Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:872/11.3BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:05/13/2021
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL;
INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO INDEVIDA DE GARANTIA.
Sumário:
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO



I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA (doravante recorrente) recorre da sentença, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial que S......., S.A, deduziu após decisão que indeferiu a reclamação graciosa, apresentada contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.° …………. , relativa ao exercício de 2007, no montante de 24.662,54 €.
A recorrente apresentou para o efeito, alegações nas quais formulam as seguintes conclusões:
« A. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo” em 16/10/2020, o qual julgou parcialmente procedente a Impugnação Judicial apresentada nos autos à margem referenciados e determinou: i) a improcedência do pedido de anulação da liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.°………, emitido em 2011-07-11, referente ao período de tributação de 2007, do montante de € 22.190,67; ii) a procedência do pedido de anulação da liquidação de juros compensatórios n.°………….. , no montante de € 1.986,83, determinando que este último acto de liquidação deve ser anulado em relação ao período anterior a 29/01/2009; iii) a procedência do pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, na correspondente medida do imposto liquidado em excesso quanto ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho.
B. A Representação da Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal “a quo” foi baseada numa errónea subsunção dos factos ao direito aplicável, padecendo de erro de julgamento da matéria de facto e da matéria de direito, no que concerne à indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia bancária.
C. No caso dos presentes autos, verifica-se que a garantia bancaria n.° 00363659, prestada pelo montante de € 37.503,80 (trinta e sete mil, quinhentos e três euros e oitenta cêntimos), por forma a garantir o processo de execução fiscal n.°…………, instaurado na sequência do não pagamento no prazo legalmente determinado do acto de liquidação adicional de IRC n.°…………., foi constituída em 2010.12.17 (vide documento n.° 4 junto aos autos com o libelo inicial).
D. Não obstante, da prova documental produzida nos autos de primeira instância, não se encontra demonstrado que a referida garantia tenha sido prestada durante um período de três anos, indicado no n.° 1 do artigo 53.° da LGT.
E. Assim, desde logo, e nos termos do disposto nos n.°s 1 e 2 do art. 53.° da LGT, para que à Impugnante, ora recorrida, assistisse o direito a ser indemnizada por prestação de garantia indevida, sem necessidade de decurso de qualquer período de tempo pelo qual a mesma se prolongue, teria que existir erro imputável aos serviços.
F. Com efeito, a douta sentença conclui, a final, pela existência de erro imputável aos serviços, sem que conste da factualidade dada como provada, factos que permitam fundamentar e sustentar tal conclusão.
G. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607.°, n°. 5, do CPC). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. artigo 371.°, do C. Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
H. Os factos constantes do Relatório Final de Inspecção elaborado no âmbito do procedimento inspectivo legitimado com base na Ordem de Serviço OI200908626, encontram-se provados nos autos através de documento com força probatória plena, encontrando-se o princípio da livre apreciação da prova limitado na medida em que estamos perante um meio de prova cuja força probatória se encontra pré-estabelecida na lei (vide n.° 1 do art. 76.° da LGT, n.° 1 do art. 115° do CPPT e art. 371.° do Código Civil e n.° 5 do art. 607.° do CPC).
I. Assim sendo, encontra-se demonstrado nos autos, com força probatória plena, através do teor dos pontos “111.1.1 Criação de emprego” e “VIII - Direito de audição - Fundamentação” do Relatório de Inspecção, que a Impugnante, ora recorrida, não apresentou junto dos Serviços de Inspecção Tributária, até ao termo do procedimento inspectivo, qualquer elemento de prova que efetivamente logre demonstrar que os contratos de trabalho a termo certo celebrados com os trabalhadores F......., R....... e M....... se converteram em contratos de trabalho sem termo, para efeitos de se configurar uma “criação líquida de postos de trabalho”.
J. Do ponto de vista jurídico, e na óptica da relação jurídica de imposto, os benefícios fiscais consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude.
K. E, precisamente porque o benefício fiscal constitui um facto impeditivo da tributação-regra, a sua extinção ou falta de pressupostos de aplicação tem por efeito imediato a reposição automática dessa mesma tributação, como estabelece o art°.14, n°.1, do E.B.F. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2a.Secção, 18/02/2016, proc.5619/12; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, C.T.F. 359, pág.75 e seg.; Glória Teixeira e Outros, Lexit - Códigos Anotados e Comentados, Benefícios e Incentivos Fiscais: EBF e CFI, ia. Edição, 2017, pág.21).
L. Assim, é ao sujeito passivo de imposto que compete fazer prova dos pressupostos de sujeição ao regime de determinado benefício fiscal, enquanto facto impeditivo da tributação-regra, atento ao disposto no artigo 74, n°.1, da LGT.
M. Contrariamente ao que entende o Ilustre Tribunal “a quo”, não resulta assente e provado dos autos qualquer entendimento de facto ou direito que demonstre que houve erro imputado aos serviços, ou seja, do conjunto dos factos descritos e constantes dos autos, um normal destinatário consegue compreender por que razão não poderá existir erro imputável aos serviços.
N. Muito pelo contrário, resulta demonstrado nos autos de primeira instância que apenas em sede de reclamação graciosa a Impugnante, ora recorrida, apresentou documento escrito relativo aos trabalhadores L....... e M......., e por estes assinado, informando da conversão do contrato de trabalho em contrato sem termo (doc.4 da petição de reclamação graciosa), bem como mapas da Segurança Social referentes ao período compreendido entre dezembro de 2002 e dezembro de 2007 (doc. 7 da petição inicial),dos quais constam os trabalhadores L......., M....... e R....... (vide ponto K) da factualidade provada na douta Sentença).
O. A anulação parcial do acto de liquidação que veio a ocorrer no seguimento da decisão proferida no procedimento de reclamação graciosa não tem, portanto, por fundamento um erro imputável aos serviços, na medida em que a necessidade de anulação da liquidação se deveu a erro imputável ao próprio contribuinte, que não apresentou, previamente à emissão do referido acto, os elementos constitutivos do direito ao benefício fiscal de que se arroga, nos termos do disposto no n.° 1 do art. 74.° da LGT.
P. No caso concreto, e atenta a factualidade demonstrada nos autos, dever-se-ia ter concluído que a actuação da Administração Tributária, no âmbito do procedimento inspectivo, foi norteada e delimitada pelo princípio da legalidade tributária, previsto no artigo 8.° da LGT, não consubstanciando erro de facto ou de direito imputável aos serviços, pelo que, não se encontram reunidos os pressupostos para a condenação da AT no pagamento de indeminização por prestação de garantia indevida, nos termos dos artigos 171.° do CPPT e artigo 53.° da LGT.
Q. Por outro lado, desde logo se dirá que a Impugnante não logrou provar que, a prestação da garantia em ordem à suspensão do processo de execução fiscal, tenha causado danos, sendo que, o sujeito passivo tem sempre que comprovar a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, consequentemente, o pedido formulado pela Impugnante teria, desde logo, que improceder.
R. Com efeito, do artigo 74.° da LGT resulta que a prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoque, pelo que, recairia sobre a Impugnante, ora recorrida, o ónus de demonstrar os encargos que suportou por conta da garantia bancária prestada para suspender o processo de execução fiscal n.°……………, o que não logrou fazer nos autos.
S. Por outro lado, resulta demonstrado nos autos de primeira instância que a Impugnante, ora recorrida, obteve, em sede do procedimento de reclamação graciosa supra discriminado, provimento parcial da sua pretensão, tendo visto reconhecido o direito a deduzir ao lucro tributável de 2007 o montante de € 16.207,80, referente aos encargos com os trabalhadores L......., R....... e M......., a título do benefício fiscal de criação líquida de postos de trabalho, previsto no artigo 19.° do EBF (vide ponto M) da factualidade provada na douta Sentença).
T. Ou seja, a questão em torno da legalidade do acto de liquidação de IRC n.°………., no que se refere ao supra aludido benefício fiscal, nem sequer é colocada pela Impugnante, ora recorrida, no libelo inicial, uma vez que, previamente à interposição da Impugnação Judicial, a mesma viu reconhecido o efeito jurídico pretendido com a reclamação graciosa nesta matéria.
U. Com o devido respeito, mais uma vez andou mal a douta sentença, ao decidir como decidiu, pois como foi demonstrado, a existência do erro imputável aos serviços não foi determinado em sede da Impugnação Judicial.
V. A indemnização por prestação de garantia indevida encontra-se na dependência do vencimento do contribuinte no meio de reação utilizado, moldando-se à sua proporção, relação de dependência que necessariamente não existe no caso concreto entre o acto de liquidação revogado e a Impugnação Judicial.
W. Aqui chegados, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que não foi demonstrado o erro imputável aos serviços, nem dos prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, pelo que, não pode, também por esta via, ser atribuído à Impugnante, ora recorrida, qualquer indemnização por prestação de garantia indevida, nos referidos termos.
X. Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento da indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia para suspensão do processo executivo, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei, nomeadamente dos artigos 171.° do CPPT e 53.° da LGT.

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!»

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público que se pronunciou pela procedência do recurso interposto.

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Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Das conclusões formuladas no presente recurso decorre que as questões a decidir são as de saber se a sentença padece de errónea subsunção dos factos ao direito aplicável, no que concerne à indemnização pelos encargos incorridos com a prestação de garantia bancária.


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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
«A) A Impugnante é uma sociedade com a classificação de atividade económica principal (CAE) 027400 - Fabrico do Lâmpadas Elétricas e Outro Equipamento e CAE secundário n 43210 - Instalação Elétrica e iniciou a sua atividade em 30/05/1956, estando enquadrada no regime geral para efeitos de IRC, com contabilidade organizada - cf. fls. 99 do processo administrativo tributário apenso (PAT) apenso.
B) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° OI200908626, de 30.11.2009, a Impugnante foi sujeita a uma ação de inspeção interna, de âmbito parcial (IRC), que incidiu sobre o exercício de 2007 - cf. o teor do Relatório de Inspeção Tributária (RIT) junto à petição inicial sob doc. 2.
C) No âmbito do procedimento de inspeção identificado na alínea que antecede a Impugnante, notificada para o efeito, exerceu o direito de audição prévia em 29.07.2010, nos termos constantes de fls. 133 a 142 do PAT apenso, e que aqui se dão por integralmente reproduzidos, incluindo os respetivos documentos anexos, onde se lê, além do mais, o seguinte:
“[...]
1. Em relação ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho, sobre as correcções propostas temos a esclarecer que:
a. Vosso Anexo I, alínea a) » a correcção proposta à matéria colectável por 14.246,11 euros (19.574,82 - 5.328,71), é correcta. O período máximo para o trabalhador F....... era 08/04/2007 e por lapso foi considerado todo o ano de 2007.
b. Vosso Anexo I, alíneas b) c) e d) » a correcção proposta à matéria colectável não é correcta, porque:
Os contratos a termo destes trabalhadores tiveram um período de duração de 7 meses, seguido de uma primeira renovação de 7 meses e de uma segunda de 7 meses e 6 meses, conforme o caso (no caso de a segunda renovação ter ocorrido após a entrada em vigor do actual Código de Trabalho 1/12/2003).
Ou seja, a data de início do contrato sem termo do trabalhador F....... é 02/10/2003, a data de início do contrato sem termo do trabalhador R....... é 04/09/2004 e data de início do contrato sem termo do trabalhador M....... é 04/01/2004.
“Os contratos de trabalhos celebrados a termo após duas renovações qualquer das partes o não denunciar por escrito, tornam-se para todos os efeitos definitivos”.
Para melhor entendimento da situação, permitimo-nos juntar fotocópia da informação nr. 288/05 Direcção Geral dos Impostos que, vem, vem esclarecer a dúvida levantada sobre a situação dos contratos de trabalho e o prova relativamente aos mesmos - Anexo 1.
Permitimo-nos ainda realçar que a melhor prova de que os contratos de trabalho de F......., R....... e M....... se transformar em definitivo e por tempo indeterminado é o facto de se encontrarem ao nosso serviço ainda hoje em 2010 (junto enviamos recibos de vencimento do mês e Junho - Anexo 2).
Concluindo: Deve ser considerado um benefício fiscal de 16.207,80 euros pelo que o valor a corrigir é pois de 14.246,11 euros (1 a) e não os 30.453,91 euros propostos no Projecto de Correcções.
2. Em relação ao benefício fiscal em I&D, na notificação recebida de V.Exas, no seu Anexo II, é-nos enviada uma cópia de uma carta da “Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à l&D Empresarial” que tem data de 29 de Janeiro de 2009 com referência ao exercício de 2007.
a. Informamos que esta Carta nunca foi recebida pela S......., SA, nem nunca a S......., SA tomou conhecimento do seu conteúdo, em Janeiro de 2009 ou em qualquer outro momento. Não podendo portanto esclarecer as questões que estão na base da sua conclusão ou ter tomado qualquer medida correctiva. Aliás a referida carta no seu conteúdo não apresenta qualquer fundamentação.
b. As actividade de I&D e produtos desenvolvidos no exercício de 2007 fazem parte integrante do “Contrato de Concessão de Incentivos Financeiros ao investimento no âmbito do Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial - Sime I&IDT (Prime)” celebrado com a Agência Portuguesa para o Investimento, EPE para projectos de investigação e desenvolvimento tecnológico no período compreendido entre 10 de Outubro de 2006 e 30 de Junho de 2008.
c. As actividade de I&D realizadas durante o ano de 2007 foram validadas pela ADI - Agência de Inovação (nomeadamente pelos professores peritos Dra. C....... e Eng° C....... da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa). Em anexo enviamos os respectivos pareceres e relatório final de síntese de avaliação - Anexo III. Este relatório de síntese e avaliação das actividades l&D tem data de 26 de Dezembro de 2008.
d. A carta que V.Exas nos remetem (referida no ponto 2 a) tem data de 29 de Janeiro de 2009 (um mês depois) e também é assinada pela Agência de Inovação, SA (!). De uma coisa estamos seguros, as actividades de I&D foram detalhadamente analisadas e validadas pelos peritos especialistas que referimos (que se deslocaram à nossa Empresa, fizeram testes e análises) e que o relatório de síntese de 26 de Dezembro de 2008 assim comprova, referindo no seu ponto 3 que “os objectivos foram cumpridos na totalidade”.
Neste sentido, demonstrada a comprovação das actividades de investigação e desenvolvimento, consideramos que não há lugar a uma revisão meramente aritmética à colecta decorrente do respectivo benefício fiscal em questão relativo ao exercício de 2007.
[...]” - cf. 133 a 142 do PAT apenso.
D) Em 25.08.2010 foi elaborado o relatório final da ação de inspeção referida nas alíneas que antecedem, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual os Serviços de Inspeção efetuaram correções, para efeito de apuramento de IRC do exercício de 2007, no montante de € 30.453,91, em relação ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho para jovens, e de € 18.460,65 em relação a incentivos fiscais à I&D Empresarial, “relativamente à diferença entre o montante deduzido pelo s.p de €34793,03 e o montante efetivamente atribuído de € 16332,38”, e de cuja fundamentação se retira, além do mais, o seguinte:
“[…]
III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL
111.1- CORRECÇÕES DE IRC
111.1.1- Criação de emprego - € 30453,91
Foi indevidamente deduzido no Q07, linha 234 da declaração modelo 22 de 2007, o montante de € 30453,91 correspondente ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho para jovens.
Após análise dos documentos remetidos pelo s.p. verifica-se que relativamente aos trabalhadores considerados para efeitos de cálculo deste beneficio fiscal não se encontram reunidos os requisitos exigidos no actual art° 19° do E.B.F (anterior art° 17°).
Conforme disposto no n° 1 do art° 19° os contratos celebrados com termo não poderão ser considerados para aplicação do benefício. É requisito essencial a contratação dos trabalhadores por termo indeterminado e essa comprovação terá de ser verificada por documentos vinculativos para as duas partes do contrato.
Por outro lado conforme disposto no n° 5 do art° 19° a majoração referida tem lugar durante cinco anos a contar da data do início da vigência do contrato de trabalho.
Foi remetido mapa discriminando os trabalhadores que reúnem os requisitos, relativamente aos quais o benefício fiscal é aplicável e o apuramento do montante aceite fiscalmente.
Em Anexo I junta-se cópia do mapa elaborado e cópia dos contratos de trabalho a termo certo. Pelo exposto conclui-se que deverá ser considerado como beneficio fiscal o valor de €5328.71, pelo que se propõe uma correcção de €30453,91, atendendo ao seguinte erro no apuramento do beneficio fiscal, no que diz respeito ao colaborador F....... e F........
Não apresentaram prova de contratação por tempo indeterminado por parte do colaborador R....... e M........
II.1.2 - Deduções à colecta - Campo 355 DR/M22 - 18460,65
0 sujeito passivo para efeitos de cálculo de IRC no exercício de 2007, efectuou uma dedução à colecta, no campo 355 da declaração modelo 22, no valor de € 34793,03.
Tendo sido solicitado através do oficio n° 37246 de 2010-05-05, os comprovativos exigidos conforme disposto na Lei 40/2005, foram remetidos os seguintes documentos:
1 - Declaração da sociedade S....... SA a solicitar o benefício fiscal nos termos da Lei n° 40/2005, emitida em 30 de Maio de 2008.
2- Comprovativo emitido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em 29 de Maio de 2008, que confirma o requerimento pela sociedade S....... SA, decorrente das actividades de I&D Empresarial durante o ano de 2007.
Após análise dos elementos remetidos que se juntam ao relatório em Anexo II, verifica-se que os mesmos são insuficientes, para a aceitação fiscal do benefício Fiscal.
Conforme disposto no artigo 6° da Lei 40 / 2005, a dedução deve ser justificada por declaração comprovativa de que as actividades exercidas e a exercer correspondem efectivamente a acções de investigação ou desenvolvimento e dos respectivos montantes envolvidos. No processo de documentação fiscal deve constar documento que evidencie o cálculo do benefício fiscal.
Os elementos remetidos peto sujeito passivo são insuficientes para comprovarem a dedução à colecta de € 34793.03, para cálculo do imposto a liquidar nos termos do artigo 83° n°2 d) do CIRC.
Contudo, no decurso da acção inspectiva foram efectuadas diligências junto do Ministério da Ciência e Tecnologia nomeadamente Comissão Certificadora para os incentivos Fiscais à I&D, no sentido de nos remeterem a declaração dos montantes efectivamente atribuídos no exercício de 2007, à sociedade S....... SA.
Conforme declaração remetida e que se junta em Anexo II), foi atribuído à empresa um crédito fiscal de € 16332,38, pelo que deverá ser efectuada a correcção relativamente à diferença entre o montante deduzido pelo s.p. de €34793,03 e o montante efectivamente atribuído de € 16332,38.
Assim diferença entre aqueles dois montantes é de € 18460,65 e deverá ser corrigida ao valor a considerar para efeitos de dedução à colecta no Q10 da declaração M/22, linha 355.
[…]
VIII - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
[…]
Em resposta ao direito de audição e após análise do mesmo à que referir o seguinte:
1- Benefício Fiscal por Criação Líquida De Emprego
Em Direito de Audição o s.p enviou cópia de um parecer da Direcção dos Serviços dos Benefícios Fiscais e de uma Ficha doutrinária emitida pela Direcção Geral dos Impostos Estes dois documentos dão razão aos motivos por nós invocados:
[...] ou seja é exigida uma prova documental vinculativa para as duas partes do contrato. Esta prova é essencial pois só assim é possível comprovar o Início da contratação “sem termo, esta data é também essencial porque determina o período de concessão do benefício fiscal”.
Face aos elementos apresentados é de manter as correcções propostas.
2- O SIFIDE, Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento empresarial criado pela Lei 40/2005 de 3 de Agosto [...] tem por objecto o Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento (I&D) Empresarial, com vista à obtenção de um crédito fiscal por parte dos sujeitos passivos de IRC, desde que obedeçam aos preceitos definidos no referida Lei.
Conforme disposto no art° 6°, a dedução permitida a que se refere o art° 4° têm de ser justificada por declaração comprovativa emitida por entidade nomeada por despacho do Ministro da Ciência e Tecnologia o Ensino Superior para analisar as situações e emitir a declaração que deverá integrar o processo de documentação fiscal do s.p a que se refere o art° 121° do Código do IRC.
A carta remetida pela Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à I&D Empresarial e que juntámos ao projecto de relatório em Anexo I, juntamente com a declaração emitida por esta mesma Comissão é o documento válido que define as despesas elegíveis para efeitos fiscais e que determina o valor dedutível à colecta no Quadro 10 da declaração modelo 22.
Relativamente ao facto de não terem recebido a carta emitida pela Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais, conforme referem no ponto I da exposição, apresentada no direito de audição não justifica a alteração de correcção proposta uma vez que a todo o tempo podariam obter tal informação da Comissão.
A este respeito é oportuno referir o prazo concedido de 15 dias conforme projecto de relatório, prazo este que é dado ao s.p para esclarecer as situações desta natureza ou outras, antes de concluído a acção de fiscalização.
Conforme já referimos o documento aceite fiscalmente é a declaração emitida pela Comissão Certificadora para os incentivos Fiscais à I&D Empresarial, a qual discrimina o valor a deduzir à colecta em cada ano.
Importa sublinhar, o contribuinte não fez prova do reconhecimento do valor do benefício fiscal, que deduziu à colecta de IRC, por parte de qualquer entidade pública, v.g Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais.
[...]” - cf. doc. 2 junto à p.i. (RIT).
E) Do “Anexo I” ao RIT, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta um quadro onde a os serviços de inspeção fizeram constar a data do contrato de trabalho a termo certo e correspondente data de admissão de cada um dos três trabalhadores, L......., M....... e R......., respetivamente em 02.01.2001, 02.04.2002 e 02.01.2003 - cf. doc. 2 junto à p.i. (RIT), concretamente o anexo I que surge a fls. 55 do suporte físico dos autos.
F) Do “Anexo III” ao RIT, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta uma carta da Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à I&D Empresarial, do Ministério da Ciência e Tecnologia o Ensino Superior, datada de 29.01.2009, acompanhada da “Declaração” para efeitos do disposto na Lei n.° 40/2005, de 3 de agosto, no montante de € 16.332,38, e dirigida à ora Impugnante, ao cuidado de Dra. E......., para a morada correspondente à sede da Impugnante - cf. doc. 2 junto à p.i. (RIT), concretamente o anexo III que surge a fls. 75/76 do suporte físico dos autos.
G) Atos impugnados: Em 23.09.2010, e em concretização das correções resultantes da ação de inspeção referida acima, foi emitida a liquidação adicional de IRC n.°………., que apurou a pagar, após acerto de contas constante do documento n.°……….., a quantia de € 28.902,33, com data limite de pagamento voluntário em 10.11.2010, sendo € 2.371,39 referentes a juros compensatórios, conforme demonstração de liquidação respetiva n.° ………..- cf. doc. 3 junto à p.i.
H) A impugnante não procedeu ao pagamento da quantia referida em G) tendo sido instaurado processo de execução fiscal com o n.° ……….com vista à respetiva cobrança coerciva - facto não controvertido e cf. fls. 97 do PAT apenso.
I) Em 20.12.2010 a Impugnante apresentou, no processo de execução fiscal n.°……….., a garantia bancária n.° ………..de 17.12.2010, até ao limite de € 37.503,80 - cf. doc. 4 junto com petição inicial.
J) Em 01.03.2011 a Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação identificada em G), cujo teor aqui se dá por reproduzido, e onde alega, no essencial:
(i) quanto às correções relativas à criação líquida de emprego, reafirma aceitar a correção no valor de € 14.246,11, contestando o restante valor para o que esclarece que procede à contratação dos trabalhadores através de contrato a termo e que, quando os mesmos se adequam aos objetivos da empresa converte esses contratos em sem termo antes de decorrido o número máximo lega de renovações, ou a conversão em contrato sem termo ocorre ope legis, atingido aquele limite, informando, em qualquer caso, através de documento, os respetivos trabalhadores, o que sucedeu quanto aos trabalhadores L....... e M......., pese embora não tenha adotado igual procedimento em relação ao trabalhador R......., tal falta não obsta a que este trabalhador não seja elegível para efeitos do benefício fiscal em apreço, mais referindo que o documento entregue ao outros também não configura uma “adenda” ao contrato de trabalho nos termos em que a AT se lhe refere no RIT, fazendo errónea interpretação do art.° 17.° do EBF, resultando da correta interpretação do regime legal convocado que “na falta de declaração das partes, se considera que o contrato de trabalho se renova por igual período até atingir uma duração máxima legalmente prevista, momento em que se converte em contrato sem termo, se as partes não manifestarem intenção em contrário”
(ii) Quanto à correção relativa ao SIFID, a falta de fundamentação da correção efetuada uma vez que apresentou o pedido de emissão da referida declaração, pelo que, estava habilitada a inscrever a referida dedução na respetiva declaração modelo 22 de IRC; que o parecer da Comissão Certificadora, do qual só tomou conhecimento no âmbito da ação de inspeção, “padece de diversas imprecisões e ilegalidades, insusceptíveis de permitir a respetiva manutenção na Ordem Jurídica”, sendo a respetiva fundamentação insuficiente em face do disposto no art.° 77.° da LGT uma vez que “não esclarece porque é que “não foram considerados elegíveis os projectos “Terra Midi...(...)”... [l]imitando-se, pois, a Administração Fiscal, nesta matéria, a formular um juízo conclusivo e que passou pela não aceitação das referidas despesas”; e
(iii) quanto à liquidação de juros compensatórios, defende que padece de ilegalidade uma vez que, atento o atraso na emissão da declaração pela Comissão Certificadora, inexiste culpa do sujeito passivo num eventual atraso no pagamento do imposto;
(iv) conclui pedindo a anulação das liquidações de imposto e de juros compensatórios, bem como a indemnização por prestação de garantia indevida - cf. fls. 3 a 15 do processo de reclamação graciosa apenso (RG).
K) Com o requerimento de reclamação graciosa que antecede a ora impugnante juntou procuração a favor do respetivo advogado subscritor, o qual remeteu a reclamação ao Serviço de Finanças de Oeiras - 3 (Algés) por correio registado; bem como, documento escrito relativo aos trabalhadores L...... e M......., e por estes assinado, informando da conversão do contrato de trabalho em contrato sem termo, a que corresponde o doc.4; mapas da Segurança Social referentes ao período compreendido entre dezembro de 2002 e dezembro de 2007, correspondentes ao doc. 7, dos quais constam os referidos trabalhadores bem como o trabalhador R....... - cf. fls. 55 a 57 e 63 a 98 da RG apensa.
L) Em 31.05.2011 foi proferido despacho sobre o projeto de indeferimento da reclamação graciosa, o qual foi objeto de notificação, para efeitos de audição prévia, apenas à ora Impugnante, diretamente, por ofício que lhe foi remetido para a sua sede pela Divisão de Justiça Contenciosa da Direção de Finanças de Lisboa, não tendo sido enviado idêntico ofício ao mandatário constituído - facto não controvertido e cf. fls. 110/111 da RG apensa.
M) Ato impugnado: Por despacho de 28.06.2011, cujo teor e respetiva fundamentação aqui se dá por integralmente reproduzida, a reclamação graciosa foi deferida parcialmente, resultando dos respetivos fundamentos, além do mais, o seguinte:
“[...]
(i)- Criação líquida de postos de trabalho
1. Em sede de reclamação graciosa, o contribuinte apresentou documentos onde é comunicada a convolação do vinculo laboral de L....... e M....... para contrato sem termo.
2. Também juntou aos autos de reclamação as declarações de remunerações à Segurança Social dos meses de Dezembro dos anos de 2002 a 2007, onde constam todos os seus funcionários, entre eles, os trabalhadores L......., M....... e R........
3. A informação agora disponibilizada, particularmente as declarações à Segurança Social, que vinculam a sociedade perante uma entidade externa à reclamante, permite aquilatar da permanência dos trabalhadores ao serviço da Reclamante após o termo dos contratos originais, conforme refere a informação vinculativa proferida no âmbito do processo 1979/2008.
4. De acordo com a mesma informação, não existindo contratos de trabalho por tempo indeterminado na forma escrita, pode ser possível à Administração Tributária "...elaborar um raciocínio que permita atestar a celebração de contrato sem termo"
5. Com as comunicações referidas no ponto 1 anterior, com as cópias dos contratos a termo certo que constam do Anexo I do relatório da Inspecção Tributária, com os elementos constantes do sistema informático: da DGCI, e de acordo com a Lei, foi possível construir o quadro seguinte:
«imagem no original»


6. Pelos motivos anteriormente referidos, será de atender à pretensão do contribuinte no que respeita às deduções à matéria colectável referentes à aplicação do art°19° aos encargos com estes 3 trabalhadores, o que se traduz numa dedução ao lucro tributável de €16.207.80 (5.402,60 x.3).
(ii) Incentivos Fiscais à I&D e respectivos Juros Compensatórios
7. No que concerne à correcção do Benefício Fiscal relativo às despesas com Investigação e Desenvolvimento, a ora Reclamante entende que pela apresentação do comprovativo do pedido de emissão da declaração emitida pela Comissão Codificadora estaria habilitada a inscrever o respectivo montante na Declaração M22 de IRC.
8. Ora, parece-nos claro que, de acordo com o art° 6° do SIFIDE, a dedução em causa tem que ser justificada por declaração da entidade competente ou por prova do pedido de emissão dessa mesma declaração.
9. Se, como foi o caso, a declaração, que foi requerida pela Reclamante, é emitida pela Comissão Certificadora com valores diferentes dos que foram apresentados deveria a Reclamante ter apresentado nova Declaração M22 alterando o valor inscrito para o que, de facto, lhe foi concedido pela entidade competente.
10. Quanto ao vício de falta de fundamentação invocado pela Reclamante, não é a Direcção de Finanças de Lisboa competente para analisar as questões de natureza técnica levantadas nos autos pela Reclamante.
11. A fundamentação exigida no art° 77 da LGT encontra-se, para efeitos fiscais, na existência per se, da declaração emitida pela Comissão Certificadora para os incentivos Fiscais à I&D Empresarial, tutelada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
12. Os critérios usados pela Comissão Certificadora para redução do montante apresentado não são, nem podem ser, discutidos no âmbito desta Reclamação Graciosa, por força da própria Lei. O SIFIDE indica que a dedução deve ser justificada por declaração emitida por entidade nomeada por despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior entidade essa que não é nenhum órgão da Administração Tributária, pelo que não consideramos este o meio próprio para contestar da bondade dos critérios utilizados pela Comissão Certificadora.
13. No que respeita à ilegalidade da liquidação de juros compensatórios, a Reclamante considera que o retardamento da liquidação não pode ser a si imputado.
14. No entanto, o valor inscrito no campo 355 (erradamente, de acordo com a Comissão Certificadora), foi da total responsabilidade da Reclamante, pelo que mesmo admitindo uma conduta idónea, foi por erro da Reclamante que a Administração Fiscal se viu sonegada do montante em causa.
15. De acordo com o alegado pela Reclamante poderia, "Ab absurdo", ter sido inscrito um valor completamente empolado de modo a absorver toda a colecta de IRC e, nunca tendo conhecimento do valor correcto, por não ter sido recebida a declaração da Comissão Certificadora, poderia decorrer o prazo de caducidade e privar o fisco do que lhe é legalmente devido, no entanto, ""bona fidas semper praesumitur nisi mala adesse probetur".
16. O artigo 35° da Lei Gerai Tributária, em todo o seu articulado, nunca faz depender a liquidação de Juros Compensatórios da conduta de boa-fé dos contribuintes, mas apenas do retardamento da liquidação poder ser, ou não, imputável ao sujeito passivo.
17. Ora, é imputável ao sujeito passivo a inscrição de despesas não elegíveis no montante inscrito no campo 355. Mesmo admitindo que o conhecimento da sua não elegibilidade tenha acontecido em momento posterior, a Administração Fiscal encontra-se prejudicada, por facto imputável à Reclamante, desde o momento em que o imposto foi inicialmente liquidado.
(iii) Indemnização por prestação de garantia indevida
18. Apesar de a liquidação reclamada vir a ser de anular parcialmente, apenas agora em sede de reclamação graciosa o contribuinte facultou elementos que seriam necessários para que a Inspecção Tributária pudesse formular diferente raciocínio no que diz respeito à correcção efectuada relativamente ao benefício fiscal associado à criação líquida de postos de trabalho.
19. Consequentemente, na nossa opinião, não deve a Administração Tributária indemnizar a Reclamante peto valor adicionai que foi obrigada a prestar para promover a suspensão do processo executivo, uma vez que era da responsabilidade da Reclamante enviar todos os elementos necessários para comprovação da justeza da fruição do benefício fiscal em causa
[...]” - cf. doc. 1 à petição inicial.
N) Em 01.07.2011 a Impugnante foi notificada da decisão que antecede - cf. doc. 1 à petição inicial e fls. 120 a 122 da RG apensa.
O) Em 13.07.2011, a petição inicial que deu origem à presente impugnação judicial foi remetida a este TAF por correio eletrónico - cf. fls. 94 do suporte físico dos autos.
P) Ato impugnado: Em 04.07.2011, na sequência do deferimento parcial da reclamação graciosa referida em J) e M), foi emitida nova liquidação de IRC para o exercício de 2007, em substituição da identificada em G), com o n.°………., de que resultou a pagar a quantia de € 24.662,54, sendo € 1.986,83 relativos a juros compensatórios - cf. fls. 99 a 101 do suporte físico dos autos.
Q) A liquidação identificada na alínea que antecede foi notificada à impugnante em 19.07.2011 - facto não controvertido e cf. fls. 115 do PAT apenso.

Fatos não provados:
1) Não resulta provado em que data a ora Impugnante requereu a à Comissão Certificadora a verificação dos pressupostos de que dependia a dedução fiscal declarada no campo 335 do Q10 da declaração mod. 22 de IRC do ano de 2007.

Motivação de facto:
A decisão da matéria de facto provada efetuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e do processo instrutor apenso, referenciados em cada uma das alíneas do probatório e ainda com base na posição assumida pelas partes nos autos.
Quanto à prova testemunhal produzida em audiência, no processo de impugnação n.° 873/11.1BESNT, que incidiu sobre a factualidade vertida nos artigos 75.° a 78.° da respetiva p.i. (apesar de Impugnante ter referido que a mesma incidiria sobre os artigos 72.° a 79.°, constata-se que os artigos 72.° a 74.° e 79.° têm natureza meramente conclusiva), as testemunhas descreveram em que consistiu o desenvolvimento do designado projeto “Terra Midi”.
Quanto ao facto dado por não provado resulta de não ter sido junto aos autos qualquer documento suscetível de demonstrar a data da respetiva ocorrência.»
**

B. DO DIREITO

A recorrida na sequência do indeferimento de reclamação graciosa, deduziu junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC n.º………., do exercício de 2007, no montante de 24.662,54 €.

Por sentença daquele Tribunal de 16 de Outubro de 2020, foi julgada parcialmente procedente a impugnação.

Tal decisão tem o seguinte dispositivo:

«a) Julga-se procedente o pedido de anulação da liquidação de juros compensatórios, devendo a mesma ser anulada em relação ao período anterior a 29.01.2009, no que se refere ao imposto decorrente da correção relativa Incentivos Fiscais à I&D Empresarial;

b) Julga-se procedente o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, na correspondente medida do imposto liquidado em excesso quanto ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho.

c) Julga-se improcedente o pedido de anulação da liquidação adicional de IRC n.º………….»

Como supra (ponto II) deixámos assinalado, o âmbito do recurso, conforme se extrai das conclusões de recurso, anteriormente transcritas, cinge-se à questão concreta de saber se à recorrida, no caso concreto, assiste o direito a ser indemnizada por prestação de garantia indevida.

Recorda-se que a recorrente insurge-se contra o decidido, alegando, que o direito à indemnização por prestação de garantia indevida, sem necessidade de decurso de qualquer período de tempo pelo qual a mesma se prolongue, teria que existir erro imputável aos serviços que, no seu entender, não se verifica.

Vejamos, então.

Como é sabido, o erro determinante do direito ao pagamento de indemnização por garantia indevida determinante da anulação ou da revogação do acto tributário pode verificar-se no processo judicial ou no procedimento tributário.

De acordo com o disposto no artigo 53.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) o devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida. Prescrevendo o nº 2 do mesmo normativo que o prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

O direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços.

Como ressalta do que acima ficou escrito, o “erro” determinante do direito ao pagamento de indemnização por garantia indevida determinante da anulação ou da revogação do acto tributário pode verificar-se no processo judicial ou no procedimento tributário.

O Tribunal «a quo», considerando a matéria de facto provada, tal como consta do probatório, veio a entender que assistia razão à recorrida quanto ao direito a ser indemnizada por prestação de garantia indevida, na correspondente medida do imposto liquidado em excesso, nos termos previstos no art.º 53.º da LGT, louvando-se no seguinte discurso argumentativo que aqui, no essencial, se recupera:

« A questão do direito a indemnização por prestação de garantia em valor superior ao devido depende, assim de saber se, não obstante a AT ter reconhecido, na reclamação graciosa, que em relação aos L......., M....... e R....... se verificavam os pressupostos para efeitos do benefício fiscal inerente à criação de emprego a que se refere o art.º 17.º do EBF, dispunha já elementos bastantes para o efeito no âmbito do procedimento de inspeção tributária e que, não tendo valorado esses elementos, em tempo, acabou por impor ao sujeito passivo a prestação de garantia em valor superior ao que seria devido. Mais concretamente, importa saber se a impugnante, através dos meios de prova apresentados no procedimento de inspeção, demonstra que os mencionados trabalhadores eram elegíveis para o cálculo do referido benefício fiscal, designadamente, que tinham um contrato de trabalho sem termo, apesar dos referidos contratos escritos não terem sido exibidos.

O conceito de “contrato sem termo”, que consta do n.º 1 do artigo 17.º do EBF (redação vigente em 2004), e os respetivos requisitos de forma não se encontram estabelecidos no referido diploma nem na demais legislação fiscal. Consequentemente, tendo presente o estabelecido no artigo 11.º, n.º 2, da LGT, o interprete deve recorrer, no presente caso, ao disposto no Direito do Trabalho sobre estas matérias, onde vigora o princípio da liberdade de forma, exceto nos casos em que a lei determina o contrário.

Assim, por regra, não é exigível forma escrita para a celebração do contrato de trabalho. Nesse caso, a prova da existência do contrato de trabalho é feita através de prova testemunhal ou qualquer meio probatório, de acordo com o previsto respetivamente nos artigos 392.º e 376.º do Código Civil. (vd., Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, Almedina, 8ª ed., 2017.).

No exercício do direito de audição prévia, ainda no âmbito do procedimento de inspeção [cf. al. C) do probatório], a impugnante, defende, por referência às datas de início dos respetivos contratos a termo certo e legislação laboral relativa ao limite de renovações desses mesmos contratos que “a data de início do contrato sem termo do trabalhador F....... é 02/10/2003, a data de início do contrato sem termo do trabalhador R....... é 04/09/2004 e data de início do contrato sem termo do trabalhador M....... é 04/01/2004”, mais referindo que “[o]s contratos de trabalhos celebrados a termo após duas renovações qualquer das partes o não denunciar por escrito, tornam-se para todos os efeitos definitivos”, e que “a melhor prova de que os contratos de trabalho de F......., R....... e M....... se transformar em definitivo e por tempo indeterminado é o facto de se encontrarem ao […] serviço” à data do procedimento de inspeção. E, com tal argumentação, a impugnante juntou cópias dos recibos de vencimento do mês e junho de 2010, relativos aos mencionados trabalhadores (cf. Anexo 2 ao direito de audição prévia, a fls. 139/140 do PAT apenso). Para além disso, juntou ainda fichas doutrinárias da própria AT sobre os procedimentos a adotar pelos serviços em relação ao benefício fiscal em apreço.

Sucede que, na análise do exercício do direito de audição prévia, constante do capítulo “VIII” do RIT, os serviços de inspeção tributária concentraram-se, apenas e só, no teor dos documentos emitidos pela própria AT (fichas doutrinárias e parecer da Direção de Serviços dos Benefícios Fiscais), frisando que os mesmos “dão razão” aos motivos da correção em apreço, considerando ser exigida uma prova documental vinculativa para as duas partes do contrato.

Esta prova é essencial pois só assim é possível comprovar o Início da contratação “sem termo, esta data é também essencial porque determina o período de concessão do benefício fiscal”. E, assim, mantém na íntegra as projetadas correções em sede de benefícios fiscais decorrente da criação líquida de emprego, nada referindo quanto ao demais invocado pela ora impugnante, quanto ao regime legal de renovação de contratos a termo certo e respetiva convolação “ope legis”, no cotejo com a demonstração de que tais trabalhadores se encontravam, à data da inspeção (2010) ao serviço da impugnante, como demonstram os respetivos recibos de vencimento juntos com o requerimento de audição prévia.»

Atendendo ao exposto, os elementos apresentados pela impugnante em audição prévia, ainda no procedimento de inspeção, no cotejo com a legislação aplicável – entenda-se, o direito do trabalho, designadamente as normas relativas à duração máxima dos contratos a termo e sobre a convolação em contratos sem termo, e não (apenas) as orientações administrativas constantes de fichas doutrinárias dos serviços –, permitiam fazer prova idónea quanto ao tipo de vínculo laboral estabelecido, ou seja, contrato de trabalho sem termo, ainda que a AT tivesse necessidade de complementar tais elementos, desenvolvendo as diligências instrutórias que reputasse de necessárias, em conformidade com o princípio do inquisitório previsto nos artigos 6.º do RCPIT e 58.º da LGT.»

Concorda-se com esta argumentação facto- jurídica.

Efectivamente, para os três trabalhadores em causa, a recorrida fez chegar ao procedimento de inspecção tributária elementos que demonstravam a permanência de tais trabalhadores na empresa no ano de 2010, o que, por referência às datas do início dos respectivos contratos sem termo, 02.01.2001, 02.04.2002 e 02.01.2003, permitia concluir pela respectiva convolação em contratos sem termo.

Ou, ainda que tal conclusão não fosse imediata, sempre a Administração Tributária poderia dissipar eventuais dúvidas pedindo documentação adicional ou oficiando a entidades terceiras, designadamente a Segurança Social, para o que dispunha dos elementos mencionados nos recibos de vencimento dos trabalhadores em causa, apresentados com a audição prévia e que, simplesmente, ignorou.

Como se deixou já entrever, só por errónea interpretação e aplicação das normas legais relevantes para o efeito, é que a Administração Tributária não aceitou, em sede de inspeção tributária, as deduções efetuados a coberto do artigo 17.º do EBF, em relação aos trabalhadores L......., M....... e R......., liquidando adicionalmente imposto superior ao devido (o que veio a reconhecer em sede de reclamação graciosa), colocando o sujeito passivo na contingência de prestar garantia bancária por valor superior ao que devia.

Resta a questão de saber se, não tendo a recorrida provado os encargos suportados com a prestação de garantia, tal circunstância, obsta ao reconhecimento do referido direito indemnizatório.

A questão nestes termos suscitada é em tudo idêntica à questão que foi apreciada e decidida no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ( Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 4.11.2020, proferido do processo n.º 0438/09.8BECTB, quando diz: «Para que o tribunal julgue procedente o pedido de indemnização por prestação indevida de garantia prestada na modalidade de garantia bancária, formulado em impugnação judicial (cf. art. 53.º da LGT e art. 171.º do CPPT), não se impõe que o impugnante aí faça prova dos custos suportados com a garantia (prejuízo sofrido), podendo o apuramento do respectivo montante ser relegado para execução de sentença (cfr. art. 609.º, n.º 2, do CPC).» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt)

Aderimos a esta jurisprudência, que é inteiramente transponível para o caso sub judice, donde não subsistirem dúvidas que também por aqui, o recurso não lograria inverter o decidido.

O recurso improcede e a sentença recorrida é de confirmar na parte em que vinha questionada.

IV. CONCLUSÕES

Como se afirmou no Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 4.11.2020, processo nº 0438/09.8BECTB: «Para que o tribunal julgue procedente o pedido de indemnização por prestação indevida de garantia prestada na modalidade de garantia bancária, formulado em impugnação judicial (cf. artigo 53.º da LGT e artigo 171.º do CPPT), não se impõe que o impugnante aí faça prova dos custos suportados com a garantia (prejuízo sofrido), podendo o apuramento do respectivo montante ser relegado para execução de sentença (cfr. art. 609.º, n.º 2, do CPC).».

V.DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes que integram a 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente.


Lisboa, 13 de Maio de 2021


[A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes–Desembargadores integrantes da formação de julgamento, Isabel Fernandes e Jorge Cortês].


(Ana Pinhol)