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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1429/08.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/11/2019
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:ORDENS DE SERVIÇO;
CREDENCIAÇÃO;
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO;
FATURAS FALSAS;
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:I. Se do teor das ordens de serviço consta o código PNAIT que esteve na base da seleção, bem como a indicação de o critério ser regional, encontra-se evidenciado o critério de seleção, nos termos previstos no art.º 27.º do então RCPIT.
II. O RCPIT contém norma especial atinente às menções obrigatórias das ordens de serviço (art.º 46.º, n.º 3).
III. O teor das ordens de serviço pode consubstanciar a fundamentação dos despachos que determinem a realização da inspeção externa proferidos sobre as mesmas.
IV. Tendo sido aposta assinatura do TOC dos recorrentes nas ordens de serviço e não padecendo estas de qualquer irregularidade, tal revela que os funcionários delas munidos estavam credenciados.
V. A irregularidade da credenciação dos inspetores tem a cominação prevista no art.º 47.º do RCPIT, ou seja, a sua verificação legitima o sujeito passivo a opor-se aos atos de inspeção.
VI. A falta de notificação das liquidações não constitui, isoladamente, fundamento de impugnação judicial.
VII. Se do relatório de inspeção tributária mencionado RIT consta, de forma explícita, contextual, clara, congruente e suficiente, o iter cognoscitivo, de facto e de direito, percorrido pela AT (concretamente a indicação, em relação a cada um dos emitentes de faturas, de situações fáticas que consubstanciam indícios de se estar perante faturação falsa, sua quantificação e enquadramento jurídico), não se verifica falta de fundamentação.
VIII. O nosso ordenamento permite a fundamentação por remissão em sede de procedimento tributário (art.º 77.º, n.º 1, da LGT).
IX. A factualidade subjacente, do ponto de vista subjetivo, à liquidação dos juros compensatórios é a mesma que está inerente às liquidações do imposto considerado indevidamente deduzido.
X. A não aceitação como dedutível do IVA concretamente contido em faturas em relação às quais a AT considerou haver indícios de as mesmas não titularem operações correspondentes à realidade é uma correção técnica (método de avaliação direta) e não um método de avaliação indireta da matéria tributável.
XI. A análise de cheques e outros elementos contendo informação bancária, facultados pelo sujeito passivo ou por alegados fornecedores, não consubstancia acesso a informação protegida pelo sigilo bancário nos termos consignados no art.º 63.º-B da LGT.
XII. É admissível a utilização de informação cruzada por parte da AT no âmbito da ação inspetiva.
XIII. Se, para cada um dos alegados fornecedores, a AT reuniu indícios sérios de que as transações tituladas pelas faturas em causa não tiveram efetividade, revelando tais indícios que há uma probabilidade séria de não terem sido feitos os fornecimentos em causa, o ónus da prova da efetividade de tais transações é do sujeito passivo.
XIV. A prova de que as operações tituladas pelas faturas foram reais não se trata de prova de facto negativo.
XV. Cabendo aos Recorrentes o ónus da prova da efetividade das transações e não sido sequer alegada em concreto factualidade que pudesse ser apta, se provada, à demonstração da efetividade das operações, não se verifica uma situação de fundada dúvida, nos termos previstos no art.º 100.º, n.º 1, do CPPT.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

M…. e I… (doravante Recorrentes) vieram apresentar recurso da sentença proferida a 31.10.2013, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada improcedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto as liquidações de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e respetivos juros compensatórios, referentes aos anos de 2003, 2004 e 2005.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, os Recorrentes apresentaram alegações, nas quais concluíram nos seguintes termos:

“A) Vem o presente recurso interposto da douta Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 31 de Outubro de 2013, nos autos do processo n.º 1429/08.1BELRS, a qual julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pelos ora Recorrentes, M... e I..., relativamente a liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respectivos juros compensatórios, referentes aos anos de 2003, 2004 e 2005, no valor total de € 1.097.417,61 (um milhão, noventa e sete mil, quatrocentos e dezassete euros e sessenta e um cêntimos).

B) Na sentença recorrida, o Tribunal a quo decidiu (salvo o devido respeito) erradamente que os actos de liquidação impugnados não enfermam das invalidades invocadas pelos aqui Recorrentes.

C) Ora, salvo o devido respeito, entendem os aqui Recorrentes que a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento, ao ter assim decidido e com estes fundamentos, razão pela qual deve a mesma ser revogada por este Tribunal e substituída por outra que conheça dos factos apurados e faça uma correcta interpretação do Direito aplicável.

D) Com efeito, entende o ora Recorrente, salvo o devido respeito, que há na sentença recorrida quer normas jurídicas violadas, quer erro de subsunção dos factos ao Direito, os quais impunham outra decisão.

E) Ao decidir que o critério de selecção que motivou o procedimento de inspecção ao qual foi sujeito o Recorrente se encontra identificado, o Tribunal a quo decidiu em violação do preceituado nos artigos 23.º e 27.º, n.º 1, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT).

F) Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, nada na ordem de serviço em causa permite aferir da conformidade legal do critério de selecção dos Recorrentes para o procedimento inspectivo.

G) Por outro lado, os requisitos previstos quer no n.º 1, alíneas c) e d), quer no n.º 2, do artigo 123.º, do CPA não foram, no caso, preenchidos pela AT, no que em concreto se reporta à ordem de serviço.

H) Pelo exposto, o Tribunal a quo fez uma errada subsunção dos factos ao Direito – como melhor resulta da análise quer do relatório de inspecção tributária, quer das ordens de serviço que alegadamente estiveram na origem da inspecção – e decidiu em violação do preceituado nos artigos 23.º e 27.º, do RCPIT e do 123.º, do CPTA.

I) Por outro lado, no que respeita ao despacho que determinou a inspecção externa, não só faltam a enunciação dos factos/ actos que lhe deram origem, quando relevantes e a fundamentação, como (igualmente) tais menções não são «enunciadas de forma clara, precisa e completa, de modo a poderem determinar-se inequivocamente o seu sentido e alcance», o que determina vício procedimental, com directas consequências no processo de determinação do imposto e a consequente anulabilidade das notificações de cobrança impugnadas.

J) Por outro lado, ainda, na sentença recorrida o Tribunal a quo decidiu em violação do preceituado no artigo 46.º, do RCPIT, já que ocorrendo falta de credenciação, os actos de inspecção praticados ao abrigo da ordem de serviço em causa não se mostram idóneos para fundar a prática dos actos impugnados.

K) A fundamentação das notificações de cobrança é inexistente, sendo que os actos impugnados, para serem válidos, carecem de ser fundamentados e suficientemente fundamentados.

L) A fundamentação expressa dos actos administrativos deve ser entendida como a exposição descritiva das razões do acto (da decisão), compreendendo quer a matéria de facto, quer a matéria de Direito, que determinaram a autoridade administrativa à prática de certo acto.

M) Com efeito, os actos impugnados, não se encontram suficientemente fundamentados, sendo que, a fundamentação expressa dos actos administrativos - neles se incluindo os actos tributários ou em matéria tributária - deve ser entendida como a exposição descritiva das razões do acto (da decisão), compreendendo a matéria de facto e a matéria de Direito que determinaram a autoridade administrativa à prática de certo acto.

N) O dever de fundamentação expressa encontra-se consagrado no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), no artigo 77.º, da Lei Geral Tributária (LGT) e no artigo 124.º, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), normas estas que resultam violadas atento o teor da sentença recorrida (sobre essa matéria).

O) A fundamentação tem de ser explícita, não bastando que resulte implicitamente do procedimento administrativo, já que apenas assim serão asseguradas as vantagens visadas pelo dever de fundamentação, ou seja, (i) a transparência e racionalidade do procedimento administrativo, (ii) as garantias para o contribuinte e, finalmente (iii) o controlo hierárquico e judicial do acto.

P) A fundamentação tem, ainda, de ser contextual, devendo acompanhar o conteúdo da decisão, constando do mesmo como um seu pressuposto racional e legal, desde logo, por se tratar de um dever de a Administração Pública - neste caso, a fiscal - fornecer os fundamentos e não, de um direito de os particulares os virem a exigir após conhecimento do acto.

Q) Por outro lado, a obrigatoriedade de fundamentação traduz-se na exteriorização dos fundamentos que foram contemporâneos da constituição do acto, através da sua inserção na forma do acto, transformando-se a existência e a exteriorização desses fundamentos numa condição de validade do (próprio) acto.

R) Assim, a fundamentação deve ser contemporânea do acto e não sucessiva (total ou parcialmente), já que a fundamentação não constitui uma justificação ex post.

S) A fundamentação do acto deve ser coeva deste, sendo integrada pelas razões que, historicamente o determinaram, nela nunca se poderão integrar razões posteriores que apareceriam como uma mera "justificação" externa de um acto sem fundamentação ou com fundamentação insuficiente.

T) A ratio principal da necessidade de fundamentação expressa aponta declaradamente no sentido de que há que ter garantias de que o órgão que praticou o acto o fez reflectidamente e por razões de interesse público, sendo que tais reflexão e razões devem ser exteriorizadas de tal forma que qualquer entidade - nomeadamente o Tribunal - possa, sem recurso a outras fontes, entendê-las e controlá-las.

U) De qualquer modo, torna-se necessário que a fundamentação seja clara, congruente e suficiente, não bastando que exista uma qualquer fundamentação.

V) Nomeadamente, a suficiência da fundamentação pressupõe que esta contenha, por si só, os elementos e as razões bastantes capazes de sustentar (formalmente) a decisão.

W) Na perspectiva do destinatário, a fundamentação deve atender a um destinatário normal ou razoável, colocado na situação do destinatário real, enquanto na perspectiva dos órgãos de controlo, a fundamentação só será suficiente se contiver os elementos necessários a esse controlo, administrativo e judicial.

X) Por outro lado, é pacífico que, no âmbito da tributação oficiosa, o grau de fundamentação deverá ser especialmente intenso e exigente, conforme decorre do disposto no artigo 77.º, da LGT.

Y) No caso dos presentes autos, deveria ter-se descrito, ainda que sucintamente, a matéria de facto e o quadro legal, subsumindo a primeira no segundo e concluindo.

Z) Ora, os actos impugnados não contêm quaisquer elementos individualizadores, faltando-lhes, ainda, uma conclusão concreta.

AA) Sendo que, mesmo com recurso a grande esforço interpretativo não se consegue retirar qual o iter volitivo que levou a que se chegasse àquele valor e não a qualquer outro, logo sendo o mesmo falho de qualquer fundamentação.

BB) No caso sub judice as notificações não preenchem os requisitos previstos no artigo 36.º, n.º 2, do CPPT.

CC) Por outro lado, provinda do autor do acto impugnado nunca os Recorrentes receberam qualquer fundamentação e, nessa medida, não se sabe quem fundamenta os actos impugnados.

DD) Constituindo a fundamentação a única forma de se apurar a motivação do autor do acto, há que possuir a certeza absoluta de que foi o autor do acto e não outra pessoa que escolheu aquela motivação.

EE) Ora, tal certeza não existe no presente caso, já que na verdade não se sabe quem fundamentou os actos.

FF) A isto acresce, ainda, que o acto praticado e a fundamentação do acto praticado têm que ter, imperativamente, o mesmo autor.

GG) Sendo desconhecida qualquer fundamentação expressa, pertencente ao autor do acto impugnado, há que concluir que mesmo que exista algum texto pretensamente fundamentador do acto, o acto impugnado foi praticado por um órgão administrativo, mas a autoria da respectiva fundamentação não pertenceu a tal órgão, mas sim a um – ou a vários – funcionários subalternos.

HH) A fundamentação do acto deve pertencer ao autor do acto praticado, não a outro órgão ou a outros funcionários, até porque o único órgão competente para a prática do acto é, também, o único órgão competente para a fundamentação do acto praticado.

II) A fundamentação constitui, não só a motivação do acto, determinando, objectivamente, a escolha da única decisão possível, como (igualmente) constitui a motivação do autor do acto, permitindo surpreender as razões que contribuíram para a formação da vontade, na respectiva prática.

JJ) Pelo que os actos impugnados carecem, em absoluto, de fundamentação, o que deveria ter determinado o Tribunal a quo a decidir pela anulação dos mesmos.

KK) Em face da ausência de notificação da fundamentação, não cabia aos Recorrentes requerer a respectiva fundamentação, nos termos do artigo 37.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), já que o contribuinte não pode ver-se obrigado a solicitar à AT que fundamente um acto, quando o que a lei lhe confere é uma faculdade (e não uma obrigação).

LL) A aplicação de regime diverso gera dúvidas de constitucionalidade – vide artigo 283.º, n.º 3, da CRP – no que se reporta ao vício de falta de indicação da fundamentação, previsto no n.º 1, do artigo 77.º, da LGT.

MM) Sendo obrigatória a notificação do acto, é também certo que nos casos em que esse acto tem que ser fundamentado, se mostra obrigatória a notificação dessa fundamentação, já que esta integra o acto.

NN) Nos termos do preceituado no artigo 36.º, n.º 1 e n.º 2, do CPPT, os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses dos contribuintes só produzem efeito quanto a estes quando lhes sejam regularmente notificados, devendo a notificação conter a fundamentação, a identificação da entidade que praticou o acto, e se o fez no uso de delegação ou de subdelegação de competências.

OO) Nos termos do n.º 9, do artigo 39.º, do CPPT, o acto de notificação da liquidação de imposto será nulo, no caso de falta de indicação do autor do acto, bem como da informação se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do sentido e da sua data. O conhecimento deste vício deve ser feito oficiosamente, nos termos do preceituado no artigo 134.º, n.º 1 e 2, do CPA.

PP) Termos em que, se impunha ao Tribunal a quo concluir que os actos impugnados padecem de vício de falta de fundamentação, determinando-se, por esta via, a anulação dos mesmos.

QQ) Por outro lado, sendo certo que nos termos do artigo 35.º, n.º 8, da LGT, os juros compensatórios se integram na própria dívida de imposto, também é certo que, nos termos do n.º 1, da mesma norma, os ditos juros dependem de um comportamento culposo imputável (no caso) aos Recorrentes que haja retardado a liquidação do imposto.

RR) Ora, como a responsabilidade objectiva não existe no presente caso – vide artigo 483.º, n.º 2, do CC –, nem a mesma se presume, deveria ter sido fundamentada a razão de ser de tais juros, formulando a AT um juízo de censura ao sujeito passivo, nos termos do previsto no artigo 35.º, n.º 1, da LGT.

SS) In casu, as liquidações de juros padecem de falta de fundamentação que as sustente, pelo que cabia ao Tribunal a quo determinar a anulação das mesmas.

TT) Os argumentos do relatório para a alteração da matéria tributável dos Recorrentes, quer da inexistência de documentos comprovativos do transporte de mercadorias, quer dos dois cheques recebidos pelo Recorrente marido (destinados à alegada simulação de pagamentos relacionados com a emissão de facturas falsas), não são suficientes para legitimar o recurso à avaliação indirecta.

UU) Relativamente aos argumentos utilizados no relatório de inspecção e que se prendem (i) com a inexistência de documentos comprovativos do transporte de mercadorias, (ii) com as supostas irregularidades na contabilidade, designadamente ao nível do saldo de caixa, de algumas facturas não contabilizadas, a existência de contas bancárias não reflectidas na contabilidade e, ainda, (iii) com os lançamentos alegadamente errados por deficiente movimentação de contas do POC, sempre se dirá que esses aspectos nunca legitimariam o recurso à avaliação indirecta, porquanto os mesmos traduzem meras irregularidades alegadamente detectadas na contabilidade do Recorrente marido.

VV) Mas se assim era, e antes de partir para o uso da via indirecta, impunha-se a notificação para regularização da contabilidade por parte do Recorrente, prevista no artigo 52.º, n.º, 2 do CIRC. Notificação essa que nunca se verificou.

WW) Por outro lado, os argumentos da AT que se prendem (i) com a inexistência de documentos comprovativos do transporte das mercadorias e (ii) com a alegada existência de facturas que nunca foram pagas apesar de as relações com os fornecedores se terem mantido, revelam um completo desconhecimento em relação ao tipo de negócio desenvolvido pelo Recorrente.

XX) Com efeito, o Recorrente assumia face a muitos dos seus fornecedores a qualidade de cliente, mas também se tornava fornecedor daqueles, designadamente quando o Recorrente possuía em stock mercadoria e aqueles fornecedores, por não terem temporariamente disponibilidade da mesma – mas tendo outros clientes a quem servir – solicitavam ao Recorrente que lhes vendesse alguma. E daí o movimento de cheques detectados pela AT.

YY) Tal circulação de cheques destinava-se a permitir que com os mesmos e com tal tipo de operações houvesse suporte documental de todas as operações reflectidas na contabilidade do Recorrente marido e dos seus fornecedores/clientes.

ZZ) Ora, de acordo com o artigo 74.º, da LGT, invocando a AT um seu direito a tributar, competia-lhe provar o facto constitutivo desse seu mesmo direito, pelo que era à AT que incumbia o ónus da prova e não aos Recorrentes.

AAA) Os actos impugnados padecem (também) de falta de fundamentação material, sendo certo que para que se possa considerar existir uma fundamentação adequada é necessário que ambas as modalidades da mesma sejam cumpridas.

BBB) Tudo isto, quando a AT fazendo uso de movimentos de cheques do Recorrente, concluiu (mal) extravasando os elementos que lhe foram fornecidos pelo Recorrente.

CCC) É que a acção inspectiva traduziu-se, de facto, numa derrogação do sigilo bancário, em relação ao Recorrente marido, mas sem que tivessem sido respeitadas as condições legais para que tal derrogação pudesse (legalmente) ser efectuada, designadamente, o ter sido concedido ao Recorrente o direito de audição específico para o efeito previamente a qualquer alegada pretensão/decisão de derrogação do sigilo bancário.

DDD) E era imperativo que tal tivesse sucedido por força do artigo 63º - B, n.º 3, da LGT.

EEE) Ao assim não ter sido feito foi preterida formalidade essencial com reflexos directos no acto que se praticou.

FFF) Quanto ao argumento (constante do relatório de inspecção) de que não se demonstrou que os supostos fornecedores do Recorrente reúnam os requisitos indispensáveis para desenvolver a actividade que lhes é imputada, donde se retira a conclusão que as facturas por estes emitidas são falsas resultando, assim, em operações simuladas, o mesmo não colhe, desde logo, porque, como se sabe, nos termos do artigo 74.º, da LGT, quem alega no procedimento tem de provar. E isso a AT não fez, pelo que não poderia a AT ter efectuado as correcções que efectuou.

GGG) Sendo que, por outro lado, e para além de a AT ter de provar – o que não provou – teria ainda de fazer prova de que o Recorrente tinha conhecimento das alegadas ausências de estruturas dos fornecedores e que actuou, pois, de má-fé e em conluio com aqueles. Ora, tal prova não se encontra feita nos autos, sendo que a má-fé não se presume, tendo (antes) de ser provada por quem a alega.

HHH) Por outro lado, o argumento das alegadas ausências de estruturas dos fornecedores não é (igualmente) apto a concluir pela existência de operações simuladas.

III) Quanto ao argumento constante do relatório de inspecção de que o comportamento do Recorrente pode ter tido por objectivo substituir na contabilidade as compras que fez sem documento de suporte bem como obter uma vantagem ilegítima através do direito à dedução do IVA e da consideração de custos, resulta do mesmo que a AT emitiu uma mera suposição, em relação à qual não demonstrou quaisquer certezas.

JJJ) Ora, assim sendo e nos termos do artigo 100.º, do CPPT, se a AT tinha dúvidas, deveria ter-se abstido de intervir sobre o Recorrente, não só por aplicação das regras gerais sobre a repartição do ónus da prova, mas também porque actualmente o brocardo in dubio contra fiscum exprime um princípio estruturante, quer do processo administrativo tributário, quer do processo contencioso tributário, de que é, precisamente, expressão, o referido artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.

KKK) Apesar de o recurso à avaliação indirecta apenas se mostrar possível quando não o for o recurso à avaliação directa, conforme decorre aliás do disposto nos artigos 85.º e 87.º, ambos da LGT, a AT não provou a impossibilidade de avaliação directa e, nessa medida, não efectuou prova da necessidade de recorrer a métodos indirectos.

LLL) O ónus da prova da impossibilidade da quantificação pela via directa da matéria tributável competia à AT e essa prova não só não se encontra feita nos presentes autos, como também não existe qualquer alegação baseada em factos que sustente as razões de tal impossibilidade.

MMM) Ora, apenas no caso de aquela alegação e prova se encontrarem feitas pela AT – o que não sucede – é que seria lícito o recurso à avaliação indirecta.

NNN) O recurso a métodos indiciários assenta no pressuposto inultrapassável da impossibilidade (absoluta) do apuramento da matéria colectável de forma directa, sendo que, o recurso à avaliação indirecta pressupõe um verdadeiro dever de fundamentação autónomo, conforme melhor resulta do disposto no artigo 77.º, n.º 4, da LGT.

OOO) Em relação aos critérios e cálculos dos valores corrigidos usados pela AT, sempre se deverá referir que em qualquer dos casos, apenas se poderiam usar os rácios da região onde o Recorrente marido se encontra inserido.

PPP) A região onde o Recorrente se insere tem variáveis próprias que a fazem distinguir de outras regiões, designadamente, ao nível da necessidade de transportes, uso de auto – estradas (e custos inerentes a tal) proximidade de fornecedores e clientes, pelo que sempre deveriam ter sido considerados os rácios dos demais contribuintes com a mesma actividade daquela zona, já que é esse o específico universo em que o Recorrente se integra.

QQQ) Sendo que, como será evidente, os valores que resultassem daquele “universo” seriam muito mais aproximados ao do Recorrente que aqueles que resultam do “universo global”.

RRR) Mas, ainda que assim não fosse, a verdade é que, conforme decorre do preceituado no artigo 75°, n.° 1, da LGT, as declarações dos sujeitos passivos gozam de presunção de verdade, o que não impede que a AT ilida essa presunção, mas sempre no pressuposto de lhe caber a si – AT – cumprir o ónus de prova que sobre si recaia, nos termos do artigo 74.º, da LGT.

SSS) Nesta medida, impunha-se ao Tribunal a quo avaliar se os elementos reunidos na acção inspectiva se mostravam suficientes para afastar a presunção de verdade de que gozam as declarações dos ora Recorrentes.

TTT) Sendo que, conforme se decidiu na douta sentença proferida no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos junto da 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa, sob o número 1280/08.9BELRS, a respeito deste mesmo relatório de inspecção, “(…) quanto ao fornecedor J…., a conclusão de que a actividade não foi exercida e de que os documentos não correspondem a efectivas operações ‘tem por base as declarações e elementos recolhidos e a inexistência de compras de mercadorias, de encargos com equipamento específicos deste sector de actividade(como por exemplo com veículos), de funcionários, bem como de outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiros”, concluindo que “assim sendo, ficou demonstrada a inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial em relação a este fornecedor escreveu também a AT que “apesar do elevado volume de facturação detectada ( rondou os 3,3 milhões de euros), em conformidade com as informações recolhidas tudo indica que não tem contabilidade, bem como TOC”.

Assim sendo, não é de estranhar que o sujeito passivo não tenha registos de compras ou outros encargos, o que significa que a AT não pode utilizar ambos os argumentos como fundamento para considerar as suas facturas como falsas.”

UUU) A AT faz referência às declarações prestadas pelo fornecedor J…, sem que, contudo, exista nenhum auto de declarações do fornecedor que haja instruído o relatório, nem tenha sido junto ao PAT, ou sequer junto a estes autos.

VVV) Também no que concerne ao fornecedor ‘T...Soc. Unip., Lda,” a “conclusão de que a actividade não foi exercida e de que os documentos não correspondem a efectivas operações tem por base as declarações alegadamente recolhidas e a inexistência de compras de mercadorias e de estrutura empresarial, conforme decorre da alegada ausência de encargos com equipamentos específicos deste sector de actividade, por exemplo com veículos, de funcionários bem como de outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiro.

WWW) Já no que se reporta ao fornecedor “F... Construções Soc, Unip. Lda.”, escreveu a AT no relatório de inspecção, que “[m]ais uma vez, a conclusão de que os documentos não correspondem a efectivas operações teve por base as declarações recolhidas, assim como a falta de confirmação de supostas compras de mercadorias, da realização de encargos com equipamentos específicos deste sector de actividades, por exemplo com veículos, de funcionários, bem como outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiros”, e que assim, “[em suma, fica demonstrada a inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial.”

XXX) No que diz respeito à T... Transportes, Lda,, concluiu a AT que “(…) os documentos não correspondem a efectivas operações, o que foi reforçado pelas declarações do respectivo sócio-gerente”, mas tudo isto quando não se conhece a identidade do sócio gerente desta sociedade, nem essa informação resulta do relatório da inspecção ou do PAT, sendo que as aludidas declarações não se encontram juntas/apensadas a estes autos.

YYY) No caso do fornecedor “E...”, que prestou depoimento nos presentes autos, a AT faz referências às declarações do próprio, sem que as mesmas hajam sido juntas aos autos, não se alcançando de toda a leitura do relatório como a AT concluiu no sentido de o sujeito passivo não evidenciar estrutura compatível com o elevado volume de facturação.

ZZZ) Embora a AT tenha feito referência a declarações recolhidas, em relação a quase todos os fornecedores, baseando as suas conclusões naquelas declarações, a verdade é que os presentes autos não se encontram instruídos com as mesmas, razão pela qual nunca seria possível ao Tribunal a quo ajuizar as mesmas, através de um conhecimento directo, porquanto a AT se limitou a trazer a estes autos meras conclusões extraídas de alegadas declarações que não foram (como se disse) carreadas para os autos.

AAAA) Por outro lado, o Tribunal a quo, não tinha condições para acompanhar a AT nas conclusões de inexistência de estrutura económica de cada um dos fornecedores, uma vez que a AT no relatório relativo à inspecção em causa, no que respeita a este indício extraiu meras conclusões, sem que, no entanto, fornecesse ao Tribunal a quo factos que permitissem chegar àquelas mesmas conclusões, não se conhecendo quais as diligências efectuadas, designadamente, para concluir que não existe estrutura, viaturas ou mão-de-obra por parte dos fornecedores a que se reporta o relatório de inspecção.

BBBB) Por outro lado, todos os fornecedores em causa foram, eles mesmos, objecto de inspecção externa, sendo que tais relatórios de inspecção não foram também eles juntos a estes autos, razão pela qual o Tribunal a quo não conheceu do seu teor, pelo que as conclusões da AT quanto a cada um dos fornecedores, também aí não podiam ser dadas por fundamentadas pelo Tribunal a quo que, salvo o devido respeito, se limitou a dar por assente de forma acrítica tudo quanto constava no relatório de inspecção.

CCCC) Do relatório de inspecção – matéria dada como assente na sentença recorrida – a AT limitou-se a formular meras conclusões que o Tribunal a quo deu como boas, sem que no entanto as mesmas integrem factos (que não sejam conclusivos), ou a prova dos mesmos, que permitam tal conclusão.

DDDD) Alegou a AT que é um indício de facturação falsa os cheques não terem regressado à esfera da actividade empresarial, quando pontos acima referiu como indício para a mesma conclusão, determinados cheques, alegadamente, terem regressado à esfera patrimonial do Recorrente marido, para contas que afirmou não estarem, devidamente, reflectidas na contabilidade.

EEEE) Ora, não se alcança, em concreto, qual o indício que a AT considerou para concluir pelas facturas falsas, o regresso dos cheques à esfera patrimonial do Recorrente ou o não regresso à esfera patrimonial do Recorrente, em conta bancária associada à contabilidade, ou a falta de reflexão de determinadas contas na contabilidade. Não se sabe, nem decorre do relatório de inspecção.

FFFF) Por esta ordem de razões, resulta à evidência que o relatório de inspecção é meramente conclusivo, sendo que quanto aos factos alegados, não foram juntos aos autos os elementos que permitissem ao Tribunal a quo comprová-los e, menos ainda, de forma a dar tal matéria como assente.

GGGG) No que se reporta à aplicação de métodos indirectos, sempre haverá que referir que a AT não instruiu os presentes autos – nem por meio de junção ou de apensação de documentos do PAT – com documentos (ou outros meios de prova) que comprovassem os factos alegados no relatório de inspecção.

HHHH) Do alegado pela AT não resulta que as contas identificadas fossem afinal utilizadas na actividade comercial do Recorrente, sendo irrelevante para a decisão de recorrer a métodos indirectos a utilização de uma conta para validar um identificador de via verde.

IIII) Alegou (ainda) a AT que a movimentação não se encontra assente em documentos válidos (foi usado, por exemplo, um extracto bancário), sucede, contudo, que essa irregularidade não afasta a contabilidade da realidade vivida pelo Recorrente, de forma a tornar as suas contas inaptas para alcançar a verdade tributária, já que não estamos perante uma omissão na contabilidade, mas outrossim perante uma omissão de que a contabilidade se apercebe e corrige, integrando essa realidade nas contas em causa, salvaguardando assim o princípio da substância sobre a forma.

JJJJ) Pelo exposto, o Tribunal a quo chamado a conhecer da questão do cumprimento do ónus da prova pela AT e sendo alegado pelo Recorrente que não estão reunidos os motivos e factos que impliquem o recurso a métodos indirectos para a determinação do imposto através de avaliação indirecta, sempre teria, antes de mais, de apurar das diligências efectuadas pela AT conforme externadas no relatório de inspecção que, em termos de substância, que não formal, se sustentam ou não.

KKKK) E não se sustentando a posição da AT através de factos e de Direito, como no caso ocorre, os actos de liquidação subsequentes teriam que ser anulados, por vício de lei.

LLLL) Nestes termos, mal andou o Tribunal a quo ao não decidir pela anulação das liquidações impugnadas.

MMMM) Finalmente – e por mera cautela e dever de patrocínio – caberia ao Tribunal a quo ter reconhecido a existência de fundada dúvida, quer sobre a existência, quer sobre a quantificação do facto tributário, uma vez que a AT não provou, em concreto, a existência de facto tributário ou o modo através do qual chegou à concreta quantificação da obrigação de imposto.

NNNN) Sendo que na falta de factos e normas fundadoras do acto impugnado, aos Recorrentes apenas resta negar a existência de qualquer facto tributário.

OOOO) Ora, quando se aleguem factos negativos, caberá à AT o ónus da prova de que o facto negativo invocado pelos Recorrentes não se verificou.

PPPP) Na verdade, tem sido entendimento pacífico da jurisprudência que, em qualquer caso, quando a prova não for possível ou se tornar muito difícil àquele que, segundo as regras do artigo 342.º, do CC, teria de a fazer, o ónus da prova deixa de impender sobre ele, passando a recair sobre a outra parte.

QQQQ) É que o artigo 108.º, n.º 3, do CPPT, ao impor a junção, à petição inicial, dos documentos de prova, obriga a juntar apenas os documentos relativos aos factos em relação aos quais recaia sobre o aqui Recorrente, nos termos gerais, o ónus da prova.

RRRR) A não ser feita tal interpretação do artigo 108.º, n.º 3, do CPPT, violar-se-ia o disposto no artigo 268.º, n.º 4, da CRP, pois traduzir-se-ia, na realidade, em esvaziar de conteúdo o direito dos interessados ao recurso contencioso.

SSSS) Na verdade, este direito constitucionalmente garantido ficaria desprovido de sentido naquelas situações em que incumbisse aos contribuintes a prova de todos os factos - mesmo os negativos - que alegam.

TTTT) Assim sendo, haveria que concluir que, não obstante o disposto no artigo 108.º, n.º 3, do CPPT, caberia à AT alegar e provar, facto a facto, em que consistiu a conclusão de que terá ocorrido facto tributário, recaindo no âmbito da incidência objectiva e subjectiva do imposto e em que consistiu a concreta quantificação efectuada.

UUUU) E essa prova teria de ser cabal e desprovida de incertezas, já que, em matéria tão delicada, não poderia o julgador bastar-se com um mero juízo de probabilidade da omissão.

VVVV) Na ausência de tal certeza, a incerteza sobre o facto teria, necessariamente, de resolver-se a favor dos Recorrentes. E isso, uma vez, o Tribunal a quo não fez.

WWWW) Não só por aplicação das regras gerais sobre a repartição do ónus da prova, mas também porque, actualmente, o brocardo in dubio contra fiscum exprime um princípio estruturante, quer do processo administrativo tributário, quer do processo contencioso tributário, de que é expressão o artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.

XXXX) Ora, é lícito lançar mão deste princípio quando, sobre factos relevantes para a causa, se deparem dúvidas sérias, fundadas e inultrapassáveis. O que é, precisamente, a situação dos presentes autos.

YYYY) Face ao exposto, e também por esta via, deveria o Tribunal a quo ter decidido o presente litígio no sentido da procedência da pretensão jurídica dos Recorrentes, consistente na anulação total dos actos tributários impugnados”.

A Fazenda Pública (doravante Recorrida ou FP) não contra-alegou.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 289.º, n.º 2, do CPPT) vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir, delimitadas pelas conclusões das alegações do recurso (cfr. art.º 639.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT):

Houve erro de julgamento de facto e de direito, em virtude de:

a) Ter havido vícios no procedimento inspetivo relacionados com o critério de seleção, a ordem de serviço e o despacho que determinou a inspeção externa?

b) Ter havido vícios atinentes à falta de credenciação?

c) Verificar-se falta de fundamentação das notificações de cobrança e dos atos impugnados?

d) Ter havido insuficiência de fundamentos para recurso a métodos indiretos e vícios de procedimento relativos à aplicação dos mencionados métodos?

e) Ter havido preterição de formalidade essencial, consubstanciada na não utilização do recurso ao procedimento de derrogação de sigilo bancário?

f) Ter havido deficiente demonstração dos pressupostos de tributação por parte da AT?

g) Haver fundada dúvida sobre a existência e a quantificação do facto tributário?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

1. Em 22 de Fevereiro de 2008, o Impugnante encontrava-se coletado desde 1999-01-02 como empresário em nome individual exercendo a atividade de comércio por grosso de madeira em bruto, com a CAE 51531 (cf. relatório de inspeção tributária, a fls. 139 do PAT).

2. O Impugnante foi alvo de uma acção de inspecção externa de âmbito parcial, em sede de IRS e de IVA, aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, em cumprimento das Ordens de Serviço n.ºs OI2007…, OI2007… e OI2007… (cf. relatório de inspecção tributária, a fls. 132 a 175 do PAT).

3. Da ordem de serviço n.º OI2007… consta a identificação do sujeito passivo inspecionado, o número da ordem de serviço, a identificação do chefe de equipa e dos dois técnicos incumbidos de realizar os actos de inspecção, a identificação dos Impugnantes na qualidade de sujeitos passivos a inspeccionar, o âmbito e extensão da inspecção, ao exercício de 2003 em sede de IRS e IVA, a identificação do PNAIT 321,38, a indicação de que o critério de seleção foi regional, mais tendo sido exarado sobre a mesma em 17 de Setembro de 2007 despacho pelo chefe de divisão determinando que se procedesse à inspecção externa (cf. ordem de serviço a fls. 416 do PAT).

4. Da ordem de serviço n.º OI2007… consta a identificação do sujeito passivo inspecionado, o número da ordem de serviço, a identificação do chefe de equipa e dos dois técnicos incumbidos de realizar os actos de inspecção, a identificação dos Impugnantes na qualidade de sujeitos passivos a inspeccionar, o âmbito e extensão da inspecção, ao exercício de 2004 em sede de IRS e IVA, a identificação do PNAIT 321,38, a indicação de que o critério de seleção foi regional, mais tendo sido exarado sobre a mesma em 17 de Setembro de 2007 despacho pelo chefe de divisão determinando que se procedesse à inspecção externa (cf. ordem de serviço a fls. 410 do PAT).

5. Da ordem de serviço n.º OI2007… consta a identificação do sujeito passivo inspecionado, o número da ordem de serviço, a identificação do chefe de equipa e dos dois técnicos incumbidos de realizar os actos de inspecção, a identificação dos Impugnantes na qualidade de sujeitos passivos a inspeccionar, o âmbito e extensão da inspecção, ao exercício de 2005 em sede de IRS e IVA, a identificação do PNAIT 321,38, a indicação de que o critério de seleção foi regional, mais tendo sido exarado sobre a mesma em 17 de Setembro de 2007 despacho pelo chefe de divisão determinando que se procedesse à inspecção externa (cf. ordem de serviço a fls. 411 do PAT).

6. Em 2 de Outubro de 2007 a ordem de serviço n.º OI2007… foi assinada por J…, na qualidade de TOC dos ora Impugnantes (cf. fls. 416 do PAT).

7. Em 5 de Dezembro de 2007 as ordens de serviço n.º OI2007… e OI2007… foram assinadas por J..., na qualidade de TOC dos ora Impugnantes (cf. fls. 410 e 411 do PAT).

8. Em 28 de Setembro de 2007 os Impugnantes tiveram conhecimento das cartas aviso da Direcção de Finanças de Lisboa dando conhecimento das Ordens de Serviço n.ºs OI2007…, OI2007… e OI2007… tendo as mesmas sido expedidas em 24 de Setembro de 2007 através de correio postal registado com o n.º de registo R002443…PT (cf. cartas, 405 a 409 do PAT).

9. Os Impugnantes pronunciaram-se em sede de audiência prévia sobre o projeto de relatório da inspeção tributária referida no ponto 1, aqui se dando por integralmente reproduzido o teor da respetiva pronúncia (cf. requerimento a fls. 213 a 249 do PAT, constituindo anexo 13 ao relatório de inspeção tributária).

10. Em 22 de Fevereiro de 2008 foi emitido o relatório de inspecção tributária [RIT] contendo as conclusões da acção de inspecção efectuada aos exercícios de 2003, 2004 e 2005 dos ora Impugnantes em cumprimento das ordens de serviços n.ºs OI2007…, OI2007… e OI2007…, do qual consta o seguinte (cf. relatório a fls. 132 a 175 do PAT):

(…)

I - CONCLUSOES DA ACÇÃO INSPECTIVA

Nos termos dos arts. 87.º, alínea b) (Redacção dada pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro), e 88.º da Lei Geral Tributária (LGT), aplicáveis por remissão do art. 39.º do Código do IRS, e atendendo à impossibilidade de comprovar e quantificar de uma forma directa e exacta os elementos indispensáveis à determinação da matéria tributável do sujeito passivo, por se verificar a insuficiência de elementos de contabilidade, bem como a ocultação, falsificação ou viciação de documentos legalmente exigidos, é proposta a fixação do rendimento tributável dos exercícios de 2003, 2004 e 2005 por métodos indirectos, nos montantes indicados no quadro seguinte.

Em sede de IVA são propostas correcções técnicas aos mesmos exercícios, correspondentes a imposto deduzido com base em facturas consideradas “falsas”, por infracção ao disposto no art. 19.º, nos 3 e 4, do Código do IVA, assim discriminadas:

II - OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA

1) Credencial e período em que decorreu a acção

A acção de inspecção dirigida ao sujeito passivo M... (NIF 118…), doravante designado apenas por “M...”, foi efectuada em cumprimento das Ordens de Serviço OI 2007…/7/8, de âmbito externo, com despachos de 2007/09/17.

Os actos inspectivos decorreram entre 2007/10/02 e 2008/01/1 7.

2) Motivo, âmbito e incidência temporal

A realização da acção de inspecção, dirigida aos exercícios de 2003 a 2005, foi proposta na sequência de investigações efectuadas junto de outros sujeitos passivos, supostos “fornecedores” do contribuinte, donde resultaram fortes suspeitas relativas à não efectiva realização das vendas / prestações de serviços facturadas, justificando-se a determinação das respectivas implicações fiscais.

A inspecção foi classificada de âmbito parcial, dirigida à análise da situação referida em sede de IRS e de IVA (PNAIT 321.38).

3) Outras situações

Com vista ao cumprimento do disposto no art. 59.º da Lei Geral Tributária (LGT) e no art. 49.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), foram enviadas as devidas Cartas Aviso (Ofício n.º 77900, datado de 2007/09/21, desta Direcção de Finanças).

III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável

1) Caracterização do sujeito passivo

O contribuinte tem domicílio fiscal no Csl. A…, Caixa 2…, em B… - Á…

Está colectado desde 1991/01/02 como empresário em nome individual, exercendo a actividade de comércio por grosso de madeira em bruto (CAE 51531). Em sede de IRS pertence à categoria B, dispondo de contabilidade organizada. Relativamente ao IVA encontra-se enquadrado no regime normal de periodicidade mensal.

Trata-se de um contribuinte que aparentemente cumpre com as suas obrigações fiscais, tendo no decurso do trabalho inspectivo, de um modo geral, disponibilizado os elementos solicitados, quer ao nível da própria contabilidade, quer relativamente a outros elementos e esclarecimentos, nomeadamente documentos bancários.

No entanto, apesar dessa aparente regularidade, na sequência de procedimentos inspectivos realizados a alguns dos supostos “fornecedores”, bem como de diversas outras diligências efectuadas, foram detectadas fortes suspeitas de utilização de facturas “falsas”, resultantes de operações simuladas, conforme adiante descrito.

Uma vez que o sujeito passivo contabilizou facturas nessas circunstâncias, influenciou os impostos devidos em consequência do exercício da sua actividade empresarial.

2) Caracterização da actividade empresarial

A actividade dos intermediários da compra e venda da madeira normalmente desenvolve-se entre os proprietários das matas e as fábricas de transformação da matéria-prima em pasta de papel.

As operações a darem-se deste modo, em sede de IRS resultavam num normal negócio de compra e venda, mas em matéria de IVA, para os ditos intermediários, em compras de madeira isentas de IVA, por serem efectuadas directamente aos produtores silvícolas, seguidas de vendas às fábricas, sujeitas e não isentas de imposto. Logo, competiria aos intermediários arrecadar o IVA resultante das transacções e proceder à entrega do mesmo nos cofres do Estado, quase na totalidade desse montante, atendendo a que haveria apenas que deduzir o IVA inerente a outros inputs.

No caso concreto do presente sujeito passivo, directa e indirectamente, neste caso através de uma empresa que funciona como central de compras, a mercadoria foi vendida a fábricas, sobretudo à fábrica da P…, de Setúbal. Contudo, segundo a contabilidade e os respectivos documentos de suporte, regra geral a mercadoria não provém de silvicultores ou de particulares proprietários de eucaliptais / pinhais, mas sim, alegadamente, de outros intermediários.

Tal circunstância evidentemente que pode ocorrer, e é frequente, acontece porém que no decurso das investigações levadas a cabo aos fornecedores do sujeito passivo se concluiu, relativamente a uma parte significativa dos mesmos, que apesar das facturas expressarem essa realidade (ainda que no todo a documentação produzida não cumpra na plenitude os requisitos legais), tudo indica que esses operadores não desenvolveram a actividade que lhes é imputada.

Em resultado dos trabalhos efectuados confirmou-se que os “fornecedores” indicados nos pontos seguintes, regra geral, encontram-se na seguinte situação:

-Não entregaram as respectivas declarações fiscais, pelo menos com os valores devidos, quer em sede de IVA, quer em Impostos sobre o Rendimento;

-Não apresentaram a contabilidade ou qualquer tipo de escrituração;

- Não dispõem de estrutura empresarial compatível com a facturação verificada, o que era indispensável para o exercício da actividade em causa;

-Não revelam a existência de relações empresariais a montante, nomeadamente ao nível da aquisição de madeira e dos inerentes serviços prestados, conforme também era indispensável ter ocorrido face aos elevados volumes de negócios detectados;

-As facturas não cumprem com os requisitos legais exigidos pelo regime aplicável aos bens em circulação, aprovado pelo Dec. Lei n.º 147/2003, já que se desconhece a existência de guias de transporte, nomeadamente quanto à indicação do meio de transporte utilizado, bem como dos locais de carga e descarga da mercadoria;

-Nem sempre foram apresentados documentos comprovativos dos pagamentos efectuados, através de meio que permita identificar o destinatário, apesar de desde o início de 2005 tal procedimento ser obrigatório legalmente, face ao disposto no n.º 3 do art. 63.º C da LGT;

- Não apresentam sinais exteriores de riqueza que indiquem ter usufruído de rendimentos inerentes à facturação emitida.

Atendendo à actividade em causa, importa realçar a falta de documentos comprovativos do transporte das mercadorias, em cumprimento do regime aplicável aos bens em circulação.

Foi ainda possível recolher informações de contribuintes e responsáveis por empresas “fornecedoras”, segundo os quais as facturas emitidas são “falsas”, o que reforçou as conclusões anteriores.

Assim sendo, foram apreciadas as circunstâncias e condições do exercício da actividade de cada um dos “fornecedores”, cujo IVA liquidado não poderá resultar em imposto dedutível na esfera do presente sujeito passivo, considerando que se demonstra estar na presença de operações simuladas, pelo menos quanto às partes e valores envolvidos, demonstrando-se impossível conhecer a identidade dos reais fornecedores e do efectivo valor das compras.

3) Fornecedores de mercadorias

Através das acções de inspecção efectuadas e das diligências levadas a cabo, concluiu-se relativamente aos operadores mencionados no quadro abaixo, “fornecedores” em nome de quem foram emitidas as facturas registadas na contabilidade do Sr. M..., nos valores indicados no mesmo (com IVA incluído), o descrito nos pontos seguintes.


“Texto integral com imagem”

3-1) J...

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva através das Ordens de Serviço OI 2007…/79/80 e OI 2007…, expondo-se mais detalhadamente os fundamentos que comprovam que as facturas emitidas são “falsas” por ter sido este o principal emitente.

O contribuinte está colectado para o exercício da actividade de comércio por grosso de madeira em bruto e de produtos derivados. Apesar do elevado volume da facturação detectada (rondou os 3,3 milhões de euros), em conformidade com as informações recolhidas tudo indica que não tem contabilidade, bem como TOC.

Em Termo de Declarações referiu, na parte que interessa ao presente processo, que:

- Os seus fornecedores de madeira eram silvicultores ou particulares, que não passavam documento, e que agora não consegue identificar;

-Por vezes recebia primeiro o dinheiro dos seus clientes, para poder ter possibilidades de pagar aos proprietários das matas;

- Nos anos indicados já não tinha nem viaturas nem equipamentos para corte, rechega e transporte da madeira, sendo tais actividades da responsabilidade dos seus clientes;

- Desconhece o destino final das mercadorias e a forma como eram efectuados os serviços.

Em primeiro lugar, segundo os cruzamentos de informação efectuados não são conhecidas relações empresarias deste contribuinte com eventuais fornecedores. Ele próprio não identificou nenhum, o que seria incompreensível caso tivesse sido ele a comprar a madeira, já que certamente recordar-se-ia de muitos dos locais onde se situavam os eucaliptais / pinhais envolvidos, assim como a identificação dos respectivos proprietários.

Para além do referido em Termo de Declarações, objectivamente também não foi comprovada a existência de instalações e equipamentos próprios deste tipo de actividade, o que é incompatível com o volume de facturação.

Pese embora o facto de o contribuinte ter referido não ter efectuado quaisquer transportes, nem identificado viaturas ao serviço da sua actividade, foi feita uma análise a alguns veículos supostamente relacionados com o contribuinte, não se tendo, ainda assim, concluído que este efectuou tais serviços. Todavia, grande parte da sua facturação respeita a serviços prestados, nomeadamente de transporte de madeira.

Apesar do contribuinte ter identificado o Sr. M... como um dos principais destinatários das facturas, como não assumiu a realização de quaisquer serviços contrariou o que foi mencionado pelo “cliente”, que referiu ter sido o “fornecedor” a fazer os serviços associados às transacções.

De realçar que se desconhece a existência de guias de transporte, bem como qual o meio de transporte utilizado e os locais de carga e descarga, que ambos os intervenientes referiram desconhecer.

É ainda relevante observar que o Sr. J… facturou transportes para diversos sujeitos passivos nas mesmas datas, tendo por referência as datas das facturas, principalmente para o Sr. M..., que foi o maior destinatário dos mesmas.

Por outro lado, determinou-se que o contribuinte não tem funcionários, o que também constituiria um factor indispensável ao exercício da actividade, face ao volume da mesma e ao facto dos transportes em que era suposto ter participado terem que ocorrer, em muitos casos, em simultâneo.

Como não foi determinada a existência de uma adequada estrutura económica (que aliás o contribuinte referiu não possuir), o que seria indispensável, concluiu-se que as facturas não podem corresponder a efectivas transmissões de bens / prestações de serviços, tratando-se de operações simuladas, materializadas com a emissão de “facturas falsas”, sendo evidente que os utilizadores das mesmas não podiam desconhecer tais circunstâncias.

Transacções declaradas:

Segundo os documentos fornecidos só o Sr. M..., nos 3 exercícios, comprou mais de 40.000 toneladas de madeira, sobretudo de eucalipto (valor calculado tendo em conta o preço médio mais alto por tonelada praticado), o que perfez um volume de facturação superior a 2.100.000 euros (conforme consta da conta 22.1.1.000009 do POC).

O Sr. M... em resposta à notificação efectuada referiu que a mercadoria havia sido transportada por viaturas do “fornecedor”, muito embora não tenham sido detectados meios compatíveis com as quantidades de mercadoria facturada, já que se estima que teriam que ter sido realizados no mínimo 1.000 transportes (40.000 ton. a dividir por uma média de 40 ton. por transporte), só para as vendas para este “cliente”. O que atendendo à inexistência de viaturas e empregados deixa claro que as facturas são “falsas”.

De referir que os cálculos foram feitos com base em valores de preço por tonelada elevados, já que muitas das facturas para o Sr. M... revelam valores inferiores.

Quanto ao pessoal envolvido, aos locais de carga e descarga da mercadoria, bem como aos elementos relativos à pesagem da mesma, não apresentou quaisquer elementos, pelo que outras dúvidas relativas à efectiva realização das operações não ficaram esclarecidas.

O Sr. M... afirmou mesmo que não poderia esclarecer o local de descarga da mercadoria, o que não é aceitável sendo ele o destinatário e considerando que em 2005 e 2006 facturou directamente à P…. Mesmo que o tivesse feito indirectamente é normal controlar a facturação pelas entradas efectivas na fábrica.

Para justificar o pagamento das facturas apresentou cópias de cheques emitidos sobre uma conta aberta na agência de Torres Vedras do Banco …, designada por “C…”, com o n.º 33… (NIB …). Os cheques não perfazem todo o montante em dívida, segundo a conta corrente do Sr. J..., não se vislumbrando como este poderia suportar os pagamentos aos seus fornecedores caso os negócios fossem reais, o que aliás também contraria o referido a este propósito pelo próprio.

Por outro lado, não se detectaram movimentos financeiros que indiciassem pagamentos a supostos fornecedores do Sr. J..., nem mesmo nos casos em que os cheques recebidos dos “clientes” foram endossados pelo contribuinte.

Outras evidências de um anormal relacionamento empresarial resultam do facto de dois dos cheques apresentados como prova do pagamento pelo Sr. M... passados mais de 2 anos ainda não terem sido movimentados (cheque n.º 902799…, de 2005/02/26, no valor de 24.983,79 euros e cheque n.º 150004…, de 2005/06/30, de 16.990,00 euros (Conforme verificação dos extractos emitidos até Julho 2007, de acordo com o gabinete de contabilidade) enquanto que outros foram levantados mais de 1 ano e num caso mais de 2 anos depois da data de emissão, como são disso exemplo os seguintes cheques (anexo 1, relação dos cheques e extracto bancário exemplificativo com 3 páginas):


“Texto integral com imagem”

Outra prova disso mesmo são as situações em que se detectou que o dinheiro teve outros destinatários, que não o suposto fornecedor, assumindo especial importância os muitos casos em que regressou à esfera pessoal do Sr. M... (ver anexo 1, com 3 páginas).

Através da análise aos números das contas bancárias indicadas no verso dos cheques foi possível observar que a maioria regressou a contas cujo titular é o próprio M... (conta com o NIB … do Banco S… (Conta que apesar de não reconhecida na contabilidade vem mencionada em documentos inscritos na mesma, pese embora no caso concreto não tenha sido usada (anexo 4, com 2 páginas)) ou a sua esposa - Sra. I... - NIF 103… (conta n.º 20… da agência de A… da Caixa …), juntando-se documentos a título exemplificativo (anexos 1 e 3, respectivamente com 3 e 7 páginas).

Mais exemplos resultam da análise de outros cheques do B… (anexo 1, com 3 páginas), igualmente emitidos pelo Sr. M... para efectuar pagamentos ao Sr. J..., cujas verbas envolvidas regressaram a uma conta bancária daquele, desta feita a conta aberta no F…, com o n.º 26253…, que também não se encontra reflectida na contabilidade, pese embora tenha sido usada, pelo menos, para validar um identificador de uma viatura no sistema da Via Verde (anexo 12, com 3 páginas).

Verificou-se ainda que uma factura do Sr. J... para outro suposto cliente (factura n.º 788, de 2004/01/19, no valor de 5.108,81 euros), deu origem a um pagamento por cheque de igual valor, cujo destino foi, mais uma vez, a conta do Banco S… antes referida (anexo 11, com 1 página). Logo, parece evidente que o fornecedor não terá sido o Sr. J..., quer porque não ficou com o dinheiro do pagamento, quer porque de acordo com a hipotética relação empresarial que teria com o Sr. M..., seria este quem devia dinheiro aquele e não o contrário.

Ainda que o Sr. M... viesse a referir que o pagamento tinha sido anteriormente feito em dinheiro, servindo o cheque de comprovativo do pagamento, o que é ilógico, o certo é que o valor dos cheques que emitiu não regressou à sua esfera empresarial, já que foram depositados em contas bancárias não reconhecidas na contabilidade.

Por outro lado, também existem casos em que cheques do Sr. M... para o Sr. J... aparentemente tiveram outros destinatários, muito embora em menor número. Justifica-se destacar os recebidos pelos Srs. J...(NIF 124…) e J… (NIF 130…). Enquanto que aquele referiu respeitarem à devolução de dinheiro emprestado ao Sr. M... para comprar matas, em que serviu de intermediário, o segundo dos destinatários referiu tratar-se do pagamento da venda de madeira efectuada pelo Sr. R… (N1F179…), em que interveio na qualidade de procurador, uma vez que este é residente nos EUA, para onde o montante em causa foi transferido.

Importa destacar que ambos referiram se tratar de negócios efectuados directamente com o Sr. M..., desconhecendo o porquê dos cheques terem sido emitidos como sendo para pagamento de facturas do Sr. J..., a quem foram dirigidos. Mais, na contabilidade do Sr. M... não foi registado o documento de compra ao contribuinte R… (anexo 2, com 5 páginas), mas sim um factura do Sr. J..., em sua substituição.

Por fim, é relevante realçar ainda que algumas facturas do Sr. J... foram utilizadas com data anterior àquela em que os respectivos livros foram entregues pela tipografia, facto que relacionado com as conclusões anteriores reforça que efectivamente não podem corresponder às operações a que fazem referência.

Estão na situação referida facturas dirigidas ao Sr. M..., quer no que respeita à factura no 751, emitida em 2003/05/12, cujo livro a que pertence só foi entregue pela tipografia em 2003/05/23, quer quanto às facturas com os n.ºs 955 e 957, datadas de 2005/12/05 e 2005/12/15, respectivamente, que só foram entregues em 2006/01/31.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

A conclusão de que a actividade não foi exercida e de que os documentos não correspondem a efectivas operações tem por base as declarações e elementos recolhidos e a inexistência de compras de mercadorias, de encargos com equipamentos específicos deste sector de actividade (como por exemplo com veículos), de funcionários, bem como de outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiros. Assim sendo, ficou demonstrada a inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial.

3-2) T...SOC. UNIP., LDA

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva através das Ordens de Serviço OI 2007…/213 e OI 2007…. Está colectado pelo exercício da actividade de demolições e terraplanagens, a que corresponde o CAE 45110.

Em Termo de Declarações o sócio-gerente da sociedade prestou esclarecimentos importantes para aferir as circunstâncias em que aparecem facturas emitidas em nome da sociedade na contabilidade de diversos sujeitos passivos, referindo nomeadamente que as facturas não têm subjacente a realização de quaisquer transacções, classificando-as de “falsas”.

Atendendo às referências efectuadas por aquele a outros intervenientes directos no modus operandi em causa, incluindo a um empregado do Sr. M..., aparentemente usado como intermediário na simulação dos pagamentos, conforme melhor se descreverá adiante, esse indivíduo foi igualmente ouvido em declarações, tendo confirmado os factos relatados pelo sócio-gerente da T….

Na sequência do procedimento a maioria dos utilizadores das facturas veio mesmo a regularizar os impostos em causa, dado que as facturas foram todas emitidas nas mesmas circunstâncias.

Em síntese, tendo em conta as várias declarações recolhidas e os diferentes elementos obtidos, tudo indica que não existe contabilidade, não tendo o TOC conhecimento do exercício de qualquer actividade, desconhecendo-se ainda a realização de compras de mercadorias ou de serviços prestados por outros sujeitos passivos à sociedade, o que teria sido indispensável.

O mesmo se pode dizer quanto à estrutura empresarial, já que não são conhecidas instalações e equipamentos próprios da actividade em causa, nomeadamente viaturas, bem como de funcionários, o que por si só leva a crer que nunca houve capacidade de realização das vendas de mercadorias / prestações de serviços facturadas, o que está de acordo com o referido pelas pessoas relacionadas com a sociedade.

Transacções declaradas:

O Sr. M... foi o maior utilizador das facturas da T..., tendo documentos de compra de mais de 500.000 euros de madeira (IVA incluído), sobretudo de eucalipto, sendo mesmo o único destinatário das mesmas em 2003 (conforme consta da conta 22.1.1.000051 do POC). O que representa nos 3 exercícios cerca de 13.000 toneladas de mercadoria (valor calculado tendo em conta o preço mais alto indicado).

Muito embora também neste caso não tenham sido detectados meios de transporte, estima-se que teriam que ter sido realizados no mínimo 300 transportes, segundo os mesmos cálculos. Dado que o valor de cada factura não pode ter correspondência com apenas um transporte, o contribuinte M... deveria estar na posse de documentos comprovativos do transporte, em cumprimento dos requisitos legais já mencionados.

Alguns dos cheques emitidos como que para pagamento das facturas deste “fornecedor” foram assinados no verso e levantados em dinheiro, enquanto que outros (endossados) foram depositados na conta bancária do empregado do Sr. M..., bem como em contas de terceiros a quem o mesmo supostamente pedia para fazer a movimentação dos cheques, de forma a não passarem todos na sua conta. De seguida o dinheiro era devolvido ao próprio M... ou utilizado para pagar aos proprietários da matas, conforme as declarações prestadas.

De facto, apurou-se que muitos dos cheques emitidos sobre a conta do empregado do Sr. M..., que representam a saída do dinheiro da sua esfera patrimonial, foram levantados em dinheiro pela esposa do Sr. M... ou depositados nas contas relacionadas com o mesmo, já mencionadas a propósito do “fornecedor” antes analisado.

É ainda revelador da intervenção do Sr. M... em relação à ‘actividade” da T... o facto de se ter detectado que um dos cheques emitidos por um sujeito passivo que utilizou facturas (anexo 5, com 1 página), e que na sequência da investigação regularizou a situação fiscal, foi depositado numa conta do Sr. M... (conta n.º 51… do Banco S…). Curiosamente, essa empresa apresentou cópia de dois cheques ao portador, que deveriam ser destinados à T..., que perfazem exactamente o valor do IVA constante nas 4 facturas que recebeu.

Verificou-se ainda, relativamente a cheques passados por uma outra sociedade para a T..., que foram endossados e depositados numa outra conta da Caixa … (anexo 6, com 2 páginas), cujo titular informou que depositou aqueles cheques na sua conta a pedido do empregado do Sr. M..., tendo-lhe devolvido o dinheiro, segundo sabe para ser entregue ao Sr. M....

Os procedimentos referidos são mais uma evidência de que as operações facturadas não se realizaram.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

A conclusão de que a actividade não foi exercida e de que os documentos não correspondem a efectivas operações tem por base as declarações recolhidas e a inexistência de compras de mercadorias e de estrutura empresarial, conforme resulta da ausência de encargos com equipamentos específicos deste sector de actividade, por exemplo com veículos, de funcionários, bem como de outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiros.

3-3) F... CONSTRUÇÕES SOC. UNIP., LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva realizada em cumprimento das Ordens de Serviço OI 2007…/9. Está colectado pelo exercício da actividade de construção de edifícios, a que corresponde o CAE 45211.

Em Termo de Declarações o sócio-gerente desta sociedade, que é o mesmo do operador mencionado no ponto anterior, referiu que as circunstâncias em que actuou em representação da empresa F... Construções, Lda. foram em tudo idênticas àquelas em que usou o nome da T....

Em razão das declarações prestadas e dos elementos recolhidos, não se justifica desenvolver aqui, novamente, todos os factos de que resulta a conclusão de que também esta empresa não dispôs de estrutura empresarial capaz de desenvolver a actividade que lhe é imputada, dado que se lhe aplica o que foi referido relativamente à T....

Na sequência deste procedimento de inspecção também houve um utilizador das facturas que regularizou os impostos em causa, o que confirma o apurado.

Transacções declaradas:

O Sr. M... neste caso também foi um dos maiores utilizadores das facturas, embora apenas com cerca de 87.000 euros de madeira (IVA incluído), conforme se verifica pela análise da conta 22….do POC.

Em virtude da actividade evidenciada nos documentos ser a mesma que a da T..., encontram-se aqui em falta os mesmos elementos de prova, nomeadamente quanto às guias de transporte, de forma a validar os veículos pretensamente usados, os locais de carga e de descarga.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Mais uma vez, a conclusão de que os documentos não correspondem a efectivas operações teve por base as declarações recolhidas, assim como a falta de confirmação de supostas compras de mercadorias, da realização de encargos com equipamentos específicos deste sector de actividade, por exemplo com veículos, de funcionários, bem como outros custos operacionais, nomeadamente de serviços prestados por terceiros.

Em suma, ficou demonstrada a inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial.

3-4) T... TRANSPORTES, LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O contribuinte foi objecto de acção inspectiva através das Ordens de Serviço OI 2007… e OI 2007…. Está colectado pelo exercício da actividade de transportes rodoviários de mercadorias, a que corresponde o CAE 60240.

O sócio-gerente desta sociedade também foi ouvido em Termo de Declarações, tendo referido que a mesma desenvolveu uma reduzida actividade económica e que, paralelamente, foi utilizada para emitir facturas “falsas”, entre as quais estão as emitidas para o Sr. M....

Em primeiro lugar, tendo em conta o determinado tudo indica que não existe contabilidade, tendo o TOC manifestado surpresa face ao volume de facturação existente em nome da sociedade.

Da mesma forma que nos operadores já referenciados, desconhece-se ainda a realização de compras de mercadorias ou de serviços prestados por outros sujeitos passivos à sociedade, assim como da existência de estrutura empresarial compatível com o volume de negócios, o que teria sido indispensável para sustentar a realização das vendas de mercadorias 1 prestações de serviços facturadas.

Pese embora tenha sido possível identificar algumas viatura relacionadas com a T... e o facto de existem “clientes” que indicaram ter sido a empresa a fazer o transporte da madeira em causa, como é o caso do Sr. M..., foi afastada a hipótese de tal ter ocorrido. Isto porque, tendo em conta que a madeira destina-se à Portucel, é possível afirmar que não existem registos das viaturas referenciadas terem sido usadas, conforme era suposto, pelo menos enquanto propriedade da T.... De realçar a ausência de documentos de transporte.

Outro aspecto importante é que também neste caso se verificou que um dos utilizadores das facturas regularizou impostos em falta, em consequência do trabalho desenvolvido, o que confirma o apurado no decurso da inspecção.

Transacções declaradas:

O Sr. M... referiu ter comprado madeira de eucalipto, segundo os documentos de mais de 1.400 toneladas, em conformidade com os cálculos já antes efectuados a propósito de outros operadores, já que as facturas não indicam os elementos necessários.

Apesar da quantidade em causa, as pretensas compras foram facturas num intervalo muito curto, de apenas 12 dias, o que reforça as dúvidas existentes. O Sr. M... disse ainda que a mercadoria foi transportada por viaturas do “fornecedor”, tendo-se já referido que tal não pode ter ocorrido. Quanto ao pessoal envolvido, aos locais de carga e descarga da mercadoria, bem como aos elementos relativos à pesagem da mesma, não apresentou quaisquer elementos.

Para pagamento das facturas apresentou 3 cheques emitidos à ordem da T..., que se comprovou terem sido levantados ou endossados, ficando a dúvida quanto ao que aconteceu posteriormente, tendo em conta que no verso de 2 dos cheques parece vir indicado o número de uma conta bancária do mesmo banco da qual se desconhece o titular.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Este caso permitiu chegar às mesmas conclusões que nos dois operadores anteriores, desde logo pela demonstração da inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial, determinando-se que os documentos não correspondem a efectivas operações, o que foi reforçado pelas declarações do respectivo sócio-gerente.

3-5) E...

Caracterização do sujeito passivo:

O contribuinte foi objecto de acção inspectiva pelas Ordens de Serviço OI 2007…/39/40. Está colectado pelo exercício da actividade de comércio por grosso de materiais de construção (excepto madeira) e equipamentos sanitários, a que corresponde o CAE 51532. Segundo as declarações prestadas pelo Sr. E...as facturas emitidas para o Sr. M... não correspondem à realidade das operações. Em concreto, os negócios de compra e venda de madeira eram realizados pelo Sr. M..., recebendo aquele apenas uma comissão de intermediação. De resto não se vislumbraram sinais exteriores de riqueza que indiciassem que o contribuinte usufruía de outro tipo de rendimentos.

Com efeito, na acção desenvolvida concluiu-se que o sujeito passivo em questão não evidencia estrutura compatível com tão elevado volume de facturação, pois apesar do afirmado, é um facto que não se detectaram evidências da existência dos indispensáveis veículos, pessoal contratado ou da prestação de serviços subcontratada, seja ao nível de mão-de-obra necessária para o corte e rechega da madeira, seja para o transporte, o que no caso da actividade ser real era manifestamente indispensável.

Por outro lado, reforça a convicção anterior o facto de não terem sido detectadas compras de mercadorias, nem tão pouco de contabilidade ou TOC.

Mais uma vez se verificou que na sequência do procedimento de inspecção houve um utilizador das facturas que regularizou os impostos em falta, o que confirma o apurado.

Transacções declaradas:

Assume especial importância o referido anteriormente porque o Sr. M... foi o maior destinatário das facturas deste operador, tendo registado documentos de compra de mais de 1.800.000 euros de madeira (IVA incluído), conforme registos efectuados na conta 22.1.1.000048 do POC. O volume de facturação representa nos 3 exercícios mais de 41.000 toneladas de madeira (valor calculado tendo em conta o preço médio mais alto conhecido para este tipo de mercadoria).

Apesar de para realizar a actividade mencionada nas facturas ser necessário dispor de uma considerável estrutura empresarial, nomeadamente para realizar os mais de 1.000 transportes que se estima (da mesma forma que nos casos anteriores) que teriam que ser efectuados, o Sr. M..., em sentido contrário ao referido pelo Sr. E…, indicou que “os meios de transporte utilizados foram do próprio fornecedor, não podendo esclarecer os locais de carga e descarga e os elementos referentes à pesagem da mercadoria, dado não estarem em minha posse”.

Ora, conforme já referido, não se demonstrou que o contribuinte disponha desses meios, sendo também incompreensível que o Sr. M... refira não conhecer o destino dos bens, tendo em conta a forma como se desenvolve a sua actividade.

Quanto aos pagamentos, regra geral efectuados por cheque, verificou-se uma situação anómala que reforça as conclusões anteriores, relacionada com o facto de alguns cheques terem sido movimentados numa data muito posterior à respectiva emissão, o que tendo em conta a forma como o Sr. E...diz ter operado confirma que as facturas serão “falsas”, já que é improvável que esperasse tanto tempo para utilizar o dinheiro, nomeadamente para pagar as supostas compras de madeira.

Sublinhe-se que existem vários cheques, emitidos em 2004 e 2005, que só foram movimentados em 2007.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

A exemplo dos operadores anteriores, ficou demonstrada a inexistência da necessária e indispensável estrutura empresarial e que as facturas não correspondem às operações realizadas, o que foi confirmado pelas declarações do contribuinte.

3-6) S…

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva realizada ao abrigo das Ordens de Serviço OI 2007…/89/90. Está colectado pelo exercício da actividade de bares, com o CAE 55403.

No decorrer do procedimento demonstrou-se impossível contactar com o sujeito passivo. Não foi também localizada a contabilidade, que se presume não existir, tendo-se procedido à circularização de informação, nomeadamente junto dos supostos clientes.

Não foram identificados os meios necessários ao exercício da actividade operacional, incluindo empregados. O contribuinte possui apenas uma viatura, que se monstra insuficiente para transportar a quantidade de madeira facturada. Note-se que vários clientes identificaram o sujeito passivo como o transportador das mercadorias.

Também não foi comunicada à Administração Fiscal qualquer aquisição de serviços de transporte ou mão de obra subcontratada pelo sujeito passivo.

A reforçar estas conclusões está o facto, verificado também neste caso, de dois utilizadores das facturas que regularizaram impostos em falta, o que confirma o apurado. Por outro lado, importa referir que não se vislumbraram sinais exteriores de riqueza que indicassem que o contribuinte usufruiu rendimentos inerentes à suposta actividade.

Transacções declaradas:

O Sr. M... contabilizou facturas de compra de quase 500.000 euros de madeira (IVA incluído), conforme registos efectuados na conta 22.1.1.000050. Segundo os cálculos efectuados no procedimento o volume de facturação representa mais de 10.000 toneladas de madeira, a que corresponderiam cerca de 250 transportes.

Como habitual o Sr. M... referiu que os meios de transporte utilizados nas transacções eram do próprio “fornecedor” e que não podia esclarecer quais os lugares de carga, descarga e pesagem da mercadoria.

Estranha-se o referido, mais uma vez, dado que se confirmou que o Sr. S… apenas dispõe de uma viatura, que teria que ter sido usada para transportar os bens destinados a todos os “clientes”. Ainda que o tivesse feito, o local de descarga não podia ser desconhecido pelo destinatário, pelas razões já enunciadas, que se prendem com o destino final dos bens (a fábrica da P…).

Neste caso não se possuem os documentos comprovativos do pagamento das facturas, apesar do Sr. M... referir que efectuou os pagamentos por cheque. Atendendo à simulação verificada em anteriores situações, admite-se que os cheques possam ter tido o mesmo destino.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Em face da análise efectuada pelos serviços verificou-se que o sujeito passivo não demonstrou ter adquirido a madeira transaccionada, não consta que tivesse a mão de obra necessária aos trabalhos de corte e empilhamento da madeira, nem que tenha subcontratado tais meios, incluindo para o transporte dos bens, já que a viatura que possui não pode ter transportado todos os bens facturados.

Em suma, também relativamente a este operador não se confirmou a existência de estrutura empresarial. Este facto conjugado com o reconhecimento por parte de alguns operadores em como as facturas não titulam reais transmissões de bens, permitiu concluir que as facturas são “falsas”.

3-7) M… COM. E SERVIÇOS EM MADEIRA, LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva realizada ao abrigo das Ordens de Serviço OI 2007…/5. Está colectado para desenvolver outras actividades de serviços prestados, a que corresponde o CAE 74872. Um dos sócios da sociedade declarou que a empresa dedicava-se ao corte e rechega de madeira, mas que nunca vendeu madeira. Informou ainda que não possuía qualquer viatura para transporte de madeira, nem nunca teve qualquer empregado.

Em momento posterior foi ouvido também o outro sócio, que declarou ter feito facturas para o Sr. M..., sabendo que o que estava a facturar não correspondia, de facto, à actividade desenvolvida, nem a nenhum tipo de operação, sendo as facturas “falsas”. A actividade que disse ter desenvolvido era apenas de intermediação no negócio de compra e venda de madeira, através da procura de matas e da negociação das mesmas com os proprietários, em nome dos destinatários da madeira, que assumiam o risco do negócio.

Referiu ainda que os negócios de madeira envolveram sempre “matas em pé”, nunca tendo realizado os serviços de corte, descasca, rechega ou transporte, até porque a M… não possuía meios para tal.

Pagava a madeira ao proprietário com dinheiro disponibilizado pelo “cliente”, por regra os cheques deste eram directamente entregues aos proprietários das matas. Ainda assim, não divulgou o nome de nenhum dos supostos proprietários.

O TOC confirmou que os sócios e gerentes da sociedade informaram-no que a empresa tinha deixado de exercer a actividade, pelo que, consequentemente, deixaram de entregar documentos da mesma, desconhecendo que tinham sido emitidas facturas.

As conclusões anteriores foram igualmente obtidas através dos cruzamentos de informação realizados, a exemplo do trabalho efectuado aos operadores anteriormente mencionados, sendo de realçar a ausência de elementos quanto ás supostas compras de mercadorias e da manutenção de relações empresariais com terceiros.

Transacções declaradas:

Importa realçar que o Sr. M... foi o maior destinatário, e um dos únicos, das facturas deste operador, tendo registado documentos de compra de cerca de 550.000 euros de madeira (IVA incluído), conforme registos efectuados na conta 22.1.1.000055. Segundo o determinado no processo inspectivo o volume de facturação representa nos 2 exercícios mais de 13.000 toneladas de mercadoria, a que deveriam corresponder cerca de 300 transportes.

Contrariamente ao referido pelos responsáveis pela empresa (e que está de acordo com o determinado pelos serviços), o Sr. M... mencionou que os meios de transporte eram do próprio “fornecedor” e que não podia esclarecer quais os lugares de carga, descarga e pesagem da mercadoria. Essa situação, conforme já antes referido, não é compreensível, porque uma vez que o sujeito passivo não possui recursos humanos ou operacionais para a realização dessas tarefas, desconhece-se que poderia ter cortado e empilhado a madeira.

Quanto aos meios de pagamento, não se possui cópias frente e verso dos cheques movimentados, levantando-se as mesmas interrogações que nos operadores anteriores. Refira-se que um dos sócios-gerentes da sociedade declarou que assinou e carimbou os cheques emitidos pelo Sr. M... e que depois lhos devolveu.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Em função do exposto, pode-se concluir que também este sujeito passivo não possui a necessária e indispensável estrutura empresarial, não sendo manifesto que tenha realizado quaisquer operações a montante, o que seria indispensável, conforme declarações dos respectivos responsáveis.

Em síntese, o sujeito passivo emitiu facturas de venda de madeira, que contudo não resultam de quaisquer transmissões de bens, configurando facturas “falsas”, pelo que se conclui que as operações foram simuladas.

3-8) A… MÁQUINAS DE ALUGUER, LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva realizada ao abrigo das Ordens de Serviço 01 2007…. Está colectado para o exercício da actividade de aluguer de máquinas e equipamentos para a construção e engenharia, a que corresponde o CAE 71320.

Em conformidade com o referido pelo sócio-gerente a empresa nunca se dedicou ao comércio de madeira, desconhecendo os operadores que possuem facturas emitidas em nome da mesma, referentes à venda de madeira, e que não recebeu qualquer pagamento inerente a essas facturas.

Não se confirmou que o sujeito passivo tenha adquirido madeira, nem que tivesse recursos humanos, mão de obra necessária aos trabalhos de corte e empilhamento da madeira, nem tão pouco meios de transporte, quer próprios quer subcontratados.

Da observação feita pelos serviços no âmbito das Ordens de Serviço, para além da confirmação dos pressupostos que levam a concluir que a sociedade não desenvolveu a actividade evidenciada nas facturas, verificou-se que o representante da mesma, fruto de doença prolongada, não apresenta condições físicas que o permitissem desenvolver tal actividade.

Transacções declaradas:

O Sr. M... contabilizou facturas de compra de aproximadamente 164.000 euros de madeira (IVA incluído), conforme registos efectuados na conta 22.1.1.000064. Segundo os cálculos efectuados, a exemplo dos já realizados para outros operadores, estima-se que estão em causa cerca de 4.000 toneladas de madeira, a que corresponderiam cerca de 100 transportes.

O Sr. M..., mais uma vez, alegou que as operações se deram nas mesmas circunstâncias dos operadores anteriores, sem juntar outros documentos comprovativos, pelo que não se justifica relatar aqui os mesmos factos.

No entanto, é de realçar a divergência entre o declarado pelo Sr. M... e o referido pelo representante da sociedade, que confirma o determinado pela inspecção, conforme as observações feitas no respectivo processo.

Tais factos, neste caso, são reforçados pela decisão de um outro utilizador das facturas em regularizar os impostos em causa.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Em resumo, importa realçar que do trabalho desenvolvido resultou, a exemplo do referido a propósito de outros operadores, que relativamente ao comércio de madeira não existe estrutura empresarial ao dispor do sujeito passivo, nem operações a montante que permitissem justificar o volume de negócios em causa, em conformidade com o declarado pelo representante do sujeito passivo.

Em função do referido, pode novamente concluir-se que as facturas em causa são “falsas”, já que não titulam reais transmissões de bens / prestações de serviços, configurando operações simuladas.

3-9) T… TRADING, LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo foi objecto de acção inspectiva realizada ao abrigo das Ordens de Serviço 01 2007…. Está colectado pelo exercício da actividade de comércio por grosso e agentes comerciais, excepto veículos automóveis, a que corresponde o CAE 51000.

Um dos sócios-gerentes em Termo de Declarações negou ter participado em negócios de compra e venda de madeira, bem como em serviços relacionados com a mesma actividade, para os quais afirmou que a empresa não tinha meios, nem técnicos, nem humanos. Mencionou ainda que a empresa praticamente nunca laborou.

Em síntese, este contribuinte encontram-se na mesma situação dos anteriores.

Transacções declaradas:

O Sr. M... tem contabilizada apenas uma factura de compra de madeira a este contribuinte, tendo a respeito da mesma referido os mesmos factos já relatados a propósito dos outros operadores, que não foram confirmados, quer pelos serviços, quer por parte da empresa.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Pode também aqui concluir-se que a factura é “falsa”, já que não respeita a uma efectiva transmissão de bens / prestação de serviços, configurando uma operação simulada.

3-10) C… SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES DO C…, LDA.

Caracterização do sujeito passivo:

O sujeito passivo encontra-se a ser inspeccionado ao abrigo da Ordem de Serviço 01 2007…. Está colectado para o exercício da actividade de construção de edifícios, a que corresponde o CAE 41200.

Segundo o TOC à data a empresa dedicava-se, de facto, à construção de edifícios para venda, tendo supostamente negociado madeira apenas durante o exercício de 2005. Actualmente encontra-se cessada para efeitos de IVA.

Através dos elementos da contabilidade é possível observar que a empresa, relativamente à negociação da madeira, foi apenas intermediária, tendo como suposto “fornecedor” da madeira vendida ao Sr. M... o já referido contribuinte S…, também ele “fornecedor” daquele. Tendo em consideração o referido acerca do Sr. S...e o facto da C… não possuir equipamentos específicos do sector de actividade em análise, nomeadamente veículos, equipamentos de corte e máquinas de rechega, bem como meios humanos, o que foi referido pela sócia da empresa, confirma-se que foi utilizada somente como intermediária entre os emitentes e os utilizadores de facturas “falsas”.

A confirmação de que o “fornecedor” dos bens em causa foi o Sr. S...resulta da comparação entre as facturas de compra (duas) e de venda (também duas) contabilizadas, que se referem às mesmas datas e o mesmo tipo de mercadoria. A diferença entre o preço de compra e o de venda, revela em cada uma das situações um lucro de 2.500,00 euros.

É ainda de realçar que, apesar das duas facturas de venda da C... em causa indicarem ter sido processadas por computador, nas cópias registadas na contabilidade foram corrigidos os respectivos números, pelo que com os mesmos números das facturas utilizadas pelo Sr. M... (que têm os n.ºs 43 e 44) existem outras duas dirigidas a outra sociedade, de realidades diferentes e igualmente rasuradas.

Transacções declaradas:

As duas facturas contabilizadas pelo Sr. M... respeitam à compra de 145.200 euros de madeira de eucalipto (IVA incluído), conforme registos efectuados na conta 22.1.1.000088. Segundo os cálculos já antes descritos, porque, mais uma vez, as facturas não têm os valores discriminados, estima-se que estão em causa cerca de 3.300 toneladas de madeira, a que corresponderiam cerca de 84 transportes.

Segundo a contabilidade do Sr. M... apenas uma das facturas em causa se encontra paga, mas, curiosamente, na contabilidade da C... consta que foram as duas pagas em dinheiro, de imediato. Este facto associado à ausência de documentos comprovativos dos respectivos transportes e de provas das compras da madeira por parte do suposto fornecedor originário, permite concluir que as facturas são “falsas”.

Esclarece-se ainda que existiu um outro suposto fornecedor de madeira, que se trata de um operador que nem sequer se encontra colectado, não se tendo, igualmente, conhecimento de que tenha feito compras de madeira ou de que disponha de estrutura empresarial.

Resultado das diligências efectuadas durante o procedimento inspectivo:

Em virtude da ausência de estrutura empresarial por parte deste contribuinte, bem como por parte do seu suposto fornecedor, para cujas conclusões se remete, apurou-se, mais uma vez, que as facturas emitidas pela C... são “falsas”, já que não está provado existir qualquer negócio real subjacente à documentação produzida, podendo dizer-se o mesmo relativamente às respectivas facturas de compra, pelo que se determinou que as operações foram simuladas.

3-11) Análise global

Em primeiro lugar, é de realçar a falta de documentos comprovativos do transporte das mercadorias. Ainda a este respeito importa esclarecer que as descargas na Portucel, por vezes, demorarem várias horas, o que ainda deixa mais evidente as dificuldades que os “fornecedores” teriam em realizar os transportes que supostamente teriam que ter efectuado.

Importa ainda referir, sucintamente, o verificado relativamente aos supostos pagamentos aos “fornecedores”, conforme acima descrito:

- O contribuinte recebeu 2 cheques que não lhe eram dirigidos, destinados à simulação de pagamentos relacionados com a emissão de facturas “falsas”, que envolveram outros operadores, conforme descrito nos pontos 3-1 e 3-2 do relatório (anexos 5 e 6, respectivamente com 1 e 2 páginas); Num dos casos, e a confirmar o que foi referido, o emitente do cheque regularizou a situação fiscal criada com a contabilização da factura ‘falsa”;

- Existe um caso em que o documento de compra da madeira ao silvicultor não foi registado na contabilidade, tendo a compra sido simulada através da utilização de uma factura do operador mencionado no ponto 3-1, para quem foi emitido um cheque pelo Sr. M..., que teve o silvicultor como destinatário (anexo 2, com 5 páginas); Caso fosse possível identificar os destinatários dos cheques através das assinaturas ou das contas bancárias indicadas no versos dos mesmos, muito provavelmente existiriam outros casos idênticos a este;

- Foram apresentados elementos de prova de pagamentos que em muitas situações revelam que o dinheiro não foi recebido pelo emitente das facturas, sendo frequente regressar à esfera patrimonial do contribuinte, através de três contas bancárias não reflectidas na contabilidade, conforme descrito no ponto 3-1 (anexos 1, 3 e 12, respectivamente com 3, 7 e 3 páginas);

- Noutros dois casos verificou-se que o destinatário dos cheques apenas os movimentou cerca de dois anos depois das supostas vendas (alguns em data posterior ao início das inspecções de que foram alvo), ainda que a relação com os “fornecedores” aparentemente se tivesse mantido, supondo-se que se trata apenas duma simulação (anexo 1, com 3 páginas);

- Existem também facturas que nunca foram pagas, pese embora, da mesma forma que no ponto anterior, as relações com os “fornecedores” tivessem continuado (conforme os respectivos extractos de conta e o anexo 8, com 1 página); - Não poderá ser alegado que os pagamentos foram feitos em dinheiro, previamente, tendo em conta o que mais à frente se dirá a propósito do saldo de caixa e o facto do dinheiro dos cheques passados não ter regressado a esfera da actividade empresarial.

Em suma, não se provou que os supostos fornecedores reúnam os requisitos indispensáveis para desenvolver a actividade que lhes é imputada, donde resulta a convicção de que as facturas não correspondem a efectivas transmissões de bens / prestações de serviços, tratando-se de “facturas falsas”, pelo que se verificam indícios fortes e objectivos de que as operações foram simuladas, quer quanto às partes, quer supostamente quanto aos valores, sendo ainda evidente que o utilizador das mesmas não podia desconhecer tais circunstâncias.

A conduta ilícita descrita ao longo do presente relatório deve ter tido por objectivo substituir na contabilidade do sujeito passivo as compras que provavelmente fez sem documentos de suporte, bem como obter uma vantagem ilegítima através do direito à dedução do IVA indicado nas facturas “falsas”, que não foi entregue pelos supostos fornecedores nos Cofres do Estado.

Tais circunstâncias, face ao disposto no art. 19.º, n.ºs 3 e 4, do Código do IVA, inviabilizam a dedução do IVA constante dos documentos contabilizados.

Por conseguinte, foi indevidamente deduzido imposto nas declarações periódicas de IVA entregues, nos seguintes montantes, em conformidade com os mapas resumo juntos (anexo 7, com 1 página):

(…)

VIII – Direito de audição - fundamentação

Em conformidade com o art. 60.º da Lei Geral Tributária e com o art. 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, no passado dia 28 de Janeiro, através dos Ofícios n.ºs 6856/7/8 desta Direcção de Finanças (Registos RO 3009 … PT, RO 3009 … PT e RO 3009 … PT), o contribuinte foi notificado para exercer o direito de audição sobre o projecto de conclusões do presente relatório.

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6 (Vendas mercadorias - Custo mercadoria vendida) / Vendas de mercadorias

-7 Calculo idêntico ao anterior, mas respeitante a todos os sujeitos passivos com a mesma actividade

8 (Vendas mercadorias — Vendas mercadorias x Margem bruta das vendas constante sistema informático dos serviços)

9 Custo mercadoria vendida declarado — Custo mercadoria vendida calculado

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Em exposição recebida no passado dia 12 de Fevereiro (anexo 13, com 41 páginas), o sujeito passivo, através dos seus mandatários Srs. Drs. M… e R…, ambos da sociedade de advogados “M… e R… - Sociedade de Advogados” e ainda dos Drs. S… e J…, associados daquela sociedade, conforme procuração passada em 2008/01/30, veio exercer o direito de audição.

No exercício do direito de audição manifestaram desacordo com as correcções propostas no relatório, sugerindo o “arquivamento do presente procedimento sem mais outra diligência”, pelo que se procede à apreciação do descrito nos diversos pontos da exposição, atendendo aos temas abordados.

I. Pontos 1 a 10 do direito de audição

Atenta a exposição realizada pelo sujeito passivo em “NOTA PRÉVIA” ao seu direito de audição, cumpre analisar o aí alegado:

1.Da notificação efectuada aos requerentes consta a assinatura de V… e com a menção de Subdelegação e o Chefe de Divisão (em substituição).

2.Não se sabe se V… pratica o acto no uso de uma subdelegação de competências ou em regime de substituição.

3.Sendo certo que uma das situações exclui ope legis a outra.

4.A isto acresce que se for o caso de ser uma subdelegação de competências não se indica a data, local de publicação e extensão das competências pulativamente subdelegadas.

5.E era imperioso que tal tivesse sucedido.

6.Isto por expressa imposição dos artigos 36.º, n.º2 e 39.º, n.º9 do CPPT.

7.Assim não tendo sido ocorre nulidade da notificação efectuada aos ora requerentes.

8.O n.º 9 consagra a nulidade do acto de notificação no caso de este não ser acompanhado de indicação do auto do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de poderes delegados ou subdelegados, da menção da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data. Verifica-se assim, e como já se referiu em nota ao artigo 37.º, que, ao contrário da omissão das restantes indicações que o acto de notificação deve conter (n.º 2 do artigo 36.º), que são sanáveis (artigo 37.º, no 1), neste caso o acto de notificação é nulo são podendo ser sanada a nulidade que o afecta.> (Valente Torrão in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, a pp. 206) (Autor refere n.º 8 mas é lapsus calami uma vez que quer certamente dizer n.º 9) ( Sublinhado dos requerentes)

9. Sendo o acto notificado insusceptível de produzir quaisquer efeitos.

10. Sem prejuízo de os requerentes virem exercer cabalmente o seu direito de audição quando suprida tal nulidade da notificação que lhes foi feita avançam agora, ao abrigo do princípio da cooperação, com um direito de audição “provisório” no qual manifestarão o seu dissídio em relação ao Projecto de Relatório.

Admitindo-se que a expressão “em substituição”, pela sua semântica possa originar alguma confusão, já não se concede, contudo, que haja qualquer ilegalidade.

O que eventualmente terá levantado dúvidas ao sujeito passivo terá sido a expressão “(em substituição)”, tendo o sujeito passivo interpretado a mesma no sentido de substituição legal, e não no sentido de nomeado em regime de substituição, que é o que no presente caso se verifica.

Não há, no entanto, qualquer confusão na prática do acto.

Quem assinou a notificação em causa, está devidamente identificado:


“Por Subdelegação

O Chefe de Divisão (em substituição)

V….”


O citado Chefe de Divisão foi nomeado em regime de substituição, ao abrigo do art. 27.º da Lei no 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto.

Posteriormente, foram-lhe subdelegadas as competências pelo Sr. Director de Finanças Adjunto, ao abrigo dos arts 36.º, n.º 2, e 37.º do Código do Procedimento Administrativo e art. 62.º, no 2, da Lei Geral Tributária.

Pelo facto, ao assinar qualquer notificação dirigida a um sujeito passivo, o Chefe de Divisão deve, de facto, informar que o faz ao abrigo de competências subdelegadas, mas, porque está nomeado em regime de substituição - e não em regime de comissão de serviço, ao abrigo do art. 21.º, nos 8 e 9, da supra citada lei -‘ deverá indicá-lo, como no presente caso ocorreu. Já se, porventura, o que por mero exercício de raciocínio se admite, o Chefe de Divisão tivesse assinado a notificação em causa como substituto legal do Director de Finanças Adjunto, não bastaria que naquele apenas constasse o seu cargo e nome. Seria ainda necessário a indicação do cargo de Director de Finanças Adjunto e nome do titular deste cargo, acrescido do cargo e identificação do substituto legal, com indicação de que assinava a notificação nessa condição de substituto legal.

Questão que não se coloca no presente caso, uma vez que nem sequer é mencionado o cargo ou identificação do Director de Finanças Adjunto (eventual substituído), já que não foi nessa qualidade que a notificação ao sujeito passivo foi subscrita.

A notificação em causa foi subscrita pelo Chefe de Divisão, nomeado em regime de substituição, no âmbito das competências que lhe foram subdelegadas pelo Director de Finanças Adjunto.

Nestes termos, afigura-se-nos despicienda a “NOTA PRÉVIA” ao direito de audição, uma vez que a invocada delegação de competências cumpre o legalmente exigido.

Pelo que se procede à análise do direito de audição per se apresentado.

II. Pontos 11 a 23 do direito de audição

Nos pontos acima mencionados limitam-se a descrever sumariamente os argumentos usados para considerar que em nome dos fornecedores referidos no relatório foram emitidas facturas consideradas “falsas”, para o que foi feito um resumo dos fundamentos apresentados, com recurso ao referido apenas no ponto 3-11) do relatório - Análise global, não tendo, nos citados pontos, sido contrariada a argumentação produzida pelos serviços.

Ainda na mesma parte da exposição e na sequência do referido a propósito dos alegados fornecedores e das relações empresarias mantidas com os mesmos, o sujeito passivo procedeu à descrição dos fundamentos, critérios e cálculos relacionados com o recurso aos métodos indirectos de avaliação, sem referir aqui também novos elementos.

III. Pontos 24 a 36 do direito de audição (apreciação das alíneas a), i) e j) do ponto 19)

Nestes pontos e com o propósito de apresentar argumentos que permitissem concluir que não existiu legitimidade para recorrer à avaliação indirecta, foi feita a apreciação de diferentes alíneas do ponto 19 da exposição, que, conforme antes referido, pretenderam fazer um resumo dos fundamentos apresentados. Começam por referir que o descrito nas alíneas a), i) e j) “não legitimariam o recurso à avaliação indirecta”.

Com efeito, relativamente ao referido na alínea a) e ao contrário do mencionado, julga-se que a inexistência de documentos de transporte das mercadorias não “se situam no domínio das irregularidades detectadas na contabilidade” (ponto 30), pelo que não é aplicável a esta matéria o disposto no art. 52.º, no 2 do Código do IRC. A inexistência de documentos de transporte foi relatada como um elemento de prova em falta, indispensável para aferir da efectiva realização das operações, mas não deixa de tratar-se de um documento “acessório”.

No entanto, no âmbito dos procedimentos de inspecção a vários dos fornecedores indicados o sujeito passivo foi notificado para apresentar esses elementos, o que não veio a fazer.

Por outro lado, no que respeita aos factos descritos nas alíneas i) e j), a saber, “irregularidades na contabilidade designadamente ao nível do saldo de caixa, algumas facturas não contabilizadas, a existência de contas bancárias não reflectidas na contabilidade”, bem como “lançamentos errados por deficiente movimentação de contas do POC”, não têm igualmente enquadramento no disposto no art. 52.º, n.º 2, do Código do IRC, porquanto, como vem referido na redacção do diploma, não está em causa:

2 - O atraso na execução dos livros e registos contabilísticos, bem como a sua não exibição imediata, a que se refere o artigo 88.º da lei geral tributária, só dá lugar à aplicação de métodos indirectos após o decurso do prazo fixado para a sua regularização ou apresentação sem que se mostre cumprida a obrigação. (Redacção do art. 52.º, n.º2, do Código do IRC) (Sublinhado nosso)

De resto, não se detectaram circunstâncias similares às referidas no Acórdão do Tribunal C. Administrativo Norte transcrito (ponto 36), porquanto no mesmo não houve disponibilização de todos os elementos de escrita e esta encontrava-se atrasada, circunstâncias essas que no presente caso não se verificaram.

Como foram enviadas as devidas Carta Aviso, nos termos do art. 49.º do RCPIT, a informar da futura presença dos inspectores tributários, o contribuinte podia ter regularizado eventuais atrasos na execução da contabilidade. Contudo, tal não se verificou, tendo os elementos contabilísticos solicitados sido apresentados dentro de uma aparente regularidade, como sendo válidos.

A este propósito poderá ainda referir-se o entendimento expresso no livro “Lei Geral Tributária Anotada” (De António L. Guerreiro, editado pela editora Rei dos Livros - ponto 4 da página 372) , segundo o qual a alínea b) do art. 88.º da LGT, uma das aplicáveis à presente situação, “preenche os pressupostos das infracções fiscais dos artigos 23.º e 28.º do RJIFNA”, pelo que, “não há lugar à cominação de qualquer prazo ao contribuinte para regularizar a situação, dado a sua conduta ter evidenciado claramente o propósito de não cooperação com a administração fiscal” (O art. 23.º do RJIFNA actualmente encontra-se expresso no art. 104.º do RGIT, aplicável ao presente caso)

Apesar do referido, não se pode concordar que a existência de contas bancárias não reflectidas na contabilidade, para as quais existiram pelo menos as transferências descritas no relatório, acrescidas a todos os factos indicados como fundamentação do recurso a métodos indirectos, não constitua um fundamento passível de conduzir à avaliação indirecta, dado que o dinheiro encaminhado para as mesmas terá tido um destino desconhecido.

O mesmo se poderá concluir a respeito do elevado saldo de caixa (que chegou a ultrapassar 1,4 milhões de euros), que não está provado ser real, desconhecendo-se, igualmente, que destino teve esse dinheiro.

IV. Pontos 37 a 43 do direito de audição (apreciação das alíneas b) a f) do ponto 19)

Nas referidas alíneas a requerente limita-se a referir que a DGCI revela um completo desconhecimento em relação ao tipo de negócio e que os fornecedores também foram clientes do sujeito passivo agora inspeccionado.

Com respeito ao referido cumpre informar que, admitindo-se como mero exercício de raciocínio que a DGCI desconhece o tipo de negócio em causa, mesmo após proceder à fiscalização de todos os fornecedores indicados, bem como de muitos outros operadores do mesmo ramo e região, isto para além de todas as outras diligências efectuadas, continuaria com o mesmo desconhecimento, já que na exposição do sujeito passivo nada mais é adiantado.

Por outro lado, não foram exibidos registos contabilísticos dessas supostas vendas, apresentadas as correspondentes facturas emitidas ou exibidos quaisquer outros elementos de prova, nomeadamente do transporte da mercadoria, quer durante os actos inspectivos quer em sede de audição prévia. Nem tão pouco tal facto foi referido pelos visados.

Assim, não foram apresentadas provas do referido, o que nesta circunstância competia ao contribuinte, uma vez que é ele que alega o desconhecimento da DGCI relativamente à actividade em causa, conforme disposto no art. 74.º da LGT.

Mais, não faz qualquer sentido que existam fornecedores que têm / tiveram como principal/ “cliente” o sujeito passivo objecto deste procedimento e que simultaneamente sejam eles próprios clientes deste, ainda para mais na mesma proporção. Nesse caso a quem destinavam a mercadoria? Ainda mais estranha se torna a explicação quando se sabe que o destino normal da mercadoria são as fábricas de papel.

No entanto, continua a não se er explicada a razão de emissão de cheques que voltaram à esfera patrimonial do sujeito passivo. A admitir-se que este também efectuou vendas para os contribuintes aqui tratados como seus “fornecedores”, do que não existe qualquer prova, porque razão não procediam ao encontro de contas, compensando o valor das compras com o das vendas? E porque razão as contas usadas não foram todas reconhecidas na contabilidade, já que nesse cenário não se pretendia retirar dinheiro da esfera empresarial do sujeito passivo?

Ao contrário do referido pelo contribuinte, a utilização de cheques do modo detectado não levou a que “houvesse suporte documental de todas as operações reflectidas na contabilidade” (ponto 43 da exposição), como existem vários exemplos nas alíneas do ponto 19 da exposição.

Em síntese, e se atendermos ao referido no relatório na parte que as alíneas b) a f) do ponto 19 da exposição procuram resumir, facilmente se conclui que existiu, de facto, simulação das operações, com recurso à utilização de facturas “falsas”. Esse aspecto conjugado com o facto de não ser possível conhecer os custos reais, nomeadamente as compras, torna indispensável o recurso aos métodos indirectos de avaliação da matéria tributável.

V. Pontos 44 a 52 do direito de audição

Na sequência do referido anteriormente é posta em causa a utilização das provas relacionadas com os cheques, por a requerente considerar derrogado o sigilo bancário sem que tivessem sido seguidos os “ditames legais”, segundo o seu ponto de vista.

Desde logo, como é sabido, os bancos não poderiam disponibilizar a informação em causa caso a DGCI não se encontrasse autorizada para tal.

No presente caso os cheques foram disponibilizados pelos contribuintes envolvidos, na sequência dos cruzamentos de informação de que foram objecto, em conformidade com o dever de colaboração previsto no art. 59.º da Lei Geral Tributária e no art. 9 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, o que, aliás, aconteceu com o presente sujeito passivo, que notificado no âmbito dos procedimentos inspectivos dos outros sujeitos passivos também facultou o acesso a essa informação. Por outro lado, algumas das conclusões reflectidas nas alíneas b) a f) do ponto 19 resultaram de elementos da própria contabilidade, como são disso exemplo a cópia dos cheques usados e os extractos bancários.

Por conseguinte, não se impunha a existência de um processo tendente à derrogação do sigilo bancário, efectuado na pessoa do sujeito passivo. Contudo, e se fosse esse o caso, a disposição legal a aplicar seria a constante no n.º 1 do art. 63.º B da LGT e não o n.º 3, já que existem indícios da prática de crime em matéria tributária, situação que não está dependente de direito de audição.

VI. Pontos 53 a 83 do direito de audição (apreciação da alínea g) do ponto 19)

Em face do referido no ponto 3-11) do relatório, assim como na parte final do ponto 2, do capítulo III, demonstra-se claramente que os fornecedores em causa não dispõem de estrutura empresarial capaz de sustentar a realização da actividade que lhes é imputada, tendo sido apreciadas as várias condições que teriam que estar reunidas para que tal se pudesse sequer admitir. Ainda assim, apesar de na exposição ser referido que não se demonstrou a ausência de meios para desenvolver a actividade, o que foi convenientemente explicitado ao longo do relatório e é por demais evidente, não foi apresentado qualquer elemento de prova em sentido contrário.

Foi particularizada a questão dos meios de transporte (em rodapé), tendo o sujeito passivo concluído que “as supostas diligências que diz ter realizado” (...) “foram francamente insuficientes”. Contudo, em primeiro lugar o sujeito passivo no direito de audição não concretizou aquelas em que suspeita da efectiva realização, e, em segundo lugar, não sendo suficiente afastar a possibilidade dos veículos relacionados com os fornecedores terem feito os indispensáveis transportes, bem como referir a total ausência de elementos relativos à subcontratação de tais serviços, aquele também não logrou indicar as diligências que considera que deveriam ter sido realizadas.

Também nada foi referido sobre os outros aspectos relacionados com a necessária existência de uma estrutura empresarial compatível com os volumes de negócios detectados em nome dos supostos fornecedores, uma vez que a fundamentação assenta igualmente na indispensável existência de funcionários, máquinas e equipamentos corte, rechega e outros.

Refira-se que atendendo à data das supostas transacções e ao tempo que demoram os serviços em causa, nomeadamente no corte, rechega, carga, transporte e descarga da madeira, teriam que estar várias pessoas envolvidas.

Do conjunto da prova produzida pelos serviços resulta fundada dúvida sobre a existência dos factos tributários documentados pelas facturas consideradas “falsas”, já que foram reunidos indícios fortes e objectivos de que as operações foram simuladas, pelo que competia ao sujeito passivo provar a sua existência, como forma de justificar o direito à utilização para efeitos fiscais dos documentos emitidos em nome dos fornecedores. Nem em resposta às notificações efectuadas no âmbito das acções de inspecção a alguns dos alegados fornecedores o sujeito passivo prestou os esclarecimentos solicitados.

Por conseguinte, cabe aqui relembrar, sucintamente, outros pressupostos em que assentou a posição defendida no relatório (Relativamente aos aspectos concretos relativos a cada um dos fornecedores remete-se para o descrito no corpo do relatório (pontos 3-1 a 3-10), no que está para além da questão relacionada com a estrutura empresarial, por serem fundamentos válidos e suficientes, tanto mais que o contribuinte não apresentou elementos de prova que permitam chegar a distintas conclusões. O que, de resto, tendo em conta o verificado, não parece possível:

- Não se detectou a existência de relações empresariais dos fornecedores a montante, quer na inevitável compra da madeira alegadamente vendida, já que não são proprietários de matas, quer na aquisição de serviços prestados (subcontratação), conforme era indispensável ter ocorrido;

- As facturas não cumprem com os requisitos legais exigidos pelo regime aplicável aos bens em circulação, desconhecendo-se a existência de guias de transporte, nomeadamente quanto aos locais de carga e descarga da mercadoria;

- Não foram apresentados todos os documentos comprovativos dos pagamentos efectuados, através de meio que permita identificar o destinatário, conforme é obrigatório legalmente; Ao invés, muitos dos documentos verificados indiciam que os montantes envolvidos não tiveram como destinatários os supostos fornecedores, tratando-se da simulação de pagamentos;

- Alguns dos fornecedores revelaram não dispor dos meios indispensáveis ao exercício da actividade (Veja-se o exemplo do fornecedor indicado no ponto 3-1) que disse no ter equipamentos, incluindo viaturas, e facturou serviços de transporte), classificando as facturas de “falsas” (Facto confirmado também por um empregado do sujeito passivo e por outros operadores que receberam facturas nas mesmas circunstâncias), conforme se percebe pelo referido nos pontos 3-2 a 3-5 e 3-7 a 3-10 do relatório;

- Nenhum dos fornecedores em causa entregou os impostos devidos e estão em causa mais de 50% das compras declaradas pelo sujeito passivo nos 3 exercícios em análise.

O conjunto de factores analisados, que permitiu concluir que as facturas são “falsas”, foi determinante para a avaliação indirecta.

Em face de tudo quanto foi referido e tendo em conta a descrição da actividade feita na exposição, não se percebe como é admissível considerar que o destinatário das facturas poderia desconhecer tais circunstâncias, pelo que só se compreende que o sujeito passivo desconheça “em absoluto as estruturas organizativas dos seus fornecedores” (ponto 67), no caso das mesmas não existirem, conforme foi confirmado pelos próprios ao admitirem não só a não realização das operações facturadas, assim como a inexistência de tais estruturas.

Repete-se, contudo, que o reconhecimento de que as operações foram simuladas não assenta somente no que se refere à ausência das necessárias estruturas empresariais, veja-se, para além dos outros aspectos referidos, o relatado a propósito da própria simulação de pagamentos, cujas explicações agora fornecidas, meramente retóricas, carecem de explicação lógica e de efectiva comprovação, conforme referido nos pontos 3-1 a 3-3, 3-5, 3-7, 3-8 e 3-11.

A comprovar a tese de que a fundamentação foi suficiente ao caso está o texto transcrito no ponto 77 da exposição, por admitir que a prova “se opere por via de presunções, sempre ilidíveis, reveladas por vias indirectas ou indiciárias que façam nascer a convicção da administração ou o julgador, consoante o caso, a certeza da ocorrência da simulação.” Ora, se de facto não existiu simulação, opinião contrária à dos serviços em face das provas recolhidas, mas fácil se tornaria ao sujeito passivo comprovar as transacções que diz ter realizado.

Mais, se as diligências que suportaram a convicção dos serviços não são suficientes, pese embora resultem de contactos com os alegados fornecedores, da avaliação da cadeia de operações, dos meios indispensáveis às mesmas, dos correspondentes pagamentos, entre outros aspectos, seria de esperar a indicação de outras diligências e a apresentação de provas efectivas.

Em resumo, confirma-se existir neste caso uma evidente convicção de que as facturas não correspondem a efectivas transmissões de bens / prestações de serviços, tratando-se de facturas “falsas”, tendo-se demonstrado a existência de indícios fortes e objectivos de que as operações foram, de facto, simuladas.

VII. Pontos 84 a 92 do direito de audição (apreciação da alínea h) do ponto 19)

Relativamente a este argumento cumpre informar que apenas se indicou aquele que deverá ter sido o objectivo pretendido, atendendo à situação verificada. No entanto, fosse efectivamente esse ou outro, o que verdadeiramente aqui importa é que ficou demonstrado que se reuniram elementos suficientes para considerar que as facturas são “falsas”.

Por conseguinte, não pode ser feito apelo ao disposto no art. 1000 do CPPT, no sentido de que da prova produzida resulta fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, porquanto o princípio aqui estabelecido somente releva quando seja a Administração Tributária a afirmar a existência dos factos tributários e não quando, tal como acontece no presente caso, caiba ao sujeito passivo provar a existência dos factos tributários em que alicerça os seus direitos.

VIII. Pontos 93 a 112 do direito de audição (apreciação da alínea k) do ponto 19)

Relativamente a este ponto, é incompreensível que seja referido, num primeiro momento, que não é mencionada a razão da impossibilidade de tributação por métodos directos, sendo isso que se pretende referir quando é dito que “não diz a DGCI uma palavra sobre tal impossibilidade” (ponto 95 e alínea k) do ponto 19), já que antes não fazem referência a qualquer impossibilidade.

Ora, relembrando o referido no relatório, fica claro que se conclui que ‘a contabilização de facturas falsas, no lugar dos custos reais, que se admite terem existido mas que não são conhecidos, não permite a conhecimento do efectivo custo da mercadoria vendida”. Uma vez que os custos efectivos não fazem parte da contabilidade apresentada e não foram declarados por nenhuma das partes, não existe forma de os obter, tanto mais que o sujeito passivo mantém que as compras declaradas são as efectivamente realizadas.

Em consequência do referido (contabilização de facturas “falsas”), foi dito ainda que se verificou a insuficiência de elementos de contabilidade, bem como a ocultação, falsificação ou viciação de documentos legalmente exigidos, no caso dos documentos que titulam as compras reais.

Na exposição o sujeito passivo reconhece também, como vem referido em rodapé (ponto 95 da exposição), que tal aspecto é ainda referido noutro local, sendo, portanto, do conhecimento do contribuinte.

De facto, quer ainda em capítulo dedicado à temática dos métodos indirectos de avaliação, quer logo na parte final do ponto 2 do capítulo III do relatório, conclui-se que se demonstra impossível conhecer a identidade dos reais fornecedores e do efectivo valor das compras, desde logo por não existirem elementos que levem à identificação dos mesmos e» ainda que assim fosse, do concreto valor das compras.

No mesmo sentido vão os Acórdãos transcritos» ao referir haver legitimidade no recurso aos métodos indirectos se se verificar a “falta dos elementos pertinentes” (ponto 102 da exposição). De resto, se no início do relatório é dito que o sujeito passivo cumpre com as suas obrigações fiscais, do ponto de vista formal, fácil é entender que não se detectou nos cruzamentos de informação disponíveis no sistema informático dos serviços a existência fornecedores omitidos à contabilidade. Na sequência de outras diligências também não foi possível obter essa informação.

Por outro lado, relembra-se aqui novamente o que foi referido a propósito da existência de contas bancárias não reflectidas na contabilidade e do elevado saldo de caixa, factos igualmente corroborantes da decisão de proceder à avaliação indirecta.

Assim sendo, a actuação dos serviços não foi contrária à lei, nem aos entendimentos transcritos, uma vez que foi referida a existência de pressupostos que impossibilitam, com carácter definitivo, o apuramento da matéria tributável de uma forma directa e exacta, por se verificar efectiva impossibilidade de reconstituir as relações do sujeito passivo a montante, bem como os valores por que se materializaram. Por outro lado, o contribuinte continua a considerar que as facturas são verdadeiras.

IX. Pontos 113 a 127 do direito de audição

Relativamente à questão da utilização do rácio relativo à margem bruta das vendas de mercadorias, mantém-se que foi utilizado aquele que se julga mais adequado à actividade exercida, conforme competia aos serviços, não só por ser efectivamente o mais representativo (Veja-se o número de contribuintes a que se refere cada um dos parâmetros) (Note-se que os rácios nacionais também englobam os da região de Lisboa), mas também pelo facto da actividade do sujeito passivo não se cingir à região de Lisboa.

Se atendermos ao facto da actividade do sujeito passivo não se restringir à região de Lisboa, os restantes argumentos apresentados sobre esta temática deixam de fazer sentido. De qualquer forma não foi apresentado nenhum dado comparativo entre os custos suportados na região de Lisboa e nas restantes. Importa ainda referir que, de acordo com o próprio contribuinte, a maior parte dos transportes teria sido realizada pelos seus supostos fornecedores, pelo que é de admitir, se fosse o caso, que esses custos seriam suportados pelos mesmos, não se verificando a influência referida.

Quanto à decisão de aplicação dos métodos indirectos, já antes objecto de análise, não resulta nada de novo no referido nestes pontos.

X. Pontos 128 a 141 do direito de audição

Não se compreende o que nos citados pontos foi referido, já que a interpretação dos serviços foi a mais adequada e mais favorável ao contribuinte, uma vez que desconsiderar mais de 50% das compras dos exercícios em análise certamente levaria à determinação de resultados mais afastados da realidade, porquanto o contribuinte teve que ter comprado mercadoria.

Pelo que se afigura correcta a desconsideração dos custos suportados pelas facturas consideradas ‘falsas” e a presunção de outros no seu lugar, porque na presente situação demonstrou-se impossível determinar o resultado de uma forma directa e exacta, nos termos da legislação indicada.

Por conseguinte, aparenta-se correcta a aplicação de métodos indirectos ao caso em análise.

Acresce referir que quanto ao principal problema detectado, a contabilização de facturas “falsas”, de que resultou para além das correcções em sede de IRS a exclusão do direito à dedução do IVA mencionado nos documentos, não foram apresentadas provas da efectiva realização das operações.

Em conclusão, em face do referido a propósito dos temas abordados na exposição, que trata sobretudo de questões de direito, considera-se rebatida a argumentação apresentada, não se tendo vislumbrado a existência de novos meios de provas ou, por outro lado, de “falhas” no procedimento que prejudiquem a realização das correcções propostas, entendendo-se, assim, que as mesmas devem ser mantidas.

(…)

11. Em 5 de Julho de 2007 foi exarado parecer de concordância pelo chefe de equipa sobre o relatório referido no ponto anterior, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. parecer a fls. 132 a 133 do PAT).

12. Em 27 de Fevereiro de 2008 foi exarado despacho de concordância pelo Director de Finanças Adjunto, por delegação do Director de Finanças, sobre o relatório de inspecção tributária referido no ponto 9, com o seguinte teor (cf. despacho a fls. 132 do PAT):


Despacho

Concordo com o parecer do Chefe de Equipa e com o relatório da acção inspectiva, em anexo.

Dos fundamentos deles constante resulta que se encontram verificados os pressupostos estabelecidos nos artigos 28.º e 39.º do CIRS, conjugado com o art. 52.º do CIRC, e com os artigos 87.º al. B) e 88.º da Lei Geral Tributária, para o apuramento do rendimento líquido da categoria B, com recurso a métodos indirectos, não sendo, também possível a quantificação e comprovação directa e exacta do rendimento colectável.

Desta forma, com os fundamentos referenciados, determino que se proceda, nos termos e preceitos legais citados, bem como, do art.90.º da LGT, art.54.º do CIRC e 65.º n.º 2 do CIRS, à determinação do rendimento colectável com recurso á aplicação de métodos indirectos para o seu apuramento relativamente aos exercícios acima enunciados.

Determino, ainda, a fixação do conjunto dos rendimentos líquidos referentes aos exercícios em referência, nos montantes propostos.

Demonstra-se ainda que foram desrespeitadas normas técnicas estatuídas no CIVA referente aos períodos acima identificados, com reflexo no apuramento do imposto (IVA) devido e a final, derivando consequentes liquidações adicionais nos termos e fundamentos do diploma referido, bem como dos artigos 81.º a 84.º da LGT.

Recolha e processamento dos DC-únicos, para efeitos de liquidação correctiva.

Remeta-se cópia do relatório à Divisão de Processos Criminais e Fiscais.

Notifique-se o sujeito passivo com remessa do relatório.

13. Em 6 de Março de 2008 os mandatários dos ora Impugnantes tiveram conhecimento do teor do relatório de inspecção tributária determinada pelas Ordens de Serviço n.ºs OI2007…, OI2007… e OI2007…, tendo o mesmo sido expedido em 5 de Março de 2008 através de correio postal registado com o registo n.º RO3009…PT (cf. ofício, talão de aceitação e A/R assinado, respectivamente a fls. 412, 413, 414 e 415 do PAT).

14. Em 6 e em 12 de Março de 2008 os ora Impugnantes tiveram conhecimento do teor do relatório de inspecção tributária determinada pelas Ordens de Serviço n.ºs OI2007…, OI2007… e OI2007…, tendo o mesmo sido expedido em 5 de Março de 2008 através de correio postal registado com os registos n.ºs RO3009…PT, R03009…PT e R03009…PT (cf. ofícios, talões de aceitação e A/R assinados, a fls. 417 a 428 do PAT).

15. Na sequência do despacho referido no ponto x foram emitidos os "mapas de apoio – DC único – IVA" assim como os DCU (documento de correcção único) referentes ao IVA de 2003, 2004 e 2005 dos ora Impugnantes, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. fls. 329 a 346, 347 a 348, 366 a 367, 372 a 383, 385 a 386, e 391 a 402 do PAT).

16. Em 29 de Março de 2008 foram emitidas as liquidações adicionais de IVA n.ºs 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08069…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059... 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…. 08059…, 08059… e 08059…, referentes aos períodos entre x e x, no montante total de EUR x, todas com prazo limite de pagamento em 31 de Maio de 2008 (cf. impressão de consulta da base de dados SIVA/DGCI a fls. 82 a 86 do PAT).

17. Em 2 de Setembro de 2008 a PI da presente impugnação judicial deu entrada no Tribunal tributário de Lisboa, para onde foi expedida através de correio postal registado sob o n.º RO 83956… em 1 de Setembro de 2008 (cf. carimbo aposto a fls. 2 e vinheta de registo no sobrescrito de remessa a fls. 79 dos autos)”.

II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida:

“Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos”.

Quanto à prova testemunhal, extrai-se ainda de decisão recorrida que:

“Quanto a esta matéria [indícios sérios da não realização das transações suportadas pelas faturas emitidas a favor dos clientes], no depoimento que prestou nos autos o inspetor responsável pela inspeção tributária em causa, C…, explicitou que atribuiu relevância à falta de documentos comprovativos do transporte das mercadorias conjugado com o facto de as descargas na P…, por vezes, demorarem várias horas, à circunstância de os meios de pagamento alegadamente usados para pagamento das transações em causa não ter sido recebido pelo emitente das faturas, regressando à esfera patrimonial do contribuinte; ao facto de nalguns casos os cheques terem sido movimentados cerca de dois anos depois das supostas vendas; e à existência de um elevado saldo de caixa, que chegou a ultrapassar 1,4 milhões de euros, que não se provou ser real, desconhecendo-se o destino teve esse dinheiro.

(…) [D]o depoimento das testemunhas indicadas pelos Impugnantes não resultou também qualquer apontamento concreto com relevância para o esclarecimento da matéria de facto em causa.

Refira-se ainda que algumas das testemunhas não revelaram sequer ter qualquer conhecimento dos factos concretos em causa.

Assim, a primeira e quarta testemunha, respetivamente Sr. D...e Sr. J...não revelaram qualquer razão de ciência que as qualificasse para prestar um depoimento útil nos autos, por não terem qualquer relação com as transações desconsideradas e correspondente faturação, tendo-se aliás limitado a fazer afirmações vagas ou a emitir opiniões. Do relatório de inspeção não resulta ter sido desconsiderada por falsa qualquer fatura emitida pelo Sr. D...ao Impugnante e quanto ao Sr. J…, referiu várias vezes que antes de 2000 deixou de ter qualquer relacionamento com o Impugnante, cuja contabilidade terá alegadamente deixado de organizar ¯muito antes"desse ano. Assim, o Sr. J...limitou-se a emitir opiniões, não tendo o seu depoimento qualquer relevância, não podendo no entanto aqui deixar de se referir que o próprio, que afirmou estar ligado ao negócio das madeiras, se revelou surpreendido com a possibilidade de em três anos alguém poder transacionar 41 mil toneladas de madeira, como alegadamente sucedeu entre o Impugnante e E....

A segunda testemunha indicada pelos Impugnantes, Sr. J…, técnico de contas, embora tivesse referido ser o técnico responsável pelo gabinete de contabilidade que organizava a contabilidade do Impugnante, referiu várias vezes que a documentação contabilística do Impugnante nunca lhe passou pelas mãos, pois havia outro técnico responsável por esse trabalho. Donde, também esta testemunha não revelou qualquer razão de ciência relevante, não tendo o seu depoimento revelado qualquer utilidade no apuramento dos factos concretos em causa nos autos.

Quanto à terceira testemunha indicada pelos Impugnantes, Sr. E..., que é referido no relatório de inspeção e cujo volume de faturação declarado nos três exercícios inspecionados ascendeu a 41 mil toneladas de madeira (!), prestou um testemunho que não se revelou de qualquer utilidade para o esclarecimento da verdade material.

Com efeito, a testemunha desmentiu ter prestado as declarações que lhe são imputadas no ponto 3-5) do relatório de inspeção, mas quando questionado sobre perante quem as proferiu, afirmou que não se lembrava.

Referiu que também ele inspecionado, começando por dizer que não foi objeto de qualquer liquidação adicional na sequência da inspeção, mas perante instâncias da Fazenda Pública hesitou, acabando por se contradizer.

Quanto à matéria de facto relevante, designadamente a comprovação da materialidade das transações alegadamente efetuadas com o Impugnante, o seu depoimento foi vago e inconclusivo: referiu que era a si que cabia o transporte das madeiras e que teria há data dos factos três viaturas, mas nunca as identificou, mais tendo referido de forma vaga que trabalhava com trabalhadores subcontratados, que não identificou.

Donde este testemunho foi vago, contraditório, não tendo sido ilustrado com qualquer apontamento concreto, não contribuindo assim para a demonstração da matéria de facto relevante nos autos. (…)

Já o depoimento da testemunha apresentada pela Fazenda Pública, C…, inspetor tributário, revelou-se claro, seguro, coerente, sem incongruências, sustentando os factos e conclusões apontados no relatório de inspeção da sua autoria e explicitando as circunstâncias e factos que enquadraram a mesma.

Referiu a propósito ter tido conhecimento pessoal que outros utilizadores de faturas emitidas pelos emitentes das faturas consideradas falsas na inspeção em causa reconheceram a respetiva falsidade, regularizado o correspondente imposto.

Por último a testemunha L…, apresentada pela Fazenda Pública, afirmou de forma convincente, que acompanhou o seu colega L… tendo assistido à tomada de declarações de E… que afirmou que a sua função era a de localizar matas e que por cada negócio agendado recebia uma determinada quantia pelo que exercia uma mera atividade de intermediário, e não de venda de madeiras, sendo que também esta testemunha depôs de modo claro, congruente e revelando conhecimento dos factos sobre os quais depôs”.

II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, e considerando o disposto no art.º 249.º do Código Civil, corrigem­-se os lapsos constantes dos factos 15. e 16. supra transcritos, que passarão a ter a seguinte redação:

15. Na sequência do despacho referido no ponto 12. foram emitidos os "mapas de apoio – DC único – IVA" assim como os DCU (documento de correção único) referentes ao IVA de 2003, 2004 e 2005 dos ora Impugnantes, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. fls. 329 a 346, 347 a 348, 366 a 367, 372 a 383, 385 a 386, e 391 a 402 do PAT).

16. Em 29 de Março de 2008 foram emitidas as liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios n.ºs 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08069…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…. 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…, 08059…. 08059…, 08059… e 08059…, referentes aos períodos compreendidos entre janeiro de 2003 e dezembro de 2005, no montante total de 1.097.417,61 Eur., todas com prazo limite de pagamento em 31 de maio de 2008 (cf. fls. impressão de consulta da base de dados SIVA/DGCI a fls. 82 a 86 e fls. 460 do PAT).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Consideram os Recorrentes que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, configurando-o em diversas vertentes, motivo pelo qual cada uma delas será analisada autonomamente.

Concretizando:

III.A.1. Quanto aos vícios no procedimento inspetivo relativos ao critério de seleção, à ordem de serviço e ao despacho que determinou a inspeção

i. Consideram, desde logo, os Recorrentes que o Tribunal a quo, ao decidir no sentido de que o critério que motivou o procedimento de inspeção se encontra identificado, atentou contra as normas contidas nos art.ºs 23.º e 27.º, n.º 1, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT). Sustentaram o seu entendimento na circunstância de, na sua perspetiva, nada na ordem de serviço em causa permitir aferir da conformidade legal do critério de seleção dos Recorrentes para o procedimento inspetivo.

Vejamos.

O art.º 23.º do RCPIT, na redação então em vigor, previa que, sem prejuízo da realização de outras ações de inspeção, a atuação inspetiva da administração tributária (AT) obedeceria ao Plano Nacional de Atividades da Inspeção Tributária (PNAIT), aprovado nos termos descritos nos n.ºs 2 a 6 da referida disposição legal.

Por seu turno, o art.º 27.º, n.º 1, do RCPIT, sob a epígrafe “Seleção”, refere que a seleção dos inspecionados tem por base:

“a) A aplicação dos critérios objetivos definidos no PNAIT para a atividade de inspeção tributária;

b) A aplicação dos critérios que, embora não contidos no PNAIT, sejam definidos pelo diretor-geral dos Impostos, de acordo com necessidades conjunturais de prevenção e eficácia da inspeção tributária ou a aplicação justificada de métodos aleatórios;

c) A participação ou denúncia, quando sejam apresentadas nos termos legais;

d) A verificação de desvios significativos no comportamento fiscal dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários perante os parâmetros de normalidade que caraterizam a atividade ou situação patrimonial ou de quaisquer atos ou omissões que constituam indício de infração tributária”.

In casu, as ordens de serviço que estiveram na origem do procedimento inspetivo foram as n.ºs OI2007…/7/8, a que respeitam os pontos 3. a. 5. da matéria de facto assente em 1.ª instância, não impugnada.

Do teor das mencionadas ordens de serviço consta o código PNAIT que esteve na base da seleção, a saber o código 321,38, bem como a indicação de o critério ser regional.

Logo, ao contrário do defendido pelos Recorrentes, o Tribunal a quo bem decidiu ao considerar que o critério de seleção se encontra em conformidade com as exigências legais e cabalmente evidenciado nas ordens de serviço em causa.

ii. Por outro lado, e quanto aos requisitos previstos quer no n.º 1, alíneas c) e d), quer no n.º 2, do art.º 123.º, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), requisitos esses que, no entender dos Recorrentes, não foram respeitados, há que ter em consideração, como referido pelo Tribunal a quo, que o RCPIT contém norma especial atinente às menções obrigatórias das ordens de serviço.

Assim, nos termos no n.º 3 do art.º 46.º do RCPIT, as ordens de serviços devem conter: a) o número de ordem, data de emissão e identificação do serviço responsável pelo procedimento de inspeção; b) a identificação do funcionário ou funcionários incumbidos da prática dos atos de inspeção, do respetivo chefe de equipa e da entidade a inspecionar; c) o âmbito e a extensão da ação de inspeção.

Ora, as três ordens de serviço contêm tais elementos, como resulta da factualidade provada (cfr. factos 3. a. 5.), concretizando:

¾ Números de ordens: OI2007…, OI2007… e OI2008…;

¾ Data de emissão: 17.09.2007;

¾ Identificação do serviço responsável pelo procedimento de inspeção: serviços de inspeção tributária da direção de finanças de Lisboa;

¾ Identificação do funcionário ou funcionários incumbidos da prática dos atos de inspeção: L… (funcionário n.º 1…) e C… (funcionário n.º 1…);

¾ Identificação do respetivo chefe de equipa: M… , funcionário n.º 8…;

¾ Identificação da entidade a inspecionar: Recorrente marido;

¾ Âmbito da ação de inspeção: IRS e IVA;

¾ Extensão da ação de inspeção: 2003, 2004 e 2005.

Face ao exposto, nada há a apontar à decisão do Tribunal a quo nesta parte.

iii. Alegam, por outro lado, os Recorrentes que o Tribunal a quo errou, ao considerar não padecer o despacho que determinou a inspeção externa dos vícios que lhe apontou, concretamente a falta de enunciação dos factos / atos que lhe deram origem e de fundamentação, não tendo tais menções, em seu entender, sido enunciadas de forma clara, precisa e completa, de modo a poderem determinar-se inequivocamente o seu sentido e alcance.

Também aqui se considera não assistir razão aos Recorrentes.

Com efeito, os despachos que determinam a realização da inspeção externa são os proferidos sobre as ordens de serviço (cfr. factos 3. a 5.), pelo que a sua fundamentação radica, naturalmente, no teor das próprias ordens de serviço que, como já referido supra, contêm todos os elementos legalmente exigíveis, que, de forma suficiente, esclarecem o sentido e alcance da inspeção (designadamente o âmbito e extensão, o código PNAIT e a indicação de o critério ser regional).

Como tal, também nesta parte não assiste razão aos Recorrentes.

III.A.2. Quanto à falta de credenciação

Consideram os Recorrentes, por outro lado, que o Tribunal a quo decidiu em violação do preceituado no art.º 46.º do RCPIT, já que, ocorrendo falta de credenciação, os atos de inspeção praticados ao abrigo da ordem de serviço em causa não se mostram idóneos para fundar a prática dos atos impugnados.

Vejamos.

Nos termos do art.º 46.º do RCPIT, na redação então em vigor:

“1 - O início do procedimento externo de inspeção depende da credenciação dos funcionários e do porte do cartão profissional ou outra identificação passada pelos serviços a que pertençam.

2 - Consideram-se credenciados os funcionários da Direção-Geral dos Impostos munidos de ordem de serviço emitida pelo serviço competente para o procedimento ou para a prática do ato de inspeção, ou no caso de não ser necessária ordem de serviço de cópia do despacho do superior hierárquico que determinou a realização do procedimento ou a prática do ato”.

O ora alegado parte do pressuposto da existência de vícios nas ordens de serviço que implicariam a sua invalidade.

Sucede, porém, que, como já se referiu, as ordens de serviço em causa não padecem de qualquer irregularidade, motivo pelo qual se consideram credenciados os funcionários munidos dessa mesma ordem de serviço.

Por outro lado, atendendo a que, in casu, as ordens de serviço foram apresentadas pelos funcionários que realizaram a inspeção, como resulta do facto de o TOC dos Recorrentes ter aposto a sua assinatura nas mesmas (cfr. factos 6. e 7.), não se verificou qualquer falta de credenciação.

Ademais, refira-se que uma irregularidade da credenciação dos inspetores não tem a cominação que lhe é assacada pelos Recorrentes. Com efeito, tal cominação encontra­-se prevista no art.º 47.º do RCPIT, ou seja, a sua verificação legitimaria os Recorrentes a opor-se aos atos de inspeção, o que não sucedeu, tendo a ação inspetiva decorrido com normalidade, face aos elementos constantes do processo administrativo (designadamente o RIT – cfr. facto 10.).

Assim, também nesta parte não assiste razão aos Recorrentes.

III.A.3. Quanto à falta de fundamentação das notificações de cobrança e dos atos impugnados

Entendem, por outro lado, os Recorrentes que a fundamentação das notificações de cobrança é inexistente.

Consideram ainda que os atos impugnados padecem de falta de fundamentação, entendendo, concretamente quanto aos juros compensatórios, que não foi demonstrado o elemento subjetivo (culpa) inerente aos mesmos.

Vejamos.

i. Antes de mais, refira-se que, quanto aos alegados vícios das notificações, os mesmos não serão apreciados.

Com efeito, há que distinguir o ato da sua notificação.

Nos termos do art.º 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), “ [o]s atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei…”.

Como tal, a notificação é o ato através do qual “… se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa” (cfr. art.º 35.º, n.º 1, do CPPT).

A falta ou irregularidade de notificação de um ato administrativo, em geral, não contende com a legalidade do ato notificado, mas sim com a sua eficácia, ou seja, comporta a ineficácia, relativamente aos seus destinatários.

Tal corolário do direito administrativo em geral encontra, desde logo, acolhimento no art.º 77.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária (LGT).

Assim, ainda que se verificassem algumas irregularidades das notificações, as mesmas, nos termos alegados, não influenciariam a legalidade dos atos de liquidação em causa, por não contenderem com a sua validade, carecendo, pois, de pertinência e efeito útil a sua apreciação.

ii. Cumpre, pois, apreciar o alegado em torno da falta de fundamentação dos atos impugnados, configurado pelos Recorrentes na perspetiva de tais atos não se encontrarem suficientemente fundamentados, atento o próprio destinatário, de forma explícita, contextual, clara, congruente, suficiente e contemporânea e também na perspetiva de se terem dúvidas sobre o autor do ato.

Apreciando.

O dever de fundamentação dos atos tributários insere-se no princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da CRP, nos termos do qual “os atos administrativos (…) carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”.

Ao nível dos atos tributários, encontra-se especificamente previsto no art.º 77.º, da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que:

“1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.

2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.

“A fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão…”(1), para que o respetivo destinatário consiga perceber o iter cognoscitivo e para que, por outro lado, seja possível o controlo, quer administrativo, quer jurisdicional, do ato em causa.

Deve ser, pois, clara, expressa, congruente e suficiente, de maneira a esclarecer inteiramente o seu destinatário, cumprindo, dessa forma, o desiderato constitucionalmente consagrado.

Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos.

As liquidações em crise fundamentam-se no RIT mencionado em 10. do probatório, resultado da ação inspetiva (cfr. art.º 63.º, n.º 1, do RCPIT), na qual, designadamente, os Recorrentes participaram, em sede de exercício do direito de audição, RIT do qual foram notificados, como resulta da factualidade assente (cfr. factos 13.e 14.).

Atento o mencionado RIT, claramente do mesmo consta, de forma explícita, contextual, clara, congruente e suficiente, o iter cognoscitivo, de facto e de direito, percorrido pela AT, que, in casu, concretamente em relação às liquidações de IVA, se consubstanciou na identificação de uma série de operações relativas a aquisições registadas pelo Recorrente, tituladas por faturas, cuja efetividade a AT considerou estar em causa, identificando as concretas situações, em relação a cada um dos emitentes das faturas, que, em seu entender, consubstanciam indícios de se estar perante faturação falsa. Encontram-se igualmente quantificados os valores da faturação por fornecedor, por mês e por ano. Estão, pois, descritos os factos pertinentes para a atuação da AT, de forma clara, completa e percetível, bem como o enquadramento jurídico respetivo (concretamente, o disposto no art.º 19.º, n.ºs 3 e 4, do Código do IVA – CIVA).

Esta fundamentação antecedeu a emissão das liquidações, não sendo, pois, fundamentação a posteriori.

Assim, nos termos expostos e à semelhança do decidido pelo Tribunal a quo, considera­-se que foi respeitado o disposto no art.º 77.º da LGT.

Como tal, existe fundamentação dos atos impugnados, fundamentação essa com elementos individualizadores, sendo perfeitamente percetível o itinerário cognoscitivo percorrido.

Por outro lado, o nosso ordenamento permite a fundamentação por remissão (cfr. art.º 77.º, n.º 1, da LGT), pelo que o autor do ato pode, por essa via, fazer sua a fundamentação elaborada por outrem, sem que isso consubstancie qualquer irregularidade.

No caso, o RIT e respetivas conclusões (facto 10.) mereceram um parecer de concordância por parte do chefe de equipa (facto 11.), após o que foi proferido despacho de concordância por parte do Diretor Adjunto de Finanças de Lisboa, no uso de competências delegadas (facto 12.), tendo os Recorrentes e o seu mandatário sido notificados de todos estes elementos (factos 13. e 14.).

Como tal, não assiste razão aos Recorrentes quando afirmam ser desconhecida fundamentação expressa do autor do ato.

Carece ainda de relevância o alegado em torno do art.º 37.º do CPPT, uma vez que o mecanismo procedimental aí previsto existe para situações em que haja fundamentação não notificada e não para situações como as in casu, nas quais, no fundo, os Recorrentes entendem, sem razão, ser insuficiente a fundamentação.

Face ao exposto, acompanha-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo também nesta parte.

iii. Concretamente quanto aos juros compensatórios, como referido pelos Recorrentes, a sua liquidação depende de um comportamento culposo que lhes seja imputável, considerando os Recorrentes que tal juízo de censura não ocorreu.

Vejamos.

Os juros compensatórios encontram-se previstos no art.º 35.º da LGT, cujo n.º 1 determina que “[s]ão devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária”.

“Os juros compensatórios integram-se na dívida do imposto, sendo liquidados com a liquidação desta (n.° 8). Têm a natureza de uma reparação civil, indemnizando o credor pela perda de disponibilidade de quantia que não foi liquidada oportunamente ou que foi indevidamente reembolsada”(2).

Na liquidação de juros compensatórios têm de estar preenchidos elementos objetivos e um elemento subjetivo, consubstanciando-se este último no facto ser imputável ao sujeito passivo, a título de dolo ou negligência(3).

Centrando-nos neste elemento subjetivo, que os Recorrentes consideram não estar evidenciado, desde já se refira que não se acompanha este entendimento.

Com efeito, a factualidade subjacente, do ponto de vista subjetivo, à liquidação dos juros compensatórios é a mesma que está inerente às liquidações do imposto considerado indevidamente deduzido – cfr. o n.º 8 do art.º 35.º da LGT.

Assim, e centrando-nos no caso concreto, o elemento subjetivo pertinente tem a ver com o facto de as liquidações de IVA terem sido emitidas na sequência do apuramento, na ação inspetiva, de deduções de IVA indevidas por comportamento imputado ao Recorrente. Como tal, resultaram de correções que implicaram a emissão de liquidações adicionais – que, como já se deixou evidenciado, se encontram cabalmente fundamentadas, na medida em que do RIT constam todos os elementos que a AT considerou como indiciadores de o Recorrente ter deduzido IVA titulado por faturas que não respeitam a operações reais. Como tal, encontra-se fundamentado o elemento subjetivo.

Face ao exposto, esteve bem o Tribunal a quo, não se verificando qualquer erro de julgamento nesta parte.

III.A.4. Quanto ao recurso à avaliação indireta

Alegam, por outro lado, os Recorrentes que os argumentos constantes do RIT não são suficientes para legitimar o recurso à avaliação indireta.

Vejamos.

Tal como referido pelo Tribunal a quo, verifica-se aqui uma incorreta configuração, por parte dos Recorrentes, da correção que esteve na base da emissão das liquidações de IVA em causa.

Concretizemos.

O nosso ordenamento prevê que a avaliação da matéria tributável se possa realizar direta ou indiretamente.

O recurso à avaliação indireta funciona como ultima ratio, só podendo ocorrer quando se revele impossível o recurso à avaliação direta. Daí o caráter subsidiário da avaliação indireta, previsto no art.º 85.º da LGT, avaliação esta que deverá ocorrer apenas nos casos previstos nos art.ºs 87.º e 89.º do mesmo diploma legal. Com efeito, dispõe o art.º 104.º, n.º 1, da CRP que “… [o] imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar”, ou seja, prevê o princípio da capacidade contributiva, que determina que a tributação seja efetuada em função dos rendimentos efetivos. Daí a preferência pela avaliação direta, porquanto, em princípio, esta refletirá tais rendimentos efetivos.

A avaliação direta, por outro lado, tem como ponto de partida as declarações dos contribuintes e/ou os dados apurados na sua contabilidade, que se presumem verdadeiros – cfr. o art.º 75.º, n.º 1, da LGT. No entanto, como decorre do mesmo art.º 75.º, mas do seu n.º 2, a presunção de veracidade da contabilidade cessa quando revelar “… omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07.10.2009 (Processo: 0422/09):

“[S]ão excepcionais e obedecem a tipificação legal (em especial a contida no artigo 87.º da Lei Geral Tributária) os casos em que é lícito à Administração tributária fixar a matéria tributável dos contribuintes por “avaliação indirecta”, afastando-se dos valores declarados, porque inexistentes ou fundamentadamente desmerecedores de confiança, recorrendo a outros elementos (também objecto de previsão legal) que permitem a determinação do valor tributável”.

Para que seja legítimo o recurso à tributação por via dos métodos indiretos, cabe à AT o ónus da prova de que se reúnem os pressupostos da sua aplicação, consubstanciando­-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fáticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos diretos de avaliação(4) (cfr. art.ºs 87.º, n.º 1, e 88.º, ambos da LGT).

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, decorre que, do RIT, resultaram correções quer em sede de IVA (as ora em crise), quer em sede de IRS.

Ora, se no caso das correções em sede de IRS houve recurso pela AT a métodos indiretos, tal não sucedeu em sede de IVA [cfr. desde logo as conclusões da ação inspetiva, constantes do ponto I do RIT – facto 10)].

Com efeito, em sede de IVA houve lugar a correções técnicas, ou seja, um método de avaliação direta, consubstanciadas na não aceitação como dedutível do IVA concretamente contido em faturas em relação às quais a AT considerou haver indícios de as mesmas não titularem operações correspondentes à realidade.

Assim sendo, não tendo havido recurso a métodos indiretos em sede de IVA, não há materialidade para apreciar o invocado pelos Recorrentes a esse respeito, quer quanto aos seus pressupostos quer quanto à sua quantificação.

III.A.5. Quanto à preterição de formalidade essencial, consubstanciada na não utilização do recurso ao procedimento de derrogação de sigilo bancário

Invocam os Recorrentes, por outro lado, que a ação inspetiva se traduziu, de facto, numa derrogação do sigilo bancário, em relação ao Recorrente marido, mas sem que tivessem sido respeitadas as condições legais para que tal derrogação pudesse (legalmente) ser efetuada, não tendo sido dado cumprimento ao disposto no art.º 63º-B, n.º 3, da LGT.

Vejamos.

O processo de derrogação do dever de sigilo bancário foi introduzido no nosso ordenamento pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, tendo vindo, ao longo dos anos, a sofrer diversas alterações.

Por implicar o acesso a informação em regra sigilosa, o procedimento de derrogação do sigilo bancário tinha, à época, uma série de exigências, por forma a que a sua utilização fosse feita em respeito pelo princípio da proporcionalidade (cfr. o art.º 63.º, n.º 3, da LGT), na sua tripla vertente de necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito(5). Com efeito, o sigilo bancário tem por objetivo, por um lado, gerar confiança nas instituições financeiras e, por outro e em consequência, garantir a privacidade dos seus clientes, como decorre, desde logo, do disposto nos art.ºs 78.º e ss., do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31 de dezembro). Como tal, o acesso a informação protegida pelo referido dever de sigilo depende da existência de valores que, pela importância que casuisticamente revistam, justificam a compressão do direito à privacidade do titular das contas bancárias(6).

Considerando este introito verifica-se que não assiste razão aos Recorrentes, dado que não decorre do RIT que tenha havido qualquer acesso a informação protegida pelo sigilo bancário, nos termos explanados.

Com efeito, como referido em sede de RIT (cfr. facto 10. – ponto VIII - V da análise do direito de audição), os elementos analisados pela AT foram elementos disponibilizados pelos contribuintes envolvidos, designadamente pelo próprio Recorrente marido [o que, aliás, é claramente reconhecido – cfr. conclusão BBB)].

Assim, não existiu qualquer acesso a informação nos termos previstos no art.º 63.º-B da LGT, carecendo, pois, de materialidade o alegado pelos Recorrentes a este propósito.

III.A.6. Quanto aos vícios atinentes à demonstração dos pressupostos de tributação

i. Antes de mais, e uma vez que os Recorrentes alegam por momentos diversos, ao longo das suas conclusões, situação em seu entender irregular, consubstanciada no facto de terem sido utilizados elementos e informações obtidos em outros procedimentos inspetivos, cumpre iniciar a apreciação por esse aspeto, dado que, como se verá, trata-se de questão transversal.

O que está nesta parte em causa é, em suma, aferir da admissibilidade da utilização de informação cruzada por parte da AT.

Desde já se adiante que, tal como referido pelo Tribunal a quo, tal é admissível(7).

Aliás, veja-se que, em sede de IVA, a própria mecânica do imposto implica que seja relevante a análise de toda ou parte da cadeia de fornecimentos e aquisições, mais sublinhando a importância de cruzamentos de informação.

Por outro lado, no caso dos autos, o RIT identifica de forma clara o número das ordens de serviço atinentes aos procedimentos de inspeção que visam os emitentes das faturas, bem como os elementos aí obtidos (designadamente quando houve declarações aí prestadas), pelo que está cabalmente identificada a informação cruzada utilizada (onde se incluem todas as diligências aí efetuadas, designadamente as declarações tomadas nesse âmbito), assegurando a transparência do procedimento.

Não tem, pois, qualquer relevância o globalmente invocado pelos Recorrentes quanto ao facto de não estarem juntos ao procedimento inspetivo os relatórios e/ou os autos de declarações elaborados no âmbito dos procedimentos inspetivos relativos aos emitentes das faturas, uma vez que, como já referido, tais procedimentos estão cabalmente identificados, permitindo sempre que fossem, em concreto, postos em causa (o que não sucede, uma vez que a alegação feita é meramente global e conclusiva). Ademais, os Recorrentes partem de uma premissa que não encontra correspondência no RIT, que é a premissa de que a AT baseou as suas conclusões exclusivamente nas declarações recolhidas junto dos emitentes das faturas, quando, da análise do RIT, decorre que os indícios recolhidos foram para além desses elementos, incluindo, aliás, diligências feitas junto do Recorrente marido.

Da mesma forma não se acompanha o constante da conclusão AAAA), uma vez que, como é facto notório, a AT dispõe de vários sistemas de informação que lhe permitem aferir da existência ou não de retenções na fonte a trabalhadores, da existência de veículos registados, da existência de fornecimentos efetuados.

Aliás, refira-se adicionalmente que, nos termos do art.º 76.º, n.º 1, da LGT, “as informações prestadas pela inspeção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei”.

Reitera-se, é admissível a consideração de elementos obtidos noutras inspeções, não sendo de molde a pôr em causa tais elementos os termos genéricos e globais em que foram feitos pelos Recorrentes nem existindo motivos para os mesmos não serem considerados pelo Tribunal a quo.

Como tal, não assiste razão aos Recorrentes nesta parte.

ii. Entendem, por outro lado, os Recorrentes que os atos impugnados padecem de falta de fundamentação material, quando a AT fazendo uso de movimentos de cheques do Recorrente, concluiu (mal) extravasando os elementos que lhe foram fornecidos pelo Recorrente. Consideram ainda, em síntese, não estarem evidenciados indícios que demonstrem a existência de faturas falsas, não tendo sido afastada a presunção de veracidade das declarações.

Apreciando.

O IVA é um imposto plurifásico, que assenta numa estrutura de entrega e respetiva dedução, pelos vários intervenientes na cadeia, até ao consumidor final, que o suporta, sem o poder deduzir. O direito à dedução do IVA é um direito que assiste aos sujeitos passivos de IVA, desde que os bens e os serviços, a que respeita tal imposto a deduzir, sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis.

O IVA funciona, pois, pelo método indireto subtrativo, de acordo com o qual o sujeito passivo deduz, ao imposto liquidado nos seus outputs, o imposto liquidado nos respetivos inputs. Trata-se de um reflexo do princípio da neutralidade, subjacente a este imposto, que, no que toca ao direito à dedução em específico, se reflete na necessidade de o IVA não condicionar os produtores a alterar o seu processo produtivo.

Como reflexo da mecânica do imposto, resulta do n.º 3 do art.º 19.º do CIVA que não se pode deduzir o IVA que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.

“[C]omo decorre do preâmbulo do CIVA, ao fazer intervir na recolha do imposto a generalidade dos operadores económicos, diluindo-se o seu peso por um maior número de operadores e sendo a dívida tributária de cada operador calculada pelo método do crédito do imposto, decorre daqui a importância que uma dedução indevida do imposto reveste (…). O objecto da dedução são as quotas suportadas pelos sujeitos passivos nos termos prescritos nos artigos 19 e segs. do CIVA. Ora o artigo 19 nº3 deste diploma legal exclui de dedução o imposto resultante de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura”(8).

Por outro lado, nos termos do art.º 75.º da LGT (redação então em vigor):

“1 - Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.

2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando:

a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo…”.

Cabe, pois, à AT ilidir esta presunção de veracidade da contabilidade, carreando, maxime em sede de fundamentação do ato tributário, elementos suficientes para esse efeito.

É pacífico o entendimento de que, em situações como a dos autos, para efeitos designadamente do art.º 74.º, n.º 1, da LGT, a AT não tem de provar, em sede de ação inspetiva, a efetiva simulação nos termos constantes do art.º 240.º do Código Civil. É assim bastante a demonstração da existência de indícios sérios e objetivos que impliquem uma probabilidade elevada de que as operações tituladas pelas faturas não foram operações reais(9). Assim, reunidos e demonstrados que estejam tais indícios, cessa a presunção de veracidade prevista no art.º 75.º da LGT, competindo ao sujeito passivo alegar e provar a efetividade das operações.

Cumpre, assim, verificar se a AT cumpriu o seu ónus probatório, ou seja, aferir se foi pela mesma alegada e demonstrada a existência de indícios que, de forma séria, abalam a presunção de veracidade dos documentos em causa.

In casu, em sede de RIT, a AT elencou uma série de indícios, que, em seu entender, permitiram pôr em causa a presunção de veracidade.

Assim, remetendo-nos para o ponto III do RIT, e depois de um enquadramento geral, no qual são referidos indícios comuns, de entre os quais se destaca a não apresentação de declarações fiscais com os valores devidos, são indicados os sujeitos identificados na contabilidade como fornecedores do Recorrente e quantificados os valores das faturas relativos aos alegados fornecimentos, sendo em seguida, em relação a cada um dos emitentes das faturas, identificadas as situações apuradas que, no entender da AT, consubstanciam faturas falsas.

Concretizando, por emitente de faturas, a AT indicou, considerando elementos recolhidos no âmbito das ações inspetivas efetuadas aos alegados fornecedores e elementos recolhidos no âmbito da ação inspetiva aos Recorrentes, designadamente os seguintes indícios:

A) J…:

a. Inexistência de contabilidade e de TOC, não obstante o elevado volume de faturação;

b. Declarações do próprio, no âmbito do procedimento inspetivo a si respeitante, nas quais declarou, designadamente, que nos anos indicados já não tinha nem viaturas nem equipamentos para corte, rechega e transporte da madeira, sendo tais atividades da responsabilidade dos seus clientes;

c. Não serem conhecidas relações empresarias deste contribuinte com eventuais fornecedores nem o próprio ter identificado algum;

d. Não ter sido comprovada a existência de instalações e equipamentos próprios deste tipo de atividade, situação incompatível com o volume de faturação;

e. O contribuinte ter referido não ter efetuado quaisquer transportes, quando grande parte da sua faturação respeita a serviços prestados, nomeadamente de transporte de madeira.

f. Falta de exibição de guias de transporte;

g. Falta de identificação do meio de transporte utilizado e dos locais de carga e descarga;

h. Inexistência de funcionários;

i. Cópias dos meios de pagamento (cheques) apresentados para justificar o pagamento das faturas não perfazem todo o montante em dívida;

j. Não deteção de movimentos financeiros que indiciassem pagamentos a supostos fornecedores;

k. Dois dos cheques, apresentados como prova do pagamento pelo Recorrente, passados mais de 2 anos ainda não tinham sido movimentados; outros foram levantados mais de 1 ano e num caso mais de 2 anos depois da data de emissão;

l. Identificação de situações em que se detetou que o dinheiro teve outros destinatários, que não o suposto fornecedor, designadamente situações em que retornou à esfera do Recorrente;

m. Existência de casos em que cheques de M... para J... aparentemente tiveram outros destinatários;

n. Algumas faturas foram utilizadas com data anterior àquela em que os respetivos livros foram entregues pela tipografia.

B) T...SOC. UNIP., LDA:

a. Declarações do sócio-gerente, no âmbito do procedimento inspetivo respeitante à sociedade em causa, nas quais declarou, que as faturas não têm subjacente a realização de quaisquer transações, classificando-as de “falsas”, confirmadas por declarações de um trabalhador do Recorrente;

b. Inexistência de contabilidade;

c. Desconhecimento, por parte do TOC, de qualquer atividade;

d. Não serem conhecidas relações empresarias deste contribuinte com eventuais fornecedores;

e. Não serem conhecidas instalações e equipamentos próprios da atividade em causa, nomeadamente viaturas, nem funcionários;

f. Alguns dos cheques emitidos alegadamente para pagamento das faturas foram assinados no verso e levantados em dinheiro, enquanto que outros (endossados) foram depositados na conta bancária do empregado do Recorrente ou em contas de terceiros, retornando ao Recorrente, de acordo com as declarações prestadas;

g. Existência de regularizações pela maioria dos utilizadores de faturas emitidas nas mesmas circunstâncias;

h. Muitos dos cheques emitidos sobre a conta do empregado de M..., que representam a saída do dinheiro da sua esfera patrimonial, foram levantados em dinheiro pela mulher de M... ou depositados nas contas relacionadas com o mesmo;

i. Um dos cheques emitidos por um sujeito passivo que utilizou faturas e que regularizou a situação fiscal, foi depositado numa conta de M... (conta n.º 51… do Banco S…);

j. Cheques passados por uma outra sociedade para a T..., que foram endossados e depositados numa outra conta da Caixa …, o seu titular informou que depositou aqueles cheques na sua conta a pedido do empregado de M..., tendo-lhe devolvido o dinheiro, segundo sabe para ser entregue ao ora Recorrente.

C) F... CONSTRUÇÕES SOC. UNIP., LDA:

a. O sócio-gerente desta sociedade (o mesmo da sociedade T... – ponto B) supra) referiu que as circunstâncias em que atuou foram em tudo idênticas àquelas referidas em B), remetendo-se no RIT para o mencionado a propósito da T...;

b. Um utilizador das faturas que regularizou os impostos em causa;

c. Falta dos mesmos elementos de prova, nomeadamente guias de transporte, impedindo a validação dos veículos pretensamente usados e dos locais de carga e de descarga.

D) T... TRANSPORTES, LDA:

a. O sócio-gerente referiu que a sociedade desenvolveu uma reduzida atividade económica e que, paralelamente, foi utilizada para emitir faturas “falsas”, entre as quais estão as emitidas para M...;

b. Tudo indica que não existe contabilidade;

c. O TOC manifestou surpresa face ao volume de faturação existente em nome da sociedade.

d. Desconhecimento da realização de compras de mercadorias ou de serviços prestados por outros sujeitos passivos à sociedade, assim como da existência de estrutura empresarial compatível com o volume de negócios;

e. As viaturas relacionadas com a T... identificadas não podem ter sido utilizadas no alegado transporte, como referido por M..., dado que, tendo em conta que a madeira se destina à Portucel, não existem registos de as viaturas referenciadas terem sido usadas;

f. Ausência de documentos de transporte;

g. Um dos utilizadores das faturas regularizou impostos em falta;

h. Não foram apresentados quaisquer elementos quanto ao pessoal envolvido, aos locais de carga e descarga da mercadoria, bem como aos elementos relativos à pesagem da mesma;

i. Foram apresentados 3 cheques emitidos à ordem da T..., que se comprovou terem sido levantados ou endossados, ficando a dúvida quanto ao que aconteceu posteriormente, tendo em conta que no verso de 2 dos cheques parece vir indicado o número de uma conta bancária do mesmo banco da qual se desconhece o titular;

E) E...:

a. Segundo as declarações prestadas as faturas emitidas para M... não correspondem à realidade das operações, sendo os negócios de compra e venda de madeira realizados por M..., recebendo E... apenas uma comissão de intermediação;

b. Não evidencia estrutura compatível com tão elevado volume de faturação, pois não se detetaram evidências da existência dos indispensáveis veículos, pessoal contratado ou da prestação de serviços subcontratada, seja ao nível de mão-de-obra necessária para o corte e rechega da madeira, seja para o transporte;

c. Não foram detetadas compras de mercadorias, contabilidade ou TOC;

d. Houve um utilizador das faturas que regularizou os impostos em falta;

e. M..., em sentido contrário ao referido por E…, indicou que “os meios de transporte utilizados foram do próprio fornecedor, não podendo esclarecer os locais de carga e descarga e os elementos referentes à pesagem da mercadoria, dado não estarem em minha posse”;

f. Quanto aos pagamentos, regra geral efetuados por cheque, verificou-se que alguns cheques foram movimentados numa data muito posterior à respetiva emissão (vários cheques, emitidos em 2004 e 2005, só foram movimentados em 2007).

F) S….:

a. Demonstrou-se impossível contactar com o sujeito passivo;

b. Não foi localizada a contabilidade, tendo-se procedido à circularização de informação, nomeadamente junto dos supostos clientes;

c. Não foram identificados os meios necessários ao exercício da atividade operacional, incluindo empregados;

d. O contribuinte possui apenas uma viatura, que se mostra insuficiente para transportar a quantidade de madeira faturada;

e. Não foi comunicada à AT qualquer aquisição de serviços de transporte ou mão de obra subcontratada pelo sujeito passivo;

f. Dois utilizadores das faturas regularizaram impostos em falta;

g. M... referiu que os meios de transporte utilizados nas transações eram do próprio “fornecedor” e que não podia esclarecer quais os lugares de carga, descarga e pesagem da mercadoria;

h. Não se possuem os documentos comprovativos do pagamento das faturas, apesar de M... referir que efetuou os pagamentos por cheque;

i. O sujeito passivo não demonstrou ter adquirido a madeira transacionada, não consta que tivesse a mão de obra necessária aos trabalhos de corte e empilhamento da madeira, nem que tenha subcontratado tais meios, incluindo para o transporte dos bens, já que a viatura que possui não pode ter transportado todos os bens faturados;

G) M… COM. E SERVIÇOS EM MADEIRA, LDA:

a. Um dos sócios da sociedade declarou que a empresa se dedicava ao corte e rechega de madeira, mas que nunca vendeu madeira, não possuía qualquer viatura para transporte de madeira, nem nunca teve qualquer empregado;

b. O outro sócio declarou ter feito faturas para M..., sabendo que o que estava a faturar não correspondia, de facto, à atividade desenvolvida, nem a nenhum tipo de operação, sendo as faturas “falsas”. A atividade que disse ter desenvolvido era apenas de intermediação no negócio de compra e venda de madeira, através da procura de matas e da negociação das mesmas com os proprietários, em nome dos destinatários da madeira, que assumiam o risco do negócio. Referiu ainda que os negócios de madeira envolveram sempre “matas em pé”, nunca tendo realizado os serviços de corte, descasca, rechega ou transporte, até porque a M… não possuía meios para tal. Pagava a madeira ao proprietário com dinheiro disponibilizado pelo “cliente”, por regra os cheques deste eram diretamente entregues aos proprietários das matas. Não divulgou o nome de nenhum dos supostos proprietários;

c. O TOC confirmou que os sócios e gerentes da sociedade informaram-no que a empresa tinha deixado de exercer a atividade, pelo que deixaram de entregar documentos da mesma;

d. Dos cruzamentos de informação realizados, realçou-se a ausência de elementos quanto às supostas compras de mercadorias e da manutenção de relações empresariais com terceiros;

e. M... mencionou que os meios de transporte eram do próprio “fornecedor” e que não podia esclarecer quais os lugares de carga, descarga e pesagem da mercadoria;

f. Quanto aos meios de pagamento, não se obtiveram cópias frente e verso dos cheques movimentados. Um dos sócios-gerentes da sociedade declarou que assinou e carimbou os cheques emitidos por M... e que depois lhos devolveu;

H) A… MÁQUINAS DE ALUGUER, LDA:

a. O sócio-gerente referiu que a empresa nunca se dedicou ao comércio de madeira, desconhecendo os operadores que possuem faturas emitidas em nome da mesma, referentes à venda de madeira, e que não recebeu qualquer pagamento inerente a essas faturas;

b. Não se confirmou que o sujeito passivo tenha adquirido madeira, nem que tivesse recursos humanos necessários aos trabalhos de corte e empilhamento da madeira, nem meios de transporte (próprios ou subcontratados);

c. Verificou-se que o representante da sociedade, fruto de doença prolongada, não apresenta condições físicas que o permitissem desenvolver tal atividade;

d. M... alegou que as operações se deram nas mesmas circunstâncias dos operadores anteriores, sem juntar outros documentos comprovativos;

e. Um outro utilizador das faturas regularizou os impostos em causa.

I) T… TRADING, LDA:

a. Um dos sócios-gerentes negou ter participado em negócios de compra e venda de madeira, bem como em serviços relacionados com a mesma atividade;

b. Afirmou que a empresa não tinha meios, nem técnicos, nem humanos;

c. Afirmou que a empresa praticamente nunca laborou;

d. M... tem contabilizada apenas uma fatura de compra de madeira a este contribuinte, tendo a respeito da mesma referido os mesmos factos já relatados a propósito dos outros operadores, que não foram confirmados, quer pelos serviços, quer por parte da empresa;

J) C... SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES DO C…, LDA:

a. Segundo o TOC à data a empresa dedicava-se, de facto, à construção de edifícios para venda, tendo supostamente negociado madeira apenas durante o exercício de 2005;

b. Através dos elementos da contabilidade é possível observar que a empresa, relativamente à negociação da madeira, foi apenas intermediária, tendo como suposto “fornecedor” da madeira vendida a M... o já referido contribuinte S…, também ele “fornecedor” daquele;

c. A C... não possuía equipamentos específicos do setor de atividade em análise, nomeadamente veículos, equipamentos de corte e máquinas de rechega, bem como meios humanos, o que foi referido pela sócia da empresa;

d. Apesar de as duas faturas de venda da C... em causa indicarem ter sido processadas por computador, nas cópias registadas na contabilidade foram corrigidos os respetivos números, pelo que com os mesmos números das faturas utilizadas por M... (que têm os n.ºs 43 e 44) existem outras duas dirigidas a outra sociedade, de realidades diferentes e igualmente rasuradas;

e. Segundo a contabilidade de M... apenas uma das faturas em causa se encontra paga; já segundo a contabilidade da C... consta que foram as duas pagas em dinheiro, de imediato;

f. Não foram apresentados documentos comprovativos dos respetivos transportes e de provas das compras da madeira por parte do suposto fornecedor originário.

Atento este elenco, considerou a AT estar perante um conjunto de indícios suficientes para pôr em causa a materialidade das prestações tituladas pelas faturas em análise.

Reitere-se que nestas situações, ao contrário do sustentado pelos Recorrentes, em termos de ónus da prova a cargo da AT, é pacífico que esta não tem de provar a simulação, mas apenas recolher indícios de que as operações a que se referem as faturas não ocorreram efetivamente. Nestes casos, como já referido, cessa a presunção de veracidade da contabilidade, passando o ónus da prova para o sujeito passivo, cabendo a este demonstrar a efetividade das operações, individualmente consideradas.

Cumpre, pois, aferir se a AT logrou reunir indícios de que as operações, tituladas pelas faturas elencadas no RIT e que estiveram na base das correções aritméticas que fundaram as liquidações em crise, não correspondiam a operações reais.

A este propósito, o Tribunal a quo considerou terem sido recolhidos pela AT tais indícios.

Adiante-se que se acompanha a posição do Tribunal a quo.

Com efeito, da análise do elenco dos indícios recolhidos em relação a cada um dos 10 emitentes de faturas, verifica-se que a AT, cruzando elementos obtidos junto dos vários emitentes e dos respetivos procedimentos inspetivos (o que, como já mencionámos, é admissível) com outros elementos coligidos, designadamente junto do Recorrente marido, elencou para cada um dos casos diversos elementos e que se podem agregar no seguinte:

a) Não apresentação de declarações fiscais pelos emitentes das faturas com os valores devidos;

b) Inexistência de estrutura funcional, capaz de concretizar os fornecimentos de madeira titulados pelas faturas emitidas (designadamente, inexistência de trabalhadores, inexistência de maquinaria, inexistência ou insuficiência de veículos, inexistência de compras e/ou subcontratações);

c) Inexistência de contabilidade organizada;

d) Declarações dos representantes das várias sociedades, confirmando que as prestações tituladas pelas faturas não corresponderam a transações reais, referindo vários deles terem, sim, sido meros intermediários;

e) Circuitos financeiros, relativos aos pagamentos, que suscitam dúvidas sérias sobre a sua efetividade (desde pagamentos que acabaram por retornar ao Recorrente a cheques não movimentados durante anos ou a ausência total de apresentação de elementos atinentes ao alegado pagamento);

f) Inexistência de quaisquer elementos relativos às pesagens e documentos de transporte.

Todos estes indícios, com particularidades discernidas para cada emitente de faturas, são indícios de que as operações tituladas não corresponderam a operações reais, porquanto não só as mesmas respeitavam a alegados fornecimentos que não poderiam ocorrer sem a existência de uma estrutura apta aos mesmos, em termos de maquinaria e transporte, designadamente, como os circuitos financeiros revelam fragilidades que não se compadecem com o circuito negocial. A falta de documentos relativos a carga, descarga, transporte e pesagens acentua a seriedade dos indícios recolhidos. Ademais, não é despicienda a própria posição assumida pelos diversos emitentes de faturas. Ao contrário do que alega ao Recorrente, não é exigível à AT, em situações como a em apreciação, a prova inequívoca de que o Recorrente tinha conhecimento das ausências de estrutura e da atuação com má-fé e em conluio. Por outro lado, a menção feita pelos Recorrentes ao mencionado no RIT a propósito do potencial objetivo pretendido pelo Recorrente não tem qualquer impacto na decisão de aferir da reunião de indícios suficientes, pelo que carece de relevância.

Assim, face ao exposto, considera-se que, para cada um dos alegados fornecedores, a AT reuniu indícios sérios de que as transações tituladas pelas faturas em causa não tiveram efetividade, revelando tais indícios que há uma probabilidade séria de não terem sido feitos os fornecimentos em causa.

Refira-se que carece de relevância o invocado atinente ao teor da decisão proferida em 1.ª instância nos autos n.º 1280/08.9BELRS, por duas ordens de razão: por um lado, por não se acompanhar o raciocínio expendido aí no sentido, globalmente, de que a AT, sendo meramente conclusiva, não teria reunido indícios suficientes de que as operações tituladas pelas faturas não corresponderam à realidade; por outro, a mencionada decisão de 1.ª instância foi apreciada, em sede de recurso, neste Tribunal, que, não obstante ter negado provimento ao recurso, fê-lo com diferente fundamentação, no pressupostos da existência de indícios de faturação falsa(10).

Concretizando, quanto ao referido na conclusão TTT), não se considera existir qualquer contradição intrínseca quanto ao afirmado relativamente ao fornecedor J…. Com efeito, no que a este emitente de faturas respeita, o que resulta do RIT é que o mesmo não tinha estrutura funcional, como o próprio assume, e que, não obstante o elevado volume de faturação, não tinha contabilidade organizada. Não se considera serem ambas as constatações mutuamente exclusivas, entendendo-se sim que as mesmas se complementam e reforçam a conclusão extraída pela AT.

É igualmente irrelevante o constante da conclusão UUU) porquanto parte da premissa errada de que não é possível usar dados recolhidos noutras ações inspetivas conexas, designadamente declarações aí prestadas, o que já foi apreciado supra.

Da mesma forma não releva o alegado:

¾ Na conclusão VVV) (que, aliás, é uma mera transcrição de texto sem qualquer conclusão efetiva), relativo ao emitente de faturas T...Soc. Unip., Lda, desde logo por se considerar admissível a informação cruzada, nos termos já referidos supra. Ademais, foram ainda considerados elementos evidenciadores da falta de estrutura (falta de relações empresarias, instalações, equipamentos, funcionários), para além da inexistência de contabilidade e do circuito dos cheques, que foi no sentido de haver ou levantamentos em dinheiro ou depósitos em contas de terceiros visando retornar ao Recorrente;

¾ Na conclusão WWW), respeitante ao emitente de faturas F... Construções Soc, Unip. Lda, uma vez que também neste caso, além de se tratar de uma transcrição sem qualquer conclusão, se limita a descrever os indícios colhidos pela AT, quer na ação inspetiva que visou aquela sociedade, quer ulteriormente, indícios esses supra sintetizados e que se revelam como suficientemente ponderosos para abalar a presunção de veracidade das faturas emitidas;

¾ Na conclusão XXX), relativa à T... Transportes, Lda, uma vez que, tal como já se referiu, os procedimentos inspetivos relativos a esta sociedade encontram-se cabalmente identificados (Ordens de Serviço OI 2007… e OI 2007…), não se considerando que o facto de não estar indicado no RIT o nome do sócio-gerente é de molde a levar a que se desconsidere a informação cruzada utilizada. Mais uma vez sublinha-se a admissibilidade do controlo cruzado;

¾ Na conclusão YYY), relativa a E..., desde logo, em virtude da já referida admissibilidade de consideração de informação cruzada (onde se incluem, naturalmente, os autos de declarações). Por outro lado, o iter cognoscitivo da AT relativo à falta de evidenciação de estrutura compatível com tão elevado volume de faturação encontra-se refletido no RIT, onde de forma clara se refere não existirem veículos, pessoal contratado ou prestação de serviços, tudo considerando os valores faturados e o que isso implicaria em termos de fornecimento de madeira.

Quanto à alegada incoerência de indícios, quanto aos cheques, sublinhada nas conclusões DDDD) e EEEE), a mesma não ocorre. O que decorre do RIT foi que foram identificados circuitos relativos aos cheques que consubstanciavam indícios de que as operações tituladas pelas faturas não corresponderam à realidade, indícios esses que tiveram diferentes configurações, de emitente para emitente e, dentro do próprio emitente, de cheque para cheque (v. o caso de J…, no qual são identificadas diferentes situações). Daí que tenham sido, designadamente, identificadas situações de retorno dos cheques à esfera patrimonial do Recorrente e situações de cheques não movimentados. Como tal, não se vislumbra que tal circunstância redunde em qualquer contradição, uma vez que cada emitente de faturas tem particularidades que têm de ser consideradas e explanadas.

Não se alcança, ademais, o pretendido na conclusão HHHH) (primeira parte, dado que a segunda se refere aos métodos indiretos, que não estão em causa na correção que originou as liquidações impugnadas), sendo que, como resulta do RIT, a menção a uma conta utilizada para Via Verde foi apenas para ilustrar a utilização da conta bancária destino de fluxos financeiros. O mesmo se refira quanto à conclusão IIII), que em nada respeita à correção em crise (como melhor se compreende da leitura das alegações – página 50, de onde resulta tratar-se de mera transcrição da sentença proferida nos autos n.º 1280/08.9BELRS, nos quais estava, ao contrário do que aqui sucede, em causa a apreciação da admissibilidade do recurso a métodos indiretos).

Assim, considera-se, como já se deixou referido, ter a AT reunido indícios sérios de que as operações tituladas pelas faturas em causa não corresponderam à realidade.

Ora, como já referido, tendo a AT logrado reunir indícios sérios de que as operações tituladas pelas faturas em causa não correspondiam à realidade, caberia aos Recorrentes o ónus da prova da efetividade de todas as alegadas operações inerentes às faturas emitidas.

Não obstante, tal como referido pelo Tribunal a quo, não foram sequer invocados factos tendentes a demonstrar tal efetividade. Com efeito, os Recorrentes nada alegaram (nem provaram) passível de demonstrar a efetividade de cada uma das operações tituladas pelas faturas. Aliás, o invocado em torno do desconhecimento em relação ao tipo de negócio desenvolvido pelo Recorrente, designadamente na alegada circunstância de alguns dos fornecedores do Recorrente serem também seus clientes, não é de molde a cumprir o ónus probatório a seu cargo, ainda que tal tivesse ficado provado (o que nem sequer é o caso). Com efeito, a alegação é global e genérica, sendo exigido, em situações como as dos autos, que a prova da efetividade das operações seja individualizada fatura a fatura, não sendo, pois, suficiente alegações de circunstancialismos genéricos(11).

Como tal, essa falta de alegação (e consequente falta de prova) implica que os Recorrentes não tenham cumprido o seu ónus probatório.

Face ao exposto, improcede também nesta parte o alegado pelos Recorrentes.

III.A.7. Quanto à ocorrência de fundada dúvida sobre a existência e a quantificação do facto tributário

Consideram ainda os Recorrentes estar-se perante uma situação de fundada dúvida, sobre a existência e quantificação do facto tributário, uma vez que a AT não provou, em concreto, a existência de facto tributário ou o modo através do qual chegou à concreta quantificação da obrigação de imposto. Para tal, consideram que, inexistindo factos e normas fundadoras do ato impugnado, apenas lhes resta negar a existência de qualquer facto tributário, cabendo à AT o ónus da prova de que o facto negativo invocado pelos Recorrentes não se verificou.

Vejamos então.

Antes de mais, refira-se que, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, nem houve in casu liquidações sem factos que as sustentem, nem cabe à AT o ónus da prova nos termos por si referidos.

Assim, como já se referiu, in casu, a AT reuniu indícios suficientes para abalar a presunção de veracidade das faturas em causa, estando tais faturas quantificadas. Ao contrário do referido pelos Recorrentes, a prova aqui exigida à AT não é a prova da simulação das operações, mas tão-só a prova consubstanciada na reunião de indícios sérios que, per se, abalem a presunção de veracidade das faturas em causa.

Nesses casos, como já mencionado, caberá ao contribuinte o ónus da prova de que as operações tituladas pelas faturas foram reais. Ora, não se trata de prova de facto negativo, ao contrário do referido pelos Recorrentes, não se verificando uma situação de diabolica probatio motivadora de inversão do ónus da prova (sendo certo que a circunstância de o facto ser negativo não desoneraria a parte de o provar(12)). Como tal, funcionam, como já referido, as regras do ónus da prova nos termos já explanados, situação que em nada belisca o disposto no art.º 268.º, n.º 4, da CRP.

Feito este enquadramento, em virtude de o mesmo se revelar pertinente, para efeitos de apreciação da pretensão dos Recorrentes, há que explanar em que situações se pode concluir pela existência de fundada dúvida, que deva ser resolvida a favor do contribuinte.

Cumpre atentar no disposto no art.º 100.º, n.º 1, do CPPT, nos termos do qual “[s]empre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado”.

Este regime surge desenhado sobretudo para situações em que o ónus probatório está a cargo da AT, logrando a parte abalar a prova ou os elementos em que se fundou a administração para prática do ato tributário.

Ora, in casu, a AT reuniu, como já mencionado, indícios suficientes para pôr em causa a presunção de veracidade das faturas.

Como tal, o ónus da prova caberia aos Recorrentes que não alegaram sequer em concreto factualidade que pudesse ser apta, se provada, à demonstração da efetividade das operações, quedando-se em alegações abstratas e não suficientemente esclarecedoras.

Como referido por Jorge Lopes de Sousa(13):

“… [T]ambém será de impor ao contribuinte, no processo judicial, o ónus da prova de factos quando ele lhe é imposto no procedimento tributário (…).

Sendo de aplicar esta regra também no processo judicial, pelo que se disse, e harmonizando-a com a regra do n.° 1 do art. 100.° do CPPT, será de concluir que, nos casos em que se verificar uma destas situações em que no procedimento tributário é atribuído o ónus da prova ao contribuinte, as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas para efeitos de, nos termos daquele n.º 1, justificarem a anulação do acto impugnado.

Na verdade, o n.º 1 do art. 100 .°, do CPPT consubstancia uma norma de carácter geral de que resulta recair sobre a administração tributária o ónus da prova dos factos que relevem para quantificação da matéria tributável. Por isso, nas situações em que a lei, em normas especiais, impõe esse ónus ao contribuinte, fica afastada a aplicação daquela regra de carácter geral”.

Assim, face ao exposto, cabendo aos Recorrentes o ónus da prova nos termos já descritos, não se verifica uma situação de fundada dúvida, pelo que improcede o alegado também nesta parte.

Refira-se que o alegado na conclusão JJJ), onde se chama à colação o mesmo art.º 100.º do CPPT, também não tem a virtualidade pretendida pelos Recorrentes. Com efeito, partindo do descrito no RIT, no sentido de o comportamento do Recorrente poder ter tido por objetivo substituir na contabilidade as compras que fez sem documento de suporte e obter uma vantagem ilegítima através do direito à dedução do IVA e da consideração de custos, consideram os Recorrentes que uma suposição deveria levar à abstenção de corrigir. Reitera-se o já mencionado a respeito deste extrato do RIT supra: tratou­-se de uma construção hipotética, que em nada releva para o caso dos autos e que não põe em causa o facto de terem sido reunidos indícios sérios de existência de faturação falsa, nos termos já expostos.

Como tal, improcedem, in totum, as alegações dos Recorrentes.

No tocante às custas, como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07.05.2014 (Processo: 01953/13): “A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade” (sublinhado nosso).

Ora, considera-se que o valor de taxa de justiça devido, calculado nos termos do tabela I.b., do RCP, é excessivo. Assim, não obstante se entender que, face à complexidade das questões envolvidas e à tramitação dos autos, não deve haver dispensa total do pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda os 275.000,00 Eur., entende-se ser adequado e proporcional, face às caraterísticas concretas dos autos e à atuação das partes, dispensar o pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda 500.000,00 Eur.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida;

b) Custas pelos Recorrentes, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda 500.000,00 Eur.;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 11 de abril de 2019

(Tânia Meireles da Cunha)

(Anabela Russo)

(Patrícia Manuel Pires)


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(1) Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, p. 676.

(2) Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., p. 283.

(3) V. Jorge Lopes de Sousa, «Juros nas relações tributárias», Problemas fundamentais do Direito tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pp. 147 e 148.

(4) Neste sentido, v., exemplificativamente, os Acórdãos deste TCAS de 25.05.2017 (Processo: 06473/13), de 17.03.2016 (Processo: 06556/13) e de 13.03.2014 (Processo: 07216/13).

(5) Cfr., a este propósito, Noel Gomes, Segredo Bancário e Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2006, pp. 306 e ss.

(6) V. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21.05.2013 (Processo: 06309/13).

(7) Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05.02.2015 (Processo: 08097/14), de 22.02.2018 (Processo: 08959/15) e de 07.06.2018 [Processo: 813/11.8BELRA (09855/16)], bem como do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11.07.2017 (Processo: 00396/09.9BEPNF).

(8) Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14.05.2002 (Processo 5650/01).

(9) Vejam-se, exemplificativamente, os Acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 01.02.2016 (Processo: 0591/15), de 16.03.2016 (Processos: 0400/15, 0587/15), de 19.10.2016 (Processo: 0511/15), de 16.11.2016 (Processo: 0600/15) e de 27.02.2019 (Processo: 01424/05.2BEVIS 0292/18).

(10) Acórdão de 18.06.2015 (Processo: 6086/12), onde se escreveu: “Com efeito, no relatório de inspecção do Impugnante foram devidamente identificados cada um dos fornecedores reputados como emitentes de facturas falsas por não apresentarem estrutura empresarial (…). // Por outras palavras, constando do relatório os fundamentos relativamente a cada um dos emitentes das facturas falsas, a AT estava habilitada a desconsiderar fiscalmente todas as facturas por eles emitidas ao Impugnante por meio da não-aceitação dos respectivos gastos que cada uma representa…”.

(11) V., a título exemplificativo, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 06.12.2018 (Processo: 754/07.3BELSB) e jurisprudência no mesmo citada.

(12) Cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, p. 467, nota 1

(13) Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado, Vol. II, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 132 e 133.