Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07552/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/05/2015
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:CADUCIDADE DA ISENÇÃO, PREVISTA NO ARTIGO 16.º/§1, DO CÓDIGO DE SISA
Sumário:1) O preenchimento do conceito de revenda, tendo em vista obstar à caducidade da isenção, prevista no artigo 16.º, §1, do CSISA, pressupõe a outorga de contrato de compra e venda, pois que a isenção é concedida às empresas que adquirem imóveis para vender, fazendo da actividade de intermediação imobiliária a sua actividade produtiva.

2) Donde resulta que a aplicação de prédio adquirido com a isenção de SISA, ao abrigo do artigo 11.º, §3, do CSISA, em entradas em espécie, no quadro da constituição de uma sociedade de que a recorrente é a única accionista corresponde a afectação do prédio a fim diferente do da revenda, o que determina a caducidade da isenção, como foi imposto pela AF.

3) A não liquidação imediata do valor devido de Imposto de SISA, no momento em que a recorrente deu um destino diferente ao imóvel da revenda, operação que permitia a isenção nos termos do artigo 16.°, §1 do CSISA, deveu-se à falta de diligência da recorrente no respectivo pagamento do imposto.

4) Tal conduta é exigível ao operador económico diligente, colocado na posição da recorrente. A recorrente não pode olvidar que o conceito de revenda não foi preenchido com a operação por si realizada de entrega em espécie do imóvel à sociedade que constituiu, pelo que, em face da verificação da condição resolutiva da isenção, era-lhe exigível que procedesse à liquidação do imposto.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
I- Relatório
B………………..- E……………s, S.A. interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 252/271, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento da reclamação graciosa interposta contra o acto de liquidação do Imposto Municipal de SISA referente ao prédio urbano sito em Lisboa, na Avª …………… 2 -10, tornejando para a ……………. 22 a 34, inscrito na matriz da freguesia de S. José sob o artigo …………., no montante total de €474.471,86, sendo €728.966,19 de imposto e €45.505,67 de juros compensatórios.
Nas alegações de recurso de fls. 283/349, a recorrente formula as conclusões seguintes:
A) No requerimento de interposição do recurso, a Recorrente requereu que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo dado que o processo de execução, relativo à liquidação impugnada, se encontrava assegurado pela garantia bancária n° ……………….. (Doc. 1);
B) No despacho de admissão do presente recurso vem dito que o recurso tem subida imediata e efeito devolutivo, o que contraria, sem qualquer justificação ou fundamentação, o disposto no art. 286.°, n.° 2 do CPPT;
C) A garantia já prestada perante o órgão de execução fiscal onde pende o processo respetivo (art.183°, n°1 do CPPT) é suficiente para conferir efeito suspensivo ao presente recurso, assim como obstou ao prosseguimento da execução no decurso do processo de impugnação judicial;
D) O cálculo do montante da garantia foi efectuado pelo serviço de finanças competente e obedeceu ao previsto no art.199°, n°5 do CPPT, devendo continuar a ser considerada idónea já que o mesmo serviço nunca a pôs em causa ou exigiu o seu reforço, ao abrigo do n°9 do mesmo artigo;
E) Face ao que ficou dito, vem a Recorrente requerer expressamente (i) a alteração do despacho de admissão do recurso, sendo a este atribuído efeito suspensivo ou (ii) caso assim se não entenda, a indicação do montante do reforço da mesma que o Tribunal entende necessário efectuar com essa finalidade;
F) No que diz respeito aos Factos Provados, a sentença recorrida limita-se a elencar o que consta de alguns documentos juntos aos autos, como se apenas essa prova fosse relevante em matéria tributária;
G) A Juiz a quo ignorou o depoimento das testemunhas e omitiu outros documentos que atestam factos essenciais para a compreensão do que se passou e que evidenciam, não só o comportamento transparente da Recorrente, como as dúvidas e hesitações da administração tributária central que nunca respondeu às questões colocadas pelos serviços periféricos sobre a liquidação impugnada;
H) Tais factos são importantes para a decisão da causa - por permitirem aferir do abuso de direito e da violação de deveres fundamentais por parte da administração, por um lado, e da inexistência de culpa por parte do contribuinte, por outro - pelo que devem ser acrescentados à matéria de facto dada como provada, com a redação sugerida a pág.s 32 a 36 das presentes alegações;
I) Por esse motivo, a sentença recorrida encontra-se ferida de nulidade, por omissão de pronúncia sobre questões de facto essenciais para a boa decisão da causa, conforme disposto no art.668°, n1, al. d) do CPC, aplicável por força do art. 2º, al. d) do CPPT;
J) Era do perfeito conhecimento da Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património (DSISTP) que o imóvel adquirido pela Recorrente, em 07/06/2001, se destinava a revenda, por tal facto resultar do processo em que a Recorrente solicitou a concessão de benefícios fiscais, ao abrigo do DL n° 404/90, para uma operação de reestruturação em que esse mesmo imóvel iria ser transmitido para sociedade a constituir, a título de realização do capital;
K) A administração tributária estava obrigada, por força dos princípios da boa-fé, da transparência de procedimentos, do dever de colaboração e do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos, a alertara Recorrente para o efeito que, no seu entendimento, decorreria da concretização da projetada operação de reestruturação e que se iria traduzir na caducidade da isenção de sisa anteriormente concedida, por aplicação do disposto no artº16°, n° 1 do CIMSISSD, dado que entendia ocorrer «mudança de destino», conforme posteriormente invocado;
L) Contrariando esses deveres, a administração tributária não informou a Recorrente e nem sequer esclareceu os seus próprios serviços que, por duas vezes, perguntaram por escrito (em 29/04/2005 e em 11/07/2006) à DSISTP qual o enquadramento legal da situação que acabou por originara liquidação impugnada;
M) Acresce que a DSISTP havia já entendido, em casos semelhantes, que a transmissão de imóveis no decurso de operações de fusões, cisões e entradas de ativos não implicava «mudança de destino» pelo que não dava origem à caducidade da isenção prevista no artº16°, n° 1 do CIMSISSD;
N) A recusa por parte da administração tributária em admitir e reconhecer que mudou os seus procedimentos, e alterou o seu entendimento sobre esta questão, mais não faz do que evidenciar e tornar irrefutável a sua má fé em todo este processo, ficando, assim, ilidida a presunção do art.59°, n°2 da Lei Geral Tributária;
O) Ao não informar a Recorrente sobre as consequências que para ela adviriam, resultantes da aprovação da operação de reestruturação em análise naquele serviço, a administração tributária violou o disposto nos art.s 4° (princípio da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos), 5° (princípios da igualdade e da proporcionalidade), 6° (princípios da justiça e da imparcialidade), 6°-A (princípio da boa-fé) e 7° (princípio da colaboração da Administração com os particulares) do CPA, bem assim como o disposto nos art.s 55° e 59° da Lei Geral Tributária;
P) A violação dos princípios fundamentais que devem reger a atividade da administração tributária constitui violação de lei que acarreta a anulação da liquidação nesses termos efetuada, conforme resulta do disposto no art.º 135°doCPA;
Q) Para além disso, tendo a sentença recorrida omitido qualquer referência à violação destes princípios, e não se tendo pronunciado sobre as questões invocadas pela Recorrente na sua impugnação, encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art.668°, n°1, al. d) do CPC;
R) Entende o Tribunal a quo que "o prédio adquirido para revenda teve um destino diferente do da revenda", corroborando, assim, a afirmação da administração tributária que invoca ter ocorrido, no caso dos autos, «mudança de destino» sem explicar em que é que essa mudança se traduziu e quando operou;
S) Ora, a administração tributária tem vindo a entender que a «mudança de destino» se concretiza quando o bem deixa de ser considerado e tratado como uma "existência" para passar a integrar o ativo imobilizado da empresa, assumindo, assim, um carácter de permanência;
T) Não restam dúvidas de que a operação de reestruturação em causa foi levada a cabo ao abrigo do regime da neutralidade fiscal, como reconhecido - e imposto - pela própria administração;
U) Assim sendo, a mudança de titularidade da propriedade do prédio em questão não implica afetação a destino diferente, nem tal poderia acontecer de acordo com o referido princípio da neutralidade fiscal;
V) Ou seja, o prédio que se encontrava no balanço da B……………….., SA como existência, mercadoria destinada a revenda, teriam de passar para o balanço da L……………., SA, exactamente na mesma situação, continuando como mercadoria destinada a revenda, por assim obrigar a referida exigência de neutralidade fiscal;
W) Aliás, a fiscalização da observância da neutralidade fiscal impendia sobre a administração tributária que, no decurso da inspeção que levou a cabo, não logrou demonstrar, como lhe competia, que tinha havido afectação a destino diferente;
X) Assim sendo, continuou a impender sobre a nova proprietária do prédio a obrigação de proceder à sua revenda no prazo de 3 anos, sob pena de ocorrer a caducidade prevista no citado art. 16°, n° 1 do CIMSISSD que elenca três situações distintas em que se verifica tal caducidade: (i) afetação a destino diferente; (ii) não revenda no prazo de 3 anos; (iii) ou revenda novamente para revenda;
Y) Neste caso, verificado que fosse o decurso de 3 anos após a aquisição "originária" para revenda, a nova proprietária estaria obrigada a fazer a competente declaração, no serviço de finanças, no prazo de 30 dias (art.91° do CIMSISSD), para efeitos de liquidação do imposto devido ou, caso não o fizesse, tal liquidação seria oficiosa;
Z) Verificada, assim, a caducidade da isenção por aplicação do n°1 do art.16° do CIMSISSD, seria a adquirente a responsável pela liquidação e/ou pagamento do imposto, como sujeito passivo de mesmo;
AA) Seguindo este raciocínio, torna-se evidente a ilegitimidade da Recorrente /impugnante, pelo que a liquidação impugnada é ilegal, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação do disposto no art. 16°, n°1 do CIMSISSD;
BB) Vem ainda a sentença recorrida afirmar que o único sentido que o art.16°, n°1 do CIMSISSD comporta é o de considerar o conceito de «revenda» limitado ao contrato tipificado de compra e venda; contudo, a administração tributária sempre defendeu um conceito de «transmissão fiscal» que vai muito para além do conceito civilístico de compra e venda;
CC) É o conceito de transmissão de imóvel que releva para efeitos de aplicação das normas de incidência em IMT (v. art. 2°, n° 5, al.s e) e g) do CIMT) e não o de "compra e venda", ou de "revenda", que não aparece sequer definido na legislação fiscal;
DD) O conceito de «transmissão de imóvel», para efeitos de incidência do imposto, não pode ter um âmbito mais alargado do que o utilizado quando se está perante uma isenção, sob pena de gritante ofensa dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça material;
EE) Questão incontroversa e aceite pela administração tributária, pelo menos, desde o despacho de 09/07/1980 (P° 15/15, L° 14/2680) que esclarece que, para efeitos fiscais, nomeadamente de sisa, o significado do termo «aquisição» é o mesmo que o de «transmissão», pelo que os imóveis objeto do contrato de cisão/fusão beneficiariam de isenção de sisa, nos termos do art°11°, n° 3 do CIMSISD de 1958,verificados que fossem os condicionalismos legais;
FF) A atual legislação fiscal considera que são operações de concentração a fusão, a cisão e a entrada de ativos pelo que o CIRC lhes dá o mesmo tratamento fiscal; acresce ainda que a realização em espécie do capital social é, para todos os efeitos, designadamente fiscais, uma operação de transmissão de bens, móveis ou imóveis;
GG) A interpretação normativa do tribunal a quo segundo a qual, para efeitos de aplicação do art.16°, n° 1 do CIMSISSD, só existe «revenda» com a celebração de um contrato de compra e venda de imóvel, afastando a aplicação daquela norma aos casos em que a transmissão ocorreu por força de uma operação de fusão, cisão ou destaque de ativos, é inconstitucional por violação dos direitos fundamentais da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé (art.s 13° e 266° da CRP), atendendo a que, se as transmissões de imóveis efetuadas no âmbito de tais operações são consideradas relevantes para efeitos de sujeição a imposto, também o terão de ser quando está em causa uma isenção do mesmo.
HH) Para O tribunal a quo "o prazo de caducidade do direito de liquidar a dívida tributária no caso do Imposto de Sisa, apenas se inicia a partir da verificação do não cumprimento da condição resolutiva de revenda no prazo de três anos";
II) Ora, tratando-se de uma condição resolutiva, tal significa que da sua verificação resulta a resolução (extinção) dos efeitos do negócio ou ato condicional peio que, extinguindo-se a isenção condicional atribuída, fica de pé unicamente o facto tributário gerador do imposto, ou seja, a aquisição inicial; aliás, a própria administração tributária, no despacho de 15/11/2006, anexo à notificação da liquidação, identificou o facto tributário como tendo ocorrido em 07/06/2001;
JJ) Assim sendo, a caducidade do direito à liquidação ocorreu em 07/06/2005 (ou seja, anos antes da notificação da liquidação que teve lugar em 21/11/2006), por força do disposto no art.45°, n°1 da LGT, conjugado com o art.5°, n°5 do D.L. n°398/98, de 17/12, que a aprovou, o qual estipula que o novo prazo de caducidade da liquidação se aplica aos factos tributários ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998;
KK) A sentença recorrida, ao pronunciar-se sobre a responsabilidade por juros compensatórios, referiu que a mesma "tem a natureza de uma reparação civil e, por isso, depende do nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a actuação do contribuinte, bem como da possibilidade de formular um juízo de censura à sua actuação (a título de dolo ou de negligência)";
LL) Efectivamente o art.35°, n° 1 da LGT é claro quando estipula que apenas são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido, o que significa que a liquidação de juros pressupõe a culpa do contribuinte, a qual tem de ser fundamentada pela administração tributária já que a mesma não se presume;
MM) O tribunal a quo formulou um juízo de censura no que respeita à actuação da Recorrente, sem o fundamentar em factos concretos, antes se limitando a "condenar" a operação de reestruturação em si mesma, ignorando que esta foi acompanhada de perto e aprovada pela administração tributária;
NN) Por outro lado, a sentença recorrida ignora, não se pronunciando, todos os atos e omissões da administração tributária que evidenciam o incumprimento de deveres fundamentais que a deveriam nortear;
OO) A Recorrente sempre atuou de boa-fé, expôs as suas pretensões com toda a clareza, deu toda a informação relevante sobre a situação concreta e apresentou todos os documentos necessários a uma decisão esclarecida e fundamentada, como ficou demonstrado;
PP) A administração tributária teve, desde início, conhecimento completo do que estava em causa e, mesmo assim, decidiu favoravelmente a pretensão da Recorrente e concedeu-lhe os benefícios requeridos, sem proceder de imediato, após a concretização da operação de reestruturação ocorrida em 20/02/2004, à liquidação do imposto, a qual só veio a acontecer em 21/11/2006;
QQ) A Recorrente estava profundamente convencida que a operação de destaque de ativo que havia sido aprovada não implicava a caducidade da isenção de que anteriormente havia beneficiado, pois, caso contrário, teria optado por outra solução;
RR) Daqui resulta necessariamente que, no caso dos autos, não se encontra preenchido o requisito subjectivo para a liquidação de juros compensatórios, previsto no art.35°, n°1 da LGT, pelo que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, violando esta disposição legal.
Nestes termos e nos mais de Direito deve o presente recurso ser considerado procedente e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, como é de inteira Justiça!
X
Não foram apresentadas contra-alegações.
X
A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr. fls. 386/387dos autos), no qual se pronuncia no sentido da recusa de provimento ao presente recurso jurisdicional.
X
Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação
2.1. De facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
1. A ora impugnante tem como denominação "B……………….ESTACIONAMENTOS …………. S.A.", com o objecto social de "construção e exploração de parques de estacionamento compra e venda de imóveis e construção e obras públicas" exerce a actividade de "outras actividades auxiliares dos transportes terrestres" com o "CAE 052213, encontrando-se, em sede de IVA no regime normal mensal, e estando enquadrada, em sede de IRC no regime geral de tributação. (cf. print da situação cadastral a fls. 153 a 157 do Processo Administrativo e Tributário de ora em diante designado PAT e cópia de certidão da Conservatória do Registo Comercial certificada por Advogado em 26 de Agosto de 2002 constante do PAT SI 21.1502/2002 não numerado).
2. Em 7/6/2001,a ora impugnante celebrou escritura pública no 13° cartório notarial de Lisboa para a aquisição pelo preço de EUR 4.289.661,91 do prédio urbano sito na …………….. 2 a 10, tornejando para a ………………. 22 a 34, descrito na 7ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n°…., inscrito na Matriz predial da freguesia de S. José sob o artigo ……, à data com o valor patrimonial EUR 88.156,00 (cf. cópia da escritura pública a fls. 142 a 147 do PAT).
3. Em 12/6/2001 a impugnante requereu ao chefe de finanças do 3.° Bairro fiscal de Lisboa a isenção de contribuição autárquica referente ao prédio identificado em 2) com o fundamento de o mesmo se destinar a revenda, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. cópia do requerimento a fls. 82 dos autos)
4. A transmissão referida no ponto n°2 ficou isenta de imposto de SISA em virtude da compra se destinar a revenda (cf. escritura pública a fls. 142 a 147 do PAT, depoimento convergente da testemunha Hernâni …………….).
5. Em 23/9/2002 a impugnante peticionou à administração fiscal a concessão de benefícios fiscais, cujos termos do pedido aqui se dão por reproduzidos e do qual consta (cf. cópia da petição a fls. 44 a 64 dos autos): " Pedido de Concessão de benefícios fiscais e outros, ao abrigo do DL 404/90, de 21 de Dezembro para a operação de transferência de activos da B……………………. – Estacionamentos ……………, SA (sociedade contribuidora) para a L…………………. - ………………….., SA (Sociedade beneficiária) (...)"
6. Em 18/12/2002, foi proferido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais despacho de deferimento do "pedido de isenção dos impostos da sisa e do selo, bem como emolumentos e outros encargos legais, formulado pela impugnante e por "L……………. - Investimentos ……………, SA, ao abrigo do DL 404/90 de 21 de Dezembro, identificado no ponto anterior e relativo a uma operação de destaque de parte do património da B…………………-Estacionamentos para a L…………… que passou a denominar-se P.M………….. – Investimentos ………….., S.A. "conforme despacho e informação da DSISTP, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. informação do DSISTP e despacho constante do PAT SI 21.1502/2002 não numerado).
7. Em 10/1/2003 foi proferido em delegação de competências pelo director de serviços o despacho de indeferimento aposto na informação da Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património, emitida em 13 de Dezembro, no processo S. I. 18. 1900. 2002, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e da qual consta o seguinte (cf. cópia do despacho e informação a fls. 70 e 71 dos autos):
“(…)
REQUERENTES: - R……………& N………., Lda., (...)
"ASSUNTO: Requer isenção do Imposto Municipal de SISA ao abrigo do n°15 do artigo 13°, do código 24-11-1958, relativamente à aquisição que pretende efectuar, do que pode inferir-se pelo pedido, tratar-se de um prédio, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de São José sob o artigo …...
INFORMAÇÃO
Compulsados os restantes elementos trazidos ao processo constata-se que, o documento emitido pelo Instituto Português do Património Arquitectónico refere que o imóvel sito na Av. ……………., n°2 a 10, tornejando para a Rua …………, freguesia de S. …………, concelho de Lisboa, não está classificado e não tem isenção fiscal.
Com efeito, não estão reunidos os pressupostos legalmente exigíveis conducentes à resolução favorável do pedido, parecendo deste modo, de corroborar aquele entendimento, propondo-se o indeferimento por não se enquadrar na previsão dos artigos 46° e 60° da Lei 13/85, de 13 de Julho.
(…)”
8. Em 12/11/2003 a impugnante requereu à Ministra das Finanças "um aditamento ao proc. n.°SI21.15.02.02, Pedido de concessão de benefícios fiscais e outros ao abrigo do DL 404/90, de 21 de Dezembro" cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido (cf. cópia do requerimento a fls. 72 a 80 dos autos).
9. Em 13/1/2004, foi proferido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais o despacho de deferimento do pedido identificado no ponto anterior, formulado por "B………………….. - Estacionamentos ………………, SA" para a operação de destaque do Cinema ………….. e a realização do capital social de uma empresa a constituir, em que a impugnante seria a única accionista." (cf. requerimento constante de fls. 112 a 120 do PAT, cópia constante a fls. 83 a 85 dos autos, cópia do oficio a fls. 100 dos autos).
10. Em 20/2/2004 foi constituída por escritura pública a sociedade "L……………… -Investimentos …………….., SA", sendo, sua única accionista a "B…………….. -………………., SA (cf. cópia da escritura pública e do contrato de sociedade a fls. 80 a 102 do PAT).
11. Para a realização do capital social da sociedade identificada no ponto anterior, a ora impugnante efectuou uma entrada em espécie, transmitindo para a L…………….. - ……………………, SA" o prédio identificado no ponto n°2 (cf. cópia da escritura pública e do contrato de sociedade a fls. 80 a 102 do PAT, identificação do proprietário a fls. 139 e 140 do PAT).
12. Em 21/12/2004, foi emitido pela Administração Tributária o oficio n°7271, tendo por assunto "notificação nos termos e para os efeitos do artigo 60° da LGT" relativa ao entendimento do serviços da Administração Tributária que, havia caducado a isenção descrita no ponto 3, em virtude de, ter sido dado ao imóvel em questão, um destino diferente da revenda, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, e que foi remetido à ora impugnante através de correio registado com aviso de recepção, (cf. oficio a fls.148 e 149 do PAT).
13. Em 10/1/2005, a Impugnante pronunciou-se em sede de audiência prévia sobre a notificação descrita no ponto anterior, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. requerimento a fls. 138 do PAT).
14. Em 15/11/2006 foi proferido pelo Chefe de Finanças, por delegação, o despacho no sentido dos serviços procederem à liquidação oficiosa do imposto e respectivos juros compensatórios, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. cópia do despacho a fls.26 e 27 do PAT):
“Serviço de Finanças de Lisboa 03
DESPACHO

B…………….. ESTACIONAMENTOS ……………. S.A., NIF ……………., por escritura pública de 2001-06-07, comprou o prédio urbano sito em Lisboa, na Avª ……………. 2 -10, tornejando para a …………….. 22 a 34, inscrito na matriz da freguesia de S. ………. sob o artigo …………….

A compra foi efectuada pelo preço de 860.000.000$00 e, à data, o imóvel tinha o valor patrimonial de 17.673.691$00.

O imóvel adquirido destinava-se a revena e a aquisição beneficiou da isenção estabelecida no nº3 do artigo 11º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações CIMSISSD.

Por escritura pública de 2004-02-20, foi construída a sociedade L…………….- INVESTIMENTOS …………., S.A., NIF ………….., tendo como única accionista a B……………………. ESTACIONMENTOS ……………… S.A..

Para a realização do capital social, a B…………….. ESTACIONAMENTOS …………….. S.A., transmitiu para a L………………….,S.A., o aludido prédio.

A coberto do Oficio nº7271, de 2004-12-21 e para efeitos do direito de audição antes da liquidação a que se refere o artigo 60º da Lei Geral Tributária (LGT), a B…………………., S.A., foi notificada de que a isenção havia caducado nos termos do artigo 16º, nº1 do CIMSISSD.

Em 2005-01-10, a B……………….., S.A., respondeu que a transmissão do imóvel para a L………………….,S.A., beneficiou de isenção conforme despacho de 2004-01-13, do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Com todo o devido respeito, o que está aqui em causa, não é a transmissão de 2004-02-20, mas sim, a de 2001-06-07.

O artigo 16º, nº1 do CIMSISSD, determina que entre outras as transmissões tratadas no nº3 do artigo 11º deixarão de beneficiar de isenção logo que se verifique, respectivamente, uma de três situações: “ Que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda”.

A isenção pela aquisição de prédios para revenda fundamenta-se na circunstância de tais prédios, destinados a integrar o activo permutável da empresa adquirente, constituem “mercadorias” da respectiva actividade.

Significa isto, que os prédios deverão ser revendidos no exercício da actividade de “compra e venda de imoveis”, ou seja, como mercadorias.

No caso presente, comprova-se que a B…………………., S.A. não revendeu o imóvel no âmbito da actividade económica de que beneficiou da isenção (compra para revenda).

Concretamente, constituiu a L…………………,S.A e para a realização do capital social transmitiu para esta o dito imóvel.

Não restam pois dúvidas, salvo melhor opinião, de que pelo contrato de sociedade de 2004-02-20, com a entrega do prédio, caducou a isenção em virtude de ao prédio ter sido dado destino diferente a fim de diferente revenda, nos termos do nº1 do artigo 16º do CIMSISSD.

Proceda-se à liquidação devida e notifique-se

Lisboa, em 200-11-15
O Chefe de Finanças
Por Delegação
Adjunto
(……) (…)”

15. Em 21/11/2006 foi emitido pelo chefe de divisão dos serviços de inspecção tributária da direcção de finanças de Braga, despacho de concordância com o relatório de inspecção realizada à impugnante na qual foi detectada a situação tributária relativa à falta de pagamento de SISA na compra efectuada por escritura em 7/6/2001, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e no qual relativamente à aquisição referida consta o seguinte (cf. cópia do despacho e cópia parcial do relatório a fls. 88 a fls 91):
“(…)
• Por escritura pública de 20/2/2004, o sujeito passivo constitui a sociedade L………………. - …………………., SA, NIPC ………………., detida a 100%, com a entrada em espécie mediante a transmissão para esta firma do prédio descrito anteriormente;
• A dúvida que surge em sede de imposto municipal de Sisa é se esta transmissão está ou não incluída no conceito de revenda, condição necessária para se verificar a isenção à data da aquisição em 7/6/2001.
• O serviço de finanças de Lisboa 3, solicitou esclarecimentos à Direcção de Serviços dos Impostos de Selo e das Transmissões do Património, pelo ofício n°9817, de 29/4/2005
Em 11/7/2006 solicitamos à mesma Direcção de Serviços informação sobre se já havia sido produzido algum esclarecimento. Aguardamos resposta.
(…)”
16. Em 21/11/2006 a ora impugnada recepcionou o ofício n°13408 de 17 /11/2006, da liquidação no valor total de EUR 474.471,86, relativa a Imposto de SISA, no valor de EUR 428.966,19 e de juros compensatórios no valor de EUR 45.505,67, com o prazo de 30 dias para pagamento voluntário (cf cópia do oficio e aviso de recepção assinado a fls. 71 e 72 do PAT).
17. Em 28/12/2006 foi emitida a certidão de divida n.°1340/2006 em nome da impugnante no valor de EUR 474.471,86, para instauração do processo executivo (cf. certidão a fls. 69 e 70 do PAT).
18. Em 19/4/2007, a impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação descrita em 12 e identificada com o n.°………………….5, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. reclamação constante a fls. 3 a 23 do PAT recurso hierárquico).
19. Em 17/9/2008, foi proferido despacho de indeferimento liminar da reclamação descrita no ponto anterior, com fundamento na intempestividade da mesma, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. despacho e informação a fls.159 a161 do PAT "recurso hierárquico" e 41 a 43 dos autos).
20. Em 23/10/2008 a impugnante recepcionou o aviso de recepção da carta postal que continha o despacho descrito no ponto anterior (cf. oficio e aviso de recepção a fls. 162 e 163 do PAT e cf. fls. 40 dos autos).
21. Em 6/11/2008, a PI da presente impugnação deu entrada na (então) repartição de finanças do 3° bairro de Lisboa (cf. carimbo aposto a fls. 3 dos autos).
X
Em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto, consignou-se o seguinte:
«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada e no depoimento da testemunha Hernâni ……………………….. que se mostrou credível, consistente e com conhecimento directo dos factos, as restantes testemunhas prestaram depoimentos cuja relevância de facto se encontra provada pelos documentos.// Factos não provados//Inexistem factos não provados com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir».
X

2.2. De Direito.

2.2.1. Vem sindicada a sentença proferida a fls. 252/271, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento da reclamação graciosa interposta contra o acto de liquidação do Imposto Municipal de SISA referente ao prédio urbano sito em Lisboa, na Avª ……………….. 2 -10, tornejando para a ……………… 22 a 34, inscrito na matriz da freguesia de S. José sob o artigo ……………., no montante total de €474.471,86, sendo €728.966,19 de imposto e €45.505,67 de juros compensatórios.

2.2.2. A presente intenção recursória centra-se sobre as questões seguintes: i) a atribuição de efeito suspensivo à interposição do presente recurso jurisdicional; ii) o vício de omissão de pronúncia da sentença por ter descurado matéria de facto que devia ter sido aditada ao probatório; iii) a não verificação do pressuposto da caducidade da isenção dado que a entrega do prédio a outra sociedade não implicou a sua afectação a destino diferente da revenda; iv) a violação dos princípios enformadores do procedimento tributário, uma vez que a AF havia dado, anteriormente, o seu aval à operação de restruturação de empresas, de que fazia parte a entrega do prédio em apreço; v) o erro de julgamento relativo à caducidade do direito à liquidação, porquanto o imposto liquidado mostrava-se caduco na data da notificação da liquidação; vi) o erro de julgamento relativo à condenação no pagamento de juros compensatórios, os quais não são devidos.

2.2.3. Para julgar improcedente a impugnação, a sentença recorrida esteou-se, entre o mais, na fundamentação seguinte:

«A questão central do presente caso concreto consiste em saber se a entrega/alienação de imóveis para constituição do capital social de uma sociedade imobiliária, pode equivaler à revenda prevista nos artigos 16.° e 11°., n.° 3 do Código do Imposto Municipal de Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações. // A Impugnante tinha um imóvel referenciado que adquiriu com isenção de SISA, por o declarar destinado a revenda, e passou a ter quotas numa sociedade em que é a única accionista, o que configura uma permuta de bens de espécie diferente. // A impugnante alega que não há diferença entre a transmissão dum imóvel que constitui a sua entrada numa terceira sociedade e a venda dum imóvel em que é assinado um contrato de compra e venda com a sociedade. // (…) // Já no caso dos autos a transmissão do imóvel para a sociedade L……………. Investimentos ……………………. SA, consistindo esta transmissão na entrada no capital social desta, faz com que continue a existir uma relação jurídica entre a impugnante e a dita sociedade, da qual a impugnante é única accionista. Não há, pois, similitude, imiscuindo-se a impugnante à tributação no acto de compra e à tributação que haveria lugar em sede de imposto sobre o rendimento, produto da venda. // Em suma: o prédio adquirido para revenda teve um destino diferente do da revenda, logo não se reuniram as condições da isenção do imposto nos termos do n.°1 do art.° 16° e 11.° n.° 3 do Código do Imposto Municipal de Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações».

2.2.4. No que respeita ao pretendido efeito suspensivo do recurso jurisdicional em presença, de referir que, na sequência de despacho do relator, a recorrente informou os autos de que procedeu ao pagamento da dívida exequenda, emergente do presente acto de liquidação, ao abrigo do regime do Decreto-Lei n.º 151-A/20113, de 31.10 (fls. 392/398); informação confirmada pela recorrida, dando conta de que o processo executivo foi extinto (fls. 402/404). Assim sendo, o efeito suspensivo requerido perde utilidade, pelo que não é de deferir.

Termos que se rejeita a presente arguição.

2.2.5. A recorrente sustenta que a sentença recorrida incorreu no vício de omissão de pronúncia ao não proceder ao aditamento à matéria de facto dos quesitos que elenca.

É nula a sentença que omita pronúncia sobre questão que lhe cumpra conhecer – artigo 615.º/1/d), do CPC. No caso em exame, a sentença apreciou as questões suscitadas pela impugnante tendo em vista a anulação do acto tributário contestado. Donde resulta que o presente vício não se comprova nos autos. De referir que o elenco da factualidade indicada pela recorrente nas alegações de recurso não se oferece pertinente à correcta instrução da causa, dado que respeita a factos relativos à concessão do benefício fiscal associado à operação de reestruturação da empresa entretanto criada pela impugnante, matéria que não incide sobre o objecto do presente litígio, relativo à caducidade da isenção do imposto de SISA devido pela aquisição do imóvel dos autos. Donde resulta que a presente matéria de facto não deve ser aditada ao probatório.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.6. A recorrente sustenta o erro de julgamento da sentença recorrida na asserção de que a operação de cessão a uma terceira sociedade, por si constituída, do prédio dos autos, não consubstancia afectação a destino diferente do da revenda, para além de que a operação em causa obteve a autorização da AF, ao conceder as isenções fiscais por si requeridas e ao reconhecer a neutralidade fiscal da operação de reestruturação de empresas em presença. Em síntese, defende que a correcção em apreço incorre no vício de erro de direito, por pressupor a caducidade da isenção, a qual, em rigor, não se terá verificado.

Vejamos.

A correcção em apreço assentou na fundamentação seguinte: «i) no acto de aquisição do imóvel, a recorrente beneficiou de isenção de SISA, nos termos do artigo 11.º/3, do CSISA, uma vez que declarou que o referido imóvel se destinava a revenda; ii) Por escritura pública outorgada em 20.02.2004, foi constituída a sociedade “L……………….., …………………., SA”, da qual a recorrente é a única accionista e, tendo sido realizado o capital social da mesma através da transmissão para a referida sociedade do imóvel em referência; // iii) a isenção pela aquisição de prédios para revenda fundamenta-se na circunstância de tais prédios, destinados a integrar o activo permutável da empresa adquirente, constituírem mercadorias da respectiva actividade; iv) o prédio em causa devia ter sido revendido no exercício da actividade de “compra e venda de imóveis”, ou seja, como mercadoria, o que no caso não aconteceu, uma vez que a “B…………………, SA” não revendeu o imóvel no âmbito da actividade económica de que beneficiou da isenção (compra para revenda)» (1).

Estatui o artigo 1.º do Código do Imposto de Sisa [CSISA] o seguinte: «[s]ão sujeitas a sisa e a imposto sobre as sucessões e doações, nos termos dos artigos seguintes, as transmissões perpétuas ou temporárias dos bens, qualquer que seja o título por que se operem». Nos termos do artigo 2.º do CSISA, «[a] sisa incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis».

Determina, por seu turno, o artigo 11.º do CSISA que «[f]icam isentas de sisa: // 3.º As aquisições de prédios para revenda, nos termos do artigo 13.º-A, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 105.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a), do n.º 1 do artigo 94.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da actividade de comprador de prédios para revenda».

O artigo 16.º do CSISA estabelece que «[a]s transmissões de que tratam os n.ºs 3, 8.º e 9.º, 12.º, alínea a), e 21.º, 25.º, 26.º e 30.º do artigo 11.º e 7.º do artigo 12.º deixarão de beneficiar da isenção logo que se verifique, respectivamente: // 1.ª Que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».

No caso em exame verificou-se que, no momento da aquisição do prédio em causa, através da escritura pública de compra e venda, datada de 07.06.2001, a sociedade declarou estar colectada na actividade de “prédios – revenda dos adquiridos para esse fim” e ter exercido com regularidade tal actividade, e que a aquisição em causa se destinava a revenda, pelo que a mesma ficou isenta de SISA, nos termos do artigo 11.º, §3, do CSISA. Contudo, os serviços de inspecção da AT consideraram que a isenção referida caducou, entretanto, uma vez que foi dado destino diferente ao bem inicialmente afecto a revenda, nos termos do artigo 16.º, §1, do CSISA.

A propósito da interpretação do preceito do artigo 16.º do CSISA constitui jurisprudência assente a seguinte:

i) «[S]e é certo que o CSisa consagra um conceito próprio de transmissão de imóveis sujeita a esse imposto (considerando como transmissões, para esse efeito, negócios jurídicos que, à luz da lei civil, não transmitem, ipso facto, o direito de propriedade – como é o caso do contrato promessa de compra e venda de imóveis com tradição da posse) também é certo que aquele mesmo código não equipara tais actos à própria revenda. // Daí que, utilizando o legislador, no nº 1 do art. 16º do CSisa, o conceito de revenda e não o de transmissão, se conclua que não pode aí apelar-se a outro qualquer conceito de revenda (conceito inexistente na lei fiscal), sendo, antes, indispensável que ocorra a nova venda do prédio (que só pode ser o acto jurídico definido no art. 874º do CCivil), ou seja, a transmissão do título de propriedade e não bastando, por essa razão, a celebração de contrato promessa de compra e venda, ainda que com tradição do prédio. Ou seja, embora a celebração deste tipo de contratos com tradição da posse seja considerada pelo CSisa como um facto sujeito a imposto, o certo é que no caso da isenção de prédios adquiridos para revenda, a lei exige, sem mais, a efectivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem àquela equiparar qualquer outro tipo de acto ou contrato [Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 23.01.2013, P. 01061/11].

ii) «As normas que regulam a isenção de imposto, na medida em que contrariam os princípios da generalidade e da igualdade da tributação, são insusceptíveis de aplicação a casos que não tenham sido expressamente contemplados no benefício concedido, devendo ser objecto de interpretação estrita ou declarativa. // Para efeitos da isenção prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT não assume qualquer relevo a troca ou permuta de bens, sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico. // Constitui troca ou permuta o contrato cujo núcleo essencial consiste na prestação de um imóvel por outro, pese embora se constate a existência de uma compensação em dinheiro que não é, pela sua importância, o objecto principal do contrato, funcionando apenas como complemento pecuniário da prestação principal» [Acórdão do STA, de 28.11.2012, P. 0529/12].

iii) «Para efeitos da isenção prevista no artº 11º, nº 3 do CIMSSD não assume qualquer relevo a troca ou permuta de bens, sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico. // Estamos perante uma permuta se o sujeito passivo adquiriu, por escritura pública de 28.12.2001, um prédio urbano, tendo tal transmissão beneficiado de isenção de Sisa, nos termos do artigo 11º, nº3 do Código da Sisa, por o mesmo ser destinado a revenda e em 10.07.2003 procedeu à transmissão do aludido imóvel, para uma sociedade por quotas, através de escritura de aumento do capital social desta». [Acórdão do STA, de 07.03.2012, P. 01141/11]

Tendo em vista reverter a decisão que fez vencimento na instância, a recorrente invoca, por um lado, a autorização por parte da AT da operação de reestruturação empresarial em causa e, por outro lado, o facto de que com a realização de capital da sociedade entretanto constituída através da transmissão da propriedade do imóvel em referência não ocorreu afectação do bem a destino diferente, o qual permanece no balanço da nova sociedade como mercadoria pronta a ser vendida.

A este propósito de referir que «[r]evender um prédio corresponde a uma actividade de alienação de bens no mesmo estado em que se encontravam quando foram adquiridos. A actividade de revenda não deve envolver qualquer actividade transformadora. Deve tratar-se apenas de uma actividade de mera intermediação nas trocas de bens, em que o único valor acrescentado que a empresa incorpora no bem é o que resulta da sua capacidade de o colocar no mercado e de encontrar comprador» (2). «A afectação do prédio para revenda é revelada pela sua contabilização no activo permutável da empresa. Essa contabilização manifesta a vontade e a decisão da administração da empresa de afectar e manter o prédio como uma mercadoria, que impede a tributação em [SISA]. // Assim, em conclusão, a aquisição do prédio para revenda exige que se cumpram três requisitos essenciais: // 1. Que essa intenção seja manifestada e fique expressa no contrato de compra e venda; // 2. Que o prédio se mantenha afecto ao activo permutável enquanto se mantiver no património da empresa, e finalmente; // 3. Que a revenda ocorra no prazo máximo de três anos após a aquisição» (3).

Suscita-se, pois, a questão de saber se estando em causa negócio de permuta, em que a impugnante, mediante a obtenção de participação social na novel sociedade transfere para esta a propriedade do imóvel em causa, não será o mesmo recondutível ao conceito de revenda.

A resposta é negativa. «A Lei exige como pressuposto essencial do direito à isenção que a revenda se efectue, não usando o conceito de transmissão. Na verdade, o [CSISA] só equipara aqueles actos a transmissões sujeitas a imposto, não as equipara a revendas, e a utilização pelo legislador do conceito de revenda e não do de transmissão tem este efeito de tornar indispensável que ocorra a venda do prédio, ou seja, a transmissão do título de propriedade. Só assim se consuma o pressuposto a revenda e isso é assim porque o [CSISA] tendo um conceito próprio de transmissão, não tem um conceito próprio de revenda, pelo que relativamente a este temos de utilizar o do direito civil. Desta forma, não basta que estas empresas pratiquem outros negócios sobre esses imoveis, nomeadamente, que celebrem contratos de promessa de alienação, para que se considere consumada a revenda. Mesmo nos casos em que a celebração de contrato-promessa para alienação desses prédios seja sucedida da tradição material da posse do prédio, não se pode considerar verificada a revenda» (4).

Em síntese, o preenchimento do conceito de revenda, tendo em vista obstar à caducidade da isenção, prevista no artigo 16.º, §1, do CSISA, pressupõe a outorga de contrato de compra e venda, pois que a isenção é concedida às empresas que adquirem imóveis para vender, fazendo da actividade de intermediação imobiliária a sua actividade produtiva. Donde resulta que a aplicação de prédio adquirido com a isenção de SISA, ao abrigo do artigo 11.º, §3, do CSISA, em entradas em espécie, no quadro da constituição de uma sociedade de que a impugnante é a única accionista corresponde a afectação do prédio a fim diferente do da revenda, o que determina a caducidade da isenção, como foi imposto pela AF. Mais se refere que do probatório não resulta a existência de acto imputável à AF que derrogue o regime descrito, nem o mesmo subsistiria em face do parâmetro da legalidade.

Ao confirmar a correcção em apreço, do ponto de vista da sua conformidade ao parâmetro da legalidade, a sentença recorrida não merece censura, pelo que deve ser confirmada nesta parte.

2.2.7. A recorrente defende, porém, que a correcção em apreço, corporiza violação dos princípios ordenadores do procedimento, porquanto a AF havia prestado informações e concedido autorizações que indiciavam uma tomada de posição inversa à que veio adoptar, depois materializada na liquidação oficiosa de SISA em exame. A falta de ponderação da presente linha de argumentação justificaria não apenas o erro de julgamento, mas também o vício de omissão de pronúncia que inquinariam a sentença em crise.

O apontado vício de omissão de pronúncia não se comprova, dado que a sentença aferiu os argumentos aduzidos pela recorrente para sustentar a sua pretensão para extrair, porém, consequências diferentes das pela mesma almejadas, o que não corresponde a omissão de pronúncia sobre questão de que cumpra conhecer (artigo 615.º/1/d), do CPC).

Não se comprova a alegada prestação de informações ou de autorizações que indiciem a concordância da AF com a tese defendida pela recorrente de que o prédio não foi sujeito a afectação diferente da revenda. O facto de ter sido deferido o pedido «de isenção dos impostos da sisa e do selo, bem como emolumentos e outros encargos legais, relativo a operação de destaque do Cinema Condes e a realização do capital social de uma empresa a constituir, em que a impugnante seria a única accionista» (5) em nada contende com a caducidade da isenção de SISA em apreço, por não ter sido observada a condição de celebração da revenda do imóvel adquirido no prazo de três anos a contar da aquisição. São questões diferentes com regimes também diferentes. O pedido referido em primeiro lugar foi formulado no quadro do Decreto-Lei n.º 404/90, de 21 de Dezembro, diploma que aprova o regime de isenção de sisa das empresas que procedam a actos de cooperação ou de concentração. Por seu turno, a questão suscitada nos autos respeita à isenção de SISA, pela aquisição de prédio que, segundo a adquirente, veio a integrar o activo circulante da empresa tendo em vista a sua revenda.

A sentença em apreço não merece censura nesta parte. Motivo porque se rejeita a presente argumentação.

2.2.8. No que respeita à asserção de que na data da notificação da liquidação oficiosa em apreço, 21.11.2006 (6), o imposto em causa mostrava-se caduco, é de referir que à data da aquisição do imóvel vigorava o preceito do artigo 92.º do CSISA [versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro], nos termos do qual «[s]ó poderá ser liquidada sisa ou imposto sobre as sucessões e doações nos oito anos seguintes à transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito».

Como se refere na sentença recorrida, resulta que in casu, não ocorreu a caducidade do direito de liquidar por parte da AT, com efeito tendo a escritura de compra e venda do imóvel sido celebrada a 7/06/2001 (cfr. ponto n.° 2 dos factos provados) e, consequentemente, o prazo de três anos para revenda esgotado a 7/06/04, o direito de liquidar expiraria, em face da norma especial contida no artigo 92.° do CIMSISSD (cuja aplicabilidade encontra respaldo na parte final do n.° 1 do artigo 46.° da LGT), oito anos depois, ou seja a 7/07/12, sendo certo que em 21/11/200[6], [a] ora impugnante foi notificada da liquidação (cfr. ponto n.° [16] dos factos provados)».

A sentença em apreço não merece censura nesta parte.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.9. A recorrente contesta também o segmento decisório relativo aos juros compensatórios.

Nos termos do artigo 35.º, n.º 1, da LGT, «[s]ão devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente (…)».Os pressupostos ou requisitos dos juros compensatórios são os seguintes: i) ter existido um retardamento da liquidação do imposto; (ii) o retardamento da liquidação causar prejuízo patrimonial ao credor tributário; (iii) o retardamento da liquidação ser imputável ao sujeito passivo. Dito de outra forma, «constituem requisitos essenciais para a liquidação de juros compensatórios a existência de uma dívida de [imposto], de um atraso na efectivação de uma liquidação desse imposto e a imputabilidade do atraso à actuação culposa do contribuinte» (7); a culpa «consiste na omissão reprovável de um dever de diligência, aptidão e conhecimento de um bonus pater famílias» (8).

Como se refere na sentença recorrida, «[é] de formular um juízo de censura ao impugnante cujo objecto social inclui a compra e venda de imóveis, que tendo beneficiado da isenção de pagamento de imposto de SISA sobre a aquisição realizada em 7/6/2001, por que a declarou destinada a revenda, não procedeu à revenda do imóvel em causa, mas sim à sua troca por quotas de uma empresa, na qual é única accionista e que face à caducidade da isenção do imposto de SISA que havia usufruído, não procedeu ao respectivo pagamento à Administração Tributária, questão aliás, que a própria Administração Tributária suscitou e notificou a impugnante em 21/12/2004, ou seja dez dias depois do acto de constituição da sociedade Liscondes-investimentos Imobiliários, SA. (pontos n.° 10,11 e 12 dos factos provados). // Pelo que a não liquidação imediata do valor devido de Imposto de SISA, no momento em que a impugnante deu um destino diferente ao imóvel da revenda, operação que permitia a isenção nos termos do artigo 16.°, n.°1 do CIMSISSD, deveu-se à falta de diligência da impugnante no respectivo pagamento do imposto».

A recorrente não logra reverter o juízo de culpa que sobre si impende pela falta de liquidação atempada do imposto. Tal conduta é exigível ao operador económico diligente, colocado na posição da recorrente. A recorrente não pode olvidar que o conceito de revenda não foi preenchido com a operação por si realizada de entrega em espécie do imóvel à sociedade que constituiu, pelo que, em face da verificação da condição resolutiva da isenção, era-lhe exigível que procedesse à liquidação do imposto.

A sentença em apreço não merece censura nesta parte.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(Cristina Flora- 1º. Adjunto)

(Cremilde Miranda - 2º. Adjunto)
(1) N.º 14 do probatório.
(2) José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, p. 422.
(3) José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos…, cit., p. 421.
(4) José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos…, cit., pp. 422/423.
(5) N.ºs 6 e 9 do probatório.
(6) N.º 16 do probatório.
(7) Ac. do STA, de 16.12.2010, P. 0587/10.
(8) Ac. do STA, de 16.12.2010, P. 0587/10.