Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1493/18.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/14/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:FIEL DEPOSITÁRIO
REMOÇÃO DO CARGO
Sumário:I - A remoção do cargo de fiel depositário pode constituir acto lesivo dos direitos e interesses daquele que foi nomeado para esse cargo.

II - Apesar da escolha do fiel depositário pelo funcionário poder recair sobre o executado, este não tem direito a ser nomeado quando o bem penhorado seja um veículo automóvel.

III - O interesse do executado na guarda e conservação do bem penhorado está garantido pelo conteúdo funcional do cargo de fiel depositário e pela responsabilidade que a lei lhe assaca pelo incumprimento dos seus deveres.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

C….., melhor identificado nos autos, apresentou reclamação, nos termos do artigo 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), do acto do órgão da execução fiscal que, no âmbito do processo de execução fiscal nº n.º 159……, contra si instaurado, ordenou a sua remoção enquanto fiel depositário de veículo automóvel penhorado.

Foi proferida sentença pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na qual se considerou que “a decisão contra a qual o Reclamante se insurge não afecta direitos e interesses legítimos do executado” e, consequentemente, foi julgada “improcedente, por não provada, a presente reclamação.”

Inconformado com o decidido, o Reclamante interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, formulando as seguintes conclusões:

A. Vem o Recorrente, nos termos e para os efeitos do Art. 283.º do CPPT, apresentar as suas alegações.

B. O Recorrente apresentou reclamação nos termos do Art. 276.º do CPPT do despacho que determinou a sua remoção do cargo de depositário, no âmbito da execução fiscal n.º 159……. .

C. Entendeu o Tribunal a quo que reclamação havia de improceder, porquanto o ato reclamado não é reclamável, por não se configurar como um ato lesivo, falecendo um dos pressupostos da reclamação previsto no Art. 276.o do CPPT,

D. mais julgando que a decisão contra a qual o Reclamante se insurge não afeta direitos e interesses legítimos do executado.

E. O Recorrente não se conforma com a presente decisão, porquanto a decisão não só afeta os seus direitos legítimos como os de terceiros.

F. No que concerne aos direitos de terceiro, é certo que o mesmo apresentou Embargos por ter adquirido legitimamente o veículo em crise nos autos, sendo que a nomeação de um estranho ao processo como fiel depositário põe em crise o seu direito de propriedade e de posse.

G. Ao ser destituído o fiel depositário, pessoa em quem o terceiro confia, e alterando-se a posse efetiva do veículo, há um claro prejuízo quer para o Executado Recorrente, quer para o terceiro, já que não só vê um estranho tomar posse do seu veículo, como existirão ainda custos para o processo, e necessariamente para o Executado Recorrente, que este não pode suportar.

H. No que concerne ao Executado Recorrente, a remoção do cargo de fiel depositário constitui um ato lesivo já que, tal remoção, tem consequências negativas na sua esfera, uma vez que o depositário pode ver lesado o seu património, na medida em que pode ser executado, podendo ainda ser responsabilizado ao nível criminal, pela prática de um crime de abuso de confiança qualificada e desobediência, nos temos conjugados dos Arts. 233.º, a) do CPPT, 771.º, n.º 2 do CPC e 384.º do Código Penal,

I. Pelo que entende o Recorrente que existe um interesse específico do Executado na guarda e conservação do bem penhorado, que sendo o Executado nomeado fiel depositário de um veículo automóvel, penhorado no âmbito de um processo de execução fiscal, pois tal remoção poderá lesar o seu direito de posse, bem como o interesse legítimo na guarda e conservação do bem, com repercussão na sua valorização.

J. Neste sentido, veja-se o Acórdão do STA proferido em 17/09/2014 no âmbito do processo 0892/14.

K. Face ao exposto, deve ser a reclamação aceite, porquanto a remoção de cargo de fiel depositário é-lhe extremamente prejudicial e lesiva dos seus direitos,

L. sendo que tal destituição apenas ocorreu por não ter tomado conhecimento das notificações remetidas pela AT, já que estas foram enviadas por meio eletrónico através da plataforma Via CTT.

M. Assim, deve a Reclamação ser aceite, devendo o Executado manter o cargo de fiel depositário do veículo penhorado à ordem dos autos.

Termos em que se requer seja dado provimento ao presente Recurso, devendo a decisão recorrida ser revogada, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer onde concluiu no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.


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Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, é a seguinte a questão a apreciar e decidir: saber se a sentença recorrida errou ao considerar que não pode proceder a reclamação deduzida pelo executado contra o despacho através do qual foi removido do cargo de fiel depositário de um veículo automóvel que foi penhorado no âmbito da execução fiscal; em concreto, importa saber se, in casu, a decisão de remoção do depositário constitui um acto lesivo dos direitos ou interesses legítimos do executado.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

1) No serviço de Finanças de Vila Franca de Xira-1, corre termos o processo de execução fiscal n.º 159…… e aps. contra o aqui reclamante, por dívidas de coimas e encargos com processos de contra-ordenação, no valor total de €2.647,14 (cfr. processo instrutor apenso);

2) Em 18/08/2017 foi efectuada a penhora do veículo, de marca mini, com a matrícula 94-…-49 (cfr. processo instrutor apenso);

3) Através do ofício n.º 41…, datado de 13/09/2017, registado com aviso de recepção foi o Reclamante notificado em 15/09/2017, da penhora referido no ponto anterior e da nomeação de fiel depositário (cfr. processo instrutor apenso);

4) Em 17/10/2017 foi expedida notificação para o domicilio do Reclamante para este no prazo de 10 dias proceder à entrega do livrete e título de registo de propriedade ou documento único automóvel e prestar informação sobre a localização do bem, sob pela de se solicitar a intervenção policial e sem prejuízo do procedimento criminal, a qual foi revolvida ao remetente (cfr. processo instrutor apenso);

5) Em 23/11/ 2017 foi a notificação de pedido de documentos do veículo penhorado entregue na caixa electrónica do Reclamante (cfr. Doc. n.º 1 da contestação);

6) Em 29/12/2017 foi enviada e entregue ao Reclamante, viaCTT, notificação para audição prévia do Reclamante, nos termos do n.º 3, do artigo 3.º e n.º 2 do artigo 761.º do Código de Processo Civil, da intenção do órgão de Execução Fiscal proceder à remoção do cargo de depositário (cfr. processo instrutor apenso);

7) Por despacho de 31/01/2018 do Chefe de Finanças de Vila Franca de Xira-1 foi determinado a remoção do Reclamante do cargo de depositário com fundamento em violação dos deveres que lhe incumbiam (cfr. processo instrutor apenso);

8) Em 31/01/2018 foi nomeado o contribuinte com a identificação fiscal n.º 206…… para depositário da penhora n.º 41…. de 2017 (cfr. tramitação do PEF);

9) Em 22/02/2018 foi enviada e entregue, via CTT, notificação ao Reclamante da sua destituição do cargo de depositário (cfr. processo instrutor apenso);

10) R……. deduziu embargos de terceiro contra a penhora do veículo automóvel, marca mini, matrícula 94-…-49, que corre termos com o n.º 2167/17.0BELRS no Tribunal Tributário de Lisboa (cfr. Doc. n.º 1 da p.i. e sitaf);

11) A presente reclamação foi remetida por correio registado ao Serviço de Finanças em 05/03/2018, onde deu entrada em 06/03/2018 (cfr. carimbo e envelope).

Factos não Provados

Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.

Motivação

O Tribunal formou a sua convicção com base nos documentos indicados relativamente a cada um dos factos, os quais não foram impugnados”.


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2.2. De direito

Deixámos já apontada a questão a decidir neste recurso jurisdicional.

Comecemos por deixar esclarecido que, no entendimento deste Tribunal não se coloca em causa que “a remoção do cargo de fiel depositário pode constituir acto lesivo dos direitos e interesses daquele que foi nomeado para esse cargo. Desde logo, porque dessa remoção, se motivada pelo incumprimento das obrigações que a lei faz recair sobre o depositário, designadamente pela falta injustificada de apresentação dos bens, podem advir-lhe consequências negativas sobre a sua esfera jurídica, quer a nível patrimonial, com a possibilidade de ser executado por uma importância equivalente ao valor dos bens depositados [cfr. art. 854.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC) e art. 233.º, alínea a), do CPPT], quer a nível criminal, podendo ser responsabilizado pela prática de um crime de abuso de confiança qualificado ou de desobediência [cfr. arts. 205.º, n.ºs 1 e 2, e 348.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal]” – cfr. neste sentido, os acórdão do STA de 14/08/13 e de 17/09/14, proferidos nos processos nºs 01279/13 e 0892/14, respectivamente.

Feito este esclarecimento inicial, importa prosseguir.

No caso, se atentarmos na p.i, percebemos que aí vinha alegado, em síntese útil, o seguinte: não só o Reclamante/ fiel depositário não incumpriu o seu dever de apresentação do bem, pois para tal não foi notificado, como lhe foi vedada a possibilidade de contradizer a tomada de decisão da sua remoção do cargo de fiel depositário, pois para tal não foi também notificado; alegou, ainda, que não faz qualquer sentido que seja nomeado um terceiro totalmente estranho ao bem, em substituição de executado, sendo que, no caso, deveria ter sido nomeado R……, por ser o real proprietário do bem à data, em virtude de o ter pago, na íntegra, à entidade financeira o veículo penhorado.

Ora, o TT de Lisboa, apreciando, desde logo, as questões suscitadas em consequência das apontadas omissões de notificações, veio a considerar que:

“(…) Vejamos, então, se nos autos se provou a efectivação da notificação que determinou em face da ausência de resposta do Reclamante a remoção de depositário do Reclamante, por incumprimento de um dos deveres do cargo do depositário, e da notificação para exercício do direito de audição prévia.

Conforme resulta da matéria de facto dada como assente, o Reclamante foi notificado, não só para proceder à entrega dos documentos do veículo e informar do paradeiro do mesmo, como também para exercer o direito de audição prévia, através do mesmo meio pelo qual foi notificado do despacho que determinou a sua remoção do cargo de depositário.

Sendo certo que, notificado nos presentes autos para se pronunciar sobre a matéria de excepção, nenhuma referência fez a esta questão que foi tratada na contestação sobre a epígrafe “Do factos”, sendo certo que a Fazenda Pública suscitou, igualmente, a falta de lesividade da decisão de remoção do cargo de depositário.

O n.º 9 do artigo 38.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), preceitua: as notificações referidas no presente artigo, bem como as efectuadas nos processos de execução fiscal, podem ser efectuadas por transmissão electrónica de dados, que equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal registada ou por via postal registada com aviso de recepção.

Importa ainda ter presente o estipulado no artigo 39.º, n.ºs 9 e 10 do CPPT:

9. As notificações efectuadas por transmissão electrónica de dados consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal electrónica.

10. A notificação considera-se efectuada no 25.º dia posterior ao seu envio, caso o contribuinte não aceda à caixa postal electrónica em data anterior.

Ora, as notificações por transmissão electrónica constituem uma modalidade válida legal e consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal electrónica, e caso não aceda à caixa postal electrónica em data anterior, a notificação presume-se efectuada no 25.º dia posterior ao envio.

Assim, a Administração Tributária tem a seu favor a presunção legal de recebimento, pelo que escusa de provar o facto que a ela conduz (artigo 350.º, n.º 1 do Código Civil).

Esta presunção legal de recebimento da notificação só pode ser ilidida quando se comprove que o contribuinte comunicou a alteração da caixa electrónica nos termos do artigo 43.º do CPPT, ou que lhe foi impossível essa comunicação, o que não sucedeu no caso dos autos.

O Reclamante, nem na p.i., nem após a notificação da contestação, alegou factos com aptidão para ilidir a presunção legal das identificadas notificações.

Deste modo, impõe-se concluir que foi validamente notificado, quer para apresentar os documentos da viatura, quer para exercício do direito de audição prévia.”

Ora, contra o assim decidido o Recorrente não se insurge neste recurso jurisdicional.

Vejamos.

Por um lado, como se vê, não vem impugnada a matéria de facto, pelo que a mesma estabilizou-se tal como resulta fixada em 1ª instância. Por outro lado, quanto à conclusão retirada relativamente à efectivação das apontadas notificações, também isso não suscitou a discordância do Recorrente, o qual se limitou (cfr. conclusão L) a afirmar que não tomou conhecimento das notificações remetidas pela AT, “já que estas foram enviadas por meio electrónico através da plataforma via CTT” e, segundo diz, “certamente compreenderá o douto Tribunal que, sendo as notificações recebidas no via CTT tão escassas, é fácil de descurar uma visita ao site com regularidade” (cfr. ponto 15º do corpo das alegações de recurso).

Quer isto dizer que, embora o Recorrente afirme que não tomou conhecimento do teor das notificações, pois não acedeu ao site do via CTT, não põe em causa que as mesmas tenham sido efectuadas, tal como decidido pela Mma. Juíza a quo.

Portanto, reiterando o que antes dissemos, há que concluir que o decidido pelo Tribunal recorrido, quanto à validade das notificações dirigidas ao fiel depositário/executado, não vem minimamente posto em causa.

Importa, então, prosseguir para sabermos se remoção do executado como fiel depositário do veículo automóvel penhorado e a nomeação de um terceiro estranho ao processo, lesa os direitos daquele e, bem assim, os do terceiro, R……, por ser o real proprietário do bem à data. É que, salienta o Recorrente, “Ao ser destituído o fiel depositário, pessoa em quem o terceiro confia, e alterando-se a posse efetiva do veículo, há um claro prejuízo quer para o Executado Recorrente, quer para o terceiro, já que não só vê um estranho tomar posse do seu veículo, como existirão ainda custos para o processo, e necessariamente para o Executado Recorrente, que este não pode suportar”. Para além do mais, “tal remoção poderá lesar o seu direito de posse, bem como o interesse legítimo na guarda e conservação do bem, com repercussão na sua valorização”.

Vejamos, antes do mais e resumidamente, o discurso alinhado na sentença sobre esta questão. Aí se lê o seguinte:

“(…)

Diga-se, desde já, que a nosso ver, tal despacho, com os contornos que nos foram presentes, não é susceptível de afectar direitos.

Efectivamente, o depositário tem os deveres indicados no artigo 1187.º do Código Civil de acordo com o estatuído no artigo 760.º do Código de Processo Civil, designadamente, guardar a coisa depositada, avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do depositante e restituir a coisa e administrar os bens com a diligência e zelo de um bom pai de família.

O não cumprimento dos deveres consagrados na lei pode justificar, ao abrigo do disposto nos artigos 761.º, n.º 1 do CPC e 233º, alínea b) do CPPT, a remoção do depositário do cargo pelo órgão de execução fiscal.

Assim sendo, o interesse do executado na guarda e conservação do bem penhorado está garantido pelo conteúdo funcional do cargo de depositário, não tendo qualquer relevância o facto de o novo depositário ser um «estranho ao bem».

Face ao exposto, não estando demonstrando nos autos que o executado reúne condições para a sua manutenção como depositário, nem que o que o substituiu no exercício do cargo não as reúne, impõe-se concluir que a decisão de remoção do cargo de depositário não constitui acto lesivo de qualquer direito ou interesse legítimo do interessado.

(…)”

Em apoio do entendimento seguido na sentença, foi convocada jurisprudência do STA, concretamente o acórdão já citado de 14/08/13.

É este acórdão que também aqui convocamos, pois naquilo que está em causa no presente recurso jurisdicional é aqui, com as adaptações necessárias, inteiramente aplicável. Em tal aresto se deixou dito o seguinte:

“(…) Desde logo, cumpre ter presente que o executado não tem o direito de ser nomeado fiel depositário. Vejamos:

Nos termos do disposto no art. 221.º, alíneas a) e b) do CPPT (O art. 221.º do CPPT dispõe:

«Na penhora de móveis observar-se-á designadamente o seguinte:

a) Os bens serão efectivamente apreendidos e entregues a um depositário idóneo, salvo se puderem ser removidos, sem inconveniente, para os serviços ou para qualquer depósito público;

b) O depositário é escolhido pelo funcionário, podendo a escolha recair no executado; (…), a penhora de bens móveis efectiva-se por apreensão efectiva do bem penhorado e, em face da inexistência de depósito público para o qual possa ser removido o veículo automóvel penhorado, o mesmo deverá ser entregue a um depositário, da escolha do funcionário, podendo a escolha recair no executado.

Relativamente aos veículos automóveis, porque o CPPT, para além do disposto no art. 230.º do CPPT (O art. 230.º do CPPT dispõe:

«1 - Quando a penhora de móveis estiver sujeita a registo, será este imediatamente requerido pelo órgão da execução fiscal, aplicando-se o n.º 4 do artigo 195.º.

2 - O serviço competente efectuará o registo no prazo de 15 dias e, dentro deste prazo, remeterá o respectivo certificado e a certidão de ónus, a fim de serem juntos ao processo.

3 - A penhora prevista neste artigo também pode ser realizada por comunicação electrónica à conservatória competente, nos termos previstos no Código de Processo Civil».), nada mais prevê, é de considerar subsidiariamente aplicável o disposto no art. 851.º, n.ºs 2 e 3, do CPC (Dizem os n.ºs 2 e 3 do art. 851.º do CPC – [a que corresponde o actual artigo 768º do CPC]:

«2 - A penhora de veículo automóvel é seguida de imobilização do veículo, designadamente através da imposição de selos ou de imobilizadores e da apreensão do documento de identificação do veículo, nos termos dos n.os 3 a 8 do artigo 164.º e do artigo 161.º do Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as necessárias adaptações, e de portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.

3 - Após a penhora e a imobilização, o veículo só é removido quando o agente de execução entenda necessário para a salvaguarda do bem, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 167.º e 168.º do Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio».), no que se refere às medidas destinadas à apreensão efectiva (Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., III volume, anotação 8 ao art. 230.º, pág. 636.). Ou seja, a penhora implica a imobilização do veículo e a sua entrega à guarda de um depositário idóneo, cuja escolha recai sobre o funcionário”.

A este propósito, tenha-se em consideração, ainda, conforme realçado no acórdão deste TCA, de 13/10/17, proferido no processo nº 272/17.1BELLE, que “tratando-se de penhora de veículos automóveis, nos termos do art. 22.º, n.º 1 do Código de Registo Automóvel, “a “apreensão, a penhora e o arresto envolvem a proibição de o veículo circular.”. – veja-se sobre este assunto o recente Ac. deste tribunal proferido em 09/06/2016 no processo nº 9594/16, onde se pode ler o seguinte.

“(…), a penhora de veículos automóveis implica necessariamente a proibição do veículo circular, e a “circulação do veículo com infracção da proibição legal sujeita o depositário às sanções aplicáveis ao crime de desobediência qualificada.”

Prosseguindo a citação que vínhamos fazendo do acórdão do STA, de 14/08/13, deve notar-se que “Apesar de, como já referimos, a escolha do fiel depositário pelo funcionário poder recair sobre o executado, este não tem direito a ser nomeado quando o bem penhorado seja um veículo automóvel (Tanto quanto nos recordamos, o direito de escolha do depositário só não existe nos casos previstos no art. 839.º, n.º 1, do CPC.- [a que corresponde o actual artigo 756º do CPC]. Consequentemente, a sua remoção do cargo também não afecta qualquer direito que lhe advenha da sua qualidade de executado.

É certo que o Recorrente argumenta com o seu «interesse na preservação do automóvel», uma vez que entende que este seria «mais bem conservado nas suas mãos do que nas de um qualquer estranho». Mas essa argumentação não procede.

Desde logo, a lei entendeu não tutelar esse “interesse”; caso contrário, teria estabelecido uma preferência pela nomeação do executado como fiel depositário do veículo que lhe seja penhorado, solução que não foi a adoptada.

Depois, porque o alegado interesse do Executado só estaria melhor assegurado pela sua nomeação como fiel depositário se estivesse demonstrado que reúne condições para o exercício do cargo e que o fiel depositário que o substituiu no exercício do cargo não as reúne, demonstração que nem sequer foi ensaiada.

Finalmente, o interesse do executado na guarda e conservação do bem penhorado está garantido pelo conteúdo funcional do cargo de fiel depositário, do qual destacamos o dever de guarda (cfr. art. 1187.º do Código Civil), e pela responsabilidade que a lei lhe assaca pelo incumprimento dos seus deveres. Note-se que se o fiel depositário incumprir com os seus deveres, designadamente os de guarda ou conservação, não só ele, como também o Estado, podem ser responsabilizados. Na verdade, o Estado pode ser responsabilizado pelos actos do depositário, que deve ser considerado como um seu agente ad hoc (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., III volume, anotação 7 ao art. 233.º, págs. 645/646.), como decidiu já este Supremo Tribunal Administrativo (Vide o acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Dezembro de 2007, proferido no processo n.º 491/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 21 de Maio de 2008 (…)”.

Ora, o que aqui se deixou transcrito é inteiramente aplicável no caso sub judice, cujos contornos são muito idênticos ao caso apreciado pelo STA.

Por último, diga-se que o teor da conclusão H) encerra uma argumentação que jamais foi alegada e, como tal, apreciada em 1ª instância, razão pela qual não tem este Tribunal que dela se ocupar.

Face de tudo quanto foi dito e dispensando-se maiores considerações, conclui-se que bem andou a sentença recorrida ao considerar que, no caso, a decisão de remoção do cargo de fiel depositário não constitui acto lesivo de qualquer direito ou interesse legítimo do executado, motivo pelo qual a sua pretensão, ao impugnar judicialmente o despacho em causa, não pode obter sucesso.

Improcedem, assim, as conclusões da alegação de recurso, negando-se provimento ao mesmo.

Mantém-se, em consequência, a sentença recorrida.


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3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 14/02/19


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Vital Lopes)

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(Hélia Gameiro Silva)