Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06995/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/30/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL.
VÍCIOS DE ACTIVIDADE CONTRAPÕEM-SE AOS VÍCIOS DE JULGAMENTO.
NÃO CONHECIMENTO DE QUESTÃO DEVIDO A NEXO DE PREJUDICIALIDADE. ERRO DE JULGAMENTO.
NULIDADES PROCESSUAIS.
NULIDADES PROCESSUAIS SECUNDÁRIAS. REGIME DE ARGUIÇÃO.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
REGIME DE ANULAÇÃO DA VENDA EM PROCESSO TRIBUTÁRIO.
A LEGITIMIDADE ENQUANTO PRESSUPOSTO PROCESSUAL DE CONHECIMENTO OFICIOSO.
CONSEQUÊNCIAS DA FALTA DE LEGITIMIDADE DA PARTE.
LEI APLICÁVEL.
LEGITIMIDADE ACTIVA PARA O INCIDENTE DE ANULAÇÃO DE VENDA.
DIREITO DE RETENÇÃO SOBRE COISA IMÓVEL CADUCA COM A VENDA EM EXECUÇÃO FISCAL.
FISCALIZAÇÃO CONCRETA DA CONSTITUCIONALIDADE POR PARTE DOS TRIBUNAIS
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso.
4. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
5. As nulidades processuais consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil). As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
6. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
7. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
8. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação, ainda que parcial, da decisão recorrida.
9. O regime de anulação da venda em processo tributário encontra-se previsto no artº.257, do C.P.P.Tributário (cfr.artº.328, do anterior C.P.Tributário), preceito que deve ser conjugado com os artºs.908 e 909, do C.P.Civil (cfr.artºs.838 e 839, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), onde se encontram enunciadas as causas de anulação.
10. A legitimidade das partes (“legitimatio ad causam”) é o pressuposto processual que, traduzindo uma correcta ligação entre as partes e o objecto da causa, as faculta para a gestão do processo. Como regra (legitimidade directa), serão partes legítimas os titulares da relação material controvertida (cfr.artº.30, nº.3, do C.P.Civil, "ex vi" do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário; artº.9, do C.P.P.Tributário), assim se assegurando a coincidência entre os sujeitos que, em nome próprio, intervêm no processo e aqueles em cuja esfera jurídica a decisão judicial vai directamente produzir a sua eficácia. Da análise do artº.30, nº.3, do C. P. Civil, conclui-se que o critério supletivo de aferição da legitimidade processual se deve basear no interesse em demandar ou contradizer, face ao objecto inicial do processo, individualizado pela relação material controvertida tal como o A. a configura.
11. Se qualquer das partes carecer de legitimidade o Tribunal deve abster-se de conhecer do mérito da causa e absolver o réu da instância (cfr.artºs.278, nº.1, al.d), 576, nº.2, e 577, al.e), todos do C.P.Civil, aplicáveis “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário), sendo tal excepção dilatória de conhecimento oficioso (cfr.artº.578, do C.P.Civil).
12.A legitimidade das partes deve ser determinada de acordo com a lei vigente no momento em que é proferida a decisão sobre a mesma.
13. A legitimidade activa para requerer a anulação da venda depende do fundamento (causa de pedir) que servir de base ao pedido.
14. O direito de retenção sobre coisa imóvel caduca com a venda em execução fiscal, sendo que o direito de preferência no pagamento que a mesma garantia real atribui ao seu titular se transfere para o produto da venda (cfr.artº.824, nºs.2 e 3, do C.Civil).
15. O que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efectuadas por aquelas decisões (cfr.artº.204, da C.R.Portuguesa).


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
... , com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.812 a 822 do presente processo, através da qual julgou verificada a excepção de ilegitimidade do ora recorrente para a dedução do presente incidente de anulação de venda no âmbito da execução fiscal nº.1384-2007/104480.0 e apensos, o qual corre seus termos no 1º. Serviço de Finanças de Leiria, mais determinando a absolvição dos demandados da instância.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.832 a 857 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Em 11/08/2008, o Serviço de Finanças de Caldas da Rainha, alegadamente sustentado em despacho proferido pelo Chefe deste Serviço de Finanças, ordenou ao recorrente que procedesse nos termos que subsequentemente se reproduzem:
(...) para no prazo de 5 (cinco) dias a contar da data da notificação, e de harmonia com o disposto no artº.930 do Código do Processo Civil restituir a posse com a consequente entrega da chave e comando de acesso às garagens, neste Serviço de Finanças, do imóvel abaixo descrito por ter sido adquirido através de proposta em carta fechada, em 2008/05/15, por ... , Cont. 180216040 no âmbito do processo de execução fiscal nº.1384200701044800 e associados.
Imóvel - Fracção AN, correspondente ao 4º. andar, do prédio sito em Facho - Foz do Arelho, a confrontar do norte com Estrada, sul com ... , nascente serventia e poente estrada e herdeiros de ... , inscrito na matriz sob o artigo n. ° 1495-NA”;
2-A legitimidade e interesse em intervir do recorrente nos presentes autos advêm, pois, da circunstância do requerente ser directamente visado pela administração fiscal neste processo e de, nessa sequência, se encontrar pessoal e patrimonialmente afectado por todos os actos que aqui foram praticados e omitidos;
3-O recorrente só teve conhecimento quer dos vícios ora arguidos e de cada uma das questões que os fundamentam no passado dia 14/08/2008, após a junção ao processo de procuração por parte da advogada signatária em 13/08/2008 e consulta dos autos neste mesmo dia - tudo sequencialmente à ordem referida no ponto 1;
4-Só nesse dia conheceu, também, os exactos termos em que teve lugar a venda cuja anulação pretende seja declarada nos presentes autos;
5-Atenta a fase processual com que o recorrente se deparou (depois da venda realizada), o recorrente não podia já lançar mão do incidente de embargos de terceiro para defender a sua posse;
6-Restou-lhe, por isso, como meio de defender os direitos que invoca, o incidente de anulação de venda a que correspondem os presentes autos: anulada que seja a venda, anular-se-á igualmente a consequente ordem de entrega da fracção e poderá, nessa altura, o recorrente defender a sua posse através desses embargos, reclamar o crédito que invoca (subsidiariamente) estar garantido com direito de retenção sobre a fracção vendida, ou utilizar outras formas processuais que julgue aplicáveis ao caso;
7-Releva ainda o seguinte: enquanto que, relativamente ao comprador da fracção nos presentes autos, os meios de defesa do recorrente (em caso da venda não ser anulada) se limitam ao alegado em sede de acção de reivindicação, já relativamente à sociedade executada, sendo a venda anulada, os meios de defesa do recorrente consubstanciam-se numa maior amplitude, uma vez que, conforme alega nos presentes autos (e é reconhecido pela AT a fls.328 e 329 do PEF), o recorrente é credor da executada, com direito de retenção sobre a fracção vendida;
8-Mais: se for anulada a venda, uma vez que a sociedade executada foi, ulteriormente à venda, declarada insolvente (ponto 21. a., dos factos assentes) abrir-se-á a possibilidade da fracção vendida nestes autos ser apreendida pela respectiva massa, o que determina que o próprio Administrador de Insolvência possa cumprir as obrigações de transmissão da mesma a favor do recorrente, de harmonia com os artºs.102 e ss. do CIRE - e/ou que o recorrente possa, numa perspectiva meramente obrigacional, de cumprimento de contratos, MESMO EM CASO DE INSUCESSO DA ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO referida em 29 dos factos assentes, defender a sua posse naquele processo de insolvência, vendo, assim, alargadas, quer as possibilidades de manutenção da sua posse, quer as vias através das quais poderá obter o reconhecimento do direito de propriedade sobre a mesma - COM MANIFESTA VANTAGEM PARA O RECORRENTE;
9-Do processo de execução consta expressamente, a fls.328 e 329, que a fracção penhorada se encontrava onerada com direito de retenção a favor de credor (o ora recorrente), decorrente de tradição e posse da mesma - pelo que a qualidade do recorrente como credor com direito real de garantia e como possuidor encontra-se reconhecida nos autos pela AT;
10-Na petição inicial da anulação, o recorrente radica a sua legitimidade, não apenas na propriedade que invoca mas também, no facto de ser possuidor da fracção vendida e credor da executada munido de direito de retenção sobre a mesma fracção (fls.5 e 6 da p.i., fls.328 e 329 do PEF), estando tal qualidade comprovada por certidão judicial junta aos autos relativa ao proc. nº.2081/080TBCLD, do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha (vide pedido subsidiário formulado na p.i.);
11-Nos termos do artº.668, nº.1, d), do CPC (aplicável ex vi artº.2, do CPPT), é nula a sentença quando "O Juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse conhecer";
12-No caso em apreço, a sentença recorrida não se pronunciou relativamente às questões referentes à qualidade de possuidor e de titular de crédito garantido com direito de retenção sobre a fracção vendida invocadas pelo recorrente, nem sequer distingue a problemática da legitimidade em função dos dois tipos de causa de pedir que integram o incidente (conclusões 24 e seguintes) as quais fundamentam e alicerçam a legitimidade processual, interesse em agir e utilidade da lide para o recorrente, pelo que se encontra inquinada de nulidade, a qual se argui;
13-Foram alegados pelo recorrente os seguinte factos, não incluídos nos factos dados por assentes na sentença, mas essenciais para a boa decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito:
PONTO 23 DA PETIÇÃO INICIAL - Conforme consta expressamente e inequivocamente de fls.328 e 329, o Serviço de Finanças de Leiria 1 foi formalmente informado pela executada de que os imóveis penhorados se encontravam onerados com direito de retenção decorrente da tradição e correspondente posse dos imóveis, ao abrigo de negócio jurídico com aquela firmado (cfr. artigo 755° nº.1 alínea f), em conjugação com o artigo 759° nº.1, ambos do Código Civil);
PONTO 24 DA PETIÇÃO INICIAL - O requerente é um desses credores (conforme, aliás, se infere quer de fls.328 e 329, quer da ordem reproduzida supra, no ponto 1 do título I);
14-Concretos meios probatórios que impunham que o Tribunal aditasse o teor daqueles pontos 23 e 24 aos factos assentes: fls.328 e 329 do PEF, a ordem de entrega de fracção dirigida pela AT ao recorrente, que consta igualmente do PEF, e, ainda, a certidão judicial relativa ao processo identificado na alínea 21 a. dos factos assentes, nos termos da qual consta que, a título subsidiário, o recorrente aduz direito de crédito contra a executada e invoca direito de retenção sobre a fracção vendida, tudo relevante para adequada decisão relativamente à questão da legitimidade processual do recorrente;
15-O facto 29 da matéria de facto assente incorrectamente julgado: foi omitida a indicação de todos os pedidos formulados pelo recorrente no proc. nº.2081/2008, do 2º. Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha: contrariamente ao que se afirma na sentença recorrida, a acção instaurada pelo recorrente, que corre termos sob o nº. 2081/2008, no 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, não consiste numa mera acção de reivindicação, nem o pedido ali formulado se limita ao que é descrito no ponto 29 da matéria de facto dada por assente na sentença;
16-Deverá, por isso, ser transcrito o teor integral desse pedido no referido ponto 29, e não apenas a primeira parte do mesmo, como se encontra plasmado na Sentença recorrida, transcrevendo-se nesse ponto a TOTALIDADE DO TEOR DO PEDIDO formulado pelo recorrente, e não só a parte da reivindicação, do teor indicado em sede de fundamentação;
17-Concreto meio probatório que impunha a transcrição integral do pedido atrás referido: certidão judicial de petição inicial do processo nº.2081/2008, do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, que se encontra junta aos autos;
18-O teor do pedido omitido (pedido subsidiário) comprova a qualidade do recorrente como credor da executada, munido de direito de retenção: igualmente relevante para se aferir e julgar devidamente sobre a questão da legitimidade processual daquele e aferir, em pleno, da utilidade que retiraria da anulação da venda;
19-Encontra-se junta aos autos certidão emitida pela Junta de Freguesia da Foz do Arelho que comprova nunca terem sido afixados na porta da sua sede quaisquer editais a publicitar a venda da fracção em causa nestes autos (concreto meio probatório);
20-Não se percebe, assim, o critério do Tribunal "a quo", o qual:
a)Inclui no ponto 25 dos Factos Assentes: "em 14/03/2008 foi lavrada certidão pelo funcionário do SF nos termos da qual foram afixados editais de igual teor nos locais designados por lei (fls.496 cujo conteúdo se dá por reproduzido)";
b)Nada refere relativamente à certidão da Junta de Freguesia de Foz do Arelho que comprova que na sua sede não foram afixados editais referentes à venda da fracção objecto da venda que se pretende anular;
21-Salvo o devido respeito, tal disparidade e omissão viola o artº.3-A, do CPC, constituindo, por si só, NULIDADE PROCESSUAL, que aqui fica expressamente invocada, pois influi no exame e decisão da causa em manifesto desfavor do recorrente (artº.201, nº.1, do CPC);
22-Deverão ser aditados novos pontos à matéria de facto assente, dos quais conste o seguinte:
a)Encontra-se junta aos autos fotocópia autenticada de certidão emitida pela Junta de Freguesia de Foz do Arelho em 25/08/2008;
b)O teor desta certidão é o seguinte: Com referência ao processo de execução fiscal nº.1384200701044800, não deu entrada nesta Junta de Freguesia qualquer documentação relacionada com o processo acima citado, motivo pelo qual, como é óbvio, não foi afixado qualquer edital";
23-Esta última questão releva igualmente para a decisão das questões jurídicas suscitadas pelo recorrente, justificando o interesse em agir deste, o fundamento sério da pretensão que invoca e a sua legitimidade para defender os direitos invocados;
24-Do que até agora fica invocado, resulta, assim, que, nos presentes autos temos dois tipos de causas de pedir para efeitos de anulação de venda:
a)Nulidade processual que influi na venda (artºs.257, nº.1, c), do CPPT, artºs.201, 203 e 909, nº.1, c), do CPC;
b)Nulidade da venda derivada da aplicação do regime da venda de coisa alheia (artº.892, do C.Civil);
25-A PROPÓSITO DA PRIMEIRA CAUSA DE PEDIR (NULIDADE PROCESSUAL):
a)A qualidade de "interessado" vem exaustivamente alegada na p.i. pelo recorrente logo no seu Capítulo I, onde esclarece que se encontra em causa a posse que vem exercendo na fracção vendida - COLOCADA EM CRISE EM VIRTUDE DA VENDA - ou seja, interessa-lhe que a venda seja anulada para que o comprador deixe de lhe exigir a posse dessa fracção, para que fique sem qualquer efeito a notificação para entrega da fracção que recebeu nos autos do PEF onde foi realizada a venda;
b)Anulada que seja a venda, não é sequer certo que a posse e direitos de propriedade invocados pelo recorrente sobre a fracção vendida sejam violados pela executada: a executada pode conformar-se, como sempre fez até hoje, com a posse dessa fracção pelo recorrente e pode até reconhecer formalmente o direito de propriedade sobre a fracção invocado pelo recorrente (como sempre tem reconhecido, de facto, até hoje);
c)Se tal posse, porém, for afectada, o recorrente poderá, então, arguir contra a executada todos os factos e o direito que invoca no Cap. IV da p.i. - nem todos, eventualmente, oponíveis ao adquirente da venda cuja anulação se requer. E poderá exercer todos os mecanismos jurídicos aplicáveis à defesa da posse, seja em PEF (embargos de terceiro), seja em sede de processo de insolvência da executada (direito à separação - artº.146 do CIRE; cumprimento voluntário de obrigações de transmissão de propriedade pelo Administrador da Insolvência - artº.102 do CIRE, etc.) - sendo evidente a utilidade jurídica que lhe advirá da anulação da venda, na perspectiva da defesa da continuidade da posse que vem exercendo sobre a fracção;
d)Mesmo na mera perspectiva (subsidiária - vide artº.31-B do CPC) de titular de direito de crédito sobre a executada, munido de direito de retenção sobre a fracção vendida (qualidade que lhe é reconhecida pela AT a fls.328 e 329 do PEF), interessa-lhe, igualmente, que sejam declaradas as nulidades que invoca - pois subvertem a adequada publicidade da venda e demais regras susceptíveis de angariar um interessado que apresente a melhor proposta de aquisição (melhor preço possível) - o que não se verifica quando o fiel depositário nem sequer tinha a posse da fracção vendida (como mostrá-la a interessados?) e quando foram violadas as regras aplicáveis à publicidade da venda (diminuição da livre concorrência e possibilidade de angariação de mais propostas), conforme exaustivamente alegado na p.i.;
e)A qualidade de "interessado" do recorrente determina, assim, que seja parte legítima no incidente de anulação de venda, na parte em que a causa de pedir se subsume a NULIDADE PROCESSUAL (artºs.257, nº.1, c), do CPPT, 909, nº.1, c), e 201 e 203 do CPC);
f)O Tribunal "a quo" deverá julgar imediatamente o presente incidente, com base nesta causa de pedir - pois tem já em seu poder elementos que comprovam as omissões apontadas e o recorrente explicou também exaustivamente na p.i. que tais omissões influem na venda, em seu prejuízo;
g)Carece, assim, de fundamento a extinção da instância por falta de interesse processual/ilegitimidade do recorrente, contrariamente ao que se julgou na douta sentença recorrida;
26-JÁ QUANTO À SEGUNDA CAUSA DE PEDIR do incidente de anulação (nulidade da venda por aplicação do regime legal da venda de coisa alheia - artº.892 do C. Civil), o recorrente invoca ser proprietário da fracção vendida, em virtude do seguinte:
c) Aquisição derivada, por permuta (Cap. IV da p.i: artºs.14 a 90);
d) Aquisição originária, por usucapião (Cap. IV da p.i.: artºs.91 a 130);
27-O Tribunal "a quo" deverá, inicialmente, conhecer das nulidades processuais invocadas pelo recorrente e que incorporam a causa de pedir referida na alínea c), do artº.257, nº.1, do CPPT, e dos artºs.909, nº.1, e 201, do CPC;
28-Se julgar não se verificarem aquelas nulidades, então, terá de suspender os presentes autos, por força da pendência da acção de reivindicação referida no ponto 29, dos factos assentes, que consubstancia causa prejudicial relativamente aos mesmos;
29-Efectivamente, a matéria relativa a direito de propriedade encontra-se subtraída da competência material do TAF, pelo que tal deverá ser declarado conforme previsto no artº.279, nº.1, do CPC (aplicável ex vi artº.2, do CPPT), ou seja: em caso de procedência da referida acção de reivindicação, verificar-se-á nulidade da venda realizada nos presentes autos, por aplicação do artº.892, do C. Civil (venda de coisa alheia);
30-Porém, será sempre o TAF o Tribunal materialmente competente para declarar a nulidade do acto processual de venda realizado no PEF (sob pena de violação do artº.49 do ETAF), fixando para efeitos de processo de execução fiscal, as consequências da eventual procedência daquela acção;
31-Não se aceita, por isso, o teor da sentença recorrida, que não reconhece a manifesta utilidade dos presentes autos para o recorrente, relativamente aos dois tipos de causa de pedir invocados para efeitos de anulação de venda;
32-O Tribunal "a quo" interpreta o artº.26, do CPC, considerando que o possuidor de um bem vendido em execução fiscal, mais propriamente de uma fracção destinada a habitação própria e permanente na qual vem habitando (como alega o recorrente), carece de legitimidade processual para requerer anulação e venda, carece de interesse directo em requerer tal anulação;
33-Trata-se, salvo o devido respeito, de uma interpretação simplista e redutora da questão da legitimidade pois o Tribunal "a quo" nem sequer leva em consideração que, no caso em análise, o recorrente requer a anulação de venda com base em causa de pedir complexa: não apenas com base na acção de reinvidicação (nulidade da venda por aplicação do regime de venda de coisa alheia - artº.892 do C. Civil), mas também enquanto interessado (artº.203 do CPC) na declaração de nulidades processuais que inquinam a venda (nulidade da venda por aplicação dos artºs.201 e 909, nº.1, c), do CPC, e artº.257, nº.1, c), do CPPT);
34-Porém, independentemente dessa "simplicidade", a interpretação do artº.26, acima referida afigura-se inconstitucional por violação dos artºs.13, 20, nºs.1 e 4 e 2, bem como do artº.65, todos da CRP, enquanto consagradores, respectivamente, do princípio da igualdade e do princípio da proibição do arbítrio, do princípio do acesso ao direito, à tutela jurisdicional efectiva e a um processo equitativo, e dos princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, corolários do princípio do estado de direito e ainda do direito à habitação e preservação - consubstanciando-se ainda manifestamente, chocante, à luz dos mais elementares princípios éticos dominantes;
35-A Douta Sentença recorrida violou e interpretou erradamente os artºs.257, do CPPT; 3-A, 26, 201, 203 e 909, nº.1, c), do CPC, 892, do C. Civil, 49, do ETAF e artºs. 13, 20, nºs.1 e 4 e 2, e 65, da CRP;
36-Deveria ter interpretado e aplicado o normativo legal violado por forma a considerar e declarar conforme anteriores conclusões 1 a 35, julgando o recorrente parte legítima nos presentes autos de incidente de anulação de venda e julgando, logo, verificadas as nulidades processuais ostensivamente documentadas nos autos;
37-Deverá ser revogada e substituída por outra que julgue em conformidade com a conclusão anterior.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.877 e 878 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.881 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.813 a 820 dos autos):
1-Por escritura de 23/10/1942, lavrada na Secretaria Notarial de Caldas Rainha -Segundo Cartório - ... e ... compraram a ... e mulher, ... , o prédio seguinte, do qual ficaram comproprietários, em partes iguais:
Terra de semeadura no sítio do Facho, freguesia da Foz do Arelho (...), a con­frontar do Norte e Sul com estrada, e nascente com ... , e do poente com estrada (...) inscrito na matriz predial rús­tica da freguesia de Serra do Bouro, sob o artigo 2629...» (cfr.escritura de fls.69 e segs. do I volume cujo conteúdo se dá por reproduzido);
2-Na data referida no número anterior, ... era casado com "... no regime da comunhão geral de bens (cfr.documento junto a fls.75 do 1º. volume cujo conteúdo se dá por reproduzido);
3-Na mesma data, ... era casado com ... tam­bém no regime da comunhão geral de bens (cfr.documento junto a fls.77 e 78 do 1º. volume cujo conteúdo se dá por reproduzido);
4-... morreu em 2/08/1947 (cfr.documento junto a fls.79 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
5-Sucederam-lhe, como seus únicos herdeiros legais:
... , cônjuge sobrevivo;
... , filho;
... , filho; e
... , filha (cfr.declarações do cabeça de casal a fls.86 verso do 1º. vol. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
6-O ... morreu em 14/06/1969 (cfr.documento junto a fls.89 do 1º. volume cujo conteúdo se dá por reproduzido);
7-Sucederam-lhe, como seus únicos herdeiros legais:
... , na qualidade de cônjuge sobrevivo;
... , filho;
... , filho (ora requerente), tudo como consta da escritura de habilitação a fls.92 e seg. dos autos cujo conteúdo se dá por reproduzido;
8-No âmbito do processo de imposto sucessório nº.14974 do Serviço de Finanças de Caldas da Rainha, instaurado por morte de ... , foi incluída a metade ilíquida e indivisa do prédio inscrito na matriz rús­tica com o artº.653 (cfr.documentos juntos a fls.98 e 99 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
9-Em 16/03/1988, através das apresentações 05/160388 e 06/160388, o prédio rús­tico sito no Facho, composto por terra de pousio e mato, com a área de 9020 m2, a confrontar do Norte com estrada, do Sul com ... , Nascen­te serventia, e Poente, estrada e herdeiros de ... , inscrito na matriz sob o artº.653 foi registado na Conservatória do Registo Predial de Caldas da Rainha, sob o nº.261/Foz do Arelho (cfr. documento junto a fls.105 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
10-Na mesma data e através daquelas apresentações, ficou inscrita a propriedade desse prédio da seguinte forma:
a)"Aquisição de 1/2 em comum e sem determinação de parte ou direito - a favor de ... , viúva, residente na Rua ... , n.° 47-1°, Esquerdo, em Caldas da Rainha; ... , casado com ... , no regime de separação, residente na Rua ... , n. 16-1°., em Caldas da Rainha; e ... , casado com ... e ... , no dito regime de bens, residente na referida Rua ... , n.° 16-2° - por dissolu­ção de comunhão conjugal por morte e sucessão de ... , casado com a citada ... , no regime da comunhão geral, residente em Caldas da Rainha;
b)"Aquisição de 1/2 em comum e sem determinação de parte ou direito - a favor de ... , casado com ... , no regime da separação, residente na Rua ... , n.° 66- 3°., direito, em Caldas da Rainha; ... , casado com ... , no regime da comunhão geral, residente na vila do Cadaval; e ... , casada com ... , no regime da comunhão geral, residente na Rua ... , n.° 3-3°, direito, em Lisboa - por sucessão de ... , divorciada, residente na dita Rua ... , nº.66, 2º., direito (cfr.tudo como consta de fls.105-verso cujo conteúdo se dá por reproduzi­do);
11-Por escritura celebrada em 9/01/1989 na Secretaria Notarial de Caldas da Rainha, o requerente, e os co-herdeiros ... e ... , compraram aos Herdeiros de ... a metade indivi­sa mencionada na alínea b) do número antecedente (cfr.documento junto a fls.110 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
12-Em 13/01/1989 registaram esta aquisição na Conservatória do Registo de Caldas da Rainha, através da ap.11/130189 (cfr.documento junto a fls.105-verso cujo conteúdo se dá por reproduzido);
13-Em 16/08/1994, o requerente, ... e ... outorgaram no 17º. Cartório Notarial de Lisboa, a escritura pública nos termos da qual os primeiros venderam a "... - Sociedade de Gestão Imobiliária", para revenda o referido artº.653 (cfr.documento junto a fls.113 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
a)Tal escritura contemplou várias cláusulas, entre as quais as relativas a pagamento faseado, que incluía a alínea c) nos termos da qual a ... entregava 36.000.000$00 através da transmissão para o requerente e para o seu irmão, ... , de um apartamento do tipo T-2 para cada um, no valor unitário de 18.000.000$00 (dezoito milhões de escudos), a serem construídos no empreendimento que aquela R. se pro­punha a construir no prédio objecto do contrato (cfr.documento junto a fls.113 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
14-Aquisição que a ... registou pela Ap.20/160595 (cfr.documento junto a fls.105-verso cujo con­teúdo se dá por reproduzido);
15-Por escritura de 5/2/2002, a ... vendeu a “... , Lda.” o referido artigo 653 (cfr.documento junto a fls.130 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
16-Através da garantia bancária n.°257396, de 5/1/1999, prestada em nome de “... Sociedade de Gestão Imobiliária, S.A.”, a favor de ... , ... e ... , o BES garantiu até ao montante de Esc.36.000.000$00 destinada a caucionar o bom pagamento, por parte da ... , de prestações vincendas de parte do preço contratado do ter­reno na Foz do Arelho (cfr.documento junto a fls.497 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
17-Através da garantia bancária nº.357/2001-S, a pedido da ... , o BPN garantiu perante ... e ... uma garantia bancária no montante máximo de Esc.55.000.000$00 destinada a garantir o cumprimento efectivo da obrigação de transmitir, livre de quaisquer ónus e encargos e no máximo até 30 de Setembro de 2003, a propriedade de dois fogos T3 à cota 40.00 metros, cuja construção será qualitativamente igual à dos demais fogos que integrem o empreendimento, fogos esses com a área unitária coberta de 119 m2, dotados, cada um, de um terraço de 15 m2, de um lugar de estacionamento e de uma arrecadação na cave, assim que os mesmos se encontrem concluídos (...) Esses fogos serão inse­ridos no empreendimento imobiliário que vai ser construído no prédio rústico (...) o artigo 653.» (cfr.documento junto a fls.498 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
18-No exercício da sua actividade, a ... , construiu no prédio artigo 653 um edifício para habitação, em regime de propriedade hori­zontal, composto por trinta e oito fracções autónomas de "A" a "AP" (cfr.documento junto a fls.135 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
19-A construção visou a comercialização das fracções;
20-Em 29/11/2004 foi emitido alvará de licença de utilização nº.411/04 (cfr.documento junto a fls.135 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
21-No âmbito do processo de execução fiscal nº.1384-2007/104480.0 e apensos, instaurada contra a sociedade “... , S.A.”, foi penho­rada em 29/10/2007 a fracção "AN" do U-1495/Foz do Arelho (cfr.documentos juntos a fls.355 e 356 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
a)Esta sociedade foi declarada insolvente por sentença de 6/10/2008 (cfr.documentos juntos a fls.531 e 619 e seg. cujo conteúdo se dá por reproduzido);
22-Foi nomeado depositário, no auto de penhora identificado no nº.21, o Sr. ... (cfr.documento junto a fls.355 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
23-O qual não tomou posse do imóvel, designadamente recebendo as respectivas chaves (cfr.documento junto a fls.491 e 492 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
24-A respectiva venda, marcada para o dia 7/5/2008, foi publicitada em dois anún­cios publicados na Gazeta das Caldas em 14/3/2008 e 21/3/2008 (cfr.documentos juntos a fls. 477 e 480 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
25-E em 14/3/2008 foi lavrada informação pelo funcionário do SF nos termos da qual foram afixados editais de igual teor nos locais designados por lei (cfr.documento junto a fls.496 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
26-No dia 7/05/2008 procedeu-se à venda por propostas em carta fechada da referida fracção "AN", tendo sido adjudicada a ... (cfr.documento junto a fls.357 a 359 cujo o conteúdo se dá por reproduzido);
27-Tal como consta do Auto de Abertura de Propostas e Adjudicação, e no que diz respeito à fracção "AN", foram proponentes “... Sociedade de Investimentos Imobiliários, Lda.”, ... e ... , que apresentou a maior oferta, não tendo havido reclamação nem prefe­rentes, pelo que a fracção "AN" foi adjudicada ao referido ... (cfr.documento junto a fls.357 a 359 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
28-Por Despacho do Chefe de Finanças de 15 de Maio de 2008, foram determinados o cancelamento e levantamento dos ónus e encargos, nomeadamente a Hipoteca Legal ao BPN e duas penhoras em nome da Fazenda Nacional (cfr.documento junto a fls.510 cujo con­teúdo se dá por reproduzido);
29-O aqui A. intentou em 1/9/2008 no Tribunal Judicial das Caldas da Rainha acção com processo sumário, que corre termos no 2º. Juízo daquele Tribunal com o nº. 2081/08.0TBCLD, contra "... Imobiliária, S.A.", ... , S.A., BPN -Banco Português de Negócios, S.A., ... e mulher ... e Estado Português, peticionando que o A. seja declarado como único e exclusivo pro­prietário da fracção "AN", que tal aquisição decorre de usucapião, sendo ainda declarada a ineficácia relativamente ao A. dos actos descritos no ponto 3 do pedido e ainda a inoponibilidade ao A. das inscrições na Conservatória do Registo Predial referidas em 4, ordenando-se o cancelamento das mesmas e que todos os RR. Sejam condenados a reconhecer o que vem pedido e a absterem-se da prática de quaisquer actos que perturbem a posse e o direito de propriedade do A. sob a referida fracção "AN" (documentos juntos a fls.532 a 586 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
30-Em 11/8/2008 o requerente foi notificado para restituir a posse com a conse­quente entrega da chave e comando de acesso às garagens referente à fração "AN" (cfr.documento junto a fls.326 e verso cujo conteúdo se dá por reproduzido);
31-Após reclamação deste, o despacho precedente foi revogado e substituído por outro, com o mesmo conteúdo e indicação dos meios de reacção contra o despa­cho (cfr.documento junto a fls.365 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou.
Os factos relativos à alegada posse do imóvel e propriedade, bem como os que poderiam sustentar o pedido reconvencional não foram objecto de pronúncia, por serem factos relativos a pedidos de que o tribunal não pode conhecer.
Com efeito, nos termos do artº.49° do ETAF aprovado pela Lei nº.13/2002, de 19 de Fevereiro, cabe aos tribunais tributários conhecer das ações de impugnação (dos actos de liquidação, dos actos de fixação de valores patrimoniais, dos actos praticados pela entidade competente nos processo de execução fiscal e dos actos administrativos respeitantes a questões fiscais), da impugnação das decisões de aplicação de coimas, das acções destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses em matéria fiscal, dos incidentes, embargos de terceiro, graduação de créditos, anulação da venda, oposições, etc.
A matéria relativa à declaração do direito de propriedade está subtraída à compe­tência material deste TAF, assim como está subtraída a matéria respeitante à declaração de ineficácia do registo a favor do adquirente, quer se funde no direito de propriedade, quer na posse.
É certo que no último caso, a posse poderia ter sido defendida com recurso a embargos de terceiro (Artº.167 CPPT), para o qual este TT seria competente, mas nesta fase tal ação é inviável, considerando ter sido vendido o seu objecto (Artº.353°/2 CPC).
Pelas mesmas razões que ficaram expostas, o dos factos relativos à causa de pedir que sustentam o pedido reconvencional formulado pelo adquirente também não foram apreciados.
Não obstante a decisão sobre a ilegitimidade do requerente, fixaram-se os factos que alegadamente conduziriam à anulação da venda, na perspectiva de várias soluções plausíveis da questão de direito (Artº.511/1 CPC)…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos nos «factos provados» com remissão para as folhas do processo onde se encontram…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
32-Na p.i. que originou os presentes autos, a qual foi intentada em 2/9/2008, que o autor e ora recorrente titula como incidente de anulação de venda, apresenta como fundamentos:
a) Que se verificaram diversas nulidades processuais que, sendo declaradas, determinam a anulação da venda efectuada, designadamente, a violação das regras relativas à nomeação de fiel depositário e ao exercício das respectivas funções, a violação das regras relativas à citação da executada e seus legais representantes, a violação das regras relativas à citação de credores com direito real de garantia, tal como a violação das regras atinentes à publicidade da venda;
b) que o requerente adquiriu o direito de propriedade sobre a fracção autónoma vendida, tanto com base na posse ininterrupta, pública, pacífica e de boa-fé do anterior prédio rústico, do respectivo solo e da consequente fracção autónoma depois de construída, como também na usucapião enquanto aquisição originária da propriedade da fracção vendida;
c) Que o requerente igualmente celebrou um contrato de permuta com eficácia real incidente sobre a fracção autónoma vendida na execução fiscal;
d) que instaurou acção de reinvindicação junto do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, a qual deve ser declarada causa prejudicial em relação aos presente autos;
e) E terminando a pedir:
-Que seja declarada a anulação da venda identificada no nº.26 do probatório;
-Que seja declarado o direito de propriedade sobre essa fracção, adquirido por usucapião;
-Que seja declarada a ineficácia face ao requerente da venda judicial efectuada e a consequente inoponibilidade do acto de registo predial da mesma fracção a favor do adquirente ... , tal como das penhoras efectuadas, devendo ser ordenado o seu levantamento;
-Que seja ordenado à Conservatória do Registo Predial o cancelamento da inscrição a favor do mesmo adquirente (cfr.data de entrada aposta a fls.3 dos presentes autos; conteúdo da p.i. junta a fls.371 a 426 dos presentes autos);
33-Tendo sido declarada a suspensão da presente instância até à decisão da acção identificada no nº.29 do probatório pelo T.A.F. de Leiria, foi tal decisão revogada por acórdão deste Tribunal, já transitado em julgado, a revogar a decisão da 1ª. Instância e a ordenar a apreciação do presente incidente (cfr.despacho exarado a fls.720 dos presentes autos; acórdão exarado a fls.785 a 797 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada uma dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou verificada a excepção de ilegitimidade do demandante e ora recorrente para a dedução do presente incidente de anulação de venda, mais determinando a absolvição dos demandados da instância.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que na petição inicial do presente incidente de anulação de venda, o mesmo radica a sua legitimidade, não apenas na propriedade que invoca mas também, no facto de ser possuidor da fracção vendida e credor da executada munido de direito de retenção sobre a fracção, estando tal qualidade comprovada por certidão judicial junta aos autos relativa ao proc. nº.2081/080TBCLD, do 2º. Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha (vide pedido subsidiário formulado na p.i.). Que nos termos do artº.668, nº.1, al.d), do C.P.C., (aplicável “ex vi” do artº.2, do C.P.P.T.), é nula a sentença quando "O Juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse conhecer". Que no caso em apreço, a sentença recorrida não se pronunciou relativamente às questões referentes à qualidade de possuidor e de titular de crédito garantido com direito de retenção sobre a fracção vendida invocadas pelo recorrente, nem sequer distingue a problemática da legitimidade em função dos dois tipos de causa de pedir que integram o incidente, as quais fundamentam e alicerçam a legitimidade processual, interesse em agir e utilidade da lide para o recorrente, pelo que se encontra inquinada de nulidade (cfr.conclusões 10 a 12 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar uma nulidade da sentença recorrida devido a omissão de pronúncia.
Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº. 133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, o que o recorrente alega é que o Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre a sua suscitada legitimidade activa para deduzir o presente incidente, enquanto possuidor da fracção vendida e credor da executada munido de direito de retenção sobre a mesma fracção.
Ora, conforme se retira do exame da decisão recorrida, principalmente do seu enquadramento jurídico (cfr.fls.812 a 822 dos presentes autos), o Tribunal “a quo” julgou procedente a excepção de ilegitimidade do recorrente para o presente incidente, dado não ser proprietário da fracção vendida, uma vez que essa qualidade não lhe está reconhecida judicialmente nem beneficia de presunção nesse sentido, decorrente de registo a seu favor, pelo que a utilidade jurídica da procedência da presente acção não será nenhuma para o autor, porquanto, decretada que fosse a eventual anulação da venda o imóvel regressaria à titularidade do executado, assim apenas lhe restando o eventual exercício dos direitos consignados no artº.910, do C.P.Civil (cfr.artº.840, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), em virtude da dedução de acção de reivindicação, mais considerando prejudicado o exame das restantes questões submetidas à apreciação do Tribunal, devido a incompetência material para o efeito (questões da competência da Jurisdição Comum). Pelo que, nos termos mencionados supra, quando o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por outro lado, como se conclui do exame da factualidade aditada ao probatório (cfr.nº.32 da matéria provada), o recorrente fundamenta a sua legitimidade para a dedução da presente acção na titularidade da propriedade da fracção autónoma vendida na execução fiscal, vector a que reconduz os pedidos formulados no final do final do articulado inicial.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, devendo improceder este fundamento do recurso.
O apelante aduz, igualmente, que se encontra junta aos autos certidão emitida pela Junta de Freguesia da Foz do Arelho que comprova nunca terem sido afixados na porta da sua sede quaisquer editais a publicitar a venda da fracção em causa nestes autos. Que não se percebe, assim, o critério do Tribunal "a quo", o qual:
a)Inclui no ponto 25 dos Factos Assentes: "em 14/03/2008 foi lavrada certidão pelo funcionário do SF nos termos da qual foram afixados editais de igual teor nos locais designados por lei (fls.496 cujo conteúdo se dá por reproduzido)";
b)Mas nada refere relativamente à certidão da Junta de Freguesia de Foz do Arelho que comprova que na sua sede não foram afixados editais referentes à venda que se pretende anular Que tal disparidade e omissão viola o artº.3-A, do C.P.C., constituindo, por si só, nulidade processual que aqui fica expressamente invocada, pois influi no exame e decisão da causa em manifesto desfavor do recorrente, tudo nos termos do artº.201, nº.1, do C.P.C. (cfr.conclusões 19 a 21 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, a existência de uma nulidade processual relativa ou secundária, dado que dependente de arguição, consistente na alegada e ilegal omissão do exame do teor de documento junto aos presentes autos (cfr.artºs.201, nº.1, e 202, do C.P.Civil; artºs.195 e 196, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
Abordando as nulidades processuais, dir-se-á que as mesmas consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.176; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.79).
As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
No entanto, o que o recorrente alega como nulidade processual não consubstancia qualquer desvio do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, antes pondo em causa o princípio da livre apreciação da prova pelo Tribunal “a quo”, concretamente no que diz respeito ao conteúdo de um documento, alegadamente junto ao processo (certidão da Junta de Freguesia de Foz do Arelho a comprovar a falta de afixação de editais relativos à venda que se pretende anular), mas que o apelante não identifica a página de tal junção aos autos. Este Tribunal, após minucioso exame, também não conseguiu localizar tal documento no processo.
Em conclusão, não nos encontramos perante qualquer nulidade processual. Por outro lado, igualmente não se evidencia dos autos qualquer violação do princípio da livre apreciação da prova pelo Tribunal “a quo”, supondo que estivéssemos perante documento autêntico cujo teor não fora apreciado na decisão recorrida (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil).
Finalizando, não existe qualquer nulidade processual relativa ou secundária, assim improcedendo o presente fundamento do recurso.
Defende, igualmente o recorrente que foram por si alegados os seguinte factos, não incluídos nos factos dados por assentes na sentença, mas essenciais para a boa decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito:
1-PONTO 23 DA PETIÇÃO INICIAL - Conforme consta, expressamente, de fls.328 e 329, o Serviço de Finanças de Leiria 1 foi formalmente informado pela executada de que os imóveis penhorados se encontravam onerados com direito de retenção decorrente da tradição e correspondente posse dos imóveis, ao abrigo de negócio jurídico com aquela firmado;
2-PONTO 24 DA PETIÇÃO INICIAL - O requerente é um desses credores.
Que os concretos meios probatórios que impunham que o Tribunal aditasse o teor daqueles pontos 23 e 24 aos factos assentes se consubstanciam no teor de fls.328 e 329 do PEF, tal como na ordem de entrega de fracção dirigida pela AT ao recorrente, que consta igualmente do PEF, e, ainda, na certidão judicial relativa ao processo identificado na alínea 21 a. dos factos assentes, nos termos da qual consta que, a título subsidiário, o recorrente aduz direito de crédito contra a executada e invoca direito de retenção sobre a fracção vendida, tudo relevante para adequada decisão relativamente à questão da legitimidade processual do recorrente. Que o facto 29 da matéria de facto assente foi incorrectamente julgado, visto ter sido omitida a indicação de todos os pedidos formulados pelo recorrente no proc. nº.2081/2008, do 2º. Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha. Que contrariamente ao que se afirma na sentença recorrida, a acção instaurada pelo recorrente, que corre termos sob o nº. 2081/2008, no 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, não consiste numa mera acção de reivindicação, nem o pedido ali formulado se limita ao que é descrito no ponto 29 da matéria de facto dada por assente na sentença. Que deverá, por isso, ser transcrito o teor integral desse pedido no referido ponto 29, e não apenas a primeira parte do mesmo, como se encontra plasmado na sentença recorrida, transcrevendo-se nesse ponto a totalidade do pedido formulado pelo recorrente, e não só a parte da reivindicação, do teor indicado em sede de fundamentação. Que o concreto meio probatório que impunha a transcrição integral do pedido atrás referido consiste na certidão judicial de petição inicial do processo nº.2081/2008, do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, que se encontra junta aos autos.
Que, analogamente, devem ser aditados novos pontos à matéria de facto assente, dos quais conste o seguinte:
a) Que se encontra junta aos autos fotocópia autenticada de certidão emitida pela Junta de Freguesia de Foz do Arelho em 25/08/2008;
b) Que o teor desta certidão é o seguinte: “Com referência ao processo de execução fiscal nº.1384200701044800, não deu entrada nesta Junta de Freguesia qualquer documentação relacionada com o processo acima citado, motivo pelo qual, como é óbvio, não foi afixado qualquer edital" (cfr.conclusões 13 a 17 e 22 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
No caso concreto, quanto ao teor da certidão emitida pela Junta de Freguesia de Foz do Arelho em 25/08/2008, não se encontrando este documento junto aos autos, não pode este Tribunal apreciar o seu conteúdo, nem podia o Tribunal “a quo” considerar o mesmo, tudo conforme já mencionado acima.
Já quanto à alegada factualidade constante dos artigos 23 e 24 do articulado inicial, desde logo se dirá que a informação mencionada pelo apelante se encontra, supomos, junta a fls.491 e 492 dos presentes autos. De tal documento, datado de 24/7/2008 e, portanto, posterior à data da venda (cfr.7/05/2008 - nº.26 do probatório), retira-se que as fracções objecto de venda estariam na posse de promitentes compradores, sendo um deles o ora recorrente. Esta factualidade reveste natureza conclusiva e não tem qualquer relevo para a decisão da causa. Por último, quanto ao nº.29 da matéria de facto assente e a alegada omissão na indicação de todos os pedidos formulados pelo recorrente no processo nº.2081/2008, do 2º. Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha. Tal omissão não se verifica porque o conteúdo do articulado inicial de tal acção se dá por reproduzido no mesmo número do probatório. Apesar disso e por outro lado, tal factualidade não tem qualquer relevo para a decisão da causa (incompetência em razão da matéria desta Jurisdição), conforme bem refere o Tribunal “a quo” na fundamentação da factualidade não provada e acima exarada.
Pelo que não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso, mais se confirmando a decisão do Tribunal “a quo” neste segmento.
Mais alega o recorrente que a sua legitimidade e interesse em intervir nos presentes autos advêm da circunstância do requerente ser directamente visado pela administração fiscal neste processo e de, nessa sequência, se encontrar pessoal e patrimonialmente afectado por todos os actos que aqui foram praticados e omitidos. Que o recorrente se deparou com a venda já realizada, pelo que não podia já lançar mão do incidente de embargos de terceiro para defender a sua posse. Que lhe restou, por isso, como meio de defender os direitos que invoca, o incidente de anulação de venda a que correspondem os presentes autos. Que anulada a venda, anular-se-á, igualmente, a consequente ordem de entrega da fracção e poderá, nessa altura, o recorrente defender a sua posse através desses embargos, reclamar o crédito que invoca (subsidiariamente) estar garantido com direito de retenção sobre a fracção vendida, ou utilizar outras formas processuais que julgue aplicáveis ao caso. Que o teor dos pedidos formulados no âmbito da p.i. do processo nº.2081/2008, o qual corre termos no 2º. Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, comprova a qualidade do recorrente como credor da executada, munido de direito de retenção, sendo igualmente relevante para se aferir e julgar devidamente sobre a questão da legitimidade processual daquele e aferir, em pleno, da utilidade que retiraria da anulação da venda. Que nos presentes autos temos dois tipos de causas de pedir para efeitos de anulação de venda:
a)Nulidade processual que influi na venda (artºs.257, nº.1, c), do CPPT, artºs.201, 203 e 909, nº.1, c), do CPC);
b)Nulidade da venda derivada da aplicação do regime da venda de coisa alheia (artº.892, do C.Civil).
Que não se aceita o teor da sentença recorrida, que não reconhece a manifesta utilidade dos presentes autos para o recorrente, relativamente aos dois tipos de causa de pedir invocados para efeitos de anulação de venda. Que o Tribunal "a quo" interpreta o artº.26, do C.P.C., considerando que o possuidor de um bem vendido em execução fiscal, mais propriamente de uma fracção destinada a habitação própria e permanente na qual vem habitando (como alega o recorrente), carece de legitimidade processual para requerer a anulação da venda, carece de interesse directo em requerer tal anulação. Que se trata de uma interpretação simplista e redutora da questão da legitimidade pois o Tribunal "a quo" nem sequer leva em consideração que, no caso em análise, o recorrente requer a anulação de venda com base em causa de pedir complexa: não apenas com base na acção de reinvidicação (nulidade da venda por aplicação do regime de venda de coisa alheia - artº.892, do C.Civil), mas também enquanto interessado (artº.203, do C.P.C.) na declaração de nulidades processuais que inquinam a venda, por aplicação dos artºs.201 e 909, nº.1, al.c), do C.P.C., e artº.257, nº.1, al.c), do C.P.P.T. (cfr.conclusões 2 a 6, 18, 24 e 31 a 33 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supomos, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
O regime de anulação da venda em processo tributário encontra-se previsto no artº.257, do C.P.P.Tributário (cfr.artº.328, do anterior C.P.Tributário), preceito que deve ser conjugado com os artºs.908 e 909, do C.P.Civil (cfr.artºs.838 e 839, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), onde se encontram enunciadas as causas de anulação.
A legitimidade das partes (“legitimatio ad causam”) é, simultaneamente, um dos temas mais versados e controvertidos da moderna disciplina processualista. Para isso contribuirá, não só, o facto de o recorte teórico de tal figura ser consequência de algumas opções fundamentais quanto à essência e função do direito processual, como também, o notável grau de interdependência da mesma face a outros conceitos e institutos processuais (v.g. direito de acção judicial; objecto do processo).
Na nossa ordem jurídica, a legitimidade é o pressuposto processual que, traduzindo uma correcta ligação entre as partes e o objecto da causa, as faculta para a gestão do processo. Como regra (legitimidade directa), serão partes legítimas os titulares da relação material controvertida (cfr.artº.30, nº.3, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário; artº.9, do C.P.P.Tributário), assim se assegurando a coincidência entre os sujeitos que, em nome próprio, intervêm no processo e aqueles em cuja esfera jurídica a decisão judicial vai directamente produzir a sua eficácia. Da análise do artº.30, nº.3, do C.P.Civil, conclui-se que o critério supletivo de aferição da legitimidade processual se deve basear no interesse em demandar ou contradizer, face ao objecto inicial do processo, individualizado pela relação material controvertida tal como o A. a configura (cfr.ac.S.T.J., 30/10/84, B.M.J. 340, pág. 334).
Se qualquer das partes carecer de legitimidade o Tribunal deve abster-se de conhecer do mérito da causa e absolver o réu da instância (cfr.artºs.278, nº.1, al.d), 576, nº.2, e 577, al.e), todos do C.P.Civil, aplicáveis “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.106; Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.83 a 86; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª.edição, Coimbra Editora, 1985, pág.128 e seg.), sendo tal excepção dilatória de conhecimento oficioso (cfr.artº.578, do C.P.Civil).
No que directamente diz respeito ao processo de execução tributária, regem as normas constantes dos artºs.153 e seg., do C.P.P.Tributário (cfr.artº.238 e seg., do anterior C.P.Tributário).
Por último, refira-se que a legitimidade das partes deve ser determinada de acordo com a lei vigente no momento em que é proferida a decisão sobre a mesma (cfr.ac.S.T.J., 14/11/94, C.J.-S.T.J., 1994, tomo III, pág.137 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2012, proc.5948/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).
A legitimidade activa para requerer a anulação da venda depende do fundamento (causa de pedir) que servir de base ao pedido.
Voltando ao caso dos autos, atentos os fundamentos invocados pelo recorrente no final da p.i. que originou o presente processo (cfr.nº.32 do probatório), deve averiguar-se da sua pretensa legitimidade para deduzir o presente incidente, face a cada uma das causas de pedir que estrutura.
Começando pela causa de pedir que se consubstancia na alegada existência de nulidades processuais que afectam a própria venda (cfr.artº.257, nº.1, al.c), do C.P.P.T., artº.195 e 839, nº.1, al.c), do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6).
A anulação da venda nos termos do artº.195, do C.P.Civil, depende de ter ocorrido, relativamente ao acto de venda ou aos actos preparatórios a ela respeitantes, qualquer omissão de acto ou formalidade prescrita na lei, desde que a irregularidade possa ter influência na venda (cfr.artº.195, nº.1, do C.P.Civil). Estão nestas condições, por exemplo, as irregularidades relativas à publicidade da venda, designadamente as que respeitam ao tempo e locais de afixação de editais, à publicação de anúncios e seu conteúdo e as relativas às notificações das pessoas que devem ser intimadas para a venda. Porém, mesmo nestes casos, a anulação da venda só deve ser decretada se, no circunstancialismo em que ocorreram as irregularidades, se puder afirmar a sua susceptibilidade para influenciar a venda, como decorre da parte final do citado artº.195, nº.1, do C.P.Civil. Pode, assim, fundamentar tal anulação, quer um vício que atinja directamente a venda, quer uma pecha que atinja acto anterior de que a venda dependa absolutamente, nos termos do artº.195, nºs.1 e 2, do C.P.Civil (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/7/2010, rec.316/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.282/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/2/2013, proc.4865/11; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.186; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.181 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, Almedina, 13ª. edição, 2010, pág.407).
Contudo, somente têm legitimidade para deduzir o incidente de anulação de venda devido a omissão de acto ou formalidade prescrita na lei, nos termos do artº.195, do C.P.Civil, as partes no processo de execução fiscal, seja o executado, o exequente ou os credores reclamantes, porquanto só estes detêm interesse na arguição de nulidades processuais que interfiram no desfecho da mesma venda executiva, que não um terceiro como é o recorrente face ao processo de execução fiscal nº.1384-2007/104480.0 e apensos, o qual corre seus termos no 1º. Serviço de Finanças de Leiria. Nestes termos, quanto a este fundamento de anulação de venda deve julgar-se o recorrente parte ilegítima e confirmar a decisão do Tribunal “a quo”.
Passemos ao fundamento de anulação de venda que se consubstancia na existência de acção de reinvidicação (nulidade da venda por aplicação do regime de venda de coisa alheia - artº.892, do C.Civil), tudo nos termos dos artºs.839, nº.1, al.d), e 840, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6.
Ora, também neste caso o terceiro alegadamente dono da coisa vendida somente tem legitimidade para intervir na execução fiscal através da dedução de embargos de terceiro, conforme reconhece o próprio recorrente, isto em momento anterior à realização da venda (cfr.artº.344, do C.P.Civil; artº.167, do C.P.P.T.). Depois da venda efectuada, como é o caso dos presentes autos (cfr.nºs.26 a 32 do probatório), o terceiro carece de legitimidade para deduzir um incidente de anulação de venda, tendo antes à sua disposição a acção de reivindicação (cfr.artº.1311, do C.Civil), acção esta a propor em separado, na jurisdição comum e sem dependência do processo executivo. Tendo ganho de causa neste acção de reivindicação, está o terceiro legitimado para requerer a declaração de ineficácia da venda efectuada em processo de execução fiscal, perdendo o comprador o direito ao bem que adquirira, sem prejuízo de ter sempre o direito a haver o preço que pagou, a restituir por aqueles a quem tiver sido atribuído, nomeadamente o exequente (cfr.artº.825, nº.1, do C.Civil; artº.840, do C.P.Civil; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.183, 184 e 193; Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, Almedina, 13ª. edição, 2010, pág.409 e seg.). Concluindo, também neste caso o terceiro reivindicante somente tem legitimidade para intervir no processo de execução quando se encontrar munido de decisão judicial que julgue procedente a dita acção de reivindicação. Até lá, carece de legitimidade para intervir na execução, nomeadamente para requerer a anulação da venda.
É esta a situação do apelante no âmbito dos presentes autos. Não deduziu, em tempo, embargos de terceiro, como ele próprio reconhece, e também ainda não se encontra munido de título judicial a reconhecer a alegada propriedade incidente sobre a fracção autónoma vendida no âmbito do processo de execução fiscal nº.1384-2007/104480.0 e apensos, pelo que carece de legitimidade para neste intervir para deduzir o presente incidente de anulação de venda, tudo conforme já decidido em 1ª. Instância.
Por último, refira-se que o direito de retenção sobre coisa imóvel, também chamado à colação pelo recorrente, caduca com a venda em execução fiscal, sendo que o direito de preferência no pagamento que a mesma garantia real atribui ao seu titular se transfere para o produto da venda (cfr.artº.824, nºs.2 e 3, do C.Civil; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/1/2010, rec.802/09; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.94 e seg.).
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se parte ilegítima para intervir no presente processo o ora apelante e improcedente o presente esteio do recurso.
Finalmente, o recorrente alega que a interpretação do artº.26, do C.P.Civil (cfr.actual artº.30, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6) efectuada pelo Tribunal “a quo” se afigura inconstitucional por violação dos artºs.13, 20, nºs.1 e 4 e 2, bem como do artº.65, todos da CRP, enquanto consagradores, respectivamente, do princípio da igualdade e do princípio da proibição do arbítrio, do princípio do acesso ao direito, à tutela jurisdicional efectiva e a um processo equitativo, e dos princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, corolários do princípio do estado de direito e ainda do direito à habitação e preservação - consubstanciando-se ainda manifestamente, chocante, à luz dos mais elementares princípios éticos dominantes (cfr.conclusão 34 do recurso). Com base em tais alegações pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos.
Encontramo-nos perante alegados vícios de inconstitucionalidade material e que buscam uma fiscalização concreta e com características oficiosas (cfr.artºs.204 e 280, nº.1, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.940 e seg.). No entanto, o que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efectuadas por aquelas decisões (cfr.artº.204, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.518 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/4/2006, proc.64561/96; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/1/2011, proc.4401/10; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 5/6/2012, proc.5445/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc. 7164/13).
O recorrente não consubstancia em que pode a interpretação efectuada pela decisão recorrida, do artº.30, do C.P.Civil, violar os princípios constitucionais que chama à liça. Este Tribunal também não vislumbra tais alegadas violações.
Por último, refira-se que a decisão recorrida não viola qualquer dos preceitos a que alude o apelante, ou seja os artºs.257, do C.P.P.T., 3-A, 26, 201, 203 e 909, nº.1, al.c), do C.P.C., 892, do C.Civil, 49, do E.T.A.F., e artºs.13, 20, nºs.1 e 4 e 2, e 65, da C.R.P.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 30 de Janeiro de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)

Declaração de voto de vencido


Concederia provimento ao recurso por considerar que invocando o reclamante um direito de retenção, que constitui um direito real de garantia, não é terceiro imas verdadeira parte no processo de execução (assim ac. deste TCAS de 23-05-21, rec. n.° 04647/11), pelo que deveria ter sido chamado a este. E alegando que a citação dos credores com garantia real padece de irregularidade - designadamente não terem sido afixados os editais da praxe, tendo até junto um documento para prova desse facto alegado, irregularidade que constituem um vício próprio da execução, que integra uma nulidade nos termos do art.° 201.°, n.° 1, do CPC (na redacção então vigente), tem legitimidade para a arguir, nos termos do art.° 201.° e ss. do CPC (actuais art° 195.° e ss. do mesmo diploma), mesmo que já tenha ocorrido a venda, dado que a procedência dessa nulidade determinação a anulação dos actos subsequentes ao acto inquinado. É, por isso, irrelevante que não tenha deduzido/embargos de terceiro.