Tribunal “a quo”, os custos incorreram. A recorrente incorreu nos custos no exato momento em que assumiu a obrigação de construir o Parque Urbano, como condição de emissão do alvará de loteamento;
25-Segundo, igualmente ao contrário do que diz o Tribunal, no seu relatório o Município da Amadora refere expressamente " que nos termos do nº 2 do artigo 6 do Regulamento do PPPUN, as operações de execução do PIP serão custeadas pela entidade privada titular do alvará de loteamento na zona envolvente (alvará de loteamento 3/2001) ".. fls. 120 Verso do processo administrativo.- que é como todos sabemos a recorrente;
26-Terceiro, a inspeção tributaria questiona a estimativa orçamental com base na qual a recorrente contabilizou os custos com o Parque Urbano;
27-O Tribunal de forma peremptória afirma "a estimativa de custos não tem qualquer aderência com a realidade";
28-Acontece que o valor dessa estimativa orçamental é inferior ao valor da caução que o Município exigiu como garantia do cumprimento da obrigação de execução do Parque urbano;
29-O que comprova o absurdo da pronuncia da 1ª Instância;
30-Também a prova documental e testemunhal produzida, evidenciam o absurdo desta conclusão da sentença;
31-Em defesa da validade do ato de liquidação o Tribunal chama à colação o disposto no artigo 19 do CIRC;
32-"...Os proveitos e os custos de atividades de caráter plurianual podem de facto ser periodizados tendo em consideração o ciclo de produção ou o tempo de construção” - artigo 18/5 do CIRC;
33-“.. A determinação do resultado em relação a obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um ano pode ser efetuado segundo o critério do encerramento da obra ou segundo o critério da percentagem de acabamento .."- artigo 19/1 do CIRC;
34-No caso, a recorrente terá optado pelo critério do encerramento da obra - relatório da inspeção tributária, anexado ao processo administrativo;
35-De acordo este critério, “...os proveitos e os custos são reconhecidos quando o grau de acabamento da obra contratada seja igual ou superior a 95 %..."- artigo 19/3/a do CIRC;
36-Assim, quando a obra tiver atingido esse grau de acabamento, são reconhecidos os proveitos, sendo deduzidos dos respetivos custos acumulados;
37-No caso o grau de acabamento da obra é manifestamente inferior a 95%;
38-Nessa medida a decisão recorrida viola o artigo 19 do CIRC, por duas razões:
i) primeiro, porque antecipa a determinação do lucro tributável, para um momento em que o grau de acabamento da obra contratada era inferior a 95%;
ii) segundo, porque para a determinação do lucro tributável valoriza apenas a receita e desconsidera por completo os custos;
39-Ora, no caso das empresas, a sua capacidade contributiva é, na verdade, revelada fundamentalmente pelo seu lucro real, por opção legal e constitucional (cfr. nº2 do artº104º da CR, anterior nº2 do artº107°);
40-A não consideração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado ano ou exercício económico, constitui, para além do mais, não só violação do princípio da especialização de exercícios, como também viola o princípio da tributação do lucro real, porque se não forem considerados, pela AT, num determinado ano ou exercício, todos os proveitos e custos, a ele economicamente imputáveis, o lucro que vier a apurar não pode, naturalmente, corresponder ao lucro real desse ano ou exercício;
41-A tributação do lucro real pressupõe a conjugação sistemática do binómio custo, proveito;
42-Todos os atos tributários que para a determinação do lucro tributável suprimem um dos lados do binomio, os custos ou os proveitos, são manifestamente ilegais e inconstitucionais;
43-Nessa medida, a correção proposta pelo ato judicial de sanação da liquidação, fundamentado na valorização da receita e na desconsideração da despesa, assenta numa interpretação dos artigos 18 e 19 do CIRC, não conforme com a Constituição, nomeadamente, com o princípio da tributação do lucro real previsto no artigo 104/2 da CRP;
44-Termos em que a decisão recorrida deverá ser revogada.
X
Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância deste segundo recurso deduzido.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento somente do recurso deduzido pela Fazenda Pública (cfr.fls.809 e 810 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.813 do processo), vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.624 a 627 dos autos):
1-No âmbito de uma acção de fiscalização efectuada à sociedade "A…. - Planeamento, Desenvolvimento Urbano e Construções, S.A.", com o n.i.p.c. 504 ……., foram efectuadas correcções ao lucro tributável do exercício de 2004, e procedeu-se a liquidação adicional de IRC para aquele ano, com o nº 2009 83100…., tendo-se apurado um imposto a pagar no valor de € 546.044,39, o qual compreende juros compensatórios e de mora (cfr.cópia de demonstração de liquidação e de acerto de contas junta a fls.34 e 35 dos presentes autos);
2-A liquidação mencionada supra, resultou das correcções constantes das “conclusões do relatório” e encontram-se fundamentadas no Relatório elaborado pelos serviços de inspecção, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido e do qual consta, designadamente, que foram efectuadas correcções ao lucro tributável no montante de € 1.717.692,97 dos quais (cfr.cópia de relatório de inspecção, datado de 3/04/2009, junta a fls.51 a 73-verso, e anexos de fls.74 a 156, tudo do processo administrativo apenso):
“(…)
III-2.2.Correcções dos custos contabilizados, referentes ao exercício de 2003.
…Analisados os elementos contabilísticos verificou-se a existência dos seguintes documentos respeitantes a 2003 e contabilizados em 2004 (Anexo IV)… “Conta 622…. – Despesas de Condomínio… Conta 631…- Selo Letra… Conta 681…- Descontos de Títulos… não foi respeitado o princípio da especialização dos exercícios não sendo os custos imprevisíveis ou desconhecidos no exercício sobre análise.
III-2.3.Provisões do exercício: Conta 672…-Processos Judiciais em Curso.
…Face aos lançamentos aí descriminados, os três primeiros processos referem-se a provisões relativas a processos judiciais relacionados com o Parque Urbano de N… …não foram apresentados quaisquer elementos para além da relação dos referidos processos.. não tendo sido apresentado quaisquer documentos comprovativos dos montantes contabilizados relativamente aos referidos processos, corrige-se o montante das respectivas provisões… quanto aos restantes lançamentos.. processos de impugnação judicial deduzidos contra liquidações de Sisa… para além dos montantes de Sisa que são considerados na correcção daquelas provisões… foram considerados na sua determinação outros montantes relativos a juros compensatórios e multas e demais encargos pela prática de infracções.. os quais não são dedutíveis.. não sendo de aceitar o montante em excesso…
III-2.4.Acréscimo de Custos (Parque Urbano e Realojamento de Colectividades).
…Foi contabilizado o custo a suportar de futuro com o realojamento de colectividades… cuja imputação foi efectuada aos vários lotes.. verifica-se que as taxas pagas relativamente às infra – estruturas foram no montante de … deduzido da importância correspondente aos custos estimados para o referido realojamento…está a considerar como custos do exercício despesas que não ocorreram… nem a data provável para a sua realização, procede-se à sua correcção… na parte proporcional às vendas ocorridas…
Parque Urbano
Foi contabilizado uma estimativa de custos referente ao parque urbano do N… … cuja imputação foi efectuada aos diversos lotes… baseada numa estimativa orçamental elaborada em 2001… resultante de verbas provisionadas para os prováveis trabalhos a realizar no mesmo que será de suportar pela empresa..do Alvará de loteamento nº …/2001, nas condicionantes do mesmo não consta qualquer custo a ser suportado pelo titular relativamente ao parque urbano.. sendo que o mesmo se encontra no Plano de Pormenor do Parque Urbano do N… … cujas operações de execução serão realizadas através do sistema de compensação… custeadas pelo titular de alvará de loteamento na zona envolvente.. cujo valor será apurado mediante a aprovação do projecto de execução ( do Plano de Pormenor) e à data da mesma… dado tratar-se de estimativas, não se poderá considerar que os custos estejam devidamente comprovados…quanto à sua indispensabilidade, uma vez que o alvará de loteamento não prevê quaisquer custos a incorrer com a construção das infra-estruturas do parque como condição para a aprovação do mesmo, os custos não poderão ser considerados como imputáveis aos lotes, por não existir um nexo causal entre os mesmos e os proveitos relativo à venda dos lotes…
III-2.5.Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis-artº.58-A, do C.I.R.C.
…Relativamente aos imóveis alienados durante o exercício de 2004, atento ao valor da escritura de compra e venda e face aos valores patrimoniais tributários definitivos para eles fixado, sem que tenha sido efectuado o pedido de prova do preço efectivo por parte do sujeito passivo.. tendo apresentado pedido de revisão do acto tributário quanto aos artigos matriciais nºs 1677º e 1719º, tendo em atenção a apresentação de declaração de substituição a que se refere a alínea a), do nº3, do artº 58º-A, pelo que deduzido do valores declarados, a correcção a efectuar é de €….
IX-Direito de Audição-Fundamentação
(…)
II-D)-Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre imóveis.
A correcção de valores de venda em declarações de rendimentos referentes a exercícios posteriores a 2004…deveria ter procedido à correcção mediante a entrega de declaração de substituição com referência ao exercício de 2004 e não de 2005…pelo que será a situação tida em conta no procedimento deste último ano…”
(…);
3-Dão-se aqui por reproduzidos os documentos internos e as deliberações da Câmara Municipal de Amadora relativas às operações de loteamento e de aprovação do projecto de Parque Urbano de N…, assim como o protocolo estabelecido pelo município com a sociedade impugnante em cumprimento do Regulamento do Plano de Pormenor do mesmo parque urbano (cfr.documentos juntos a fls.411 a 509, aviso nº 901/2008, da C.M. Amadora, publicado na II Série do D.R. nº7, de 10.01.08, junto a fls.510 a 513, e protocolo junto a fls.514 a 519, tudo dos presentes autos);
4-As operações de concretização do parque urbano referido supra e respectivos custos a suportar pela impugnante ainda não se encontram realizados até à presente data (cfr. depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante, tudo conforme acta junta a fls.594 a 597 dos presentes autos; documento junto a fls.116 a 120 do processo administrativo apenso).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita …”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, sendo que do depoimento das testemunhas que merecem credibilidade em razão do exercício de funções naquela edilidade à data dos factos…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, além do mais, em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
5-Do relatório de inspecção tributária identificado no nº.2 supra igualmente consta o seguinte (cfr.cópia de relatório de inspecção, datado de 3/04/2009, junta a fls.51 a 73-verso do processo administrativo apenso):
“(…)
Consequentemente se os custos em análise - Realojamento de Colectividades - tem subjacente uma previsão de custos a ocorrer no futuro, que contabilisticamente, apenas tem como suporte uma estimativa de valores, já que não consta da referida contabilidade, nem foi disponibilizado à administração fiscal, quer no decurso dos actos de inspecção, quer quando do exercício de direito de audição, documento comprovativo do mesmo, nomeadamente, recibo das colectividades de que receberam o(s) montante(s) em causa ou, facturas ou documentos equivalentes que suportem e comprovem a efectiva ocorrência dos custos de realojamento das colectividades, confirma-se, desde logo a ausência de um dos requisitos para que o custo seja aceite fiscalmente nos termos do disposto no artº.23 do CIRC e, como tal, deverá o mesmo ser acrescido ao resultado contabilístico para apuramento do lucro tributável do exercício, em cumprimento do disposto no artº.17 do CIRC. (…)”.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar parcialmente procedente a impugnação, mais determinando, em consequência:
1-A anulação da correcção de custos/acréscimo de custos relativa a "realojamento de colectividades", tudo ao abrigo do artº.19, nº.5, do C.I.R.C., e do nº.7, da Directriz Contabilística nº.3/91, dado que nos encontramos perante obras de carácter plurianual;
2-Manutenção na ordem jurídica do remanescente das correcções, nomeadamente, a incidente sobre o acréscimo de custos relativo ao "Parque urbano do N…".
Deve relevar-se o trânsito em julgado da decisão recorrida no que se refere à manutenção das correcções relativas a "Custos contabilizados, referentes ao exercício de 2003", a "Provisões do exercício" e ao "Valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis", tudo no montante total de € 746.574,78 (cfr.artº.635, nº.5, do C.P.Civil).
X
Em primeiro lugar, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Visando os recursos deduzidos parcelas distintas da sentença recorrida, entende este Tribunal apreciar os mesmos com base num critério meramente cronológico, assim se começando por examinar e decidir a apelação apresentada pela Fazenda Pública (cfr. artº.124, do C.P.P.Tributário).
Antes, porém, deve vincar-se que, contrariamente ao defendido pela sociedade recorrente "A…. - Planeamento, Desenvolvimento Urbano e Construções, S.A.", a sentença recorrida não merece censura quanto ao facto de ter, alegadamente, decidido sobre matéria já transitada em julgado (cfr.conclusões 1 e 2 do recurso e supra expostas). Assim é, porquanto, conforme se pode constatar do exame do processo, este Tribunal, em acórdão exarado no pretérito dia 13/09/2011, anulou a sentença produzida pelo T.A.F. de Sintra, ao abrigo do artº.712, nº.4, do C.P.Civil, e devido a défice instrutório, pelo que, não ocorreu o trânsito em julgado da decisão de qualquer matéria em apreciação nos autos (cfr.dispositivo do acórdão junto a fls.541 a 557 do processo).
X
1-Aduz a recorrente Fazenda Pública, em síntese, que a sentença recorrida considerou a impugnação procedente na parte das correcções relativas a acréscimos de custos em resultado do realojamento de colectividades. Que a sociedade impugnante contabilizou no ano de 2004, a título de “acréscimos de custos” e na conta 273…, custos a suportar no futuro com o realojamento de colectividades, no montante de € 589.478,81, cuja imputação foi efectuada aos diversos lotes vendidos neste exercício. Que a referida dedução se refere a custos com o realojamento das colectividades "Os Al…", "Esc…" e "D… Ginásio Clube". Que a empresa ao proceder, no ano de 2004, à contabilização da referida importância como acréscimo de custos e à sua redistribuição pelos lotes, está a sobreavaliar os custos, no exercício em análise. Que a referida verba já foi objecto de compensação, ao ser deduzida do valor global das taxas de infra-estruturas devidas ao Município da Amadora, mas também porque está a considerar como custos do exercício, despesas que não ocorreram pelo menos até 2009, data da conclusão da inspecção. Que a decisão recorrida padece de erro de julgamento, tendo a actuação da A. Fiscal sido conforme à lei (cfr.conclusões 1 a 19 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Dissequemos se a decisão do Tribunal "a quo" padece de tal vício.
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à A. Fiscal actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/3/2006, rec.1236/05; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 17/7/2007, proc.1107/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13).
Refira-se, igualmente, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.artº.115, do C.I.R.C., na versão em vigor em 2004; artºs.29 e 31, do C.Comercial).
Quanto ao enquadramento no aludido artº.23, do C.I.R.C., deve apelar-se a três subsídios jurisprudenciais relativos à aplicação de tal normativo:
1-É entendimento da jurisprudência que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa de cariz subjectivista. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr.artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/04/2010, rec.774/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/02/2008, rec.798/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/11/2009, proc.3253/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13);
2-Um custo indispensável não tem de ser um custo que directamente implique a obtenção de proveitos. Há vários custos que só mediatamente cumprem essa função e que, nem por isso, deixam de ser considerados indispensáveis, nos termos do artº.23, do C.I.R.C. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/6/2011, proc.4589/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2015, proc. 8137/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13);
3-A questão do ónus da prova da indispensabilidade do custo passa ao lado da presunção de veracidade da escrita correctamente organizada (cfr.artº.75, nº.1, da L.G.T.) pois não se questiona a veracidade (existência e montante) da despesa contabilizada mas a sua relevância, face à lei, para efeitos fiscais, no caso, da sua qualificação como custo dedutível, em sede do citado artº.23, do C.I.R.C. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/2/2010, proc.3669/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2015, proc. 8137/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.7245/13).
Revertendo ao caso dos autos, defende a Fazenda Pública que o acréscimo de custos em resultado do realojamento de colectividades não é aceite fiscalmente nos termos do artº.23, do C.I.R.C., porquanto, a contabilização da importância de € 589.478,81 e a sua redistribuição pelos lotes, está a sobreavaliar os custos, no exercício em análise. Por outro lado, que a referida verba já foi objecto de compensação, ao ser deduzida do valor global das taxas de infra-estruturas devidas ao Município da Amadora. Por último, porque está a considerar como custos do exercício, despesas que não ocorreram pelo menos até 2009, data da conclusão da inspecção.
Por seu lado, a decisão recorrida, se bem a interpretamos, apesar de reconhecer que estamos perante montante de custos estimados e a suportar no futuro, concluiu que na contabilização dos mesmos se devia considerar o regime das obras de carácter plurianual, nos termos do disposto no artº.19, nº.5, do C.I.R.C., e no nº.7, da Directriz Contabilística nº.3/91, tudo conforme supra expendido.
Com base nestes pressupostos decide anular a correcção em causa.
Vejamos quem tem razão.
A fundamentação essencial da correcção sob exame encontra-se nos nºs.2 e 5 do probatório, para onde se remete.
Deve recordar-se, antes de mais, que o Tribunal é livre de conhecer dos aspectos jurídicos da causa (interpretação e aplicação das regras de direito), com independência das razões invocadas pelas partes (cfr.artº.5, nº.3, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/06/2016, proc.5917/12).
Abordemos, agora, o regime das obras de carácter plurianual, as quais colocam especiais dificuldades à concretização do princípio da especialização dos exercícios, previsto no artº.18, do C.I.R.C., na redacção em vigor no ano de 2004.
O citado regime das obras de carácter plurianual merecia consagração legal no artº.19, do C.I.R.C., na redacção em vigor no mesmo ano de 2004.
Sendo pacificamente aceite que o momento de reconhecimento dos proveitos obtidos e dos custos incorridos nem sempre coincidem com os dos respectivos recebimentos e pagamentos, nem por isso aqueles dois pares de factos patrimoniais podem ser definitivamente dissociados. Quer isto significar que um proveito só o será verdadeiramente se lhe vier a suceder uma receita ou recebimento de um meio usual de pagamento ou uma desobrigação de um passivo e, por forma semelhante, um custo só o será verdadeiramente se lhe vier a suceder um dispêndio, uma despesa ou pagamento ou então uma diminuição de um qualquer activo afecto ao património.
Havendo a possibilidade de diferimento entre as operações geradoras de proveitos e de incorrência em custos e as dos correspondentes recebimentos e pagamentos devem, por isso, os proveitos e os custos, quando não recebidos ou pagos de imediato, ser reconhecidos quando houver uma razoável probabilidade de os mesmos serem cobrados dos devedores ou satisfeitos aos credores, respectivamente.
Compreendem-se no citado artº.19, do C.I.R.C., as obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um (1) ano, isto é, aquelas cuja duração de execução se estende para além de um exercício económico. Nesta definição cabem, a título exemplificativo, a construção de pontes, barragens, estradas, edifícios, navios e bens de equipamento, não se circunscrevendo, portanto, à construção civil e empreitadas de obras públicas e privadas. São excluídas da previsão do preceito, todavia, as actividades de ciclo de produção ou de tempo de construção inferior a doze meses, embora com início e termo situados em dois períodos fiscais anuais diferentes.
Consagra-se no preceito a possibilidade de as empresas que realizam obras de carácter plurianual adoptarem, na determinação dos resultados, o método do encerramento da obra ou o método da percentagem de acabamento, reconhecidos de há longa data pela prática contabilística e recomendados pelas normas internacionais de contabilidade.
Pelo primeiro método os resultados só são determinados e registados quando a obra é dada por concluída ou substancialmente concluída (grau de acabamento superior a 95% - cfr.artº.19, nº.3, al.a), do C.I.R.C.), sendo os custos incorporados nas obras acumuladas até final nas existências e as prestações recebidas dos clientes relevadas como adiantamentos. Verifica-se, em consequência, o diferimento e a concentração de tributação do lucro no exercício da conclusão da obra.
Por sua vez, o método da percentagem de acabamento permite que os resultados sejam evidenciados na contabilidade à e na medida do desenvolvimento físico da obra, isto é, em função do estádio de avanço da obra. A percentagem de acabamento pode ser aferida por diversos critérios, sendo o mais usual o recurso ao cálculo de percentagens dos custos incorporados na obra até certa data sobre a totalidade dos custos estimados. Ao revelar-se o resultado no período em que em princípio é produzido, obtém-se uma distribuição da carga fiscal ao longo do tempo de duração da obra.
A possibilidade de opção entre os dois métodos identificados (método do encerramento da obra ou método da percentagem de acabamento) é muito restringida pelo legislador (cfr.artº.19, nº.2, do C.I.R.C.), o qual impõe a utilização do método da percentagem de acabamento nas obras públicas ou privadas em que haja lugar a facturações parciais do preço estabelecido e as obras realizadas tenham atingido o grau de acabamento correspondente aos montantes facturados e, igualmente, nas obras efectuadas por conta própria e vendidas fraccionadamente.
Estamos perante métodos que pretendem dar tradução à correlação temporal entre proveitos e custos, tendo como pano de fundo o citado princípio da especialização dos exercícios e que suscitam relevantes dificuldades de aplicação (cfr.Maria dos Prazeres Lousa, A determinação dos resultados nas obras de carácter plurianual, Revista Fisco, nº.8, Maio de 1989, pág.3 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.71 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, entendeu o Tribunal “a quo”, conforme mencionado supra, que na contabilização do acréscimo de custos em resultado do realojamento de colectividades e no montante de € 589.478,81, se devia considerar o regime das obras de carácter plurianual, nos termos do disposto no artº.19, nº.5, do C.I.R.C., e no nº.7, da Directriz Contabilística nº.3/91.
Dispõe o mencionado artº.19, nº.5, do C.I.R.C., que no apuramento de resultados de obras em que ainda não tenham sido suportados os custos totais necessários para o seu acabamento, se aceita o diferimento dos proveitos correspondentes ao custos estimados a suportar. Saliente-se, todavia, que do ponto de vista contabilístico, quando a obra estiver substancialmente concluída (grau de acabamento superior a 95%), os custos que faltarem para o seu fecho devem ser estimados e considerados como acréscimo de custo, conforme estatui o ponto 7 da Directriz Contabilística 3/91, a qual consagra o tratamento contabilístico dos contratos de construção (cfr.nºs.5 e 7, da Circular nº.5/90, de 17/01/1990, emitida pela D.G.C.I.; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.183 e seg.).
Recorde-se, por outro lado, que a citada Directriz Contabilística 3/91, no seu ponto 6, estatui que o método da percentagem de acabamento não deve ser aplicado se não houver possibilidade de estabelecer estimativas fiáveis (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.171).
Ora, apesar de tudo o acabado de referir quanto ao regime a aplicar às obras de carácter plurianual (regime este que, eventualmente, se poderia aplicar ao caso dos autos), certo é que a correcção sob exame e estruturada pela A. Fiscal se baseia num enfoque prévio ao dito regime e que passa pelo crivo do artº.23, do C.I.R.C., supra devidamente estudado.
Conforme se retira do probatório (cfr.nºs.2 e 5 da factualidade provada), o acréscimo de custos em resultado do realojamento de colectividades e no montante de € 589.478,81, carece de prova, nomeadamente documental, que o comprove. Prova essa que incumbia à sociedade impugnante produzir (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.).
Por outras palavras, a sociedade impugnante não produziu prova que permitisse a comprovação do acréscimo de despesas em resultado do realojamento de colectividades e no montante de € 589.478,81, assim devendo tal montante ser adicionado ao resultado contabilístico.
Concluindo, concede-se provimento ao recurso deduzido pela Fazenda Pública, mais se revogando a sentença do Tribunal "a quo" neste segmento, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
X
2-A recorrente "A… - Planeamento, Desenvolvimento Urbano e Construções, S.A." alega, em primeiro lugar e em síntese, que a Fazenda Pública não aceitou € 789.913,65 de acréscimo de custos relativo ao "Parque urbano do N….", porque entendeu, além do mais, que tais custos não estavam devidamente comprovados. Que a prova documental e testemunhal produzida evidencia que os custos contabilizados pela impugnante estão devidamente comprovados (cfr.conclusões 3 a 9 e 11 a 17 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6. Por outras palavras, o recorrente apenas observa os ónus de impugnação legalmente exigidos, quando especifica os concretos meios de prova que impõem que, para cada um dos factos impugnados, fosse julgado provado/não provado, quando indica qual a decisão que em concreto deve ser proferida sobre a matéria impugnada, e menciona os pontos da gravação com referência ao que ficou expresso na acta da audiência de discussão e julgamento ou, pelo menos, apresenta transcrições dos depoimentos das testemunhas que corroboram a sua pretensão (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/04/2014, proc.7396/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/06/2018, proc.6499/13; ac.T.R.Lisboa, 1/03/2018, proc. 1770/06.8TVLSB-B.L1-2).
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
O Tribunal de 2ª. Instância pode/deve modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova produzidos, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a regra da livre apreciação da prova, quando aplicável, um resultado diferente do produzido pelo Tribunal “a quo” que seja racionalmente sustentado (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/06/2018, proc.6499/13; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4ª. Edição, 2017, pág.285).
No caso concreto, o apelante põe, além do mais, em causa o exame da prova testemunhal produzida em 1ª. Instância, visando a modificação da matéria de facto no sentido de considerar comprovado o acréscimo de custos relativo ao "Parque urbano do N…". Pois bem, nesta sede e sem prejuízo de estarmos perante meio de prova a que se aplica a regra da livre apreciação (cfr.artº.396, do C.Civil), este Tribunal concorda com a decisão da matéria de facto efectuada pela sentença recorrida (cfr.nº.4 da factualidade provada), concordância esta que se estende à fundamentação da mesma.
Mais se deve recordar que a desconsideração dos custos contabilizados pela sociedade impugnante se baseou no exame da documentação contabilística apresentada pela mesma e respectivo cruzamento com a restante prova documental constante dos anexos ao relatório de inspecção. Portanto, as conclusões da Fazenda Pública foram fundadas no exame de prova documental. Tais conclusões foram corroboradas pelo Tribunal “a quo”, agora também com base na produção de prova testemunhal.
Arrematando, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente este fundamento do recurso.
Aduz, igualmente e em sinopse, a sociedade recorrente que atento o teor dos documentos e dos depoimentos prestados é inequívoco que a sociedade recorrente incorreu nos custos com a execução do Parque Urbano, sendo os mesmos condição indispensável para a aprovação do loteamento e consequente venda dos lotes. Que os "custos" contabilizados como inerentes à execução do Parque Urbano estão justificados por uma estimativa orçamental, nos termos do artº.115, nº.3, al.a), do C.I.R.C. Que falecem os pressupostos em que assenta o acto de liquidação controvertido, a saber, a inexistência de nexo causal e a falta de idoneidade da estimativa que suporta a contabilização dos custos. Que o Tribunal “a quo” valida o acto de liquidação com fundamentos diferentes dos constantes do relatório da inspecção tributária. Que ao Tribunal de 1ª Instância não cabe sanar os vícios dos actos de liquidação, mas tão só pronunciar-se sobre a sua legalidade em face dos pressupostos enunciados pela Administração Tributária. Que a decisão recorrida viola o regime do artº.19, do C.I.R.C. Que a não consideração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado ano ou exercício económico consubstancia, não só violação do princípio da especialização de exercícios, como também do princípio da tributação do lucro real consagrado no artº.104, nº.2, da C.R.P. (cfr.conclusões 10 e 18 a 43 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A fundamentação essencial da correcção sob exame encontra-se nos nºs.2 e 4 do probatório, para onde se remete.
Contrariamente ao que defende o apelante, a sentença recorrida não valida o acto de liquidação com fundamentos diferentes dos constantes do relatório da inspecção tributária. Assim é, porquanto, a fundamentação jurídica da decisão do Tribunal “a quo” (cfr.fls.630 e 631 do processo físico), na parcela em que examina esta correcção efectuada pela A. Fiscal, concorda/remete para o relatório de inspecção concluindo que a estimativa de tais custos não tem qualquer aderência à realidade, situação que igualmente é reconhecida pelo Município da Amadora em resposta que consta do anexo VII ao mesmo relatório (cfr.documento junto a fls.116 a 120 do processo administrativo apenso).
Por outro lado, recorde-se que o Tribunal é livre de conhecer dos aspectos jurídicos da causa (interpretação e aplicação das regras de direito), com independência das razões invocadas pelas partes, conforme já vincado acima.
Concluindo, o Tribunal “a quo” não apresenta diferente fundamentação para a correcção sob exame.
Mais defende o recorrente que os "custos" contabilizados como inerentes à execução do Parque Urbano estão justificados por uma estimativa orçamental, nos termos do artº.115, nº.3, al.a), do C.I.R.C.
Ora, o citado preceito apenas se limita a consagrar as obrigações contabilísticas dos sujeitos passivos de I.R.C. (cfr.anterior artº.98, do C.I.R.C.), sendo que no seu nº.3, al.a), se estabelece a necessidade dos lançamentos contabilísticos estarem devidamente apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário, situação que no caso “sub judice” se não verifica, conforme constatou a A. Fiscal e decidiu o Tribunal “a quo”.
Em epílogo, a dita estimativa orçamental padecia de falta de prova.
Aduz, igualmente, o apelante que a decisão recorrida viola o regime do artº.19, do C.I.R.C.
O regime previsto no artº.19, do C.I.R.C., na redacção em vigor no ano de 2004, encontra-se devidamente estudado supra, para onde se remete.
Quanto à alegada violação do dito regime por parte da decisão recorrida, não vislumbra este Tribunal a mesma, sendo que o recorrente também não a concretiza.
Apenas se deve acrescentar que a correcção da A. Fiscal sob apreciação se baseou, tal como a relativa ao acréscimo de despesas em resultado do realojamento de colectividades, no artº.23, do C.I.R.C.
Defende, ainda, o apelante que a não consideração dos custos relativos à execução do Parque Urbano consubstancia, não só violação do princípio da especialização de exercícios, como também do princípio da tributação do lucro real consagrado no artº.104, nº.2, da C.R.P.
A vida de uma unidade económica não possui, em regra, qualquer limitação temporal, caracterizando-se pelo desenvolvimento de uma actividade de duração tendencialmente ilimitada, facto, aliás, que suporta a previsão, em sede do direito contabilístico, do princípio da continuidade da exploração. Porém, a actividade da unidade económica evolui em diversas fases, temporalizadas por exercícios económicos, genericamente coincidentes com o ano civil, realidade que alicerça, em termos de contabilização e de tributação, a previsão do princípio da especialização ou do acréscimo, ínsito no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outra palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados, nisto se expressando o dito princípio da especialização dos exercícios (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/4/2008, rec.807/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/9/2012, proc. 3145/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2014, proc.2832/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/06/2015, proc.8630/15; J.L.Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Deveres de Cooperação, Autoavaliação e Avaliação Administrativa, 2ª. Edição, Lex, 2000, pág.224 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.172 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.64 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, mais uma vez não vislumbra este Tribunal que a correcção da A. Fiscal incidente sobre o acréscimo de custos relativo ao "Parque urbano do N…" viole o dito princípio da especialização ou do acréscimo, sendo que o recorrente também não a concretiza. E recorde-se que em causa está, desde logo, a falta de prova da existência dos custos.
Passemos ao princípio constitucional da tributação pelo rendimento real.
O princípio da tributação pelo lucro real, como opção de tributação relativa aos entes empresariais, encontra consagração no artº.104, nº.2, da C.R.Portuguesa.
Porém, tal princípio, não é absoluto, como desde logo a redacção da sua norma o pressupõe, ao dispor que a tributação das empresas incide "fundamentalmente" sobre o seu rendimento real, e não em todo e qualquer caso, antes tendo de ser concatenado com outros princípios constitucionais e normas constantes em diversos diplomas legais infra-constitucionais, como seja, por exemplo, o da satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas (artº.103, nº.1, da C.R.P.), tal como os artºs.18 e 23, do C.I.R.C. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2014, proc.6694/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/10/2015, proc.8843/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/02/2017, proc.6423/13; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.1100).
No caso "sub judice", não lobrigando o Tribunal no que possa ter violado o mesmo princípio constitucional a correcção à matéria colectável sob apreciação (o recorrente também nada concretiza de palpável neste domínio), julga-se improcedente o presente esteio do recurso.
Finalizando, não vislumbra este Tribunal que a sentença recorrida viole o disposto nos artºs.104, nº.2, da C.R.Portuguesa, e 18 e 19, do C.I.R.C.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida neste segmento, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1-CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA, em consequência do que se revoga a sentença recorrida neste trecho e se julga improcedente a impugnação;
2-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DEDUZIDO PELA SOCIEDADE IMPUGNANTE e confirmar a decisão recorrida neste segmento.
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Condena-se a recorrente "A….. - Planeamento, Desenvolvimento Urbano e Construções, S.A." em custas em ambas as instâncias.
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Registe.
Notifique.
Ofício junto a fls.873 do processo físico: satisfaça, remetendo cópia do presente acórdão.
D.N.
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Lisboa, 19 de Dezembro de 2018



(Joaquim Condesso - Relator)



(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Lurdes Toscano - 2º. Adjunto)