Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 03043/09 |
Secção: | CT- 2º JUÍZO |
Data do Acordão: | 07/15/2009 |
Relator: | PEREIRA GAMEIRO |
Descritores: | ÂMBITO DO ART. 276 DO CPPT OPOSIÇÃO À PENHORA |
Sumário: | 1 - Muito embora o texto do art. 276 do CPPT refira “decisões” como possíveis objectos de reclamação, o entendimento da doutrina e da jurisprudência é no sentido de que os interessados podem reclamar, na execução fiscal, para o Juiz de todos os actos que os lesem, tenham ou não a configuração ou a designação de decisões, como se depreende do disposto nos art. 97 nº 1 al. n), 151 nº 1 e 278 nº 3 do CPPT e art. 101 al. d) e 103 nº 2 da LGT (“é assegurado o direito de recurso de actos praticados na execução” e “é garantido o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária” na terminologia legal). 2 - No processo de execução fiscal a oposição á penhora é deduzida através da reclamação prevista nos art. 276 e segs. do CPPT. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | I – C…… & G…………… , LDA, recorre da sentença de fls. 94 a 98 da Mmª. Juiz do TAF de Sintra que lhe julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º 1……………. por divida de IRC de 2003, pretendendo a revogação do despacho com baixa dos autos à 1ª instância para apreciação do pedido de ilegalidade da dívida e o consequente levantamento da execução. Nas suas alegações de recurso formula as conclusões seguintes: a) Deste modo, e com o devido respeito, parece-nos que o Tribunal errou ao indeferir liminarmente a petição inicial por improcedência, uma vez que a ora Recorrente não discutiu a legalidade da liquidação do imposto, mas sim a responsabilidade pela mesma, fruto dos crimes de burla agravada e de abuso de confiança agravado de que foi vítima. b) Nestes termos e com base na petição inicial indeferida, parece-nos resultar com alguma clareza que a lei não assegura outro meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação pelos factos invocados. c) Mais, cumpre-nos referir que tal indeferimento constitui uma dupla penalização da ora Recorrente e uma preterição do princípio da justiça tributária, ou seja, com refere o Prof. Diogo Freitas do Amaral, In Direito Administrativo, II, pág. 200, "... harmonizar o interesse público específico que lhe cabe prosseguir com os direitos e interesses legítimos dos particulares eventualmente afectados.". Não foram apresentadas contra alegações. Os autos foram com vista ao Ministério Público que não emitiu parecer. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. ****** A) Em 7.10.2007 foi instaurado pelo SF de C…… -l contra a Oponente o processo de execução fiscal n.°1………………………… para cobrança coerciva de dívida referente a IRC do ano de 2003, no montante de € 11.757,48. (Doc. a fls. 49 dos autos). B) O prazo voluntário de pagamento da dívida exequenda terminou a 3.09.2005, sem que o mesmo se tivesse verificado. (Doc. a fls. 50 a 51 dos autos). C) A presente Oposição foi remetida via postal em 8.01.2007 a este Tribunal. (Fls. 3 dos autos). A que, nos termos do art. 712 nº 2 do CPC, se adita o seguinte: D) A executada foi citada pessoalmente em 16.2.2007, tendo-lhe antes sido expedido aviso nos termos do art. 191 do CPPT em 28.10.2005 (cfr. fls. 52 e 53). Como facilmente se percebe face aos elementos dos autos, nomeadamente da informação de fls. 49 e dos doc. de fls. 50 a 53, a data referida em A) do probatório não está correcta pois que a execução foi instaurada em 7.10.2005 e não em 7.10.2007, pelo que se corrige a referência aí feita a 2007 para 2005. **** No entendimento de que o oponente visava a execução fiscal cingindo todo o teor da sua argumentação à discussão da legalidade da dívida e que a lei prevê e assegura a impugnação ou recurso judicial contra o acto de liquidação foi julgada improcedente a oposição não sendo de se ordenar a convolação dos autos em processo de impugnação por já se mostrar ultrapassado o prazo previsto no art. 102 do CPPT. A recorrente discorda do decidido defendendo que não discutiu a legalidade da liquidação do imposto, mas sim a responsabilidade pela mesma fruto dos crimes de burla agravada e de abuso de confiança agravado de que foi vitima e que, por isso, não tinha outro meio judicial para reagir contra o acto de liquidação, sendo que o indeferimento constitui uma dupla penalização da ora recorrente e uma preterição do princípio da justiça tributária. Pretende a revogação do despacho e a baixa dos autos à 1ª instância para apreciação do pedido de ilegalidade da liquidação da dívida exequenda e o consequente levantamento da penhora. Antes de mais, cumpre referir que não se trata nos autos de qualquer despacho de indeferimento liminar da petição como refere a recorrente nas suas alegações e conclusões, mas de uma sentença que julgou improcedente a oposição (cfr. fls. 94 a 98), sendo mesmo estranho que a recorrente na conclusão a) refira que não discutiu a legalidade da liquidação do imposto mas sim a sua responsabilidade pela mesma dívida e depois venha pedir a baixa dos autos para o Tribunal de 1ª instância apreciar o pedido de ilegalidade da liquidação da dívida e o consequente levantamento da penhora. Quanto ao entendimento vertido na decisão de que a oponente cinge todo o teor da argumentação formulada à discussão da legalidade da liquidação do imposto, estamos de acordo com esse entendimento, pois que ao invocar que a dívida exequenda deve ser imputada a outra pessoa (ao TOC) a oposição tem por fundamento a ilegalidade em concreto da liquidação. A entender-se que a invocação tem a ver com a questão de responsabilidade pelo pagamento da dívida (ilegitimidade da pessoa citada), logo havemos de concluir que ela não se enquadra na previsão da al. b) do nº 1 do art. 204 do CPPT, pois que a ora recorrente consta do título executivo como executada e a dívida é de IRC, não resultante, pois, de qualquer posse e daí sempre se ter de concluir que a fundamentação invocada não constitui fundamento de oposição. Mas terá sido correcta a distribuição e tramitação operada como de oposição à execução? A resposta só pode ser negativa. Vejamos. Como resulta da pi de fls. 3 e 4, a ora recorrente veio deduzir oposição à penhora e pediu que a oposição fosse julgada procedente e que a penhora fosse levantada. Dúvidas não podem restar de que a ora recorrente veio reagir contra um acto praticado na execução que foi a penhora que refere nos artigos 1º e 2º da pi. No CPC (art. 863-A e 863-B) prevê-se a possibilidade do executado se opor à penhora em incidente deduzido na própria execução. E poderá também opor-se à penhora no âmbito do CPPT? A resposta só poderá ser positiva como resulta do disposto no art. 276 do CPPT onde se prevê a possibilidade de impugnação de quaisquer decisões do órgão da execução fiscal ou de outras autoridades da administração tributária que afectem os direitos ou interesses legítimos do executado. Muito embora o texto do art. 276 refira “decisões” como possíveis objectos de reclamação, o entendimento da doutrina e da jurisprudência é no sentido de que os interessados podem reclamar, na execução fiscal, para o Juiz de todos os actos que os lesem, tenham ou não a configuração ou a designação de decisões, como se depreende do disposto nos art. 97 nº 1 al. n), 151 nº 1 e 278 nº 3 do CPPT e art. 101 al. d) e 103 nº 2 da LGT (“é assegurado o direito de recurso de actos praticados na execução” e “é garantido o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária” na terminologia legal). Assim tem de concluir-se que é reconhecido à ora recorrente o direito de solicitar a intervenção do Juiz no processo de execução fiscal em causa através da reclamação prevista no art. 276.° do CPPT, relativamente à penhora em causa efectuada na execução fiscal tal como invoca. E foi o que ela fez pretendendo o levantamento da penhora com a fundamentação invocada, sendo que a reclamação prevista no art. 276 do CPPT se destina a obter a anulação de actos praticados no processo de execução fiscal. Já a oposição à execução destina-se a obter a extinção total ou parcial da execução e não a anulação de qualquer acto praticado na execução. Ora, não se tendo atentado correctamente no pedido formulado que era de levantamento da penhora (anulação da mesma) e distribuindo-se o processo como de oposição e seguindo-se a tramitação desta forma processual, evidente se verifica que houve distribuição e processamento incorrecto do processo dado que não é compatível com o meio processual utilizado o pedido efectuado pela ora recorrente, sendo que o meio processual adequado para a finalidade pretendida é a reclamação prevista no art. 276 do CPPT e não a impugnação judicial como também se entendeu na decisão recorrida só não se tendo ordenado a convolação para esta forma de processo por já ter decorrido o prazo para a impugnação. No sentido de que no processo de execução fiscal a oposição á penhora é deduzida através da reclamação prevista nos art. 276 e segs. do CPPT já teve o STA oportunidade de se pronunciar como se pode ver, entre outros, do Ac. de 20-10-2004, recurso n.° 979/04 e do Ac. 13-10-2004, recurso n.° 1538/03. Assim, sendo o meio processual adequado para a finalidade pretendida pela ora recorrente, a reclamação prevista no art. 276 do CPPT, verifica-se a existência de erro na forma de processo que é de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final e que importa a anulação dos termos subsequentes à petição devendo o processo ser convolado para a forma adequada dado que nada obsta a isso (cfr. art. 199 do CPC, 98 nºs 2 a 4 do CPPT e 97 nº 3 da LGT). Não se pode, pois, manter a decisão recorrida sendo de se anular o processado a partir da petição inicial e determinar a convolação da petição considerada de oposição à execução em reclamação prevista no art. 276 do CPPT, nesta forma processual devendo ser processada a petição de oposição à penhora apresentada. IV – Termos em que acordam os Juízes deste Tribunal em, concedendo provimento ao recurso, anular a decisão recorrida bem como os termos posteriores à petição inicial e determinar a convolação da petição em reclamação prevista no art. 276 do CPPT nesta forma prosseguindo os ulteriores termos. Sem custas. Lisboa, 15.7.09 PEREIRA GAMEIRO ROGÉRIO MARTINS LUCAS MARTINS |