Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:372/10.9BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2019
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO DEVE BASEAR-SE NUM RESULTADO RACIONALMENTE SUSTENTADO.
SUJEITO PASSIVO DA RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA DE SISA. MATÉRIA COLECTÁVEL DO IMPOSTO DE SISA.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO.
NATUREZA RECEPTÍCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
NOTIFICAÇÃO COMO SIMPLES CONDIÇÃO DE EFICÁCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO DE SISA.
IMPOSTOS DE OBRIGAÇÃO ÚNICA. TERMO INICIAL DO PRAZO DE CADUCIDADE.
INCIDÊNCIA DA SISA SOBRE O VALOR DAS BENFEITORIAS IMPLANTADAS NOS PRÉDIOS.
AQUISIÇÕES DE BENFEITORIAS. ARTº.8, Nº.4, DO C.I.M.S.I.S.S.D.
BENFEITORIAS. NOÇÃO.
CÔMPUTO DO PRAZO DE CADUCIDADE A PARTIR DO MOMENTO EM QUE O DIREITO PODE SER EXERCIDO (CFR.ARTº.329, DO C.CIVIL).
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
5. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
6. O Tribunal de 2ª. Instância pode/deve modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova produzidos, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a regra da livre apreciação da prova, quando aplicável, um resultado diferente do produzido pelo Tribunal “a quo” que seja racionalmente sustentado.
7. O sujeito passivo da relação jurídico-tributária de sisa era o transmissário, ou seja, aquele que recebia os bens imóveis transmitidos (no caso de venda é o comprador) e a matéria colectável do imposto (pressuposto objectivo genérico de qualquer relação jurídico-tributária) era constituída pelo valor do imóvel, correspondendo o conceito fiscal de transmissão ao do direito privado, isto é, só é transmissão a perda relativa e a aquisição derivada de direitos, exceptuando os casos em que a lei fiscal dispuser o contrário (artºs.7 e 19, do C.I.M.S.I.S.D.).
8. Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere.
9. No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos.
10. A possibilidade de exame da caducidade do direito à liquidação pode verificar-se no âmbito do processo de impugnação, desde que estejamos perante situação que se reconduz à estruturação de liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo. Mais se dirá que a conjuntura de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, pode visualizar-se como fundamento do processo de impugnação judicial ou do processo de oposição à execução fiscal.
11. A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação.
12. No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor).
13. O prazo de caducidade do direito à liquidação de sisa não era de oito anos nos termos do artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., na redacção do dec.lei 472/99, de 8/11 (cfr.artº.35, nº.1, do actual C.I.M.T.).
14. Nos impostos de obrigação única, como era o caso do Imposto Municipal de Sisa, o facto gerador de imposto se produzia de forma instantânea, sendo nesse momento que ocorria o termo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação.
15. Regra geral, a sisa incide sobre o valor das benfeitorias implantadas nos prédios transmitidos e que não esteja incluído no respectivo valor patrimonial, nos termos do artº.19, § 2, “in fine”, do C.I.M.S.I.S.S.D.
16. Nos termos do artº.8, nº.4, do C.I.M.S.I.S.S.D., as aquisições de benfeitorias estão sujeitas a sisa.
17. As benfeitorias (cfr.artº.216, do C.Civil) consubstanciam melhoramentos introduzidos numa coisa alheia pela pessoa que a detém, designadamente, a título de usufruto, posse ou locação. São esses melhoramentos materiais (partes integrantes e pertenças) quando transmitidos, onerosamente, ao proprietário que estão abrangidos por esta norma de incidência.
18. O prazo de caducidade de oito anos previsto no citado artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., deve ter, no caso concreto, o seu termo inicial indexado à data da possibilidade de conhecimento, por parte da A. Fiscal, do não cumprimento da mencionada norma de incidência, tudo, de resto, de acordo com o princípio geral de cômputo do prazo de caducidade a partir do momento em que o direito pode ser exercido (cfr.artº.329, do C.Civil).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.115 a 127 do presente processo que julgou parcialmente procedente a impugnação intentada pelo recorrido, “P…….. - Propriedades e Equipamentos, S.A.”, visando acto de liquidação de Sisa e juros compensatórios no montante total de € 58.442,90.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.133 a 138-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-A Impetrante apresentou impugnação judicial da liquidação oficiosa de SISA e juros compensatórios, resultante da transmissão de benfeitorias realizadas, relativas à construção de um pavilhão industrial e escritório (2 pisos), integrado no designado “Futuro Edifício R……”;
2-Alega para o efeito preterição de formalidades essenciais, caducidade do direito à liquidação, e, ainda na existência de erro sobre os pressupostos de facto e de direito;
3-A decisão recorrida que julgou parcialmente procedente a presente impugnação judicial considerou como facto provado, no parágrafo H) da sentença que «A construção do “pavilhão industrial” e do “escritório (2 pisos)”, identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) sob o item “Futuro Edifício r……” foi realizada durante o ano de 2001.»;
4-Não podemos deixar de dissentir da decisão proferida, pelas razões que sustentam o presente recurso, sob o prisma do que consideramos ter sido erro de julgamento, assim, contraditando a sentença proferida em 1ª instância;
5-A sentença recorrida erra quando dá como provado que as obras que deram origem à transmissão das benfeitorias em crise foram realizadas no ano de 2001;
6-As obras em dissídio foram objeto de avaliação por uma equipa de peritos externos e independentes que analisaram e avaliaram as mesmas, tendo em vista a celebração da “escritura pública de Aumento de Capital e Alteração Parcial do Contrato de Sociedade”;
7-Dos documentos carreados aos autos, designadamente da análise ao relatório da “C.....”, melhor identificado no parágrafo do parágrafo F) dos factos provados, verifica-se que as obras em causa ainda não se encontravam concluídas à data da visita dos peritos da “C......” ao local (2 de novembro de 2002), vide ponto 3 e 4 do relatório da C......;
8-Assim, os factos dados como provados entram em contradição, pois o parágrafo f) contradiz o parágrafo h);
9-Em caso algum poderia o Tribunal a quo ter dado como facto assente a realização das obras em 2001, quando existe um documento emitido por uma entidade externa e independente que fez a sua avaliação e que afirma perentoriamente que as mesmas ainda não se encontravam concluídas à data da sua visita ao local - novembro de 2002, aceitando, no entanto, que as mesmas pudessem estar concluídas no final de dezembro de 2002;
10-De salientar, que a impugnante nunca colocou em causa as datas constantes do relatório da “C......”, pelo que devem as mesmas ser aceites como verdadeiras/fidedignas;
11-Entende o Tribunal a quo que a transmissão das benfeitorias se verifica na data da sua integração/corporização no imóvel;
12-Partindo do raciocínio jurídico atrás referido, o que apenas se admite à cautela e se procura infirmar na 2ª parte do presente recurso, demonstrando-se que as obras não foram concluídas no ano de 2001, mas na melhor das hipóteses no final do ano de 2002, facilmente se tem de concluir pela validade da liquidação oficiosa de SISA e respetivos juros compensatórios;
13-A liquidação oficiosa foi notificada à impugnante através do ofício emitido pelo SF de Torres Novas em 25.01.2010;
14-Considerando a data de conclusão das obras que deram origem às benfeitorias e a data do ofício emitido pelo SF de Torres Novas, que procedeu à notificação das liquidação de SISA e juros compensatórios, facilmente se alcança que esta não se encontrava caducada;
15-Ao contrário do defendido pelo Tribunal a quo ainda não tinham decorrido os oito anos que a lei estipulava para a tributação da transmissão das benfeitorias, nos termos do disposto nos artigos. 8.º, n.º4, 92.º, 115.º e 116.º, todos do antigo Código da SISA;
16-Considerando o erro de apreciação da prova produzida pelas partes e dada como assente pelo Tribunal a quo, deve, sem mais, ser dado provimento ao presente recurso;
17-Não obstante, e caso assim não se entenda, o que apenas se admite à cautela, dir-se-á ainda que existe erro de julgamento por errado enquadramento jurídico do caso posto em discussão;
18-Entende o Tribunal a quo que a data da transmissão a considerar para efeitos de contagem do aludido prazo de caducidade de oito anos, é a da integração/corporização no imóvel em causa de cada uma das benfeitorias realizadas;
19-A Fazenda Pública dissente de tal entendimento, pois considera que a transmissão das benfeitorias apenas ocorreu em 19.12.2002, data da celebração da escritura pública de “Aumento de Capital e Alteração Parcial do Contrato de Sociedade”;
20-Pois, só naquela data (19.12.2002) se verificou a transferência das benfeitorias para a esfera jurídica da sociedade impugnante;
21-O nascimento do facto tributário ocorreu com a exteriorização da vontade assumida pelas partes, ou seja na data da “entrega formal” das benfeitorias à impugnante;
22-Mais, a impugnante nunca liquidou o Imposto Municipal da Sisa, nem deu conhecimento da realização das benfeitorias, para que a Administração Tributária pudesse, em caso de falta declarativa do contribuinte, promover à competente liquidação oficiosa;
23-Entende a Fazenda Pública que só em 19.12.2002 ficou a Administração Tributária conhecedora da transmissão das benfeitorias, e não no momento da integração /corporização das mesmas no imóvel em causa, conforme sentenciado pelo Tribunal a quo;
24-Assim, pelos motivos enunciados ter-se-á de considerar que o facto tributário correspondente à transmissão das benfeitorias ocorreu em 19.12.2002, ficando nesta data sujeita a tributação, nos termos do disposto nos artigos art. 8.º, n.º 4 e 115.º, n.º 4.º, ambos do Código da SISA;
25-Pelo que, também se aponta erro de julgamento quanto à subsunção jurídica do caso posto à apreciação do Tribunal de primeira instância;
26-Não perdendo de vista a prudência que deve nortear o Tribunal Superior no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto e de direito, reputa-se ter sido ela mal julgada na instância de origem, impondo-se por isso rematar de imediato pela absoluta e total legalidade das liquidação oficiosa de SISA e juros compensatórios no valor global de 58.442,90 Euros;
27-Nestes termos e nos demais de facto e de Direito, que certamente o mui douto entendimento do Insigne Colectivo não deixará de convocar, defende a Representação da Fazenda Publica o provimento do presente recurso jurisdicional, determinando a revogação da decisão provinda do Tribunal a quo, substituindo-a por decisão que determine o decaimento do pedido anulatório formulado na impugnação judicial pleiteada, fazendo-se assim, a COSTUMADA JUSTIÇA!
X
O impugnante/recorrido produziu contra-alegações (cfr.fls.140 a 145-verso do processo físico), as quais remata com o sequente quadro Conclusivo:
1-A sentença recorrida anulou e bem “as liquidações impugnadas na parte influenciada pelas benfeitorias respeitantes ao pavilhão industrial e ao escritório (2 Piso), identificados sob o item futuros edifício de r....... no quadro de avaliação a que se alude em G) dos factos provados.”;
2-Inexistindo qualquer erro de apreciação da prova produzida pelas partes e dada como assente pelo Tribunal a quo;
3-No facto H ) deu se como provado que “a construção do pavilhão industrial e de Escritório (piso 2) identificados no quadro de avaliação a que se alude em G) sob o item futuro edifício de r…….. foi realizadas durante o ano de 2001; e a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo é clara quando diz que quanto ao facto sob a al. H) do probatório formou a sua convicção fundado no depoimento das testemunhas que depuseram com segurança e coerência tendo demonstrado a sua razão de ciência relativamente aqueles factos;
4-As testemunhas inquiridas quanto a este facto, a que se refere o Tribunal, foram trabalhadores que trabalharam naquelas obras, pelo que obviamente eles melhor que ninguém sabem a data em que as obras foram concluídas;
5-Já o facto F) dos factos dados como provados deu como provado que a “C..... C...... de A......, Lda.” foi elaborado documento denominado “M…… – Estimativa de Custo das Obras de Beneficiação nas Instalações Industriais da M….. G….., em Torres Novas”, datado de 02.12.2002;
6-O facto dado como provado em F) em nada é contraditório com o facto dado como provado em H) como a recorrente Fazenda Nacional pretende fazer crer, porquanto no facto F) o que se dá como provado é a elaboração de um relatório pela C......, datado de 02.12.2002, com o conteúdo acima mencionado;
7-Não se dá como provado os factos constantes daquele relatório e consequentemente que as obras construção do pavilhão industrial e de Escritório (piso 2) identificados no quadro de avaliação a que se alude em G) sob o item futuro edifício de r……. Só ficaram concluídas no ano de 2002;
8-Aliás tal relatório trata-se de um documento particular e a força probatória do documento particular circunscreve-se no âmbito das declarações (de ciência ou de vontade) que nela constam como feitas pelo respectivo subscritor;
9-Tal como no documento autêntico, a prova plena estabelecida pelo documento respeita ao plano da formação da declaração, não ao da sua validade ou eficácia. Mas, diferentemente do documento autêntico, que provém de uma entidade dotada de fé pública, o documento particular não prova plenamente os factos que nele sejam narrados como praticados pelo seu autor ou como objecto da sua percepção directa;
10-O documento autêntico prova a verdade dos factos que se passaram na presença do documentador, quer dizer, os factos que nele são atestados com base nas suas próprias percepções, mas não fia a veracidade das declarações que os outorgantes fazem ao documentador; só garante que eles as fizeram;
11-Nessa medida, apesar de demonstrada a autoria de um documento (Relatório da C.....), daí não resulta, necessariamente, que os factos compreendidos nas declarações dele constantes se hajam de considerar provados, o mesmo é dizer que daí não advém que os documentos provem plenamente os factos neles referidos;
12-Se o decisor de facto da 1ª instância formou a sua convicção sobre a veracidade e a irrealidade dos factos cujo julgamento é impugnado no recurso, também na prova testemunhal, deve exigir-se aos documentos nos quais o recorrente funda a impugnação um valor probatório tal que imponha para aqueles factos uma decisão diversa que não possa ser destruída por aquela prova pessoal;
13-Um dos aspectos da impugnação empreendida pelo apelante contra a decisão da matéria de facto que logo fere a atenção respeita às provas que, no seu ver, impõem, para os factos objecto de controversão, decisão diversa da encontrada pelo decisor da 1ª instância;
14-Essa prova resume-se à prova documental - mais exactamente ao Relatório da C......;
15-É nessa prova - e só nessa prova - que o apelante funda o error in iudicando que imputa á decisão impugnada, e pese embora faça referencia ao depoimento das testemunhas da recorrida não faz qualquer referência ao registo da gravação do depoimento das testemunhas tal como seria sua obrigação;
16-Simplesmente, uma leitura ainda que pouco detida da motivação adiantada pelo Sr. Juiz a quo para fundamentar a decisão da matéria de facto, torna patente que uma das provas que exerceu no seu espírito uma influência considerável, foi a prova testemunhal, mais precisamente, os depoimentos das testemunhas …, produzidas pela apelada;
17-Ora, tendo o decisor de facto da 1ª instância formado a sua convicção sobre a veracidade e a irrealidade dos factos apontados também na prova testemunhal, então aos documentos no qual o recorrente funda a impugnação deve exigir-se um valor probatório tal que imponha para os apontados factos uma decisão diversa que não possa ser destruída por aquela prova pessoal (artº 662 nº 1 do CPC);
18-Ora não sucedendo jamais pode a decisão sobre a matéria de facto ser alterada como pretende a recorrente, devendo manter-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo e consequentemente que o direito à liquidação da Fazenda Nacional no que respeita as benfeitorias respeitantes ao pavilhão industrial e ao escritório (2 Piso), identificados sob o item futuros edifício de r…….. no quadro de avaliação a que se alude em G) dos factos provados, realizadas no ano de 2001 se encontra caducado;
19-Devendo em consequência manter-se a anulação das liquidações tal como determinada pelo douto Tribunal na sentença recorrida;
20-Termos em que deve ser negado provimento ao recurso apresentado pela Fazenda Nacional, mantendo-se a sentença proferida nos autos. Assim se fará a costumada justiça.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do presente recurso (cfr.fls.157 a 159 do processo físico).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.115 a 123 do processo físico):
A-No Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas correu termos “Ação Especial de Recuperação de Empresa”, a que corresponde o Processo n.º …../96, e no qual figura como requerente “M…. C….. N……, SA” (cfr.certidão junta a fls.73 a 91 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
B-No âmbito do processo a que se alude em A) foi apresentado documento denominado “Relatório do Gestor Judicial”, do qual consta conforme segue, na sua versão final:
«(…)
5.2 Gestão controlada
Analisada a situação económico-financeira da M….. C….. N…., S.A. e os meios de recuperação previstos no Decreto-Lei n° 132/93 de 23 de Abril, avaliadas as condicionantes atrás referidas e feito o estudo de viabilidade, o meio de recuperação que nos parece mais apropriado é o da GESTÃO CONTROLADA aplicado pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável por mais 1 (um) ano conforme estipula os artigos 979 a 117° do CPEREF.
5.3 Plano: Linhas gerais
5.3.1. - Gestão controlada por 1 (um) ano prorrogável por mais 1(um);
5.3.2. - Designação para a Administração de: A………; S…….. e M…….;
5.3.3. - Designação para a Comissão de Fiscalização de:
a) Estado, que presidirá
b) J.J….. das N….., S.A., vogal efectivo;
c) Centro Regional de Segurança Social de Lisboa e Vale do Tejo, vogal efectivo
d) C……., S.A. (como suplente)
(…)
5.3.7. - Constituição de uma nova sociedade, a N………-Investimentos S.A., para a qual será transferido livre de ónus ou encargos, o imóvel da M….. G……, com o valor de balanço igual ao valor de avaliação encontrado pela C..... - 424 500 000$00, sendo o capital social de 424 500 000$00 representado por 424 500 acções no valor nominal de 1 000$00, sendo inicialmente estas acções detidas pela M…. C….. N…., S.A.
O capital social poderá ser subsequentemente aumentado, mediante subscrição de novas acções pela M……., S.A. pelo valor das benfeitorias feitas por esta última no imóvel da M…. G….., corrigindo-se em consequência o valor do activo da sociedade N……- Investimentos, S.A.
O processo de avaliação de novas benfeitorias e aumento de capital depois de realizado inicialmente com base em avaliação a solicitar à C...... -C......., será renovado anualmente.
As despesas de construção civil necessárias para a Instalação de equipamentos pesados são consideradas benfeitorias para efeitos do presente número.
(…)»
(cfr.documento junto a fls.73-verso a 80-verso do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
C-No âmbito do processo a que se alude em A) foi proferida sentença datada de 23.10.1998, da qual consta, além do mais, o seguinte:
«SENTENÇA
Face à percentagem de votos favoráveis ao plano de recuperação proposto, homologo por sentença a medida de recuperação de gestão controlada proposta nos termos de fls. 2017 a 2021.
Para Administração e Comissão de Fiscalização, são nomeadas as pessoas e as entidades referidas na proposta a fls.2017 devendo os autos aguardar até ao fim do 5° dia útil após esta assembleia a indicação pelas entidades nomeadas praa Comissão de Fiscalização das pessoas que as irão representar.
(…)»
(cfr.documento junto a folhas 81 a 85 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
D-Na sequência da interposição de recurso da sentença a que se alude em C), foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Coimbra, do qual consta, além do mais, o seguinte:
«DECISÃO
Mantém-se a sentença recorrida, explicitando-se, todavia, que a medida de recuperação homologada não atinge os direitos dos trabalhadores que a ela não deram o seu acordo, nem os direitos dos trabalhadores que lhe deram o seu acordo, na parte em que este atinja a zona de impenhorabilidade dos seus créditos.
(…)»
(cfr.documento junto a fls.88 a 91 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
E-O acórdão a que se alude em D) transitou em julgado em 05.01.2000 (cfr.teor de certidão junta a fls.73 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
F-Pela “C.... C...... de A......, Lda.” foi elaborado documento denominado “M……. - Estimativa de Custo das Obras de Beneficiação nas Instalações Industriais da M….. G……., em Torres Novas”, datado de 02.12.2002, do qual consta, além do mais, o seguinte:

«(…)
“Texto integral com imagem”

(…)


(…)»
(cfr.documento junto a fls.27 a 31 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
G-O documento a que se alude em F) é integrado por “Quadro de Avaliação” do qual consta o seguinte:
«(…)
“Texto integral com imagem”

(…)»
(cfr.documento junto a fls.27 a 31 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
H-A construção do “pavilhão industrial” e do “escritório (2 pisos)”, identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) sob o item “Futuro Edifício r……” foi realizada durante o ano de 2001;
I-No ano de 2002 efetuaram-se operações de montagem e assentamento de máquinas no imóvel da “M……. G……..” a que se alude em F);
J-No ano de 2002 efetuou-se a montagem e “assentamento” de um torno no imóvel da “M…… G……” a que se alude em F);
K-A montagem do torno a que se alude em J) implicou a utilização de uma grua, para cuja entrada no edifício foi necessário proceder à movimentação de máquinas pequenas e à retirada de algumas “asnas do telhado”;
L-No dia 19.12.2002 foi outorgada escritura de “Aumento de Capital e Alteração Parcial do Contrato de Sociedade” da qual consta, além do mais, o seguinte:
«(…)

“Texto integral com imagem”

(…)»
(cfr.documento junto a fls.131 a 135 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
M-O Chefe do Serviço de Finanças de Torres Novas proferiu (por delegação) “despacho/projecto de decisão”, datado de 12.11.2009, sob o assunto “Imposto Municipal Sisa - IMT - Imposto Municipal s/ as Transmissões Onerosas de Imóveis”, do qual consta conforme segue:
«(…)


“Texto integral com imagem”


(…)»
(cfr.documento junto a fls.19 e 20 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
N-O Serviço de Finanças de Torres Novas remeteu à impugnante, “P……. - Propriedades e Equipamentos, S.A.”, documento denominado “Notificação/Direito de Audição”, sob o assunto “Imposto Municipal de Sisa - Transmissão de Benfeitorias no valor de € 566.499,73, à data de 2002-12-19” (cfr.documento junto a fls.10 a 12 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
O-Em 02.12.2009 foi recebido no Serviço de Finanças de Torres Novas, documento em nome da impugnante com vista a exercer o respetivo “Direito de Audição Prévia”, do mesmo constando, além do mais, a indicação de duas testemunhas a ser ouvidas (cfr.documento junto a fls.21 a 26 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
P-Em 25.01.2010 foi proferido despacho sob o assunto “Imposto Municipal Sisa - IMT - Imposto Municipal s/ as Transmissões Onerosas de Imóveis”, do qual consta, além do mais, o seguinte:
«(…)
(…)»
(cfr.documento junto a fls.17 e 18 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido);
Q-O Serviço de Finanças de Torres Novas remeteu à impugnante ofício datado de 25.01.2010, recebido em 26/01/2010, sob o assunto “Imposto Municipal Sisa - Transmissão de Benfeitorias no valor de € 566 499,73 - Ano de 2002”, do qual consta, além do mais, o seguinte:
«(…)
(…)»
(cfr.documentos juntos a fls.16 a 18 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; factualidade admitida no artº.6 da p.i.);
R-A petição da impugnação foi recebida no Serviço de Finanças de Torres Novas em 19.02.2010 (cfr.carimbo aposto a fls.1 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Considera este Tribunal não se ter logrado provar a factualidade seguinte:
1-Que as operações identificadas no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) dos factos provados, sob o item “Edifício 3 - Fundição/ Carpintaria/Refeitório”, foram terminadas em novembro de 2001;
2-Que as infraestruturas e áreas exteriores, em particular, o alcatroamento exterior e frontal; a pavimentação da entrada da casa da cisterna; a colocação de mastros à entrada da fábrica, a colocação de dois postes eléctricos, a abertura de valas para tubagens de eletricidade e água, todos identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) dos factos provados, foram terminadas em novembro de 2001;
3-Que os “telheiros para estacionamento”, os “mastros” e o “forno de aço” identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) dos factos provados, não se encontravam integrados, com caráter de permanência, no “imóvel da M…… G…….”, a que se alude em F) dos factos provados…”.
X
A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, com base nos documentos constantes dos autos, acima identificados.
Quanto ao facto sob a alínea a H) do probatório, a convicção do Tribunal fundou-se nas declarações prestadas pelo administrador da Impugnante, e, ainda, no depoimento da testemunha inquirida, a qual depôs com segurança e coerência, merecendo por isso, atenta a respetiva razão de ciência, a credibilidade do Tribunal.
Quanto aos factos sob as alíneas I) a K) do probatório, a convicção do Tribunal fundou-se, igualmente, no depoimento da testemunha inquirida pelas razões acima aduzidas.
No que respeita aos factos não provados, a convicção do Tribunal deriva de, por confronto do depoimento da testemunha inquirida com as declarações do administrador da Impugnante, não resultar a respetiva confirmação com a certeza e segurança exigíveis à formação da convicção do Tribunal no sentido da verificação da aludida factualidade, nem a mesma resultar de forma inequívoca dos documentos juntos aos autos.…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, além do mais, em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
S-O imóvel sito no O….. da M….. G……, freguesia de S…. M…., concelho de Torres Novas, mencionado na escritura identificada na al.L) supra, foi adquirido pela sociedade impugnante em 23/01/2002 (cfr.cópia de certidão junta a fls.160 a 164 do processo administrativo apenso).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação que originou o presente processo, em virtude do que anulou as liquidações objecto do processo (cfr.al.Q) do probatório) na parte influenciada pelas benfeitorias respeitantes ao pavilhão industrial e ao escritório (2 pisos), identificados sob o item “futuro edifício r……” no quadro de avaliação a que se alude em G) dos factos provados, dado que transmitidas durante o ano de 2001, assim se operando a caducidade do direito à liquidação face a este segmento da liquidação de sisa.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Defende, em primeiro lugar e em sinopse, o apelante que a sentença recorrida erra quando dá como provado que as obras que deram origem à transmissão das benfeitorias respeitantes ao pavilhão industrial e ao escritório (2 pisos), identificados sob o item “futuro edifício r….....” foram realizadas no ano de 2001. Que dos documentos constantes dos autos, designadamente, da análise do relatório da “C.........”, melhor identificado na al.F) dos factos provados, verifica-se que as obras em causa ainda não se encontravam concluídas à data da visita dos peritos da “C.........” ao local, em 2 de Novembro de 2002, embora aceitando que pudessem estar concluídas no final de Dezembro de 2002. Que a sociedade impugnante nunca colocou em causa as datas constantes do relatório da “C.......”, pelo que devem as mesmas ser aceites como verdadeiras (cfr.conclusões 3 a 10 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Dissequemos se a decisão do Tribunal "a quo" padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Mais, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6. Por outras palavras, o recorrente apenas observa os ónus de impugnação legalmente exigidos, quando especifica os concretos meios de prova que impõem que, para cada um dos factos impugnados, fosse julgado não provado, quando indica qual a decisão que em concreto deve ser proferida sobre a matéria impugnada e menciona os documentos ou pontos da gravação com referência ao que ficou expresso na acta da audiência de discussão e julgamento ou, pelo menos, apresenta transcrições dos depoimentos das testemunhas que corroboram a sua pretensão (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/04/2014, proc.7396/14; ac.T.R.Lisboa, 1/03/2018, proc.1770/06.8TVLSB-B.L1-2; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/10/2018, proc.6584/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/02/2019, proc. 118/18.3BELRS).
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.8060/14).
Por último, deve vincar-se que o Tribunal de 2ª. Instância pode/deve modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova produzidos, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a regra da livre apreciação da prova, quando aplicável, um resultado diferente do produzido pelo Tribunal “a quo” que seja racionalmente sustentado (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/06/2018, proc.6499/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/02/2019, proc.118/18.3BELRS; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4ª. Edição, 2017, pág.285).
No caso concreto, se bem percebemos, o recorrente não põe em causa os depoimentos testemunhais produzidos perante o Tribunal “a quo” e que estiveram na origem da factualidade constante da al.H) do probatório (A construção do “pavilhão industrial” e do “escritório (2 pisos)”, identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude em G) sob o item “Futuro Edifício r……” foi realizada durante o ano de 2001), mais devendo levar-se em consideração a fundamentação da decisão da matéria de facto supra exarada e constante da sentença recorrida, no que se refere à identificada alínea da matéria de facto.
O que o apelante tenta realçar é a alegada contradição entre tal factualidade e a constante da al.F) dos factos provados, a qual se baseia num relatório elaborado pela “C..... C....... de A......., Lda.”, datado de 02/12/2002 e onde, defende o mesmo, as obras no pavilhão industrial e no escritório (2 pisos), identificados sob o item “futuro edifício r........” se teriam concluído somente em finais de 2002.
Ora, não vislumbra este Tribunal qualquer contradição existente entre a factualidade que se retira do relatório identificado na al.F) dos factos provados e a constante da al.H) do probatório. Concretizando, no relatório identificado na al.F) do probatório (o qual consubstancia um documento particular, assim não afastando a possibilidade de produção de prova testemunhal face à matéria de facto do mesmo constante, desde logo, porque a sociedade impugnante põe em causa o seu teor, no que se refere à data de acabamento das obras, nos artºs.17 a 20 da p.i. - cfr.artºs.376 e 392, nº.1, do C.Civil) vamos encontrar uma descrição genérica das obras realizadas pela empresa “M….., S.A.” nas Instalações Industriais da M….. G….. . De resto, do mesmo relatório, consta a admissão de que houve obras terminadas no ano de 2001, a partir de Outubro. Mais fazendo menção à existência de acabamentos interiores nas áreas de escritórios ainda por concluir. Pelo contrário, na al.H) do probatório vamos encontrar a concreta menção ao facto da construção do “pavilhão industrial” e do “escritório (2 pisos)”, identificados no “Quadro de Avaliação” a que se alude na al.G) da matéria de facto, sob o item “Futuro Edifício r…….”, ter sido realizada durante o ano de 2001.
Estamos, portanto, perante factualidade que se complementa e não que se contradiz ou contraria.
Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este alicerce do recurso.
O recorrente alega, igualmente e em síntese, que a transmissão das benfeitorias em causa nos autos apenas ocorreu em 19/12/2002, data da celebração da escritura pública de “Aumento de Capital e Alteração Parcial do Contrato de Sociedade”. Que o facto tributário correspondente à transmissão das benfeitorias ocorreu, igualmente, em 19/12/2002, ficando nesta data sujeito a tributação, nos termos do disposto nos artºs.8, nº.4, e 115, nº.4, ambos do Código da SISA. Que ainda não tinham decorrido os oito anos que a lei estipulava para a tributação da transmissão das benfeitorias, nos termos dos artºs.8, nº.4, 92, 115 e 116, todos do Código da SISA. Que existe um erro de julgamento quanto à subsunção jurídica do caso posto à apreciação do Tribunal “a quo” (cfr.conclusões 11 a 26 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O sujeito passivo da relação jurídico-tributária de sisa era o transmissário, ou seja, aquele que recebia os bens imóveis transmitidos (no caso de venda é o comprador) e a matéria colectável do imposto (pressuposto objectivo genérico de qualquer relação jurídico-tributária) era constituída pelo valor do imóvel, correspondendo o conceito fiscal de transmissão ao do direito privado, isto é, só é transmissão a perda relativa e a aquisição derivada de direitos, exceptuando os casos em que a lei fiscal dispuser o contrário (cfr.artºs.7 e 19, do C.I.M.S.I.S.S.D.).
Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. A necessária brevidade da relação jurídica que comporta um direito caducável determina que o não exercício do mesmo no prazo legal ou convencionalmente definido acarreta a sua extinção. Refira-se, ainda, que a caducidade, determinando a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gera o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição. Por último, a caducidade deve consubstanciar-se como uma excepção peremptória passível de apreciação oficiosa pelo Tribunal (cfr.artºs.328, 331 e 333, todos do C.Civil; artº.496, do C.P.Civil; Luis A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, A.A.F.D.L., 1983, pág. 567 e seg.; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1989, pág.372 e seg.; Aníbal de Castro, A Caducidade na doutrina, na lei e na jurisprudência, 3ª.edição, 1984, pág.29 e seg.).
No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7773/14; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e Anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.359 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.259 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.225 e seg.).
A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12).
Mais se dirá que a conjuntura de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, pode visualizar-se como fundamento do processo de impugnação judicial ou do processo de oposição à execução fiscal (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 12/10/2005, rec.633/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/04/2015, rec.51/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2012, proc.5594/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13).
No caso dos autos, estamos face a liquidação de sisa, sendo que, de acordo com os ensinamentos da doutrina e jurisprudência, o Imposto Municipal de Sisa deve considerar-se um tributo de obrigação única, dado que dá origem somente a uma obrigação tributária que não se renova. O período de imposto é, precisamente, o critério temporal pelo qual a lei fragmenta no tempo um facto duradouro, via de regra correspondente ao período anual. O período de imposto surge, assim, como elemento essencial do facto tributário, de tal modo que nos factos duradouros periódicos a cada período (anual) corresponde uma obrigação nova e autónoma, tudo por contraposição aos impostos de obrigação única que têm por base facto tributário instantâneo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 26/10/2011, rec.354/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/08/2012, proc.5857/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/09/2017, proc.6294/13; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Rei dos Livros, volume I, 1996, pág.130 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.45 e seg.).
Sem prejuízo de tudo o acabado de mencionar, certo é que o prazo de caducidade do direito à liquidação de Imposto Municipal de Sisa era de oito anos nos termos do artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., na redacção do dec.lei 472/99, de 8/11 (cfr.artº.35, nº.1, do actual C.I.M.T., com idêntico prazo de oito anos - cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/09/2017, proc.6294/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e Anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.363).
No caso “sub judice” o que se discute é o termo inicial deste prazo de caducidade de oito anos. Haverá que saber se tal termo inicial ocorreu ainda durante o ano de 2001, conforme decidiu o Tribunal “a quo”, no que diz respeito à parcela das liquidações objecto do processo (cfr.al.Q) do probatório) influenciadas pelas benfeitorias respeitantes ao pavilhão industrial e ao escritório (2 pisos), cujas obras terminaram em 2001. Pelo contrário, o facto tributário em causa somente ocorreu em 19/12/2002, data da celebração da escritura pública de “Aumento de Capital e Alteração Parcial do Contrato de Sociedade”, como defende o apelante, sendo esta a data do termo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação.
Vejamos quem tem razão.
Recorde-se, antes de mais, que nos impostos de obrigação única, como era o caso do Imposto Municipal de Sisa, o facto gerador de imposto se produzia de forma instantânea (conforme vincado supra), sendo nesse momento que ocorria o termo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação (cfr.José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.408).
Por outro lado, regra geral, a sisa incide sobre o valor das benfeitorias implantadas nos prédios transmitidos e que não esteja incluído no respectivo valor patrimonial, nos termos do artº.19, § 2, “in fine”, do C.I.M.S.I.S.S.D. (cfr.F. Pinto Fernandes e N. Pinto Fernandes, C.I.M.S.I.S.S.D. anotado e comentado, Rei dos Livros, 4ª. Edição, 1997, págs.320; ac.T.C.A.Norte-2ª.Secção, 28/06/2012, proc.42/06.2BEMDL).
Revertendo ao caso dos autos, a Fazenda Pública fundamenta a liquidação objecto do processo nos artºs.8, nº.4, e 115, do C.I.M.S.I.S.S.D. (cfr.al.M) do probatório).
Nos termos do citado artº.8, nº.4, do C.I.M.S.I.S.S.D., as aquisições de benfeitorias estão sujeitas a sisa. As benfeitorias (cfr.artº.216, do C.Civil) consubstanciam melhoramentos introduzidos numa coisa alheia pela pessoa que a detém, designadamente, a título de usufruto, posse ou locação. São esses melhoramentos materiais (partes integrantes e pertenças) quando transmitidos, onerosamente, ao proprietário que estão abrangidos por esta norma de incidência. Pelo contrário, se é o autor das benfeitorias a adquirir a coisa principal, não há, obviamente, a transmissão de benfeitorias (cfr.F. Pinto Fernandes e N. Pinto Fernandes, C.I.M.S.I.S.S.D. anotado e comentado, Rei dos Livros, 4ª. Edição, 1997, págs.128).
Por sua vez, o aludido artº.115, no seu n.º 4, estatui que a sisa deverá ser paga, além do mais, dentro de trinta dias contados da data do contrato, se o adquirente já estiver usufruindo os bens.
Por último, consagra o mencionado artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., na redacção do dec.lei 472/99, de 8/11, que só poderá ser liquidado imposto municipal de sisa ou imposto sobre as sucessões e doações nos oito anos seguintes à transmissão.
“In casu”, o termo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação de oito anos previsto no aludido artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., não poderia ocorrer ainda no ano de 2001, conforme decidiu o Tribunal “a quo”, por dois motivos:
1-A sociedade impugnante somente adquiriu a propriedade do imóvel onde se realizaram as benfeitorias em 23/01/2002 (cfr.al.S) do probatório), pelo que somente a partir desta data poderia ocorrer o facto tributário previsto na citada norma de incidência do artº.8, nº.4, do C.I.M.S.I.S.S.D., que não no ano de 2001;
2-Por outro lado, o dito prazo de caducidade de oito anos previsto no citado artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D., deve ter, no caso concreto, o seu termo inicial indexado à data da possibilidade de conhecimento, por parte da A. Fiscal, do não cumprimento da mencionada norma de incidência, tudo, de resto, de acordo com o princípio geral de cômputo do prazo de caducidade a partir do momento em que o direito pode ser exercido (cfr.artº.329, do C.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/03/2014, proc.7267/13). Ora, tal data deve reportar-se, obrigatoriamente, à da escritura datada de 19/12/2002 (cfr.al.L) do probatório).
Com estes pressupostos, tendo o prazo de caducidade o seu termo inicial em 20/12/2002 (cfr.artº.279, al.b), do C.Civil), pelo que se impunha que a notificação da liquidação aqui em causa fosse efectuada até 20/12/2010. Ora, a sociedade impugnante/recorrida foi notificada da liquidação de sisa em 26/01/2010 (cfr.al.Q) do probatório), pelo que, manifestamente, não ocorreu a caducidade do direito à liquidação, ainda que parcial, no caso dos autos.
Arrematando, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se procedente o presente recurso e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO e revogar a sentença recorrida, mais julgando improcedente a impugnação e mantendo as liquidações objecto do processo (cfr.al.Q) do probatório).
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Condena-se o recorrido em custas em ambas as instâncias.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 25 de Junho de 2019


(Joaquim Condesso - Relator)


(Mário Rebelo - 1º. Adjunto)


(Patrícia Manuel Pires - 2º. Adjunto)